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O Palmeiras de Abel transcende

Crédito imagem: Cesar Greco/Palmeiras

Ganhar consecutivamente não é simples. É para poucos. O chavão que diz: ‘mais difícil do que alcançar o topo é se manter nele’ faz todo sentido. Por isso, os méritos do Palmeiras com esse bi (tri) campeonato da Libertadores devem ser reconhecidos e aplaudidos de pé.  

Vamos começar falando da parte mental, que o técnico Abel Ferreira tanto propaga. É normal o ser humano relaxar após um feito conquistado. Nossa natureza nos leva a uma acomodação depois de um objetivo alcançado. Pegue você, na sua vida pessoal e profissional: não é difícil se colocar em ação posteriormente a uma meta atingida?! Pois bem, atletas profissionais não são diferentes… e quando Abel percebeu que estava difícil recolocar o foco do grupo em conquistar mais, fazer história, ele pediu reforços. Alguns entenderam como choro e desculpa pela oscilação da equipe no começo da temporada… os reforços não vieram e mesmo assim Abel conseguiu colocar todos novamente em alta performance e veio mais uma Libertadores. Incrível!

E temos que voltar nosso olhar também para o Palmeiras como um todo. Um clube que hoje atua com excelência em cada um de seus departamentos. Que trabalha incessantemente para minimizar os riscos e erros naturais e inerentes ao futebol.

Chegar e ganhar tanto nunca é obra do acaso! Ciência do esporte, fisiologia, nutrição, parte médica, análise de desempenho, governança, finanças, enfim, tudo no Palmeiras hoje é feito de forma extremamente profissional. Duas Libertadores, dois Brasileiros, duas Copas do Brasil e um Paulistão em seis anos confirmam isso. Abel com seu inconformismo, sua gana, seus estudos, sua comunicação pautada na Programação Neurolinguística, era a cereja que faltava nesse bolo. Um clube forte vai produzir bons resultados independentemente do treinador. Mas esse mesmo clube com um técnico acima dos demais terá resultados jamais alcançados.

Esse é o Palmeiras de Abel 2021. Transcendendo tudo o que já foi feito na gloriosa história alviverde.

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Táticas: restringem ou potencializam as tomadas de decisão? – Parte Final

Créditos imagem: Lucas Figueiredo/CBF

Nesta terceira e última parte (Clique aqui para acessar a primeira parte ou aqui para a segunda parte), darei continuidade às discussões acerca da influência da tática nas tomadas de decisão, analisando uma outra possível abordagem do desenvolvimento tático na formação de um jogador, além de apresentar minhas conclusões sobre esse tema tão polêmico.

Princípios Táticos na Formação de um Jogador

Nessa parte, iremos discutir a formação do jogador de futebol através do desenvolvimento dos princípios táticos, usando como estratégias pedagógicas jogos condicionados e uma variedade de táticas individuais e de grupo.

Entenda por “princípios táticos” o resultado de décadas de estudos da pedagogia do esporte procurando compreender a lógica do jogo. Para Castelo (1994), citado por Costa et al. (2011), os princípios táticos são a tradução teórica a propósito da lógica do jogo, em que se busca operacionalizar os comportamentos técnico-táticos dos jogadores. Por isso, os jogadores precisam conhecê-los e saber como usá-los.

Diferentes princípios táticos, de acordo com o Glossário do Futebol Brasileiro (Fonte: CBF Academy, 2020).

Para que esses princípios possam ser compreendidos e desenvolvidos, uma opção de aprendizagem são os jogos condicionados, que envolvem atividades com mudanças nas regras (alterando o tamanho do campo, posicionamento e número de jogadores, gols etc.), procurando criar desafios para que os jogadores possam resolver os problemas do jogo (BALZANO, 2012).

Também é possível desenvolver princípios táticos específicos, através das táticas de grupo e individual, a partir do entendimento das mesmas como expressões do jogo, buscando soluções ótimas para desafios que se repetem em termos de lógica, dentro da variabilidade infinita do jogo. 

Dois exemplos de táticas individuais são a antecipação defensiva, no qual o defensor se antecipa ao atacante adversário a fim de interceptar a bola, e a antecipação ofensiva, que geralmente ocorre durante um cruzamento, no qual o atacante se antecipa ao defensor para tentar finalizar ao gol do oponente.

Para enriquecer o repertório e a criatividade dos jogadores, pode-se incluir no processo de ensino-aprendizagem características tanto da cultura brasileira, quanto de outras modalidades esportivas, especialmente o futsal.

Por exemplo, para fugir da marcação, pode-se ensinar uma movimentação típica do futsal conhecida como “dar o gato”, em que o jogador realiza rápidas mudanças de direção para criar espaço para receber a bola.

Ao pensar em táticas de grupo e combinações tradicionais como o “toca e vai” (também conhecida como “um, dois” ou “passe de parede”), pode-se adicionar variações a partir dos conceitos por trás de jogadas típicas do futsal, como os da paralela e da diagonal, para ajudar a desenvolver a capacidade de percepção das ações e as possibilidades da tomada de decisão dos jogadores (Antonelli, 2018).

Figura 2. Dentro de um modelo tático, os jogadores podem se utilizar da sua capacidade de leitura de jogo e realizar diferentes combinações para ludibriar a marcação adversária. Fonte (Antonelli, 2018).

Cada tática de grupo exigirá dos jogadores uma série de táticas individuais para serem aplicadas com eficiência. Por exemplo, durante as combinações descritas acima, o jogador poderá também decidir individualmente se faz uma corrida mais longa quando o marcador for ultrapassado ou curta com parada brusca quando o marcador se afastar (Balzano, 2020), proporcionando assim outras formas de realizar a conexão.

Para Santana (2019), as táticas individuais são uma forma de expressão da autonomia dos jogadores e representam um recurso importante na resolução dos problemas do jogo.

Dentro dessa perspectiva de adicionar elementos para o processo de leitura, tomada de decisão e execução das respostas, as táticas de grupo e individuais podem ser usadas como catalizadoras da tomada de decisão, desenvolvimento cognitivo e motor, permitindo ao jogador excelência na resolução dos problemas do jogo, podendo ser aplicadas em qualquer esquema tático e, assim, ajudando a formar um jogador “criativo”. Nessa perspectiva, um jogador com uma formação rica de estímulos que permita compreender a lógica do jogo será capaz de executar soluções eficientes dentro do universo “micro” do mesmo. E em momentos posteriores da sua formação, quando as capacidades cognitivas estiverem mais desenvolvidas, será possível aprender com maiores detalhes os esquemas táticos e as funções que irá desempenhar dentro dos modelos de jogo modernos.

Conclusões

Afinal, as táticas restringem ou ampliam as tomadas de decisão? As táticas podem tanto restringir quanto ampliar as capacidades de decisão dos jogadores. A questão não é buscar uma visão dualista e considerá-las como “boas” ou “ruins”, mas compreender o universo tático e as implicações de diferentes abordagens (didáticas-metodológicas), seja na formação de um jogador ou no aprimoramento do atleta em idade adulta.  A forma como o treinador entende, desenvolve e possivelmente exige a aplicação de cada tática pode torná-la mais restritiva ou abrangente.   

É preciso tomar cuidado para não as usar de forma a restringir o desenvolvimento de jogadores durante a sua formação, através de uma especialização precoce de “posição e função”, ou ao exigir que certas táticas (sejam elas individuais, de grupo ou coletivas) sejam utilizadas sem a compreensão das mesmas, o que pode acarretar em uma utilização fora do contexto mais apropriado.  Por outro lado, uma abordagem tática intencional e organizada, que considere os diferentes estágios de desenvolvimento, pode ajudar a desenvolver jogadores que sejam capazes de compreender e seguir esquemas e desempenhar funções específicas, e também de serem criativos e efetivos dentro dos campos, podendo ter capacidade autônoma de responder aos inúmeros problemas que emergem durante o jogo.

Referências

Antonelli 2021: O Futebol Potencializado pelo Futsal. Disponível em: https://www.soccerpoweredbyfutsal.com/livros

Balzano 2012: Metodologia dos Jogos Condicionados para o Futsal e Educação Física Escolar. 1 ed. Várzea Paulista, SP.

Balzano 2020: Dois Um Brasil: Um Método Genuinamente Brasileiro. Fontoura.

Beuker, M. (2021). Thinking differently at AZ Alkmaar. Disponível em: https://trainingground.guru/articles/marijn-beuker-thinking-differently-with-az-alkmaar

Da Costa, I. T., da Silva, J. M. G., Greco, P. J., & Mesquita, I. (2009). Princípios táticos do jogo de futebol: conceitos e aplicação. Motriz. Journal of Physical Education. UNESP, 657-668.

Santana, W. (2019). Qual o maior legado para o futebol do jogador formado no futsal? Clique aqui para acessar.

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Estágio de evolução da equipe: a convicção no processo!

Crédito imagem: Robson Mafra/AGIF

A ideia de futebol coletivo ainda sofre resistência no Brasil. Há no inconsciente do torcedor uma certeza de que o melhor time é o que tem os melhores jogadores. Não que isso não possa acontecer. Mas não é regra.

Em um jogo disputado por vinte e dois atletas, com oposição, campo grande, alvo (gol) proporcionalmente pequeno, em que há momentos de ataque – com a bola – e de defesa – sem a bola – podemos até discutir quais de fato são os melhores jogadores. Os que atacam melhor? Ou os que sabem defender com mais eficiência? Por isso o conceito de equipe passa necessariamente pela junção de atletas que se complementem.

E formar um time eficiente e vencedor leva tempo. Há uma infinidade de variáveis. O que se sabe com certeza, porém, é que após essa análise inicial de características e perfis, vem as dinâmicas e os encaixes que dependem de repetição e de uma certa “química” que vem do campo, da bola, dos treinos e dos jogos.

E isso tende a não brotar do nada, da noite para o dia…

Diante disso, me incomoda as cobranças em cima do atual elenco do Corinthians, sobretudo após as derrotas para Atlético-MG e Flamengo. Ambas fora de casa!!! O técnico Sylvinho pode e deve ser criticado por algumas estratégias e escolhas. Afinal, qual técnico do mundo é perfeito e não comete falhas?! 

Mas aqui precisamos falar de processo. De tempo, de maturação. De conjunto! Como colocar os atuais times de Corinthians, Flamengo e Atlético-MG no mesmo estágio de evolução?! É impossível! Basta um recorte mínimo da temporada passada: Flamengo e Galo brigaram por conquistas e o Corinthians lutou contra o rebaixamento. E se for para individualizar, Willian, o melhor reforço corintiano, não joga há cerca de um mês.

Entendo a paixão do torcedor e não pretendo que quem está na arquibancada use a razão para interpretar o que se passa dentro de campo, analisando tudo de maneira contextual e sistêmica. Mas espero que quem esteja no comando não tenha essa mesma passionalidade e compreenda que nenhum grupo se torna vencedor sem um trabalho constante, coerente e perene.

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Principal diferença entre a aula e o treino de futebol

Crédito imagem: Marcio Vieira/ATN

No processo de iniciação esportiva, considero importante os professores perceberem que dão aulas, e não treinos. Por que me importo com isso?

Alguém pode dizer, talvez, que, comercialmente, seja mais interessante chamar minha aula de treino, para que as crianças e, especialmente, seus pais sintam um clima do tão idealizado sonho de estar em um clube de futebol profissional. Se for apenas para simular uma situação que está no imaginário tanto dos pais quanto das crianças, até entendo, embora tenhamos que conscientizá-los de que há grandes diferenças que precisam ser respeitadas.

O problema é quando não há a devida distinção por parte dos professores. Eles mesmos se enxergam como treinadores de equipes adultas e não professores de crianças ou adolescentes em etapa de iniciação. Não quero de maneira nenhuma desmerecer a categoria de professores de futebol. Pelo contrário! Quero enaltecer que para ser professor(a) de iniciação e dar uma boa aula de futebol, precisamos saber coisas diferentes daqueles que dão bons treinos de futebol para jovens e adultos. Às vezes, pode ser até o(a) mesmo(a) profissional com competência para atuar nas diferentes etapas do processo de formação, caso ele ou ela entenda que a sua postura, didática, estímulos e feedbacks devem se alterar coerentemente ao público que está trabalhando. 

Entretanto, não é apenas a questão da idade do público-alvo que diferencia se daremos uma aula ou treino, concorda? A principal diferença está no processo de ensino-aprendizagem ao qual esse momento de interação entre o educador (professor ou treinador) e educando (aluno ou atleta) está inserido. Para entendermos em qual processo estamos inseridos, precisamos nos perguntar: (1) qual é a quantidade e a qualidade de prática que o(a) aprendiz necessita para ter uma aprendizagem efetiva? (2) quais variáveis posso conduzir e controlar dessa prática no meu trabalho de educação esportiva?

Vamos utilizar o exemplo do processo de ensino-aprendizagem do futebol. Muitas vezes, os alunos e alunas que apresentam um melhor nível de jogo nas escolas de futebol são aqueles(as) que, sempre que damos a oportunidade de terem tempo e espaço livres, querem brincar de bola ou certas brincadeiras tradicionais (que também ajudam de alguma forma para as habilidades aplicadas no futebol). As crianças que frequentam escolas de futebol, e apenas possuem esse tipo de experiência lúdica nesses espaços formais, costumam ter uma aprendizagem muito aquém daquelas que brincam em ambientes informais também. Se a escola for boa, ela contribuirá para a aprendizagem efetiva dos dois tipos de crianças. Contudo, sabemos que aquelas que chegam ao alto rendimento são as que praticaram uma quantidade de horas muito além daquelas fornecidas pelas escolas de futebol.

Este exemplo nos faz pensar no papel que as aulas de futebol têm para as crianças aprenderem efetivamente o jogo. A frequente prática informal de jogos de bola com os pés (Scaglia, 2003) pode ser muito eficaz na aprendizagem do futebol, como foi extensamente observado na história do futebol mundial, sobretudo brasileiro. Então, qual a contribuição que eu, como professor de futebol, posso dar aos meus alunos e alunas para que aprendam e melhorem na prática do futebol? Posso utilizar a minha aula para ensinar coisas importantes para a vida, que reverberarão no futebol, posso ensinar a gostarem de futebol e jogos relacionados a ponto de quererem praticá-los sempre que puderem, posso ensinar a pensarem o jogo e seus componentes de uma maneira diferente da que pensavam antes da aula e, com isso, conseguirem enxergar soluções para jogar que não viam anteriormente, posso ensinar a terem bons ídolos e referências de aprendizagem, posso ensinar que podem aprender e como aprender o jogo ou qualquer outra coisa. Como irão utilizar esses aprendizados? Não posso controlar, pois não fico tempo suficiente com meus alunos e alunas para isso. Eu ensino para autonomia plena, para que façam do futebol aprendido o que quiserem.  

Agora esse cenário muda um pouco de figura quando estou inserido em um processo de treino. O treinamento esportivo tem princípios que precisam ser respeitados, são eles (Lussac, 2008):

  • Princípio da individualidade biológica.
  • Princípio da adaptação.
  • Princípio da sobrecarga.
  • Princípio da continuidade/reversibilidade.
  • Princípios da especificidade.
  • Princípio da variabilidade.
  • Princípio da interdependência de volume/intensidade.
  • Princípio da saúde.
  • Princípio da interdependência dos princípios.

Alguns deles devem ser respeitados em aulas de escolas de futebol, porém outros, são mais difíceis. Especialmente o princípio da sobrecarga e da continuidade são dificilmente atingidos pelo fato de as crianças normalmente passarem muito poucas horas semanais na escola de futebol, cerca de 2 a 4 horas, tendo em vista a quantidade de conteúdos e adaptações orgânicas que o futebol demanda para que a criança o aprenda efetivamente. Se ela não tiver uma prática extra fora da escola, ela evoluirá vagarosamente e não conseguirá chegar a um grande nível de aptidão para a modalidade. Além disso, o princípio da especificidade deve ser relativizado na etapa de iniciação para que não haja a especialização precoce.

Em processos de treinamento, todos os princípios devem ser respeitados e controlados dentro da periodização, almejando a performance esportiva crescente. Este deve ser um objetivo claro de ambos, educador(a) e atleta. Não é à toa que em determinada etapa do processo de formação de atletas de futebol, eles ou elas são impedidos(as) de praticarem a modalidade fora do ambiente formal do clube. Sempre que há um treinamento por conta do(a) atleta, este trabalho deve ser bem coordenado com a comissão técnica responsável pelo seu treinamento dentro do clube. Quanto maior a estrutura de suporte à comissão técnica, mais variáveis importantes para o desempenho devem ser controladas: estímulos, adaptações, alimentação, sono, repouso, estresse, entre outras.

Esta distinção entre a aula e o treino pode ser aplicada a qualquer contexto. Para garantir a aprendizagem efetiva de um instrumento musical, de um novo idioma, de liderança, de uma nova área de trabalho etc., se a pessoa não tiver o comprometimento de organizar as variáveis de desempenho para canalizá-las à sua performance, ela não chegará ao alto nível. Em etapas de iniciação a qualquer atividade, não é momento de haver uma preocupação tão grande com todas as variáveis que interferem no desempenho, mas sim, na relação construída entre o indivíduo e a atividade. Por exemplo, construindo uma relação de que o indivíduo se sinta bem e feliz naquela atividade e queira estar fazendo-a sempre que possível. Esta tarefa do(a) educador(a) é extremamente importante e difícil, pois cada indivíduo traz consigo uma série de medos e inseguranças sobre o desconhecido. Além do mais, sobretudo quando a pessoa começa uma atividade (etapa de iniciação a qualquer coisa), ela e ninguém sabe bem o que representará essa atividade para a vida dela. É recomendado, inclusive, que a pessoa experimente coisas diferentes para, só depois, saber em qual delas ela realmente quer dedicar mais energia e se tornar boa.

Enfim, se me permitem dizer algo aos professores e treinadores de futebol, é que todos saibamos em que etapa estamos trabalhando para identificarmos as reais necessidades de estímulos à aprendizagem efetiva e o desenvolvimento integral do indivíduo, seja o(a) aluno(a) ou o(a) atleta.  

________________________________________

Scaglia, A J. O futebol e os jogos/brincadeiras de bola com os pés: todos semelhantes, todos diferentes. Tese de Doutorado, Unicamp, 2003.

Lussac, R. M. P. Os princípios do treinamento esportivo: definições, possíveis aplicações e um possível novo olhar. EFDeportes.com – Ano 13, n. 121, 2008.

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Vou falar de arbitragem. Mas só hoje…

Crédito imagem: Washington Alves/Cruzeiro

Evito falar de arbitragem. Em minhas tribunas, prefiro campo e bola. É isso que decide campeonatos. Os árbitros podem até interferir em um jogo ou outro – normal, porque são seres humanos e estão passíveis de equívocos. Porém no médio prazo, em um torneio, principalmente de pontos corridos, ganha sempre quem mereceu. Quem foi melhor.

Ao passo que me incomoda técnicos e dirigentes que culpam quem apita por tudo de ruim que lhes acontece, não gosto de usar este nobre espaço para falar disso. Só abro esta exceção por conta dos últimos acontecimentos. Não posso me calar ao ver quem comanda (!) trocar pessoas, mas manter esse modelo amador falido e a falta de união dos clubes diante de tudo isso.

Como pode o árbitro não ser profissional?! Em uma indústria que movimenta milhões, até bilhões de reais, quem apita é amador. Não é possível mesmo pagar um salário mensal e oferecer toda a preparação necessária para quem vai definir a justiça no placar?! E me refiro aqui aos árbitros de campo e também a quem opera o VAR. Por melhor que seja a tecnologia ela ainda é manuseada por seres humanos. 

Quando não está apitando, esse indivíduo não tinha que estar em um outro emprego, que ele é obrigado a ter para poder entrar no quadro de árbitros. Ele deveria estar fazendo a preparação física específica para os movimentos necessários no campo de jogo, tendo uma preparação psicológica voltada para a pressão que é encontrada dentro das quatro linhas, assistindo aulas, reforços e palestras sobre recomendações e interpretações das regras, enfim, se o jogador atua no domingo e faz toda a preparação nos dias seguintes, porque o árbitro tem que ser amador e realizar outra atividade laboral?!

E chego aqui em outro ponto crucial que faz com que tudo isso vá se perpetuando por décadas a fio: a falta de união dos clubes. O individualismo e o egoísmo que vemos são absurdos! Se há um erro contra mim, grito, esperneio e faço uma pressão. Se sou “favorecido” me calo cinicamente. Não há a menor intenção de discutir o todo, o sistema. E sim pressionar para a próxima partida…

Não sei a quem interessa uma arbitragem não profissional…aos clubes é que não… mas eles estão muito ocupados, fazendo força nos bastidores tentando evitar, por exemplo, que um árbitro que seja de um estado que tenha algum clube brigando pelo mesmo objetivo, não apite seus jogos… triste futebol brasileiro…

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Entendendo o jogo de hoje

Crédito imagem: A2M/CBF

A evolução do futebol nos obriga a também sermos melhores em vários pontos: entendimento, comunicação, análise etc. Se o jogo já não é mais o mesmo de vinte, trinta anos atrás, obrigatoriamente temos que compreender o que de fato acontece nas quatro linhas contemporâneas, sob pena de vermos o fenômeno atual com um óculos míope de um passado que só existe em nossas memórias afetivas.  

Um ponto interessante para refletirmos é a posição e função de cada jogador em campo. Como uma visão simplista do papel individual nos leva a leituras coletivas distantes da realidade: temos como um padrão cultural no mundo todo a necessidade de definir esquemas nas escalações; as próprias transmissões televisivas precisam de um desenho inicial para melhor apresentar os onze titulares. Me refiro aqui ao 4-4-2, 4-3-3, 3-5-2 etc. Porém são raras as equipes que mantém uma ocupação rígida do espaço durante os noventa minutos. Com a bola há uma formação, se a posse está com o adversário há outra, sem falar das transições que também pedem desenhos táticos específicos. Soma-se a isso a necessidade de se rotular cada jogador por características ‘universais’: volante marcador, lateral ofensivo, meia de chegada, centroavante matador e por aí vai… o problema de tudo isso? Acreditar que um time pode estar defensivo demais por ter ou três zagueiros ou dois volantes. Ou o oposto: achar que ao escalar vários atacantes um time estará sendo ofensivo e agressivo…

Ao invés de olharmos plataformas de jogo (os 4-4-2 e adjacentes), vamos observar comportamentos e ideias, ou seja, quais os padrões da equipe para atacar e defender – e isso vai muito além da simples ocupação do terreno de jogo. Ou quem sabe ainda sairmos do clichê de que zagueiro tem que ‘zagueirar’ e atacante não pode ajudar na marcação porque assim não terá fôlego (?) para chegar na frente. Todo jogador pode ter um perfil com e sem a bola. No momento ofensivo todos atacam, incluindo o goleiro, e no defensivo todos defendem, inclusive o centroavante. Um viés mais sistêmico e completo é o que pede o jogo atual de alto nível.

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Como a subjetividade do futebol nos apaixona

Crédito imagem: Felipe Oliveira/EC Bahia

Há vários argumentos, teorias e explicações sobre o porque de o futebol ser o esporte mais apaixonante, assistido e comentado do mundo. Todas as teses são válidas e corretas. Sabe por que? Por ser imprevisível, não há certo ou errado no futebol. Até o bonito e o feio são particulares, próprios de cada um. E é aí que está a graça do negócio! 

Com um terreno de jogo de grandes dimensões, o alvo (os gols) pequeno, vinte e dois jogadores manipulando a bola com os pés – mais difícil por essa ser a parte do corpo mais distante do cérebro (tente escovar os dentes com os pés para comprovar a dificuldade!) – enfim, esses são alguns poucos, mas há vários outros elementos básicos do futebol que o tornam uma verdadeira caixinha de surpresas.

O jogo tem evoluído absurdamente nos últimos trinta anos. A tecnologia está tornando tudo mais veloz e dinâmico não só dentro, mas também fora das quatro linhas. As informações são globais, gerando um intercâmbio mundial de ideias que também contribui para o aumento da qualidade.

Apesar de tudo isso, tenho certeza que se esse texto fosse escrito daqui cem anos, mesmo com a tecnologia chegando a patamares inimagináveis para a nossa geração, eu continuaria afirmando que o futebol é algo imprevisível e aleatório.

Estudamos ao máximo todas as vertentes do jogo e mesmo assim há variáveis eternamente incontroláveis. Existem inúmeras formas de se aumentar as probabilidades de sucesso. Mas nenhuma certeza. Técnicos, analistas e os próprios jogadores podem se preparar da melhor maneira possível que mesmo assim a vitória não é certa. Há quem garanta, inclusive, que em um jogo de futebol há mais possibilidades de acontecimentos do que há átomos no universo!

Encerro, com base em tudo isso, trazendo exemplos práticos que estão acontecendo neste final de 2021 no futebol brasileiro: 

  • mesmo o Flamengo sendo o mais rico ele não vai ganhar tudo.
  • o time flamenguista de Jorge Jesus nunca mais vai existir, mesmo se estiverem reunidos todos aqueles jogadores e o próprio Jesus. Porque não foram só as pessoas que fizeram aquele futebol arte. Foram as pessoas e suas circunstâncias. O que é bem diferente…
  • a Chapecoense, mesmo virtualmente rebaixada, pode tirar pontos de quem está em cima da tabela.
  • o Grêmio pode ser rebaixado, mesmo com um time repleto de craques.
  • Marinho jamais voltará a ser no Santos e em clube algum o craque que foi em 2020.
  • Benitez, meia do São Paulo, é craque, mas não consegue jogar. Não compensa tê-lo no elenco, mesmo sendo craque, repito.
  • o Corinthians mesmo com quatro excelentes reforços vai oscilar. Lembra que estamos falando de algo coletivo e subjetivo?! E o técnico Sylvinho tem culpa quase nula nessa natural oscilação…

Enfim, o futebol é um eterno comparativo entre a ilusão da expectativa e a gestão da realidade… o torcedor continuará sofrendo esperando certezas em algo total e prazerosamente imprevisível!