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Na onda da Copa

Este ano concluí na Suíça um programa de pós-graduação promovido pela Fifa, denominado Fifa Master. Dentre diversas atividades extremamente proveitosas, desenvolvi um projeto acadêmico de pesquisa que analisou os impactos da Copa do Mundo de 2010 na liga de futebol sul-africana.
 
A grande relevância desse trabalho, em nosso dia-a-dia, é que as Copas de 2010 e de 2014, que provavelmente será realizada no Brasil, têm muito em comum. Digo que a Copa de 2014 provavelmente será aqui, uma vez que o Brasil ainda pode perdê-la, caso não cumpra tudo aquilo prometido pela CBF.
 
E, cá entre nós, é melhor não ser escolhido, do que, uma vez escolhido, ser substituído por falta de recursos.
 
Enfim, naquele trabalho realizado, identificamos uma série de impactos sobre a liga de futebol que já estão ocorrendo antes mesmo da Copa de 2010. Dentre eles, podemos citar:
 
(i)           Os direitos de televisão da liga nacional foram renegociados, com valores inéditos;
(ii)          Clubes de menor porte estão sendo adquiridos e novos patrocínios sendo assinados, por pessoas (físicas e jurídicas) que antes não investiam em futebol;
(iii)         O CEO da liga foi substituído, dando a ela um caráter muito mais profissional;
(iv)         Novos conceitos de gerenciamento e administração da liga estão sendo implementados;
(v)          O nível do futebol local aumentou (basta ver os números de gols, etc), uma vez que os seus jogadores estão querendo “mostrar serviço” ao nosso Parreira, atual técnico da seleção sul-africana, conhecida como “bafana bafana”.
 
Importante para nós brasileiros, e, em especial à CBF, ficarmos atentos a esses impactos, bem como as providências que a liga sul-africana está tomando, para que possamos adotar por aqui uma estratégia que, finalmente, coloque o nível do nosso futebol local à altura que merecemos.
 
Não podemos mais admitir casos como a tragédia da Fonte Nova. Se não formos diligentes com essas questões, a saída para problemas como esse será apenas a reforma dos principais estádios que serão utilizados para a Copa de 2014, sendo que os outros milhares de estádios que possuímos ainda estarão nas mãos de Deus para que outra tragédia não ocorra.
 
A CBF precisa aproveitar a Copa do Mundo não só para mostrar que é capaz de organizar um evento dessa magnitude ou, em outras palavras, para “inglês ver”. Ela precisa sim utilizar esse momento espetacular que a Copa traz para efetivamente fazer uma competição, em todos os seus níveis, organizada e com clubes estruturados.
 
Uma excelente medida, que já foi implementada na Europa e que está sendo estudada na África do Sul, é o estabelecimento de um regime de licenciamento de clubes. Para quem não está familiarizado com esse sistema, as ligas européias editaram regras uniformes e rigorosas para que o clube possa se habilitar a participar da competição. As regras vão desde aspectos de segurança no estádio até critérios específicos para organização interna de diretores e investidores dos clubes.
 
A CBF deveria implementar uma cartilha dessa natureza, porém realista ao cenário brasileiro, para que os clubes pudessem participar das ligas em que se encontram.
 
Os clubes de primeira divisão, por exemplo, não poderiam apresentar estádios precários para mando de seus jogos. Assim, a Fonte Nova nunca seria liberada para utilização em jogos oficiais.
 
Devemos mencionar aqui que o sistema de licenciamento ainda é bastante discutido na Europa e questionado por clubes de menor expressão, que dificilmente conseguem se adequar a todos os requisitos. Se de um lado isso traz alguns problemas para esses clubes, por outro obriga os demais clubes a atingirem excelência no trato com seus torcedores, imprensa, investidores, times adversários, etc.
 
Essa é apenas uma das ferramentas que a CBF poderia aproveitar do impacto trazido pela copa do mundo. Mas outras tantas podem ser aproveitadas caso haja vontade e seriedade de seus dirigentes.
 
A Copa do Mundo deve ser bem organizada, não resta dúvidas, a Fifa cobrará a CBF por isso. Porém, a CBF deve olhar também às possibilidades que possam levar o nosso futebol interno a uma reforma benéfica e sustentável em prol de todos os brasileiros. É para isso que vale a pena utilizar verba pública para melhoria dos estádios. Caso contrário, será mais uma oportunidade perdida.

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A atmosfera do espetáculo

Fui a um show do Djavan, que dizem ser torcedor do Flamengo, aqui em Curitiba. O show foi dentro de um teatro, Guaíra, o maior da cidade, com capacidade para mais de 2 mil pessoas. Ultimamente, muitos shows musicais aqui em Curitiba têm acontecido no teatro. Coisa estranha.
 
No começo do show, casa lotada e todo mundo sentadinho, cada qual em seu lugar. Djavan tocava uma música, todo mundo escutava e no fim aplaudia. Coisa de teatro. Poderia ser uma peça, quiçá um monólogo. Aparentemente, tanto fazia. Primeiro a música, depois o aplauso. A alternância era constante e deixava o espetáculo bonito, mas estranho. Durante as músicas, as pessoas acompanhavam as letras, mas de forma contida. Era legal de ver. Mas parecia um devedê.
 
Conforme o show foi evoluindo, os espectadores começaram a ficar inquietos. Uns se levantavam para dançar aqui, outros acolá, mas nada que durasse por muito tempo. Logo se sentavam. Em determinado momento, porém, Djavan convocou todos à beira do palco. De imediato, o público se levantou e passou a pular, dançar, gritar, esgoelar, et al. Aí sim, dava dizer que se estava em um show. Djavan e a banda passaram a interagir com a platéia, e a platéia correspondia. Diferentemente da situação anterior, o show se distinguia de um DVD. Era um evento único e interativo. Muito culpa da atmosfera criada pelas variáveis que foram transformadas no decorrer do espetáculo por demanda da banda e do público. A banda sentiu-se mais confortável em atuar nesse ambiente, e o público, aparentemente, pagou para participar do show, e não para simplesmente assisti-lo.
 
A atmosfera é, hoje, o grande produto que se vende em grandes espetáculos, e no futebol não é diferente. A atmosfera de um jogo de futebol é atualmente o grande produto de um estádio de futebol. Nos primórdios, o estádio vendia o acesso ao jogo. Afinal, ou se ia ao estádio para ver o jogo, ou não se via em lugar algum. Conforme a tecnologia foi evoluindo, esse produto passou das mãos dos estádios para as mãos dos veículos midiáticos. Hoje, o acesso ao jogo não é mais um produto dos estádios, mas dos canais de televisão e de outras mídias, que conseguem oferecer o acesso de maneira muito mais adaptada ao gosto do público. Com isso, o estádio precisa se preocupar em vender produtos e valores agregados ao jogo que a televisão não consegue vender. É o caso da atmosfera do jogo. Quem vai ao estádio não o faz para ver o jogo. O faz para sentir o jogo, para participar do jogo, para viver o jogo. E quem vende esse produto precisa estar preocupado em oferecê-lo da melhor maneira possível.
 
No Brasil, não há sinais de que as pessoas estão muito dispostas a pagar pela atmosfera do jogo, até porque a atmosfera não é a adequada para boa parte do público, uma vez que ela está aparentemente atrelada ao sentimento de insegurança. Além disso, o esforço necessário para se vivenciar esse ambiente acaba não sendo justificado, uma vez que é preciso adicionar ao custo da atmosfera fatores como banheiros inapropriados, trânsito caótico e estrutura precária, entre outros, muitos outros.
 
Boa parte da solução para esse problema passa não só pela mobilização dos clubes de futebol e órgãos reguladores das competições, mas também, e talvez principalmente, pela ação do poder público, ainda mais em um país subdesenvolvido, ou em desenvolvimento, como o nosso. Como o público que utiliza os estádios não possui muito valor econômico, eles acabam abandonados e carentes de manutenção e serviços básicos. Como o futebol possui grande importância pública e por conta disso os estádios continuam a ser utilizados, independentemente do seu estado, cabe ao poder público definir os limites mínimos que prezem pela segurança e comodidade das pessoas que fazem uso desses espaços.
 
O fato de que o grande responsável por iniciativas que regulem a segurança dentro dos estádios é o poder público torna o acidente acontecido no estádio da Fonte Nova ainda mais absurdo, uma vez que o estádio pertence ao poder público. Se o poder público não consegue zelar nem por aquilo que é dele, como pode ele exigir alguma coisa dos outros? Não tem muito mais o que possa ser dito. É simples assim. Triste e infelizmente.
 
Alguém parou pra pensar no ridículo que foi o acidente na Fonte Nova? Alguém parou pra pensar que um buraco abriu no meio do concreto? Como alguém explica uma coisa dessas? Como o poder público explica uma coisa dessas?
 
No dia 05 de outubro de 2006 eu publiquei uma coluna neste mesmo digníssimo site que dizia o seguinte: “Sempre digo que uma grande tragédia está à espera do futebol brasileiro. Cada vez mais tenho certeza disso. Infelizmente, parece que as coisas só mudarão quando ela acontecer”. Como eu disse que sempre digo e continuarei a dizer: uma grande tragédia aguarda o futebol brasileiro. A morte de sete torcedores na Fonte Nova, infelizmente, ainda não é uma tragédia grande o suficiente para transformar de vez o futebol brasileiro. Vai acontecer o de sempre: políticos vão bradar, a imprensa vai reclamar e pouca coisa vai mudar.
 

Uma grande tragédia ainda aguarda o futebol brasileiro, e isso é visível e perceptível. Todo mundo sabe disso, ainda que inconscientemente. E quem paga pra freqüentar um ambiente desses? Melhor pagar a tevê a cabo. E torcer pra não abrir um buraco na minha sala.

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Fila de apagões

Mais de meio milhão de pessoas, média de quase 39 mil torcedores por partida, nove dos dez melhores públicos do campeonato, dez das dez melhores arrecadações da competição e quase R$ 5 milhões em renda ao longo de 13 partidas.
 
Os números da euforia da torcida com a volta do Bahia à Série B do Campeonato Brasileiro só não são mais belos pela tragédia em que se transformou o estádio da Fonte Nova na noite do último domingo. A queda de parte da arquibancada do estádio baiano deixou pelo menos oito mortos e apagou a festa baiana.
 
Não dá para se falar em acidente. Pelo menos não no que diz respeito a uma tragédia num estádio brasileiro. A precariedade nas estruturas dos principais locais que abrigam eventos esportivos no Brasil é gritante e assunto muito antigo. Mas, para variar, o tema vem sendo empurrado com a barriga já há muitos anos.
 
Quem nunca enfrentou a “emoção” de assistir a um jogo num estádio brasileiro pode considerar o caso da Fonte Nova um acidente. Mas, a cada partida que um torcedor tem o “prazer” de acompanhar in loco, a certeza de uma iminente tragédia é latente.
 
O apagão estrutural dos estádios brasileiros vem desde a década de 90. Alguns deles se preocuparam em reformar, passar por melhorias e deixar a situação mais tranqüila para o torcedor. Desde 1992, quando a proteção da arquibancada do Maracanã caiu e resultou na morte de torcedores antes da decisão do Brasileirão entre Flamengo e Botafogo, passando pelo desastre da decisão da Copa João Havelange em 2000, o abandono dos estádios tem gerado muitos transtornos à indústria do futebol.
 
Mais uma vez a imprensa alardeará o problema, reforçará os problemas estruturais que vivemos e não fará muita coisa além disso. Infelizmente. Afinal, a partir de uma cobrança contínua e eficiente, é possível provocar a mudança de comportamento dos dirigentes.
 
A queda na Fonte Nova faz a Bahia perder pontos até no projeto de abrigar partidas da Copa do Mundo de 2014. Mas revela também a necessidade de, para o bem do futebol, o país conseguir conter a falha estrutural que corrói os estádios e demais praças esportivas.
 
Investir milhões em novas arenas não é mera jogada de marketing ou até mesmo exigência para o país abrigar a Copa. O apagão dos estádios precisa ser resolvido urgentemente. Do contrário, o torcedor ficará afastado do futebol. E, junto com ele, todo o consumo que ele pode gerar. Isso sem falar, mais uma vez, em vidas perdidas pela negligência e conformismo de quem está no poder.
 
É mais um apagão na fila dos “apagões” que se transformou o país.

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É mais fácil jogar no 4-4-2 ou no 4-5-1? No 4-3-3 ou no 3-5-2?

DICA! – Para melhor compreensão e aproveitamento desse texto, retome os conceitos “Estruturação do Espaço de Jogo”; “Comunicação na Ação” e “Relação com a Bola” discutidos na 2ª parte.
 
A orientação das dinâmicas de uma partida de futebol a partir de uma plataforma de jogo é norteada por uma estrutura sistêmica maior; a lógica do jogo.
 
A boa comunicação na ação (de jogadores e equipe) é dependente da maior ou menor compreensão das dinâmicas proporcionadas pela plataforma de jogo. Então o nível de entendimento dos jogadores sobre essa variável (compreensão das dinâmicas) será fator determinante para a comunicação na ação mais eficiente. Um ponto facilitador para que isso seja alcançado é propiciar ao grupo de jogadores a serem trabalhados, dinâmicas que estejam de acordo com o nível (a zona) de desenvolvimento dos mesmos. Sendo assim, dinâmicas mais complexas e elaboradas só serão justificáveis se o nível de desenvolvimento da equipe permitir. Caso contrário, progride-se gradualmente (atingindo-se novas zonas de desenvolvimento), trabalhando com o que é adequado a cada fase dessa progressão.
 
Se quanto mais simples a orientação das dinâmicas a partir de uma plataforma, mais fácil o entendimento, cabe aqui uma questão de grande importância: a plataforma de jogo pode determinar o nível dessa “simplicidade”?
 
Muitos de nós, talvez seduzidos pelos argumentos da 1ª e 2ª partes do texto acreditemos que sim. Mas o fato é que se o jogo de futebol possui sua lógica (a lógica do jogo), e esta orienta as dinâmicas da plataforma de jogo, torna-se aceitável pensar que de acordo com essa “orientação” uma plataforma como o 4-3-3 pode ter uma dinâmica tática e estratégica densa ou não, difícil ou não, complicada ou não dependendo de como essas dinâmicas são elaboradas e concebidas.
 
Então o problema não é se essa ou aquela plataforma possui orientações e dinâmicas mais simples, mas sim qual delas (as plataformas) possibilita dinâmicas e orientações mais simples. Isso quer dizer que a menor complexidade organizacional não está na plataforma, mas sim nas estruturas, táticas e estratégias que são criadas a partir dela. Porém é possível que haja uma plataforma que permita, de início, o desenvolvimento de estruturas, táticas e estratégias mais simples.
 
Voltamos daí, a competência “estruturação do espaço de jogo”. Aparentemente a melhor estruturação do espaço, pode levar a composição de uma dinâmica menos complexa, o que poderia contribuir para melhor entendimento do jogo, que, em última instância possibilitaria melhor comunicação na ação.
 
Tanto a comunicação na ação quanto a estruturação do espaço de jogo podem contribuir para o melhor desenvolvimento da relação com a bola (pois serão balizadores dessa relação); tanto a comunicação na ação quanto a relação com a bola estão necessariamente atreladas ao nível de desenvolvimento para entender e jogar o jogo.
 
Então, parece ser a estruturação do espaço de jogo, a variável mais “manipulável” (dentro de nossa discussão) para possibilitar menor complexidade de construção de dinâmicas, sem perder de vista o bom equilíbrio e a boa performance de jogo.
 

Voltamos então ao 4-4-2 e ao 4-3-3 (mais comuns que os seus familiares de “linha”: 4-2-4, 2-4-4, 3-4-3, 3-3-4). Ambos, possuem boa distribuição porque minimizam o número de quadrantes vazios (vide figura).

No 4-4-2, quadrantes vazios que se agrupam horizontalmente. No 4-3-3, quadrantes vazios que se agrupam verticalmente. Para o sistema defensivo melhor se os vazios forem os horizontais (na linha de ataque).
 
Se levarmos em conta que na lógica da divisão das linhas, o 4-3-3 parece mais equilibrado (melhor distribuição por linhas) e que a menor complexidade da dinâmica de jogo precisa estar atrelada aos sistemas ofensivo, defensivo e de transição ao mesmo tempo; na “média” os quadrantes verticais vazios são mais satisfatórios (ao mesmo tempo) para ataque, defesa e transição do que os quadrantes horizontais vazios da linha de ataque.
 
Então, em tese, a melhor resposta para a pergunta que iniciou esse texto (qual plataforma de jogo parece mais simples, prática e equilibrada para se assimilar, dentro das dinâmicas da lógica do jogo?) é a de que o 4-3-3 é a plataforma mais equilibrada; não a mais simples, mas a que possibilita dinâmicas menos complexas, e portanto pode ser mais prática para assimilação.
 
Obviamente que estamos analisando o jogo de dentro para fora; da sua lógica para a sua construção (porque por exemplo, em um país em que culturalmente esteja enraizado o 3-5-2, certamente será mais fácil e prático (porém não menos complexo) partir dessa plataforma, e não do 4-3-3).
 
Então, nada melhor do que dar significado aquilo que se ensina, se treina e se desenvolve. E sobre o jogo, olhando de dentro dele; nada melhor do que compreender a sua lógica…
 
Para refletir:
 
O jogador de futebol precisa aprender a ler o jogo taticamente. Aprender! Uma das atribuições do treinador de futebol é facilitar e potencializar esse aprendizado.
Apreciemos um trecho de um texto (texto que transcende o futebol) do professor João Batista Freire sobre algumas descobertas do pesquisador russo Vygotsky.
 
“Para Vygotsky, a aprendizagem é fator de desenvolvimento. Nessa linha, a escola não tem que esperar pelo desenvolvimento para ensinar seus conteúdos para os alunos. Aquele pesquisador russo afirmava que a escola não existe para ensinar as crianças no nível de conhecimento em que estão, mas sim, no que ele chamou de próximo nível de desenvolvimento. Ou melhor, se a criança tem um certo nível de conhecimento, por exemplo, em pular corda, o que deve ser ensinado a ela é o próximo nível desse pular corda. Ao nível atual de conhecime
nto Vygotsky chamou de nível A; ao próximo de B. A zona entre A e B, é a zona onde deve atuar a escola. Ou seja, B é o nível superior a A, mas que inclui A. É o nível em que a atuação da criança torna-se momentaneamente insegura, indecisa, com erros eventuais, mas na direção dos êxitos”.
 
Esses conceitos não se aplicam somente as crianças; se aplicam aos seres humanos; se aplicam aos jogadores de futebol. “Se o jogador de futebol e sua equipe têm um certo nível de conhecimento sobre jogar futebol (taticamente e tecnicamente), o que deve ser ensinado-desenvolvido-trabalhado com eles é o próximo nível desse jogar futebol”. Sobre esse aspecto temos um exemplo no treinador português José Mourinho. Após conquista da Taça da UEFA, pela equipe do Porto, resolveu estruturar um “próximo nível de jogo” a sua equipe. Já tendo consolidado ao longo da temporada o 4-3-3, resolveu implementar novas lógicas dentro do jogo a partir do 4-4-2 (forma de jogar que o treinador considera “mais desequilibrada, embora igualmente eficiente, e que como tal, necessita de maior concentração”). Então, ao treinador-professor cabe estruturar seu plano de ação, encorpado em todas as questões que julga importante no seu “projeto de treinamento”.

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Podemos segurar nossos principais craques no país?

Na semana passada, li um artigo em um jornal de grande circulação nacional que, aliado ao jogo de quarta-feira no Morumbi, inspirou-me a escrever a coluna desta semana.
 
Pouco importa, para os fins desse texto, o autor do artigo em questão. Nosso interesse está em seu conteúdo, que acredito refletir a opinião de uma grande massa de torcedores: Por que o Brasil possui tantos craques, e ao mesmo tempo tem campeonatos nacionais e regionais de baixíssima qualidade? Por que nossos dirigentes não tomam alguma providência para segurar craques como Ronaldinho, Kaká para promover o esporte no País?
 
Será que existiria alguma saída viável para fazer com que esses craques passem a ignorar as ofertas milionárias feitas por grandes clubes do exterior? A resposta é bastante simples: não.
 
Mas não é essa a preocupação que devemos ter.
 
Como em toda situação crítica, antes de atacar eventuais culpados e apontar as soluções possíveis é necessário que se faça uma análise criteriosa dos fatos e uma identificação precisa do real foco do problema, que entendo estar um pouco desvirtuado.
 
Como já comentamos anteriormente, o futebol sofreu nas últimas décadas um processo de comercialização e internacionalização que o transformou em uma área de negócios muito rentável. Impulsionados pelos impactos do caso Bosman e da conseqüente extinção no instituto do “passe”, os melhores atletas profissionais de futebol passaram a receber salários elevadíssimos e também ofertas “irrecusáveis” para atuarem nos melhores clubes do cenário internacional.
 
Dessa forma, tornou-se impossível aos clubes nacionais, por mais estruturados que possam ser, manter em seus elencos as principais estrelas.
 
Essa discussão, na verdade, extrapola os limites do futebol. É uma questão que envolve a posição econômica do Brasil no cenário internacional. Esse fenômeno ocorre da mesma forma que uma empresa nacional, em qualquer outro ramo de atividade, não consegue segurar um profissional de primeira linha que tenha recebido uma oferta mais favorável de uma multinacional. É a famosa lei do mercado.
 
Quando, por exemplo, lembramos que o nosso atual presidente do Banco Central, Henrique de Campos Meirelles, morando nos Estados Unidos, foi presidente global do BankBoston, vemos o fato com admiração e, por que não, orgulho. O mesmo deve acontecer com relação aos nossos jogadores de futebol.
 
Muito bem. Isso posto, qual seria o real problema da má qualidade de nossos campeonatos nacionais e as possíveis soluções?
 
O verdadeiro problema é a literal debandada de jogadores intermediários (muitas vezes de excepcional qualidade) que, sem o mínimo de estrutura no Brasil, partem ao exterior em busca de qualquer oportunidade.
 
Esses jogadores vão para países da Ásia, África, ou mesmo para divisões inferiores de países europeus. Nessas empreitadas, muitas vezes levados pela conversa de aproveitadores de plantão, acabam se submetendo a condições sub-humanas de trabalho e convívio social.
 
Todos esses jogadores intermediários não deveriam sair do País. Deveriam ter condições mínimas financeiras para ficarem aqui, com seus familiares e amigos.
 
Foi exatamente o que disse o presidente da FIFA, Sepp Blatter, no discurso de nomeação do Brasil como sede da Copa do Mundo de 2014: “jogadores brasileiros, fiquem no Brasil”.
 
Com esses jogadores por aqui, poderemos ter uma melhora significativa do nosso futebol doméstico, sem tentarmos travar batalhas invencíveis com clubes como Milan, Real Madrid, Manchester Utd., etc.
 
Mas para que isso ocorra, nossas federações, confederação e demais autoridades devem se empenhar para promover uma profissionalização em nossos campeonatos e propiciar melhores condições aos clubes filiados que, por sua vez, poderão melhorar o relacionamento com seus atletas.
 
A oportunidade é boa, já que os impactos dos anos que antecedem a Copa do Mundo podem e devem ser utilizados para essa finalidade.
 
Basta seriedade; não para trazer de volta os Ronaldinhos e Kakás, mas para ter por aqui nossos infinitos craques anônimos espalhados pelo mundo.

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Racionalização e condenação

Racionalmente, o futebol serve para pouca coisa. A não ser que você esteja diretamente envolvido no mercado ou que você seja um pouco disfuncional, o futebol altera pouca coisa na sua vida. Ele dá uma alegria aqui, uma tristeza ali, uns minutos de conversa acolá, mas vai pouco além disso. São poucos os que se preocupam mesmo com o futebol porque são poucos que vêem um sentido mais profundo de utilidade na sua existência.
 
Apesar de pouco útil, porém, o futebol desperta grande interesse pontual, o que faz com que ele acabe ganhando uma importância maior do que aquela que ele realmente possui. Em dias de jogo, por exemplo, o futebol se molda a partir de contornos artificiais, principalmente em partidas mais importantes. Quando elas acontecem, o futebol adquire um valor superior àquele que de fato possui. Em dia de decisão de campeonato, todo mundo quer saber e falar sobre futebol. Uma semana depois, ninguém mais fala nada. Em dia de decisão, todo mundo quer palpitar sobre tudo o que envolve o esporte. Uma semana depois, as pessoas tendem a dar pouca importância ao que de fato acontece com as estruturas do futebol.
 
Tudo isso cria um ambiente muito superficial, construído a partir de premissas rápidas, pouco fundamentadas e por vezes desprovidas de sentido e de lógica. Entretanto, esse ambiente tende a criar a base para o pensamento que se faz na busca pela mudança e pelo aprimoramento da situação atual, o que acaba fazendo com que boa parte das medidas sugeridas para a melhora do futebol seja descabida de qualquer sentido racional ou minimamente fundamentado.
 
Tal falta de utilidade do futebol para a real vida da maioria dos indivíduos em contraste com o enorme interesse pontual despertado pelo jogo faz com que o rumo do esporte seja ditado principalmente pelo regime do governo. Afinal, o interesse público é enorme, mas a disposição desse mesmo público em intervir nos seus processos é muito pequena. É como se todo mundo fosse a um restaurante e quisesse comer, mas não quisesse pagar. Como para o governo é legal que todo mundo coma, ele acaba pagando a conta. O exemplo talvez não seja dos melhores, mas acho que dá pra ilustrar a idéia.
 
Isso tudo faz com que em geral o futebol evolua de acordo com a vontade do Estado no qual ele está inserido. Uma lógica rasa sugeriria que quanto mais interessado é o governo no futebol, maiores são as chances de ele se desenvolver dentro da localidade governada pelo poder em questão. Afinal, já que o governo gosta de futebol, melhor estruturado ele será. Todavia, dois exemplos pelo mundo demonstram que essa lógica não se aplica, muito pelo contrário. Conforme esses casos nos mostram, a idéia que prevalece é que quanto menos o governo em questão gosta do futebol, maiores são as chances de ele se desenvolver.
 
O primeiro exemplo, que constantemente é mencionado por diferentes razões, é o futebol inglês, que só adquiriu o status atual por conta da rejeição ao esporte demonstrada pelo governo Thatcher. A dama de ferro não gostava de futebol. Para ela, futebol era um problema que precisava ser solucionado. E o futebol inglês só se desenvolveu porque em determinado momento ele começou a ser considerado não apenas um problema interno, mas também um problema europeu. Por conta do futebol, a Inglaterra passou a ser mal vista pela Europa. E isso fez com que o Estado inglês atuasse de maneira preponderante na modernização do sistema, que se encontrava extremamente obsoleto em meados da década de 80.
 
No Brasil isso também aconteceu, em partes. Até hoje, o grande momento de evolução do futebol brasileiro aconteceu durante o governo FHC, que se caracterizava por ser, assim como o Thatcherismo, um governo de certa forma distante da sociedade e, quase que conseqüentemente, distante do futebol. Por conta do afastamento de FHC do futebol, foi possível que algumas mudanças legislativas essenciais fossem consolidadas para que o desenvolvimento econômico e estrutural do futebol brasileiro pudesse ser mais racionalizado. No governo Lula, com laços notadamente mais próximos da população e do futebol, a racionalidade do esporte foi deixada um pouco de lado, dando lugar a uma filosofia que busca mais um equilíbrio entre o entendimento dos agentes que buscam a transformação do futebol e aqueles que buscam a manutenção da estrutura atual.
 
A racionalização do futebol será preponderante para a estruturação da Copa de 2014 e também para o melhor aproveitamento do seu legado. Para isso acontecer, a história sugere que será necessário um governo que se caracterize por não relevar o futebol como um elemento fundamental para a população brasileira, ou seja, que o próximo governo não goste de futebol. Entretanto, com a Copa, nenhum político será louco de adotar uma postura que vá contra o futebol e a popularidade despertada por ele.
 
O ambiente brasileiro sugere que o futebol brasileiro não passará por um processo de racionalização na próxima década. E história sugere que o futebol brasileiro está condenado.

Para interagir com o autor: oliver@universidadedofutebol.com.br

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Melhor do mundo

Kaká é, definitivamente, o melhor jogador do mundo. Não por causa de suas arrancadas, dribles e gols fantásticos, como o marcado no domingo contra o Peru. Kaká é, na atualidade, o jogador mais completo do futebol. E completo não só pelo que joga dentro de campo, mas também por suas atitudes fora dele.

Na última semana, em meio à enxurrada de perguntas sobre a seleção brasileira, a vida pessoal, o filho do cachorro do vizinho e a violência no futebol italiano, Kaká foi soberano nas respostas, consciente no que falou e, sobretudo, craque na hora de responder à imprensa.

Questionado sobre a violência no Calcio, o meia do Milan foi enfático em relembrar o problema que havia ocorrido em fevereiro, quando um policial foi assassinado. Depois, lembrou do caos que surgiu com as denúncias de manipulação de resultados e defendeu o seu clube, dizendo que não concordava com a punição que o fizera perder o título que já havia sido tirado da Juventus. Por fim, contou a terrível experiência de estar dentro de campo e ver o descontrole dos torcedores da Atalanta, sem nada a fazer a não ser apenas torcer para que nada de pior ocorresse.

E a resposta terminou aí. A indagação continuou, até o momento em que foi incitado a responder se deixaria o clube por causa da violência. Aí Kaká mostrou a mesma classe que desfila em campo. Com firmeza, lembrou de outros jogadores que já deixaram o Calcio e, também, comentou o quanto se sente frustrado com a onda de violência que impera no futebol italiano, dizendo que às vezes não se sente seguro de jogar no país.

Resumo da ópera: Kaká foi firme nas respostas e deu a entender tudo o que você quisesse. O torcedor milanista ficou com o coração feliz em ver o Bambino D’Oro reclamar da punição do CalcioCaos e dizer que só a violência o tiraria do país. Os dirigentes de outros clubes, como Chelsea, Barcelona e Real Madrid, por exemplo, ficaram com o sinal amarelo ligado pensando na possibilidade de contar com um dos atletas mais cobiçados do planeta. E a imprensa teve tempo de sobra para gastar especulando se Kaká estava se oferecendo a outro clube, se ele ficaria no Milan, se ele havia se cansado da Itália, etc.

A elegância de Kaká, a certeza com que ele respondeu a todas as perguntas, mostram um jogador maduro, pronto para encarar qualquer parada. Um jogador que não é apenas um sex symbol, mas um craque dentro de campo e, a cada dia, mostra também ser inteligentíssimo fora dele.

O melhor do mundo dentro de campo ele já é. Agora, fora dele, Kaká tem mostrado que também é digno da premiação. O futebol agradece.

 

Para interagir com esse autor: erich@universidadedofutebol.com.br

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É mais fácil jogar no 4-5-1 ou no 4-4-2? No 4-3-3 ou no 3-5-2?

2ª parte – (a geometria e as linhas de jogo)
 
Para tentarmos chegar a uma conclusão sobre a questão levantada na primeira parte desse texto (coluna anterior – “qual plataforma de jogo parece mais simples, prática e equilibrada para se assimilar dentro das dinâmicas da lógica do jogo?”), vamos clarear primeiro o significado das três competências gerais destacadas no texto anterior (adaptado de GARAGANTA, 1995):
 
1 – A estruturação do espaço de jogo;
2 – A comunicação na ação;
3 – A relação com a bola.
 
A estruturação do espaço de jogo diz respeito à competência de ocupar geometricamente o espaço de jogo de forma equilibrada e ao mesmo tempo “desequilibradora”, de maneira organizada, vantajosa e topograficamente coerente com a plataforma utilizada, com as táticas, estratégias, dinâmicas e lógicas do jogo. Essa competência deve ser compreendida tanto na estruturação do espaço defensivo quanto na estruturação do espaço ofensivo.
 
A comunicação na ação diz respeito à competência de interagir coletivamente às diversas situações-problema do jogo, através do entendimento da lógica que norteia as ações táticas e estratégicas da equipe, tanto defensivamente quanto ofensivamente.
 
A relação com a bola diz respeito à competência de interagir com a bola do jogo e de fundamentalmente compreender a funcionalidade da mesma para solução de situações-problema individualmente e coletivamente.
 
As três competências estão integradas e, como um todo, subordinadas à lógica do jogo.
 
Tradicionalmente, temos no futebol a representação numérica da formação e distribuição das equipes para um jogo, estabelecida em três linhas (linha de defesa, de meio-campo e de ataque). Então, ainda que saibamos que posicionalmente uma equipe esteja, por exemplo, jogando em um 3-4-1-2, observadores e especialistas o “arredondam” para um 3-5-2. Essa é uma discussão que merece destaque, já que a distribuição em linhas pode interferir diretamente em conceitos de amplitude e profundidade, na defesa e no ataque – mas a deixemos (a discussão) para outro texto.
 
Considerando então o “arredondamento” das linhas, notemos que ao considerarmos a “estruturação do espaço de jogo”, geometricamente, em tese, para chegarmos à plataforma de jogo mais bem distribuída e mais equilibrada no espaço, bastaria dividirmos por três (três linhas) o número de atletas a serem distribuídos.
 
Então, dez jogadores divididos por três linhas são iguais a 3,33 atletas por linha. Como não é possível haver 3,33 jogadores, “arredondamos” para três (três atletas vezes três linhas, igual a nove jogadores – sobra um). O jogador que “sobra” nessa operação matemática (ah, se o futebol fosse simples assim!) precisa ser adicionado a uma das três linhas.
 
Dessa adição poderíamos então ter o 4-3-3, o 3-4-3 ou o 3-3-4. Do ponto de vista da estruturação do espaço, se considerarmos a simplicidade da idéia das linhas, poderíamos afirmar (cuidado!) que as plataformas mencionadas (4-3-3, 3-4-3, 3-3-4) são as mais equilibradas e proporcionariam mais rápida assimilação dada a complexidade da lógica que a orientaria.
 
 
Em um exercício de imaginação, poderíamos ilustrar na figura acima a idéia de tomarmos como único ponto para a análise da questão central do texto a estruturação do espaço de jogo. Em uma divisão didática das três linhas horizontais da representação numérica e das quatro faixas verticais (faixa lateral esquerda e direita, faixa média esquerda e direita), observemos os quadrantes mais escuros (espaço geométrico vazio). Quanto mais quadrantes escuros uma plataforma de jogo tiver, mais espaços geométricos vazios existirão para serem ocupados (e logo maior dificuldade de equilíbrio posicional).
 
É claro que a figura se propõe apenas a uma representação esquemática didática. É claro também que as plataformas apresentadas podem sofrer variações de posicionamento.
 
O fato é que aparentemente o 4-4-2 e o 4-3-3 são aquelas que têm menor número de quadrantes vazios; e que está no 4-3-3, aparentemente, a distribuição mais equilibrada “horizontalmente”.
 
Porém, devemos destacar que a plataforma de jogo é apenas uma das variáveis da ocupação do espaço.
 
Não adianta a plataforma de jogo, como estrutura básica para a construção das estratégias e táticas do jogo, prever uma distribuição harmoniosa e equilibrada dentro do campo se o entendimento da lógica que a norteia não der conta de mantê-la (a distribuição) harmoniosa e equilibrada na dinâmica das ações do jogo.
 
Para tanto, devemos então (ainda, antes de chegar a uma conclusão) analisar as outras competências (“comunicação na ação” e “relação com a bola”).
 
Continua na próxima semana

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Os direitos de transmissão no futebol globalizado

A atividade profissional do futebol, como qualquer outro ramo de atividade, desenvolve-se como reflexo da evolução sócio-econômica mundial. Nas primeiras décadas do século passado, o futebol engatinhava em termos de profissionalização e comercialização. Os jogadores recebiam apenas modestos prêmios por desempenho, no Brasil conhecidos como ‘bichos’, e não havia grande interesse por parte da iniciativa privada em qualquer forma de patrocínio.
 
Desde então, houve uma evolução natural e gradativa nesse esporte, em que dirigentes de clubes passaram a remunerar seus jogadores para não perdê-los e, principalmente, grandes empresas passaram a investir no futebol, enxergando-o como uma excelente oportunidade de valorizar seus produtos e/ou serviços. Com essa evolução, os meios de comunicação passaram também a dedicar grande parte de suas atividades ao futebol, incluindo as emissoras de televisão, que proporcionaram uma efetiva revolução no meio.
 
No início das ligas profissionais de futebol, a principal fonte de receita dos clubes de futebol era composta quase que exclusivamente pela venda de ingressos para os jogos de seu time. Hoje, além da bilheteria – que na verdade representa no Brasil uma renda variável e incerta – e dos patrocínios, os clubes das divisões superiores contam com a receita da venda, para emissoras de televisão, dos direitos de transmissão de seus jogos. Para se ter uma idéia de onde podem chegar os valores dessa nova e importante receita, o AC Milan fatura anualmente aproximadamente US$ 140 milhões com a venda desses direitos.
 
Assim, as diversas federações locais negociam e vendem para as emissoras o direito de transmitirem os jogos de futebol e, em um segundo momento, repassam esses recursos para os clubes (em alguns países, como na Itália, os clubes negociam individualmente com as emissoras). O que se vê na teoria é um verdadeiro círculo vicioso, em que as emissoras pagam pelos direitos aos clubes que, com esses fundos, conseguem equilibrar suas finanças e manter um bom elenco dentro de campo. Dessa forma, os jogos tornam-se mais atrativos ao público, que mantém o interesse em assisti-los pela televisão, aumentando conseqüentemente o potencial de receita das emissoras.
 
Interessante observar que, ao contrário do que se imaginaria, a transmissão de jogos pela televisão individualmente considerada não afasta os torcedores dos estádios. Ao contrário, ela expande ainda mais a popularidade do futebol e estimula o comparecimento aos estádios. No Brasil, a baixa média de renda nos estádios é explicada principalmente pela constante violência entre torcedores e pela precariedade dos serviços básicos oferecidos nos estádios. O futebol italiano, com os recentes casos de mortes em estádios, corre o mesmo risco.
 
Ocorre que, com o processo de globalização que hoje vivenciamos, as televisões estão, pouco a pouco, dando lugar aos computadores. Da mesma forma, as transmissões televisivas, aos poucos, darão lugar às transmissões via internet. Num futuro não tão distante, a previsão é de que poucas pessoas tenham televisores em suas residências.
 
Assim, a questão que se apresenta nessa prospecção refere-se aos direitos de transmissão no meio cibernético. Com o advento da internet, a diferenciação entre os conceitos de “transmissão visual” e “imprensa escrita” torna-se tênue. Hoje em dia já temos as transmissões escritas de jogos, em tempo real, pela internet, com divulgação de fotos instantâneas, sem qualquer pagamento de direitos de transmissão aos clubes. A tendência natural é que essa nova modalidade de transmissão chegue cada vez mais perto de uma transmissão visual do jogo como a que hoje vemos na televisão.
 
Haverá pagamento de direitos de transmissão para provedoras de internet para transmissão dos jogos? Como os direitos televisivos serão protegidos contra transmissões não autorizadas via internet? Qual será o relacionamento entre as emissoras de televisão e as provedoras de internet? As respostas para estas perguntas ainda não estão claras e tampouco legalmente previstas, mas certamente serão necessárias à medida em que os primeiros conflitos venham à tona.
 
Torna-se assim imprescindível que os operadores do direito e demais intermediários nas negociações de direitos de transmissão entre clubes, federações, patrocinadores e emissoras tenham amplo conhecimento dessas novas questões para prevenir possíveis entraves de ordem jurídica. A boa notícia aos clubes é que, como há um interesse das emissoras em mantê-los com boa saúde financeira e, conseqüentemente, com plantel em nível atraente aos seus telespectadores, dificilmente haverá pressões para a extinção do pagamento dos direitos de transmissão.

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Samba na bola

“Queremos uma troca. Ela vai ganhar com a exposição na mídia. Nós vamos ganhar por ela ser uma pessoa conhecida”. A frase foi dita por Wilson Vieira Alves, o Moisés, presidente da escola de samba Vila Isabel, ao Jornal “O Estado de S. Paulo” do último sábado. “Ela” é a atual Miss Brasil, Natália Guimarães.

Nos últimos anos, o Carnaval brasileiro (e especialmente o do Rio) tornou-se o principal produto de atração de turistas do Brasil. Não existe um evento que reúna tanta gente e que seja transmitido para tantos países como o Carnaval do Rio. Além disso, uma série de produtos licenciados com a marca da festa é vendida para os turistas que vão à cidade conhecer de perto esse espetáculo único.

DVD com os melhores momentos dos desfiles, CD com as músicas das escolas, réplica da Marquês de Sapucaí, pandeiro em miniatura… Tudo isso e mais um pouco está à venda para o turista que acabou de se apaixonar pelo samba.

Voltemos a Natália e Vila Isabel. Os personagens poderiam ser outros, mas o resumo da história é o mesmo. A junção de duas marcas conhecidas, famosas e respeitadas, gerando uma relação de ganho para os dois lados.

O marketing que invadiu e profissionalizou o samba no Rio ainda está longe de atingir em cheio outro produto de exportação do Brasil, o futebol. Em vez de trazer o estrangeiro para que ele conheça o país e se encante com algo que só existe por aqui, exportamos o talento, não nos preocupamos em formar novos artistas e, ainda, sequer mostramos ao mundo o que temos de bom por aqui.

Não existe um presidente de clube que tenha a consciência de que ter um grande jogador em seu clube representa não uma condição de patrão-empregado ou um ônus para a conquista de vitórias. É uma troca, uma parceria, uma relação que faça o clube e o atleta crescerem.

Ronaldinho Gaúcho é assim no Barcelona. Kaká é assim no Milan. Beckham foi assim no Manchester, no Real Madrid e é agora no LA Galaxy. Assim como no Carnaval brasileiro os artistas e as escolas se somam para se promoverem e promoverem uns aos outros, o futebol no restante do mundo faz o mesmo na relação entre clubes e jogadores.

Por que o futebol não aprende com o samba?

Para interagir com o autor: erich@universidadedofutebol.com.br