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A fim de atacar melhor

É de conhecimento de todos que existem diferenças muito significativas entre a marcação/defesa zonal e a marcação/defesa individual. Se na primeira temos como grande referência-alvo de marcação os espaços considerados valiosos, na segunda temos a movimentação dos adversários. Porém, sem muito embasamento teórico para isso, tem-se uma “impressão geral” que defesa zonal é uma forma passiva de marcação, o que não concordo. Além de não ser, este tipo de marcação te dá a possibilidade de atacar melhor. Estar em permanente equilíbrio posicional te traduz na ocupação cuidada e inteligente dos espaços no ataque, no sentido de permitir uma reação rápida e eficaz à perda ou ganho da posse de bola. Trata-se de assegurar a permanente gestão coletiva do espaço e do tempo no jogo, com vista ao domínio dos momentos de transição ofensiva.

De acordo com isso, levanto uma questão: se na defesa individual a movimentação do opositor é a grande referência defensiva de posicionamento e marcação, como fechar os espaços quando os adversários estão em constante movimentação, principalmente abrindo no campo para receber a bola no espaço ou para abrir a defesa (procuram ocupar os corredores e dar profundidade e amplitude ao jogo)?

Na resposta, estão as ideias basilares da “marcação/defesa zonal”, uma vez que a grande preocupação é “fechar como equipe” os espaços de jogo mais valiosos, o mesmo não podemos dizer da “defesa individual”, pois as referências defensivas são individuais e os espaços são subvalorizados. Ou seja, caracterizando-se essa forma de organização defensiva por uma soma de ações individuais com referências à movimentação dos oponentes (o tal “jogo dos pares” onde a equipe procura “encaixar” no adversário).

Alguns autores citam que joga-se melhor ofensivamente contra equipes que façam “marcação individual”, na medida em que isso nos permite levar os jogadores rivais para zonas que nos interessam e assim criar espaços livres. Afirmam também que, com essa forma de organização defensiva, estamos a dar uma vantagem à equipe adversária, pois em vez de sermos nós a oferecermos e bloquearmos os espaços, é o adversário que usa o espaço da forma que quiser, ou pelo menos tem a sua disposição essa possibilidade.

Neste aspecto uma excelente vantagem da defesa a zona, é a manipulação defensiva do oponente (aqui algumas pessoas falam sobre “jogar no erro do adversário”, ou pelo menos se explicam assim). Neste tipo de marcação a preocupação é o espaço a ser ocupado e não a movimentação dos atletas adversários. Espaço que podemos controlar sem a bola, ou seja, podemos influenciar aquele que está com ela e aquele que irá recebê-la, assim o é, pois temos o controle do espaço, do território a ser ocupado, ou pelo menos podemos tê-lo.

Quando estamos a defender, temos que, quem tem a bola, mais quer o espaço para progredir. E quem defende deve gerir/reduzir/tirar esse espaço. Porém, ás vezes, é melhor dar determinado espaço para que possamos atrair o adversário, para que ele vá aonde queremos que ele vá. O que pretendo exemplificar com o exemplo abaixo (percebe-se claramente que o adversário oferece a linha de passe e induz o portador a passar a bola. Com isso intercepta-se o passe e retoma a posse de bola):

Manipular é a palavra-chave de defender bem, e todas as equipes de alto nível sabem e o fazem constantemente. O atleta que está fazendo a cobertura defensiva daquele que está realizando a pressão ao adversário com a posse; ou uma cobertura ofensiva sobre aquele que está fazendo cobertura defensiva daquele que está fazendo a pressão, pode oferecer uma linha de passe ao adversário, mas uma linha de passe que ele sabe que tem a total condição de interceptar a trajetória da bola, e obtê-la com o menor “custo energético”.

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Sinceridade

Há duas imagens especialmente emblemáticas de Neymar na decisão do torneio de futebol masculino dos Jogos Olímpicos de 2016, no Rio de Janeiro. O dono da camisa 10 e da faixa de capitão da seleção brasileira anotou um gol de falta no empate por 1 a 1 com a Alemanha e executou com perfeição a cobrança que definiu a vitória de seu time por 5 a 4 nas cobranças de pênaltis, mas não são essas as cenas mais relevantes que ele protagonizou no Maracanã. Os feitos do jogador em campo podem dizer muito sobre seu repertório técnico, mas a faixa usada na comemoração e uma discussão com um torcedor revelam traços de personalidade muito mais densos.

Neymar tem 24 anos. É pai, é jogador de seleção há pelo menos seis temporadas e já esteve entre os três melhores do mundo em eleição realizada pela Fifa. Defende o Barcelona, clube que está entre os maiores faturamentos do planeta, e representa marcas que igualmente se encaixam entre as mais poderosas do mundo. É um dos rostos de empresas como Nike, Ambev, Procter & Gamble, Panasonic e Unilever. O comportamento dele representa muito mais do que atitudes individuais.

Por tudo isso, é injusto avaliar as ações de Neymar como se ele fosse qualquer outra pessoa de 24 anos. Neymar não é apenas um moleque ou apenas um homem imaturo. É alguém que carrega enorme responsabilidade – e que é muito bem pago por isso, diga-se. Muitas apostas de empresas e instituições estão alicerçadas na imagem do atacante.

Quando foi comemorar o maior título que ele já conquistou com a seleção brasileira, contudo, Neymar ignorou todo esse repertório. Colocou na cabeça uma faixa com a inscrição “100% Jesus” e ficou com o adereço durante toda a festa no Maracanã. Toda personalidade – e toda pessoa, aliás – tem direito de ter suas crenças e professá-las como achar mais conveniente. A discussão aqui não é sobre liberdade religiosa, mas sobre representatividade: quando está ali, Neymar não é apenas um indivíduo; representa os ideais e os valores de marcas e instituições que apostaram nele. E nem todas essas marcas são 100% Jesus.

A religião, porém, foi apenas uma das facetas de Neymar após o ouro olímpico. A outra foi uma discussão acalorada com um torcedor na saída de campo. Exaltado, o atacante ofendeu e ameaçou alguém que estava na arquibancada do Maracanã. Ao contrário dos palavrões ditos pelo camisa 10, os motivos para isso não ficaram claros.

Neymar não é obrigado a ser uma personalidade laica. Tampouco assumiu compromisso de ouvir calado os impropérios de todo mundo e de reagir com sorrisos a todo tipo de provocação. Neymar é humano, e como humano ele pode ter reações individualistas e desconectadas do contexto.

Nesse aspecto, o grande problema é a falta de sinceridade. Não é por acaso que uma série de bad boys do esporte “vende” melhor do que o principal jogador da seleção brasileira. A questão aqui é que a blindagem de clubes, instituições e marcas em torno do jogador cria uma imagem de que ele está evoluindo ou de que existe da parte dele um compromisso com os fãs.

Neymar é hoje o principal garoto-propaganda do esporte brasileiro. Ainda assim, também tem um nível de rejeição assustador para alguém com tantas conquistas em tão pouco tempo de carreira. E essas restrições à imagem do atacante têm relação direta com a falta de sinceridade na comunicação.

Ninguém é obrigado a ser uma personalidade modelo ou cumprir todos os pontos da cartilha de um porta-voz ideal. Ninguém é obrigado a pensar em contexto, pesar cada atitude e fazer as coisas de acordo com valores das marcas que representa. O problema, no caso de Neymar, é passar uma falsa impressão disso.

Seria muito mais genuíno se Neymar assumisse os problemas de personalidade e se comportasse como alguém moldado por esses aspectos. Se lidasse melhor com a imagem de alguém falível e evitasse a falsa ideia de que pode ser o líder que tantos cobram dele. Depois dos Jogos Olímpicos, o camisa 10 da seleção deu um importante passo nessa direção ao abdicar da faixa de capitão.

É possível comunicar qualquer tipo de personagem ou marca. É possível obter sucesso com perfis absolutamente dicotômicos, desde que exista sinceridade na transmissão dessas mensagens. Neymar tem uma série de virtudes, mas ainda precisa de maturidade para admitir esses traços de personalidade. As frustrações sobre Neymar são quase sempre resultantes de expectativas que não são condizentes com o que ele realmente apresenta.

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“Seja mais político”

Esta é uma expressão/conselho que provavelmente você já ouviu (direcionada ou não a você) no ambiente do futebol. Para dar sequência ao texto solicito, primeiramente, um breve exercício:

Registre, como e onde quiser, 10 palavras ou expressões associadas à política e/ou aos políticos brasileiros.

Peço, em seguida, uma reflexão:

Como você se sentiria se a imagem que o mercado do futebol tem sobre você fosse composta por todas essas palavras/expressões ou, ao menos, por boa parte delas?

O mesmo exercício proposto a você foi feito também com alguns companheiros de profissão. Corrupção, injustiça, desonestidade e malandragem foram termos comuns mencionados por eles.

A coluna desta semana pretende trazer alguns apontamentos sobre a conduta e a convivência no complexo ambiente do futebol, repletas de relações e interações humanas em todos os seus níveis.

Da comunicação com a comissão técnica e jogadores, ao posicionamento perante à diretoria, o profissional do futebol está sujeito à situações que deve expor sua opinião e/ou tomar decisões que evidenciam sua personalidade e a forma com que lida com os problemas do cotidiano.

Para tentar deixar mais tangíveis as reflexões, proponho, agora, mais um exercício. Peço que imagine, de acordo com a sua função (exercida ou almejada) qual seria sua conduta em cada um dos problemas hipotéticos listados a seguir:

  • Um dos principais jogadores do time, vinculado a um grande empresário, tem apresentado um comportamento individualista e egoísta
  • A diretoria quer intervir no seu programa de treinamento
  • Um membro da sua comissão técnica tem se dedicado menos do que o ideal em sua opinião
  • No clube, tem surgido algumas fofocas/conversas em relação a sua pessoa e as suas atitudes
  • Você discorda de um posicionamento da diretoria
  • Lhe oferecem uma boa quantia em dinheiro para a aprovação de um jogador no elenco
  • Você quer se manter no cargo e percebe que para isso precisa bajular algumas pessoas

Para quem está no dia-a-dia do futebol, seguramente, já deve ter vivenciado situações semelhantes ou, inclusive, mais complexas que as supracitadas. Também seguramente, suas respostas a estes problemas devem ter seguido seus princípios e valores. É momento, então, para outra reflexão: sua conduta segue o ritmo/status quo das pessoas e do ambiente que você está inserido ou você tenta, de alguma forma, transformá-los?

A transformação (propósito da Universidade do Futebol) é uma palavra com imenso significado para os contextos político e futebolístico atuais. Ela não vem, no entanto, sem estar somada às altas doses de debates, divergências, conflitos, trocas de conhecimento e opiniões.

Por isso, mais do que direcionarmos o foco das mudanças nas coisas (nos métodos, nas estruturas, nas competições ou nas instituições), deveríamos direcioná-lo às pessoas, principais responsáveis pela transformação da política, do futebol ou de qualquer outro produto da sociedade.

E quando a imagem predominante da política brasileira for marcada por expressões como transparência, revolução, oportunidade, competência, honestidade, crescimento, desenvolvimento, coragem, igualdade e justiça, indubitavelmente será prudente, para sua conduta no futebol (e na vida), seguir o conselho como o do título do texto.

Abraços e até a próxima!

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"Seja mais político"

Esta é uma expressão/conselho que provavelmente você já ouviu (direcionada ou não a você) no ambiente do futebol. Para dar sequência ao texto solicito, primeiramente, um breve exercício:
Registre, como e onde quiser, 10 palavras ou expressões associadas à política e/ou aos políticos brasileiros.
Peço, em seguida, uma reflexão:
Como você se sentiria se a imagem que o mercado do futebol tem sobre você fosse composta por todas essas palavras/expressões ou, ao menos, por boa parte delas?
O mesmo exercício proposto a você foi feito também com alguns companheiros de profissão. Corrupção, injustiça, desonestidade e malandragem foram termos comuns mencionados por eles.
A coluna desta semana pretende trazer alguns apontamentos sobre a conduta e a convivência no complexo ambiente do futebol, repletas de relações e interações humanas em todos os seus níveis.
Da comunicação com a comissão técnica e jogadores, ao posicionamento perante à diretoria, o profissional do futebol está sujeito à situações que deve expor sua opinião e/ou tomar decisões que evidenciam sua personalidade e a forma com que lida com os problemas do cotidiano.
Para tentar deixar mais tangíveis as reflexões, proponho, agora, mais um exercício. Peço que imagine, de acordo com a sua função (exercida ou almejada) qual seria sua conduta em cada um dos problemas hipotéticos listados a seguir:

  • Um dos principais jogadores do time, vinculado a um grande empresário, tem apresentado um comportamento individualista e egoísta
  • A diretoria quer intervir no seu programa de treinamento
  • Um membro da sua comissão técnica tem se dedicado menos do que o ideal em sua opinião
  • No clube, tem surgido algumas fofocas/conversas em relação a sua pessoa e as suas atitudes
  • Você discorda de um posicionamento da diretoria
  • Lhe oferecem uma boa quantia em dinheiro para a aprovação de um jogador no elenco
  • Você quer se manter no cargo e percebe que para isso precisa bajular algumas pessoas

Para quem está no dia-a-dia do futebol, seguramente, já deve ter vivenciado situações semelhantes ou, inclusive, mais complexas que as supracitadas. Também seguramente, suas respostas a estes problemas devem ter seguido seus princípios e valores. É momento, então, para outra reflexão: sua conduta segue o ritmo/status quo das pessoas e do ambiente que você está inserido ou você tenta, de alguma forma, transformá-los?
A transformação (propósito da Universidade do Futebol) é uma palavra com imenso significado para os contextos político e futebolístico atuais. Ela não vem, no entanto, sem estar somada às altas doses de debates, divergências, conflitos, trocas de conhecimento e opiniões.
Por isso, mais do que direcionarmos o foco das mudanças nas coisas (nos métodos, nas estruturas, nas competições ou nas instituições), deveríamos direcioná-lo às pessoas, principais responsáveis pela transformação da política, do futebol ou de qualquer outro produto da sociedade.
E quando a imagem predominante da política brasileira for marcada por expressões como transparência, revolução, oportunidade, competência, honestidade, crescimento, desenvolvimento, coragem, igualdade e justiça, indubitavelmente será prudente, para sua conduta no futebol (e na vida), seguir o conselho como o do título do texto.
Abraços e até a próxima!

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Rogério Micale

Há uma década, mais ou menos, um pensar novo começou a atuar efetivamente no futebol brasileiro. A porta de entrada das boas ideais foram principalmente as Categorias de Base dos nossos clubes.

Frequentada por uma geração de profissionais curiosos e pesquisadores, uma avalanche de conhecimentos invadiu a formação de talentos e a ciência da construção do jogo no futebol brasileiro. Há pelo menos vinte anos o mundo respira novas formas de conceber o treinamento e as táticas no futebol. No Brasil, foi principalmente a “meninada da Base” quem correu atrás!

Como os setores de formação dos clubes brasileiros são sempre mal falados, o futebol dos adultos ficou meio distante deste novo pensar. Não raro, achamos aqui no Brasil que o talento nasce pronto e os formadores são quem os “estragam”. Por isso também os departamentos de Base e Profissional ficam de costas um para o outro em seu modo de gerir o projeto futebol nos clubes. Infelizmente, ainda continua assim em grande parte deles. São raríssimas as exceções!

Só se fala em Categorias de Base no Brasil quando mais um jovem craque desponta em nossa vitrine. Mesmo assim, valorizando somente o talento e não considerando a bagagem de trabalho realizada para que o craque chegasse àquele ponto.

E o Rogério Micale? Onde ele se encontra nesta reflexão? Afinal de contas é o personagem principal do nosso post.

Pois bem, o professor Micale se mostra ao Brasil e ao mundo como grande representante da nova, já bem experiente, geração de treinadores e formadores do talento nacional brasileiro. Rogério Micale com seus dez a quinze anos de treinador de categorias de base, saiu do seu “humilde espaço” para contribuir nobremente com a conquista brasileira do ouro Olímpico do futebol. Eu sempre digo, que quando quero aprender algo diferente e moderno no futebol me recorro à “garotada da Base”, treinadores e outros profissionais. Não me arrependo nunca!

Para mim, Rogério Micale é a prova inequívoca que o futebol de Base brasileiro é competente e uma grande escola formadora de profissionais. Nem pareceu que ele nunca tinha sido treinador de equipes adultas. Conduziu com sabedoria a grande missão que lhe foi atribuída. Seu perfil de treinador faz parte da nova geração que poderá representar a virada em campo dos “7X1” que nos incomoda!

Não serei injusto com os “coroas”, treinadores brasileiros mais experientes, que também abraçaram essa linha de pensamento e trabalho que concebe o futebol moderno.

Tite talvez seja o mais destacado representante desse grupo seleto de treinadores do nosso mercado. Não parou no tempo e não se conteve a uma visitinha ao território europeu como “estágio profissional”. Fez um ano de profundos estudos para argumentar seu inovador método de trabalho. Além disso, ele sabe, assim como os profissionais da base, que a literatura moderna está ao alcance de todos, e pelo que percebemos, mostra ser um assíduo degustador desse saber.

Rodrigo Leitão disse certa vez: não é preciso atravessar o Atlântico para saber como o Barcelona joga e/ou constrói a sua forma de jogar. Jorge Sampaoli construiu um Chile rico em conceitos táticos modernos, praticamente sem sair da América do Sul.

As ideias e a fala do professor Tite são sempre compatíveis à qualidade de jogo das suas equipes. Para o bem do futebol brasileiro, tomara que o novo treinador da Seleção Canarinho consiga bons resultados para fazer valer a importância desses pensamentos que povoam a nossa escola.

Outros nomes importantes da nova geração, além de Micale e Tite, merecem ser citados: Róger Machado, João Burse, Eduardo Baptista, Enderson Moreira, Osmar Loss, Adilson Batista, Fernando Diniz, José Ricardo, Paulo de Castro, Sandro Fórner, Lucas Macorin, Leo Condé, Rodrigo Leitão, Felipe Surian, Gustavo Silva, Diogo Giacomini, Max Sandro, Maurício Barbieri, Carlos Amadeu, Paulo Autuori, Jorginho, Doriva, Marquinho Santos, Ney Franco, Dado Cavalcanti, Bruno Pivetti, Ricardo Gomes…, dentre outros.

A maioria deles com passagens pela Base em seus currículos. Estes profissionais, acompanhados de todas as necessidades subjacentes à construção do jogo moderno, são e/ou serão grandes protagonistas do alavancar do futebol brasileiro nos próximos anos. Me desculpem outros nomes que fazem parte desse grupo especial e que não deixam de ser tão importantes por não terem sido citados neste espaço.

Aos leitores que não conhecem o passado dos treinadores que mencionei, não há distinção entre eles quanto à formação que tiveram. Temos ex-atletas e acadêmicos, todos com ótimos perfis para o mercado do futebol moderno. A competência é que deve regular a trajetória destes profissionais, assim como acontece em todas as profissões. Uma coisa é certa: a maioria deles, senão todos, passaram ou estão passando pelos cursos de formação de treinadores da CBF. Será que o Brasil está se encontrando em uma nova fórmula de reimplantar Escola Brasileira de Futebol?

Parabéns aos amigos da comissão técnica que participaram competentemente da conquista do ouro Olímpico, especialmente ao Rogério Micale, um grande comandante! Parabéns aos jogadores que neste torneio já jogaram um jogo brasileiro parecido às necessidades do futebol moderno! E isso sem perder traços importantes da escola brasileira. Estamos no caminho!

Forte abraço e até breve…

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Da estratégia ao comportamento, da posição a função

Como relatei na coluna anterior, fazendo uma análise superficial dos sistemas estratégicos, na estreia da Premier League (13/08), das 20 equipes: 7 no 1-4-3-3 (Chelsea, West Ham, Liverpool, Bournemouth, Man.City, Swansea, Hull City), 6 no 1-4-2-3-1 (Arsenal, Man.United, Cristal P., Tottenham, Middlebrough, Stoke), 4 no 1-4-4-2, 2 linhas (Sunderland, Burnley, Bromwich e Leicester), 1 no 1-3-4-3 (Everton), 1 no 1-4-3-1-2, losango (Southampton) e 1 no 1-3-5-2 (Watford).

Comumente tem se falado que o Sistema Estratégico de uma equipe de futebol não diz como ela vai se comportar em campo. O que não concordo inteiramente! Penso que isso seria um conclusão errada, também simplista, da forma como enxergamos e de como tratamos o Sistema Estratégico no futebol (uma forma geométrica de ocupar o espaço de jogo, o problema que esquecemos das variáveis tempo, velocidade e adversário).

Esta simples e superficial análise demonstra (“superficialmente”) que o jogo nos aspectos físicos (principalmente, por enquanto) e técnico (talvez, de um “jeito” raso) vai cada vez mais ficar semelhante, ou pelo menos, várias equipes tendem a usar o mesmo “caminho” durante o jogo. Ao meu ponto de vista, o Sistema Estratégico, influencia determinado comportamento em determinada posição em campo: fechar a linha, cobertura defensiva, largura/profundidade, fechamento de espaço vertical/horizontal, etc. (Ps: estes exemplos partem do pressuposto de pensarmos de uma forma mais sistêmica do que linear (coletiva e não individual / racional e não energética/emocional).

O Sistema Estratégico se caracteriza por ser um precursor, um ponto inicial, de tudo que envolve o comportamento da equipe. Um ponto de partida para os comportamentos que idealizam e caracterizam a equipe. Comportamentos estes, colocados pelo treinador, que por sua vez precisa verificar a validade e a eficácia destes a partir da posição dos atletas em campo. Corroborando com isso, se torna necessário identificar as valências do atleta antes de coloca-lo em determinada posição em campo. Neste mesmo sentido, temos a diferenciação entre posição e função, determinado jogador com determinadas características (pode) ocupa(r) uma determinada posição, que prioritariamente não é a “dele”.

Sistema Estratégico é um facilitador, ou um “prejudicador” do processo. Não nos diz tudo que vai acontecer, mas nos diz alguma coisa. Se pretendemos determinado comportamento, temos que ter em mente que certo posicionamento em campo vai te ajudar a alcançar este objetivo, como também, determinada condição técnica e física do jogador. Sendo uma forma geométrica (uma disposição em campo) cada atleta, em cada posição, deve cumprir determinados requisitos tático/técnicos (função) a fim de se cumprir “bem” certas ações inerentes a posição dele no estabelecido sistema estratégico. Penso que devemos entender que cada Sistema, independente de qual seja (1-4-4-2, 1-3-5-2, etc.), tem sua virtudes e falhas estruturais intrínsecas, desde o nível mais baixo de rendimento ao mais alto. O que pretendo mostrar no vídeo abaixo:

Não podemos (não deveríamos) seguir e “adotar” determinados “princípios” (comportamentais ou não) somente por serem “belos e atraentes” (moda), ou pior, por terem dado “certo” (aqui podemos relembrar a coluna que falei sobre “o real valor da vitoria”). Este é um exemplo crasso das padronizações das ideias sobre o futebol. Se todos pensarmos as mesmas coisas sobre o jogo, treino, etc, jogaremos da mesma maneira. Podemos colocar aqui a equivocada interpretação dos tais “princípios”. A minha preocupação em demonstrar isto, está na padronização de uma determinada forma de jogar (“negativa” ou “positiva”).

Ao meu ver o que devemos olhar e observar é como tem-se evoluído o processo para se chegar em determinado lugar (ideia envolvida). Não simplesmente adotar uma estratégia (posição) ou tática (função), somente por ter dado “certo”. O porque determinada equipe/pessoa de TOP faz aquilo que faz? Pensar mais no processo do que no resultado. Devemos evoluir mais no treino cognitivo, na tomada de decisão, no pensar sobre o fazer, na leitura e interpretação do treino/jogo, na relação direta e indireta com o adversário. Pensar de uma forma mais aberta as relações das variáveis entre si. Ter uma organização de jogo mais complexa, do que rígida. Observar o jogo de uma forma original, eleger e criar os próprios exercícios e levar em conta a personalidade dos atletas, a cultura do clube e as expectativas. Assim criar uma forma de jogo própria.

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A necessidade de resiliência do futebol brasileiro

“Não é o mais forte que sobrevive, nem o mais inteligente, mas o que melhor se adapta às mudanças. ”

Leon C. Megginson

Olá!

Em minha primeira coluna “Crise Técnica do Futebol Brasileiro” busquei instigar os leitores a refletirem sobre o atual momento do nosso futebol, aproveitando a recorrente ideia de que “não possuímos mais tão bons jogadores como antigamente”, presente na maioria das discussões sobre o futebol brasileiro dos dias de hoje. A participação dos leitores tanto no site da Universidade do Futebol, como em sua página no Facebook, foi muito bacana, e a maioria dos comentários levam à conclusão de que nosso futebol necessita de mudanças em toda a sua estrutura.

Nestes tempos em que os Jogos Olímpicos têm dominado todas as mídias, me deparei com um vídeo muito interessante. Este apresentava a diferença entre as competições de ginástica da década de 1950 para a Olímpiada do Rio de Janeiro 2016.

Segue o vídeo:

A diferença entre a ginástica praticada há mais de 60 anos para a atual é gigante! Ao longo dos anos a modalidade foi ganhando mais dinâmica, novos movimentos, novos métodos de treino, etc. Tudo conduziu para a modalidade se tornar o que é hoje, e a tendência é que ela continue se modificando…

Motivado por esse vídeo, decidi fazer o mesmo com o futebol, porém em um espaço de tempo de 20 anos. Para isso, resolvi assistir às finais das Copas de 1970, de 1990 e de 2010 para buscar identificar as mudanças mais visíveis na modalidade.

Seguem os vídeos:

1970


1990

2010

Ficam visíveis algumas diferenças no modo de jogo em cada um deles.

1970

1990

2010

Fase Ofensiva

Pouca mobilidade; troca lenta de passes (a bola quase fica parada); as equipes atacam com poucos jogadores no último terço do campo.

Maior mobilidade; troca de passes mais rápida; maior quantidade de jogadores chegando ao último terço de campo.

Grande mobilidade, principalmente no campo ofensivo; troca rápida de passes; praticamente todos os jogadores entrando no segundo e último terço de campo; utilização dos goleiros como opção de passe.

Fase Defensiva

Quase não se exerce pressão sobre o portador da bola até o último terço do campo (exceto nos atacantes); referências predominantemente individuais; os atacantes praticamente não participam desta fase do jogo.

Aumento de pressão sobre o portador da bola já no segundo terço de campo; há um misto maior entre referências individuais e zonas de marcação, os jogadores do ataque dão maior contribuição nesta fase do jogo; utilização do líbero.

Pressão constante e em todo o campo ao portador da bola; referências zonais de marcação bem definidas; todos os jogadores contribuem ativamente nesta fase do jogo; goleiros realizam coberturas constantemente.

Transições

São mais lentas e quase não há tentativas de recuperação imediata da posse de bola ou no campo ofensivo.

Já são mais rápidas tanto para atacar quanto para defender; mas ainda predominando a intenção de impedir que o adversário progrida imediatamente ao seu gol.

Muito rápidas tanto para atacar quanto para defender; já com uma intenção maior de recuperar imediatamente a posse da bola.

Além destes aspectos, destaco também:

  • Em 1970 são raras as marcações de impedimento, mais comuns em 1990 e 2010.
  • O contato físico entre os jogadores aumenta bastante em 1990 e 2010.
  • Os jogadores de defesa utilizam-se bastante da vantagem de poder recuar a bola, com os pés, para o goleiro pegar com as mãos em 1970 e 1990.
  • A distância entre as linhas das equipes, tanto para atacar quanto para defender, é muito grande em 1970, menor em 1990 e diminui muito em 2010. Os jogadores passam a estar mais próximos e as equipes mais compactas.
  • O jogo de hoje exige maior versatilidade dos jogadores.
  • As situações de 1×1 são menos constantes em 2010 do que em 1990 e 1970.

Uma análise mais profunda e detalhada poderia identificar outras inúmeras diferenças. Destaco estas por serem de mais simples visualização a partir dos vídeos e ficarem bem claras a qualquer um. Um dado interessante que se pode verificar em estudos científicos e na base de dados do site da FIFA, reforçando a crescente dinâmica do jogo, é o aumento da distância média percorrida pelos atletas e pelas equipes, o tempo efetivo de jogo (bola rolando) e a quantidade de passes trocados.

A intenção aqui não é julgar valor, não é dizer que o jogo de hoje ou de ontem é melhor, mas sim entender que o jogo mudou e continua mudando, este é o fato que não se pode negar. Sendo assim, estando o jogo em constante mutação, aqueles que não souberem acompanhar e se adaptar a estas mudanças, terão grandes dificuldades em se manter competitivos, aí entra a necessidade de resiliência do futebol brasileiro que mencionei no título desta coluna.

Ser resiliente não significa perder sua essência, suas raízes, mas entender como é a melhor forma de otimizar suas características no cenário atual. Acredito que nosso futebol tem sido pouco resiliente, tem sido resistente à muitas mudanças que ocorreram no futebol, principalmente no que tange a métodos de treinamento, capacitação profissional e gestão esportiva. O Brasil não acompanhou com a mesma velocidade estas mudanças no jogo, mas felizmente ainda é tempo, ainda possuímos matéria prima suficiente para sermos extremamente competitivos e vitoriosos e, como alguns leitores comentaram, não é simplesmente copiando o que se faz lá fora, mas entendendo e adaptando as nossas demandas, as nossas necessidades e capacidades. Isso é o que nossos adversários fizeram e continuam fazendo. O Brasil não pode ficar estagnado na ideia de que vivemos uma “crise técnica”, todo brasileiro aprecia um jogo plástico, com refino técnico, e esse jogo é possível de ser praticado!

Se desejamos continuar a ostentar a alcunha de “País do Futebol”, precisamos acompanhar e nos adaptar às mudanças do esporte e, para isso, não é necessário perdermos nossa essência, a qual esteve ao longo dos anos e ainda continua presente desde a Champions League até o famoso dez minutos ou dois gols.

Final de 1970 – http://www.dailymotion.com/video/x1ht8qc_fifa-world-cup-1970-final-brazil-vs-italy-full-match_sport
Final de 1990 – http://www.dailymotion.com/video/x1jo4iu_fifa-world-cup-1990-final-deutschland-argentinien-full-match_sport?GK_FACEBOOK_OG_HTML5=1
Final de 2010 – http://www.dailymotion.com/video/x2i3y2a_2010-fifa-world-cup-final-netherlands-vs-spain_sport
 

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A dicotomia da organização no futebol

Para começar, quero salientar que na estreia (começou sábado e terminou na última segunda) da Premier League, das 20 equipes, 7 jogaram no 1-4-3-3 (Chelsea, West Ham, Liverpool, Bournemouth, Man.City, Swansea, Hull City), 6 no 1-4-2-3-1 (Arsenal, Man.United, Cristal P., Tottenham, Middlebrough, Stoke), 4 no 1-4-4-2, 2 linhas (Sunderland, Burnley, Bromwich e Leicester), 1 no 1-3-4-3 (Everton), 1 no 1-4-3-1-2, losango (Southampton, ) e 1 no 1-3-5-2 (Watford).

Quanto mais os seres organizados diferem um dos outros em relação a sua estrutura, aos hábitos e a constituição…, tanto mais probabilidades têm de ser bem sucedido na luta pela sobrevivência ( Darwin, 1859). 

Ao se objetivar a organização de uma equipe de futebol, operacionalizam-se as convicções em forma de treino e jogo. Colocando em prática tais ideias, busca-se tamanha ordenação das ações entre os atletas, como equipe. Há um esquecimento desprezo do “querer” do atleta, com suas decisões, sua criatividade, sua forma de ver o jogo.

Para a construção de uma organização coletiva, precisa-se ter em mente a organização individual e a forma de jogar de cada atleta. Necessita-se conhecer o atleta, sua personalidade, suas características e suas ideias. Se esta não for a base da organização coletiva tender-se-á a um número maior de ocorrências durante o jogo, que propiciarão uma quantidade desnecessária de situações de risco, tendendo à ruptura organizacional da equipe.

No desenrolar do jogo de futebol, dois locais merecem ser considerados para análise, observação, construção e  desenvolvimento de “uma” certa organização em equipe: o local onde está a bola (jogo local/núcleo do jogo/micro) e o local onde a bola não está (jogo global/fora do núcleo/macro). No primeiro, a organização baseia-se na vertente setorial, organização coletiva dada por um número de atletas (1, 2, 3, 4, etc.) menor que o todo. Ou seja, a parte é responsável pelo cumprimento e eficácia da organização do todo. No segundo local, a organização tem como pilar a vertente coletiva, organização coletiva dada por um número de atletas, jogo fora do núcleo onde está a bola, próximo do todo (11 atletas). Neste caso, um grupo de atletas, na maioria das vezes maior, sustenta e dá forma a organização da equipe.

“O jogo local está para o jogo global, assim como o jogo global está para o jogo local”

O jogo local manipula todo o contexto do jogo de futebol. O(s) atleta(s) que está onde a bola está, tem o poder de guiar e dar sentido ao jogo. Este(s) atleta(s) tem o “poder” do jogo em suas mãos. Isto ocorre pois o resultado do confronto, de quem tem e de quem não tem a posse de bola, pode prejudicar ou favorecer o jogo global/macro: a chegada da bola, em um local onde ela não estava, poderá ocorrer em um contexto de prejuízo. Por exemplo, muito se fala e se faz para pressionar o local onde a bola se encontra, contudo, se a equipe não está preparada tática/estrategicamente, talvez seja melhor a bola não sair do local onde se encontra. Neste caso, melhor seria não pressionar o local da posse. A fim de pressionar, se torna imprescindível estar preparado coletivamente (vale salientar aqui a diferença entre pressão (individual) e pressing (coletivo))Outro exemplo, agora ofensivamente, o que muitas equipes fazem com a bola está na atração do adversário para abrir um determinado local do campo. Mostro no vídeo o Manchester City (treinado por Pelegrini), na transição ofensiva, a equipe “acelera” o passe/posse de um lado para abrir o lado oposto, atraindo a marcação em bloco do Southampton. Este por uma interpretação da marcação zonal praticada como princípio defensivo, basculam por completo para um lado e depois para outro, abrindo o lado oposto, onde sai o gol do Manchester City.


 

Caso o jogo local (deixar jogar sem pressão, atrair com posse acelerada, etc) permita que o global (lado oposto, cobertura defensiva, estrutura da linha defensiva, etc) seja exigido, este tende a ter maior probabilidade de erro/acerto. Quando a bola está no jogo local e, por “escolha” de quem está na defesa há passagem para o jogo global, a equipe será exigida e testada perante sua organização coletiva defensiva, por exemplo (caso do vídeo). Caso esteja devidamente estruturada e estabelecida na sua vertente defensiva, tenderá a não sofrer mal algum. Ao contrário, não estando precisamente organizada defensivamente, sofrerá as consequências de sua falta como conjunto, ou seja, será desorganizada, romper-se-á em sua própria estrutura aumentando positivamente as chances de sucesso da equipe adversária.

Levando isto em conta, conclui-se que não pode preocupar-se somente com a organização coletiva e/ou setorial de uma equipe pois esta organização, mesmo que bem executada e eficiente durante o jogo, sofrerá com as frequentes situações que colocam em prova sua organização. Porém, estas situações estarão na dependência do jogo local, ou seja, só estarão presentes se o jogo local o permitir! Sem esta anuência do jogo local, o número de situações que colocaram em teste a organização defensiva coletiva/setorial será bem menor, sendo também menores as probabilidades de ruptura. Precisa-se ter como preocupação a tomada de decisão de cada atleta em cada momento do jogo, fazendo com que o atleta perceba que a sua decisão e a sua ação são extremamente importantes, independente do local ou momento do jogo, para o bem da equipe, para o bom andamento do jogo, para que o desenvolvimento do jogo seja favorável à equipe, defensiva e ofensivamente.

Perante o pensamento sistêmico: determinada situação só está certa ou errada se a bola ali chegar. Caso contrário, não se pode inferir que aquilo que num primeiro momento parecia incorreto realmente o é.

O resultado do jogo local que dará sentido/forma à organização coletiva. 

Não se pode focar isoladamente/prioritariamente na organização coletiva da equipe. Uma boa orientação deve estar preocupada com a “organização individual” do atleta, em cada situação do jogo. Fazer com que o atleta perceba que a decisão dele é fundamental para o ideal desenvolvimento da partida, fazendo-o entender que sua decisão influenciará a decisão de outros atletas (da mesma equipe ou não) e que a mesma foi influenciada pelas decisões anteriores. Nada além do que decisões interativas.

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Olimpíada e liberdade de expressão

Os Jogos Olímpicos começaram com uma belíssima cerimônia de abertura quando o Brasil mostrou ao mundo sua capacidade de organizar uma grande festa com baixo orçamento.

A grande polêmica do início dos Jogos diz respeito ao direito dos torcedores manifestarem-se politicamente, eis que o Comitê Olímpico Internacional proíbe a exibição de faixas e cartazes durante os eventos esportivos.

Segundo a Constituição Brasileira em seu artigo 5º, IV, é livre a manifestação do pensamento.

Tal direito fundamental é dirigido ao Estado (Governo) que não pode, em hipótese alguma, restringir a manifestação do pensamento por qualquer meio, como, por exemplo, a censura.

A Olimpíada corresponde a um evento organizado por uma entidade privada e que tem seus objetivos insculpidos na Carta Olímpica que, em seu artigo 50, reforça o caráter “não ideológico” da Entidade ao proibir, em qualquer instalação Olímpica, manifestações e propaganda política, religiosa ou racial.

Tal vedação tem por objetivo promover os princípios apolíticos do olimpismo, bem como proteger os patrocinadores do evento que seriam “afugentados” em caso de manifestações para não terem sua marca vinculada a determinado pensamento ideológico.

A atenção ao art. 50 da Carta Olímpica, é recebido expressamente pelo ordenamento jurídico brasileiro no art. 28, da Lei 13284/2016 que estabelece como condição de acesso e permanência nos locais oficiais não utilizar bandeiras para outros fins que não o da manifestação festiva e amigável.

Ressalte-se que os eventos olímpicos são privados e que o cidadão ao adquirir o ingresso, firma contrato de adesão no qual aceita as condições de acesso e permanência.

Obrigar o Comitê Olímpico Internacional a permitir manifestações políticas em seus eventos é como obrigar um cidadão a permitir manifestação que não concorda dentro de sua propriedade.

Além disso, a liberdade de expressão deve encontrar limite no Princípio do Dano que “É o princípio de que o único fim para o qual as pessoas têm justificação, individual ou coletivamente, para interferir na liberdade de ação de outro, é a autoproteção. É o princípio de que o único fim em função do qual o poder pode ser corretamente exercido sobre qualquer membro de uma comunidade civilizada, contra a sua vontade, é o de prevenir dano a outros”. (MILL, 2011, p.35)

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Ou seja, não se pode obrigar o COI a sofrer danos com a fuga de patrocinadores para garantir que cidadãos manifestem-se politicamente nos eventos olímpicos.

Neste sentido, importante destacar a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, 1789, art. 4º:

“A liberdade consiste em poder fazer tudo aquilo que não prejudique outrem: assim, o exercício dos direitos naturais de cada homem não tem por limites senão os que asseguram aos outros membros da sociedade o gozo dos mesmos direitos. Estes limites apenas podem ser determinados pela Lei.”(Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, 1789, art. 4º)

Dessa forma, a vedação às manifestações políticas pelo COI não afronta a Constituição Brasileira.

Apesar disso, a Justiça Federal do Rio de Janeiro deferiu medida liminar que veta a repressão dos protestos e expulsão dos manifestantes.

A União anunciou que recorreria da decisão, mas, de certo, diante do delicado momento político que o país enfrenta, optou por não recorrer e, por consequência, diminuir a polêmica.

Entretanto, provavelmente o recurso da União seria provido e a proibição das manifestações políticas seria mantida. Isso porque, o STF, Corte Maior do país, em 2014, ao analisar caso semelhante durante a Copa do Mundo julgou constitucional a restrição de manifestação política em estádio.

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Jogo fragmentado – jogo argumentado

A TV Globo, em seu Esporte Espetacular do último 24 de julho, veiculou uma matéria interessante com dados sobre o jogo brasileiro jogado em 2016. Deu números da Série “A” em comparação, principalmente, ao Brasileirão de 2015. Antes de qualquer comentário, recomendo-a como matéria importante a ser vista por todos os desportistas do futebol!

A verdade dos números mostrou um fenômeno que nós, treinadores e outros profissionais da área, vimos constatando há algum tempo. Os minutos de bola em jogo no Campeonato Brasileiro 2016 são substancialmente maiores que 2015. Será que o jogo truncado está cedendo lugar ao velho e bom jogo brasileiro do toque de bola? Aquele que inspirou Guardiola e incrementou um perfil de jogo para o mundo?

Na prática, o que nos mostra a reportagem é a melhora do jogo praticado pelas equipes brasileiras. O fenômeno é mundial! Nos últimos dez anos, os efeitos do estilo de “jogo Barcelonês” se espalharam por todos os lados. O mundo da bola está jogando um futebol melhor e os brasileiros, ainda que a duras penas, têm acompanhado a tendência. Estamos saindo do futebol fragmentado, com disputas loucas e exclusivas por espaços, para um jogo argumentado em conceitos táticos que respeitam a lógica dos princípios modernos da sua construção.

Não tenho dúvidas que ainda veremos, no Brasil, treinadores caindo após duas ou três derrotas, mesmo com suas equipes jogando melhor que em tempos passados. O que continuará provocando a queda de treinadores no futebol brasileiro serão os resultados. A leitura da bola que entra ou não é mais fácil para a nossa pobre compreensão desse jogo. Ainda não sabemos avaliar o que é jogar bem e não somos capazes de bancar um projeto de construção de jogo se este não for acompanhado de vitórias nos primeiros jogos. “Eles continuam não sabendo o que fazem”!

Para uma mudança abrangente do panorama futebolístico brasileiro muita coisa há de ser reparada no âmbito da gestão esportiva nos clubes e nas Federações, além da construção e aplicação de Leis profissionais e trabalhistas no nosso mercado.

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Que os treinadores estão se qualificando, não há dúvidas. Os resultados apurados na reportagem da Globo são comprovatórios, mas existem muitas outras evidências a nossa disposição. Quem tem olhos para os cursos de formação de treinadores da CBF, verá um grande esforço profissional em busca da qualificação. As salas de aula estão sempre lotadas e é grande a procura por vagas dos treinadores jovens e experientes de todo o Brasil e até do exterior.

Muitas respostas boas têm saído deste ambiente que outrora não existia no futebol brasileiro. Um projeto de altíssimo nível que, se não atrapalharem, veio para ficar, crescer e refazer a Escola Brasileira de Futebol! Os Cursos da CBF foram implantados há quase dez anos e desde então só faz crescer.

Jogar bem é apenas “um passo” na complexa tarefa da construção do jogo, porém não é pré-requisito para vitórias a curto prazo. Pode até ser o caminho para muitas vitórias futuras! É preciso contextualizar o trabalho de campo à realidade imposta pelo futebol brasileiro, com inúmeras dificuldades no trabalho dos treinadores.

Mesmo com o quadro sombrio no mercado brasileiro da bola, os treinadores têm dado sua contribuição para a melhora do jogo. Não me canso de dizer que o treinador brasileiro é muito mais vítima que réu nesse processo de construção e/ou qualificação do nosso jogo. Haja visto o expressivo número de treinadores estrangeiros que têm vindo ao Brasil nos últimos anos sem conseguir fazer melhor que os nossos! Seria bom que eles durassem mais em seus cargos nos clubes para levarem do futebol brasileiro uma análise mais apurada do nosso mercado.

Concluir que apenas não têm tempo para trabalhar ou que “o calendário de jogos é desumano” é muito pouco para uma conjuntura tão complexa quanto a nossa. Acho esse tema importante e com detalhes tão característicos que merece um post exclusivo futuramente. Podem aguardar!!

Prefiro agora valorizar a evidente melhora do jogo jogado em nossos campos. Ótimos treinadores brasileiros têm se empenhado na qualificação dos treinamentos e outros recursos de campo que contribuem para a modernização do jogo. Talvez já seja o prenúncio do que o alemão Paul Britner vaticinou há dois ou três anos, que “quando os brasileiros descobrirem novamente os caminhos da construção do jogo moderno, retomaria a hegemonia mundial”!

Tomara que o Tite, como treinador da Seleção Nacional, ilumine boa parte destes caminhos. Tem competência e credibilidade para contribuir no desencadear deste processo.

Parabéns à Rede Globo e até a próxima! Tomara que com um futebol cada vez melhor praticado em nosso país…