Neste mês de junho abriremos espaço para a reflexão e discussão sobre o processo de detecção, seleção, e formação de jogadores nos clubes. Feliz e coincidentemente, alguns temas abordados pelo portal esta semana introduziram de forma brilhante o que eu pretendia escrever.
A entrevista feita pela equipe da Universidade do Futebol com o Thiago Corrêa, a necessidade de evolução das peneiras escrita pelo Eduardo Barros, o exemplo da administração de sucesso do Barcelona escrita pelo Erich Beting e os fins justificando os meios com crimes cometidos na revelação de jogadores destacada pelo Geraldo Campestrini não poderiam ter vindo em tão boa hora!
Por sermos um dos países que mais exporta jogadores no mundo, é comum ouvirmos frases do tipo “o Brasil é um celeiro inesgotável de craques”. Quase todo ano algum jovem jogador de destaque nacional se transfere para o futebol internacional nos fazendo crer que o processo de formação de jogadores está perfeito, não é? Mas se analisarmos quantas pessoas praticam futebol e quantas desistem de praticar, fico imaginando quantos Barcelonas (campeão da Champions League com a maioria dos jogadores formados no clube e muitos deles campeões pela seleção na Copa de 2010) não perdemos a cada ano.
Mas no fundo, não dá pra reclamar, pois o futebol reflete exatamente aquilo que somos enquanto nação! Imediatistas, com pensamento de curto prazo e querendo colher frutos sem plantar nada. Na educação é assim, no trabalho é assim, na política é assim e por que no futebol não seria? Salvando raríssimas exceções tudo vai ficando para depois e se ainda der para pedir prorrogação que assim seja. Vejam o exemplo das obras para a Copa de 2014.
Quem aposta suas fichas que vai dar tempo?
Em países onde algumas coisas funcionam de verdade podemos aprender grandes lições. Na Finlândia, por exemplo, os melhores professores estão no ensino básico, pois ao incorporarem bons hábitos, disciplina, estudo e respeito nas crianças, sabem que verdadeiramente construirão o futuro e por isso recebem os maiores salários. Não precisamos de muita inteligência para saber que seria muito mais difícil, e caro, um país querer construir esses valores na população com idade adulta e mesmo que o fizesse, a chance de sucesso seria menor.
Outros países como os Estados Unidos, por exemplo, utilizam competições mundiais juvenis como processo de formação de atletas e não como objetivo de vitória. Não são raros campeões mundiais e olímpicos adultos não terem tido muitos pódios nas categorias de base.
Agora imagine… Se um clube de futebol optasse por uma política de longo prazo na base e contratasse os melhores profissionais para formar atletas por um período indeterminado;
onde independentemente da diretoria que estivesse no comando do clube, o trabalho teria a mesma continuidade de modo que no final de cada ciclo, após avaliação criteriosa, pudesse ser melhorado ao invés de substituído; onde os familiares pudessem ficar sossegados por saberem que lá há alimentação adequada, segurança, apoio à saúde, respaldo psicológico e que mesmo que o jogador não se torne profissional, saberiam que ele se tornaria uma pessoa melhor; que mesmo ele não dando certo no futebol, teria oportunidade no mercado de trabalho porque teve condições de investir em sua formação em conjunto com sua carreira futebolística.
Agora volte à realidade…
Tudo parece ser feito ao contrário da lógica. Já reparou que os profissionais na base geralmente estão em início de carreira? Que aqueles que se destacam logo são promovidos para outro departamento ou mudam de clube? Que as categorias formadoras servem como degrau profissional sem a perspectiva de oferecer uma oportunidade de carreira duradoura?
Se pensarmos na galeria de troféus dos clubes então, vira tortura!
Muitos troféus que lá estão vieram das categorias de base, porém a maioria dos atletas que os conquistaram não chegou ao time profissional. Acúmulo de lesões por excesso de sobrecarga, transferência para outros clubes de forma precoce, abandono da modalidade por dificuldade financeira, desmotivação por excesso de cobrança e erro nos critérios de seleção são alguns dos motivos que justificam este “desaparecimento” de jogadores da base.
E sabe o que é pior? O trabalho da base geralmente não é avaliado pelos jogadores que forma, mas na quantidade de títulos que se ganha. Assim, os papéis se invertem e a prioridade passa a ser a vitória ao invés da formação. Neste modelo, adivinhe: quem não é campeão está fora e a consequência disso é que de tempos em tempos inicia-se um novo trabalho já sabendo que o mesmo poderá não ser concluído.
O processo de seleção e formação de jogadores da base deveria passar por uma análise multifatorial, objetiva, quantitativa e qualitativa. Profissionais especializados em crescimento, desenvolvimento e aprendizagem motora deveriam encabeçar o departamento e todos os outros profissionais do futebol amador (treinadores, preparadores físicos e fisiologistas) deveriam ter expertise não somente em futebol, mas também em educação, crianças e adolescentes.
Com melhores oportunidades de carreira, condições de trabalho e salários, o trabalho de longo prazo poderia formar melhores pessoas, mais jogadores com qualidade, daria opções menos dispendiosas para o futebol profissional e com maior número de negociações traria mais lucro para os clubes. Mas se só há benefício, por que então isso não corre? Mentalidade arcaica de algumas diretorias, falta de cultura de longo prazo e escassez de profissionais da gestão do esporte são alguns dos motivos que justificam essa situação na maioria dos clubes brasileiros.
Só nos resta então três opções:
1) saber se isso vai mudar um dia;
2) saber quando vai mudar;
3) torcer para que seja logo…
Para interagir com o autor: cavinato@universidadedofutebol.com.br