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O direito de mentir

“Repetir uma mesma escalação em três dos quatro jogos que fizemos até agora é algo muito bom. Ainda não tenho todos os jogadores disponíveis, mas manter uma sequência ajuda a dar uma consistência para o grupo”.

A frase foi replicada nos jornais, sites, rádios e TVs na sexta de tarde e no sábado pela manhã. Seu autor é Paulo César Carpegiani, treinador do São Paulo, antecipando o duelo que teria contra o Grêmio, pelo Campeonato Brasileiro.

Baseados nas declarações do treinador são-paulino, os jornalistas já anteciparam a formação tática da equipe paulista e o fato de Carpegiani ter mantido a equipe, mesmo com algumas críticas de torcedores e comentaristas pelo jeito mais “fechado” de o São Paulo jogar com a formação no meio-campo tendo quatro jogadores mais afeitos à marcação.

Bom, mas aí veio o jogo… E, depois dos 3 a 1 do São Paulo sobre o Grêmio, com uma ótima atuação de Marlos, o “titular-surpresa” de Carpegiani, veio a entrevista coletiva para a imprensa.

“Eu menti. Já tinha planejado jogar com o time daquela forma, mas não poderia antecipar isso”, afirmou o treinador são-paulino.

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O “nó tático” de Carpegiani não foi só dentro de campo, sobre Renato Gaúcho, que claramente montou um time baseado naquele São Paulo que três dias antes havia jogado, e sofrido, contra o Atlético-MG. Todos os jornalistas que acompanham o cotidiano do clube paulista sentiram-se um pouco derrotados depois do jogo, meio zonzos pelo drible desconcertante que levaram.

Mas Carpegiani se aproveita de um fato que é muito corriqueiro no cotidiano dos clubes de futebol. Jornalista adora ir a treino, mas raramente passa o tempo todo acompanhando o exercício dos atletas. Ok, muitas vezes temos diversas funções a cumprir, outras preocupações para fazer para o jornal, a internet, a rádio ou a TV.

O problema é que muitas vezes o repórter não entende que a cobertura de um treino não pode se limitar às entrevistas que são realizadas depois dele. É fundamental usar uma característica que está na essência do jornalismo, que é a capacidade de o repórter observar o ambiente em que se encontra e reproduzir uma história a partir dele.

Carpegiani tem todo o direito de mentir. Principalmente quando a informação que ele boicotou a mídia era estratégica para obter o resultado de que precisava. É muito provável também que o São Paulo não tenha chegado a treinar com a formação usada em jogo, mas aí está o grande segredo dos treinadores: conhecer os seus atletas e saber como tirar o melhor proveito deles, mesmo sem nunca ter treinado dessa maneira.

Ao jornalista, além do direito de perguntar, está o dever de observar. Talvez, dessa forma, as mentiras sejam pegas “de calças curtas”, como se dizia no passado. Afinal, essa é a essência da apuração jornalística. Não se ater às declarações, sabendo que o entrevistado pode usar as palavras apenas em benefício próprio.

Para interagir com o autor: erich@universidadedofutebol.com.br