Caros treinadores,
é bastante comum no futebol brasileiro que os motivos para suas derrotas sejam os mais variados possíveis que não as suas próprias falhas.
Ao adotarem este comportamento, nas coletivas e entrevistas pós-jogo (no caso daqueles com maior visibilidade, é claro), utilizam como desculpa a falta de reforços, os erros de arbitragem, a falta que fizeram os lesionados, o pouco tempo no cargo, o cansaço devido ao acúmulo de jogos ou até uma inexplicável má fase.
São poucos os que focam nos reais problemas de sua equipe (RPE). Os que o fazem, geralmente, limitam-se a questões mais superficiais.
Ao atribuir o “peso” principal do resultado negativo aos fatores externos, os RPEs passam despercebidos. Logo, no dinâmico mundo atual, o jogo seguinte, após uma vitória ou demissão, acaba por encerrar o tema que permitiria horas de enriquecedoras discussões sobre futebol.
A sorte de vocês, caros treinadores, é que a mídia especializada ainda não está preparada para ser um dos vértices da evolução do futebol brasileiro. Com isso, jogo a jogo, coletiva a coletiva, limitam-se a induzir as respostas prontas dos jogadores e treinadores. Afinal, respostas prontas são as soluções para perguntas repetitivas.
O movimento necessário de evolução do futebol brasileiro passa, indispensavelmente, por uma maior compreensão do jogo de futebol por parte dos formadores de opinião. Com melhor capacitação, seriam mais exigentes e inteligentes em suas perguntas e, consequentemente, “forçariam” respostas mais complexas.
No entanto, quantos profissionais da imprensa estão preparados para questionar a opção de um treinador marcar por zona ou individualmente em bolas paradas?
Quantos seriam capazes de perguntar por que o goleiro não participa ativamente do modelo de jogo quando a equipe sobe o bloco e ele deixa de se posicionar caso seja necessário uma cobertura defensiva?
Quem será o primeiro a questionar uma resposta superficial de um treinador que em determinado jogo afirma não ter conseguido manter a posse de bola mesmo que apresente como transição ofensiva predominante uma retirada vertical do setor de recuperação com passes longos que inviabilizam a posterior circulação?
Ou então, quem irá instigar os treinadores que há tempos os meias dos grandes clubes europeus têm a ocupação do espaço como referência para marcação e não somente a bola e o adversário mais próximo (como ainda fazem muitas das nossas equipes)?
Pois é, enquanto boa parcela da mídia contribuir para a estagnação do futebol brasileiro, questões como as más leituras de jogo com ações coletivas distintas para o mesmo problema, limitações setoriais que impedem o cumprimento da lógica do jogo, substituições não condizentes com as necessidades do sistema-equipe, deficiências circunstanciais da unidade complexa (e não somatória de onze jogadores) que têm ocorrido frequentemente ou quaisquer outras questões mais abrangentes envolvendo o jogo não serão abordadas e os RPEs ficarão guardados para resolução nos treinamentos.
Resolução possível somente se os treinadores souberem quais são os RPEs. Você sabe quais são os seus?
E para a palavra “treinadores”, leia-se também todo e qualquer assistente envolvido na comissão técnica. Preparadores físicos costumam olhar somente se sua equipe está suportando fisicamente o jogo, treinadores de goleiros, se houve falha individual do seu jogador no(s) gol(s) sofrido(s) e o auxiliar, muitas vezes, se isenta de culpa (mesmo que internamente), pois não é o treinador principal.
Saibam que a culpa também é de vocês! A expressão (e a ação) “treinador adjunto” é a ideal para modificar a atrasada configuração das comissões técnicas brasileiras.
Independentemente da evolução da mídia, que poderia ampliar a visão dos milhões de brasileiros apaixonados por futebol que clamam por um bom espetáculo, os treinadores que conseguirem gerenciar os RPEs tenderão a se aproximar das vitórias.
E, se no caso das derrotas a culpa é exclusivamente do treinador e de sua comissão, no caso das vitórias o mérito deve ser, também exclusivamente, dos jogadores.
Coisas da dura profissão de treinador de futebol!
Obs: Por enquanto, os RPEs têm passado despercebidos inclusive para os dirigentes. Outro vértice da evolução do nosso futebol e tema para uma outra coluna.
Para interagir com o autor: eduardo@universidadedofutebol.com.br