O Brasil acabou de passar pela eleição presidencial mais acirrada desde a redemocratização do país. Foi um processo conturbado, cujas sequelas ainda serão notadas nos próximos anos. E isso pode ter criado um cenário extremamente favorável ao esporte.
Explico: muito do que cindiu o país durante a eleição é consequência de como o jogo político é feito. O ambiente é inóspito, e algumas coisas inadmissíveis são apenas legítima defesa ou sobrevivência (e aqui, para deixar muito claro, não há nenhuma defesa de atos ilícitos ou corrupção; o ponto é apenas uma crítica ao modelo político vigente no país).
Não é por acaso que a reforma política foi a primeira bandeira levantada por Dilma Rousseff (PT) do discurso em que ela comemorou a reeleição. O jogo não é mais compatível com as necessidades do país. Se quisermos mudar o país, temos de mudar o jogo.
Antes mesmo da confirmação da reeleição, a reforma política já era um consenso entre situação e oposição. Ainda que os termos sejam discutidos de parte a parte, há um consenso sobre o desgaste do modelo.
E onde o esporte entra nisso? É uma seara que pode se beneficiar desse movimento voltado a repensar o país. Com oposição e situação dispostas a discutir uma reforma ampla, o próximo quadriênio talvez seja a maior oportunidade da história para que o esporte tenha mudanças verdadeiramente contundentes.
Essas mudanças passam necessariamente pela profissionalização e pela mudança de foco. O esporte no Brasil hoje é feito para os clubes ou para os atletas. Qualquer evolução depende de uma alteração de foco. É necessário pensar em consumidores e em pessoas.
Os atletas são importantes, é claro, mas são uma fatia da população. O esporte tem de ser feito para a maioria, para os que vivem isso como lazer ou meio para qualidade de vida.
Os clubes também são relevantes, até por funcionarem como incubadoras de todo desse processo. Mas o clube não pode ser visto como um fim, como acontece atualmente no Brasil. O consumidor precisa ser o foco, e o clube deve se adaptar às necessidades do público.
Todo esse processo, porém, está intrinsecamente ligado a uma mudança de mentalidade de quem comanda o esporte no país. E qualquer mudança de mentalidade, infelizmente, depende de uma reforma estrutural.
O esporte precisa saber aproveitar o momento de divisão do país. Precisa entender o potencial de uma discussão sobre reforma política. É o momento para que essa renovação chegue a vários âmbitos da sociedade.
O problema é que esse clamor por mudanças não partirá de quem comanda o esporte. Afinal, ao contrário da gestão pública, essa área tem poucas cisões e raros casos de oposição com representatividade (e isso independe da modalidade).
Esse movimento por mudança deve partir de quem depende da mudança. Atletas, gestores e até torcedores têm um compromisso enorme nos próximos anos. A oportunidade está aí.
Você pode ter começado a segunda-feira triste ou feliz com o resultado das eleições do último domingo (26). Se você é apaixonado por esporte ou se trabalha na área, contudo, sua responsabilidade é ter um sentimento um pouco diferente. É a hora de o esporte perguntar o que precisa ser feito para mudar.
A necessidade premente de reforma política transformou o novo mandato em grande oportunidade. Você pode até passar os próximos meses chorando o resultado da eleição, mas a necessidade agora é outra. Precisamos discutir meios de o esporte aproveitar as cartas colocadas na mesa.
O Brasil mudou muito desde a redemocratização. O esporte, no entanto, segue com uma cultura envelhecida e com uma estrutura vigente desde o início da segunda metade do século passado. A despeito dos inegáveis avanços, nunca tivemos uma ruptura ou uma reforma que repensasse a estrutura do segmento.
Se esse tema conseguir dirimir até a dicotomia posta em opositores de Facebook, por que não sonhar com uma reforma que mude também a estrutura do esporte? É isso que eu gostaria de ver no segmento durante os próximos quatro anos.