Para aqueles que estudam e sonham com um futebol gerido de maneira diferente no Brasil, recomendo reservar 90 minutos. Exatamente o tempo de uma partida de futebol! É para assistir a uma série de reportagens produzidas pela SIC Portugal sobre o Sport Lisboa e Benfica, o clube mais popular da terra de nossos colonizadores.
Com as ressalvas sobre o enredo jornalístico da produção, que serve, naturalmente, para ser atrativo para todos os públicos, para nós que estudamos e procuramos buscar novas informações sobre a gestão do futebol vale pelos filtros de processos e de construção de longo prazo pela qual o clube português passou na última década.
Além disso, trata-se de um clube social na sua essência, que disputa uma competição nacional pouco atrativa (embora possa disputar os principais campeonatos europeus), situado em um país com limites geográficos reduzidos, uma economia ainda frágil, que não se pode comparar com as principais economias europeias, e população de pouco mais de 10 milhões de habitantes, idêntica a Paraná ou Rio Grande do Sul. Muito por isso o exemplo é de extrema relevância para a nossa realidade, fugindo daquele senso comum de querermos nos igualar a Manchester, Barcelona, Real Madri ou Bayern de Munique. Trata-se de algo muito mais próximo daquilo que podemos construir no cenário dos nossos clubes no Brasil.
Eis os links para a série de reportagens, com breves comentários sobre cada uma delas:
– PARTE 01 (http://goo.gl/sdGcNv): apresenta de forma clara a transformação pela qual o clube passou – (a) Definição de metas; (b) Gestão profissional; (c) Contratação de especialistas para gerir e tomar decisões efetivas pelo clube; (d) Agir localmente e pensar globalmente; (e) Controle de conteúdo.
– Comentário: no nosso cenário, serve como um importante parâmetro que não se é possível mais fazer futebol em alto nível, com controle de receitas e proteção da marca, com meros “simpatizantes” do clube o administrando. Não é mais admissível que um departamento de marketing de um clube, que fature mais de R$ 200 MM por ano, seja administrado por menos de uma dezena de profissionais, que atuam sem qualquer autonomia. Também mostra uma premissa que já é consagrada no mercado americano, que é o controle do conteúdo do clube pelo clube. Isso se traduz pela criação da BenficaTV, que é citada de forma sintética na reportagem.
– PARTE 02 (http://goo.gl/6J0Um5): a abordagem passa, em um primeiro momento, pela parte técnica e a relação com a gestão do clube, apresentando o Centro de Treinamento, as equipes de Análise de Jogo e alguns bastidores da preparação da equipe para os jogos. Do lado do marketing, uma pequena amostra sobre as atividades e compromissos dos atletas com ações semanais em prol do clube, que reforçam sua marca e sua proximidade com o público.
– Comentário: é fundamental evoluir de forma significativa a gestão técnica dos clubes no Brasil. A intromissão sobre os processos de trabalho cotidiano da comissão técnica feita pelos dirigentes é a parte mais latente e que afeta substancialmente a performance. Quanto ao marketing, apenas mais uma mostra de que é possível fazer coisas simples, de baixo custo, e com alto valor para os fãs – como resultado, naturalmente, um maior apreço pela marca do clube.
– PARTE 03 (http://goo.gl/d0VuoH): certamente o capítulo menos técnico do ponto de vista da gestão, mas relevante para percebermos as entregas de conteúdo em casos de conquistas esportivas e também a relação com ex-jogadores do clube – o que demonstra o ambiente interno positivo construído pelo Benfica na relação entre dirigentes e equipe técnica.
– Comentário: a preparação para a conquista e o ambiente criado para os festejos do título é o maior aprendizado. O cenário e, novamente, a proximidade com os fãs formam o melhor retrato deste conceito.
O desejo pela mudança transcende as conquistas esportivas, que são o fim, ou seja, a consequência de um trabalho bem feito, de forma consistente ano a ano, sem desvios.
É por esses e outros exemplos mundo afora que defendemos a ideia que é possível termos algo muito melhor no futebol brasileiro. Não centralizado apenas em um bom exemplo, mas em vários. Não apenas em lapsos ou bolhas, com prazo de validade, mas sim de maneira perene e sólida. Podemos fazer mais e melhor com os recursos que temos à nossa disposição hoje. É preciso começar e não desistir dos objetivos, mesmo que no meio do caminho os obstáculos apareçam!