Não saíram de dentro das quatro linhas as notícias mais relevantes do São Paulo em 2015. Foi uma temporada conturbada, com renúncia de presidente, uma série de escândalos de gestão e a aposentadoria de um dos maiores ídolos da história tricolor. A saída encontrada pelos paulistas para amenizar o luto pela falta de resultados e pelo fim da carreira do goleiro Rogério Ceni foi repatriar o zagueiro uruguaio Diego Lugano, referência da equipe na década anterior, que estava no Cerro Porteño. Mas Lugano vale a aposta que o São Paulo fez?
Lugano não foi contratado (apenas) como uma adição técnica. O zagueiro teve passagem vitoriosa pelo São Paulo e foi capitão da seleção uruguaia em um período de alta da equipe nacional, mas os atributos que a diretoria brasileira buscou nele não foram esses. Lugano volta ao São Paulo por ser líder, por ser um exemplo para os atletas mais novos e por mexer com o tão abalado emocional dos torcedores.
A chegada do zagueiro ao Aeroporto Internacional de Cumbica, em Guarulhos, foi uma demonstração do apreço que a torcida do São Paulo tem por ele. O incremento de vendas das camisas com o número 5, o que será usado por Lugano, também.
O São Paulo queria fazer uma apresentação grandiosa para Lugano. A ideia era colocar o zagueiro num espaço de grande porte (o estádio ou algo similar) e atrair um enorme número de torcedores para ver o ídolo. Em um cenário normal, essa seria uma oportunidade incrível para vender produtos licenciados e criar oportunidades de ativação de patrocinadores.
No entanto, o São Paulo não vive um cenário normal. O início da temporada 2016 é uma reconstrução para o elenco, que não perdeu apenas Rogério Ceni – Alexandre Pato e Luis Fabiano, dois dos principais atacantes da equipe, também saíram. Há carências técnicas, e tudo isso está nas mãos de um novo treinador – Edgardo Bauza, dono de dois títulos da Copa Libertadores.
Além disso, existe uma pressão colocada pelos torcedores. A temporada sem títulos também foi marcada por derrotas acachapantes para rivais – a mais elástica delas, para o Corinthians, por 6 a 1. A soma é cruel para um clube do porte do São Paulo: é preciso reagir logo, mas é preciso fazer isso com um elenco que perdeu seus principais referenciais e que tem pouco dinheiro para ser reconstruído.
É nesse contexto que entra Lugano, um zagueiro que nunca foi um virtuose no ponto de vista técnico. No auge, o defensor se destacava por aspectos como liderança e vigor físico. Desde 2011, porém, ele não disputa mais de 20 partidas em uma só temporada.
Lugano hoje não é o defensor que passou pelo São Paulo ou que liderou a seleção uruguaia. Não apenas pela queda física, mas por não ter encontrado meios de reconstruir seu jogo. Para usá-lo bem, o time paulista terá de saber explorar o atual estado do defensor e proteger suas deficiências.
E vale a pena construir um time pensando em todas essas questões para um defensor? Vale a pena ter todos esses asteriscos ao moldar a equipe? Vale a pena ter de pensar em tantos condicionais?
Mais: vale a pena fazer tudo isso e colocar em risco o ídolo? Se Lugano tiver uma temporada ruim em 2016, o que isso fará com a imagem que ele construiu na década anterior? Será que o São Paulo considerou em algum momento o valor do que o atleta representa?
O São Paulo vê em Lugano uma solução de curto prazo, mas ignora os riscos de médio e longo prazo. Afinal, debelar a imagem de um ídolo é um risco também para o valor de marca do próprio clube.
Todo o plano de comunicação e marketing que o São Paulo tem desenvolvido em torno de Lugano só tem aumentado a pressão. Nessa lógica, a postura mais sensata partiu do próprio uruguaio, que vetou uma apresentação de grande porte e preferiu fazer um evento “comum”, aberto apenas para jornalistas.
O melhor que o São Paulo pode fazer agora é preservar Lugano. E isso não vale apenas para aspectos como tática e técnica, mas também (e principalmente) para comunicação e marketing.
No esporte, o resultado é um alicerce fundamental para qualquer estratégia de comunicação ou marketing. É possível adotar outras prioridades, mas é remota a chance de sucesso ao ignorar esse item.
Quer um exemplo recente? É só ver o que aconteceu com Ronaldinho Gaúcho no Fluminense. O ex-melhor do mundo foi contratado no ano passado, com grande alarde, como parte de uma campanha interna para alavancar o capital político do vice-presidente de futebol Mario Bittencourt, que deve disputar no fim deste ano a eleição presidencial do clube.
Ronaldinho chegou a um elenco jovem, barato, liderado por poucos jogadores experientes. O grupo havia sofrido muito no começo do ano, quando o Fluminense perdeu a Unimed, que era a principal patrocinadora do clube e atuava como mecenas no futebol.
Era um perfil diferente, que atraía todos os holofotes, num elenco que havia se fechado em meio às dificuldades e que havia se acostumado com a condição de menos badalado.
Aqui não cabe nem a discussão técnica, mas Ronaldinho não “casou” com o Fluminense em momento algum. A imagem do astro não tinha nada a ver com o que aquele elenco representava – mesmo os jogadores mais experientes daquele grupo, como o goleiro Diego Cavalieri e o atacante Fred, eram mais associados ao “time de guerreiros” e tinham trajetórias de menos estrelato.
Usar a comunicação ou o marketing para potencializar o alcance de um reforço é tática extremamente legítima. Dissociar isso do restante do elenco, contudo, é um erro de grande proporção.
O que casos assim ensinam é que o sucesso de uma personalidade do esporte depende de contexto, e não apenas de passado ou de presente. O desafio para Lugano no São Paulo é exatamente esse.
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