Somente pelo fato de que a maioria dos gols do Campeonato Brasileiro, atualmente, se dá por ataque rápido e transição, não quer dizer que essa seja a característica do nosso jogo ou até deste campeonato. Contrariando aquilo que quero dizer, o campeão brasileiro de 2016 teve, em seus gols feitos, 28% em ataque rápido e 18% em transição (contra-ataque) e apenas 9% em posse e circulação (os demais: 39% de bola parada). Já o vencedor da edição 2015 teve 28% dos gols feitos em ataque rápido e 24% em transição e 14% em posse e circulação (os demais: 33% de bola parada). Esta análise, mesmo que de forma superficial, nos oferece a impressão de um suposto perfil do campeonato e das equipes vencedoras. O que ao meu ver deve ser extremamente bem estudado o contexto e a interpretação desses números e de nossas impressões da equipe e do campeonato.
Contudo, devemos ter cautela nas conclusões que tiramos tendo em vista essas características. Perfil do campeonato? E qual a influência destas características nas equipes? O meu grande medo? Está em levar essas informações de forma exagerada para o treino e na orientação da equipe. Ou seja, deixar de nos importamos mais e melhor com a nossa equipe e em nosso potencial, em detrimento de jogar o jogo que iremos enfrentar na competição (jogo direto com ataque rápido e forte na bola parada). Desprezando, ao mesmo tempo, o potencial da equipe/jogadores e as fases do jogo (ofensiva/defensiva e transições). Penso que no futebol brasileiro a transição ofensiva e o momento defensivo não são grande problemas, estão relativamente “bem” estruturadas, mas claro que pode-se melhorar (e muito). E, aqui trago duas de minhas preocupações com o nosso jogo: a posse e a transição defensiva. Ainda não aprendemos treinar e organizar muito bem estas duas fases do jogo. Esses dois problemas, que independentemente da característica da equipe, são inerentes ao jogo e precisamos saber o que fazer nestas duas situações (o que tentei escrever em duas colunas atrás).
Não se sabe o que fazer, em sua grande maioria, quando se tem tempo e espaço para ter posse durante o jogo de futebol. E um exemplo claro, se encontra na construção ofensiva das equipes brasileiras (e muito de não saber o que fazer com a bola passa muito por esse início). A posse na iniciação ofensiva é precária. Não há construção ofensiva para que se chegue no último terço do campo em condições favoráveis de tempo e espaço, chega-se de forma rápida e sempre com o recurso da velocidade. Os atletas que iniciam a posse (e aqui são jogadores prioritariamente defensivos, zagueiros/volantes/laterais) se submetem facilmente a pressão do adversário. Claro, que ao mesmo tempo, o jogador que vai receber essa bola não se “mexe” muito e não facilita para o jogador que está com a bola (fazendo linha de passe ofensiva – cobertura ofensiva em mobilidade).
Na transição defensiva (quando a equipe sofre um contra-ataque) encontramos uma grande falha na construção e organização da equipe. Sem uma transição defensiva organizada e estruturada, fica mais “fácil” para a equipe adversária chegar a meta. Seria interessante pensar mais sobre isso.
Contudo, o mais imprescindível está em não interpretar a competição como se fosse ela a “norteadora” de todo o processo de construção e organização da equipe. O treino (e tudo que envolve ele) é que faz a competição que queremos jogar, e não ao contrário. Se quero jogar de determinada forma, preciso, necessariamente, treinar de determinada forma. Aliás, a porcentagem dominante dos conteúdos de treino, impõe a direção da adaptabilidade do processo que se vai realizar (jogo). E não achar que a competição é assim e somente assim chegaremos aonde queremos chegar.