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A ética no jornalismo

Recentemente abordamos neste espaço a questão do famigerado “direito de resposta” a ser dado pela imprensa. A reclamação do relacionamento imprensa-fonte é corriqueira, ainda mais no meio do futebol, em que as assessorias de imprensa ainda não se tornaram tão eficientes quanto nos outros setores da nossa sociedade, para alegria dos jornalistas e desespero das fontes.
 
Na última terça-feira, enquanto o Corinthians apresentava o técnico Paulo Cesar Carpegiani, o diário “Lance!” destacava em sua capa a comissão de R$ 150 mil paga ao empresário Orlando da Hora, que intermediou as negociações entre treinador e clube.
 
Até aí, nada de errado na matéria, fruto da apuração da repórter Marília Ruiz, também repórter da TV Record e profissional com passagens por “Folha de São Paulo”, “Band” e “RedeTV!”, entre outros. O “Lance!” obtivera os detalhes do contrato e havia reproduzido no jornal, dando um belo furo em toda a concorrência.
 
O desenrolar da história, porém, se tornou um fato inédito da história do jornalismo esportivo brasileiro. Na terça-feira, o presidente do Corinthians, Alberto Dualib, anunciou que registrou um boletim de ocorrência acusando o diário de furto do documento.
 
Segundo o mandatário, no domingo houve uma coletiva de imprensa para veículos de televisão em sua casa. Na noite daquele dia, Dualib deu conta de que o documento havia sumido e chamou a polícia, que o aconselhou a esperar qual veículo daria a notícia para, então, registrar queixa do furto.
 
O “Lance!” reiterou que, de sua equipe, apenas a repórter Marília Ruiz, que também trabalha para a Record, esteve presente na casa de Dualib. Mas, em entrevista à rádio Bandeirantes, o editor Fernando Santos afirmou que as informações foram obtidas por uma fonte, sem que o documento reproduzido no jornal tivesse sido feito a partir do contrato original.
 
Cabe à polícia, agora, encontrar culpados para a história. O fato é que o estrago já está feito. O “Lance!” conseguiu a melhor história sobre a contratação de Carpegiani. Afinal, Orlando da Hora, que faturou R$ 150 mil, é o mesmo empresário que há quase um ano briga com a direção corintiana para tirar Nilmar do clube.
 
No final das contas, o furo foi dado, o jornal vendeu bastante e obteve grande repercussão com a história. Mas a que preço?
 
Imaginemos que, de fato, o documento original tenha sido furtado da casa do presidente Dualib e, depois, usado para fazer a matéria. Jornalisticamente, o material resultou numa grande reportagem, que mostra no mínimo um caso de pagamento de comissão a uma pessoa que faz de tudo para tirar um dos melhores jogadores do Corinthians há quase um ano. Agora, porém, o “Lance!” e a repórter poderão ter de responder criminalmente pela história revelada.
 
Mas o maior problema que se coloca é a questão da ética no jornalismo. Não existe, na profissão, um código de ética, como aquele que regula os trabalhos de médicos e advogados. Não há um manual de conduta para a busca por uma boa história.
 
Ou seja, a ética no jornalismo é, na realidade, a ética do jornalista. E isso faz toda a diferença. Afinal, valores morais são passados de pais para filhos e se modificam ao longo do tempo. Mais do que isso, variam de pessoa para pessoa.
 
Acostumamos a ver matérias em vídeo de denúncia a más condutas em postos de saúde, em pagamentos de propinas, etc. É ético fazer a gravação de imagens sem anunciar que se está com uma câmera? Eu não estaria invadindo a privacidade do outro? Eu não estaria infringindo a lei da mesma forma que quando um documento é furtado? É permitido fazer grampo telefônico para conseguir uma grande matéria?
 
A questão não é quem roubou o documento, se é que de fato ele foi roubado. Só precisamos saber quando haverá um guia de regras para fazer com que o exercício do jornalismo não seja norteado pelas noções éticas de cada um.

Para interagir com o autor: erich@universidadedofutebol.com.br