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Papéis invertidos

Qual a influência das câmeras de TV no comportamento espetacular de treinadores à beira do campo durante uma partida de futebol? Sinceramente, esse sempre foi um questionamento que fiz ao longo da vida, primeiro como torcedor e, hoje, como profissional de imprensa, principalmente após participar da transmissão de jogos.
 
Sempre achei que treinador ficasse de ouvidos atentos para o que diziam os comentaristas antes, durante e após as partidas. Seja por meio de informantes, seja por conta própria, ao chegar em casa após um jogo e decidir revê-lo, dessa vez tendo mais opiniões de gente que estava noutra posição assistindo àquela partida.
 
E, nessa dança de querer ficar bem informado sobre a opinião que o torcedor em casa iria ter, o treinador parece encarnar um personagem, que começa a não se contentar em ficar quieto à beira do campo. E daí o teatro começa…
 
Na noite da última quarta-feira, porém, todo o romantismo que cercava essa minha curiosidade caiu por terra. Já havia visto, diversas vezes, Vanderlei Luxemburgo em conversa ao pé do ouvido com repórteres de campo para monitorar os lances duvidosos de um jogo. Mas, na vitória que teve resultado de derrota do Santos para o Grêmio, na quarta, Luxemburgo extrapolou qualquer limite do aceitável.
 
Ao término da partida, quando foi questionado sobre a vitória/derrota do Santos, o treinador foi enfático: “Só tenho uma coisa a dizer ao José Roberto Wright. Quando que uma falta não é importante num jogo? O lance do gol do Grêmio foi falta em cima do meu jogador. O árbitro não deu. E aí? O jogo era (sic) 3 a 0 e nós estávamos classificados. E você vem dizer que falta não muda o jogo Wright?”.
 
Como poderia Luxemburgo saber o que estava se passando na cabine da única emissora a exibir a partida ao vivo para a TV aberta do Brasil? Ele preferiu extravasar toda a sua ira por uma doída derrota no comentarista de arbitragem da TV Globo, esquivando-se da pergunta sobre o desempenho de sua equipe dentro de campo.
 
Mais do que isso, ele reclamou de um suposto comentário feito durante a transmissão do jogo que tinha acabado de se encerrar. Muito mais importante seria ele questionar seus zagueiros de por que se deixou repetir a mesma jogada que resultou no pênalti do primeiro gol do Grêmio em Porto Alegre? Ou melhor, ele já deveria ter preparado os seus atletas para não caírem na mesma armadilha do jogo no Sul.
 
Não, mas o espetáculo parece, infelizmente, que cada vez mais é o fundamental numa partida maravilhosa e cheia de emoção como foram os dois jogos entre Grêmio e Santos. A TV desempenha hoje um papel tão preponderante na transmissão do futebol que o treinador primeiro quer questionar o comentarista de arbitragem, esquecendo-se dos erros simples de marcação que derrubaram o Santos na Vila Belmiro e, uma semana antes, no Olímpico.
 

Sim, de fato o auxílio tecnológico que a transmissão esportiva dá ao evento é inegável. Mas os atores do espetáculo devem entender que, mais importante do que a TV, é o esporte. O restante é um faz-de-conta, que infelizmente cada vez mais se torna o ponto de debate, e não o local para ele.

Para interagir com o autor: erich@universidadedofutebol.com.br