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Oprimidos

Tradicionalmente, o futebol é governado por um sistema hierárquico vertical forte e consolidado. Aqui no Brasil, isso é evidente. Primeiro tem a Fifa, aí tem a Conmebol, aí tem a CBF, as Federações Estaduais e, aí, os clubes. Um em cima do outro, um mandando no outro, um não podendo fazer muito para suplantar o outro.

Esse modelo de governança é não apenas exercido, mas também fortemente perpetuado pela Fifa. Por isso que ela tenta, ao máximo, impedir a entrada de outros agentes no sistema, como os governos, por exemplo. As coisas do futebol, de acordo com o próprio, devem permanecer no futebol. E quem manda no futebol é a Fifa, depois as Confederações continentais, as Federações nacionais, em alguns casos as federações regionais e, por fim, os clubes. Quanto menos desenvolvido for o mercado de futebol de uma determinada localidade, mais obediente será esse mercado a essa estrutura.

O oposto, porém, também é verdadeiro. Ou seja, quanto mais desenvolvido for um mercado de futebol, menor a necessidade de ele obedecer a essa hierarquia vertical e fechada. Um exemplo são as Ligas. Quando clubes possuem incentivos suficientes para formar uma entidade própria, eles formam uma Liga, que pode deixar de obedecer à hierarquia futebolística para andar com as próprias pernas. Quanto mais forte for a Liga, mais independente ela consegue ser.

É o caso da English Premier League, que essa semana rebateu o projeto do ‘jogo limpo financeiro’ da Uefa. Com razão, diga-se. O argumento externado pelo Richard Scudamore, um sujeito simpático que é o CEO da EPL, é aquele justamente exposto aqui nesse espaço na semana passada. Ele deve ter lido. Basicamente, a crítica parte do fato de que se é para se controlar, fiscalizar e estabelecer parâmetros mínimos para a despesa de clubes de futebol, o mesmo deve ser feito para as receitas. Ou seja, no momento que se padroniza o quanto os clubes vão gastar com salários e transferências, é preciso também padronizar o quanto o clube se beneficia economicamente de diferentes formas, como o subsídio público ao estádio, o subsídio fiscal às despesas do clube e a quantidade de imposto pago pelo salário do jogador. Tudo isso conta, porque tudo isso, no final, influencia na capacidade do clube em contratar os melhores atletas, que por sua vez influencia na chance do time se tornar campeão.

É claro que a EPL tem lá suas razões, uma vez que o ‘jogo limpo financeiro’ pode afastar a entrada de novos bilionários nos clubes ingleses, além de reduzir a dominância dos clubes ingleses na Champions League. Mas quem pode reclamar, pode. E se tem uma organização que pode hoje levantar a voz contra a Uefa, essa organização é a Premier League. Antes tinha o G-14, mas o Platini, na sua aparente incansável luta para se tornar o manda-chuva da Fifa, conseguiu desmantelar. Até a ECA conseguir se organizar para protestar contra medidas desse tipo, o Platini já terá conseguido se eleger.

E antes que você se indigne sobre o fato de eu ter escrito que as federações regionais mandam nos clubes brasileiros, isso ainda é fato. Pelo menos na maioria dos clubes do país. Assim como no caso Europeu, apenas aqueles situados em regiões com o mercado de futebol mais desenvolvido conseguem, hoje, brigar com a federação estadual. Um dia, quem sabe, eles poderão ter voz contra a federação nacional. Um dia. Quem sabe.

Para interagir com o autor: oliver@universidadedofutebol.com.br