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Quem aguenta as mesas-redondas?

Ontem, definitivamente, desisti de tentar. Domingão de rara folga, depois de passar o dia em família fui me aventurar em assistir à Mesa Redonda, para tentar acabar com a síndrome de que esses programas de bate-papo sobre futebol na TV perderam cada vez mais sentido.

Depois de cinco minutos cheguei à conclusão de que, realmente, não existe mais a menor condição de alguém suportar acompanhar um programa de bate-papo sobre futebol, especialmente quando o debate é em canal de TV aberta.

Descobri que o meu limite para suportar os duelos verbais na TV tem ficado menor do que o tempo de intervalo entre um merchandising e outro.

Com a popularização da TV em banda larga e com o crescimento do acesso aos diferentes meios de comunicação, é praticamente impossível, hoje, o torcedor das classes sociais mais privilegiadas ainda se dar ao luxo de suportar um programa de mesa-redonda na televisão.

Como o Campeonato Brasileiro ainda tem desses inexplicáveis atrasos, a internet no Brasil já permite que, cinco minutos depois de o gol acontecer, o internauta assista a ele, na íntegra, mas ainda com a narração feita para a televisão.

Não conseguimos ainda quebrar a barreira da transmissão ao vivo para a internet, que poderá começar a revelar uma migração do telespectador das classes A e B para a tela do computador na hora de assistir a um jogo de futebol.

Para esse tipo de consumidor, muito mais do que o debate, o que vale é a bola dentro do gol. E, para isso, o torcedor que antes não tinha outra opção a não ser aguardar a mesa-redonda, agora pode simplesmente ligar o seu notebook, em qualquer lugar, e ver apenas os gols que lhe interesse, naquele exato momento.

Deve ser por isso que os programas de debate se digladiam para ver qual consegue ser mais apelativo para chamar a atenção, na lógica simplista de que as pessoas só querem ver desgraça e, com isso, ao promover todo e qualquer tipo de debate, turbina-se a audiência. Até balizadas discussões sobre homossexualidade foram vistas no último domingão.

Cada vez mais chego à conclusão de que a melhor coisa numa mesa-redonda é o merchandising. Pelo menos ali sabemos que não se faz qualquer coisa pela audiência…

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O treino tático

Em um momento específico de sua história, a preparação desportiva do futebolista deparou-se com uma encruzilhada que definiria, posteriormente, décadas de um modelo de trabalho seguido à risca por treinadores, preparadores físicos e assistentes técnicos – modelo esse, que até hoje desponta como norte, especialmente no Brasil.

Os treinamentos “técnicos, táticos, físicos e psicológicos”, foram e têm sido, por muito tempo, fragmentados em partes isoladas, na expectativa de que somadas, pudessem resultar no “todo”, no bem “jogar” futebol.

O fato é que o desempenho do jogador de futebol é transdimensional, e isso quer dizer que suas dimensões, física, tática, técnica e psicológica, estão fortemente e intimamente relacionadas, de maneira que a separação delas (das dimensões) deve ter apenas caráter didático, e não prático-aplicado.

Não é possível creditarmos, por exemplo, apenas ao treino físico, carga ou desgaste, metabólico ou neuromuscular, como se em um treino tático a dimensão física deixasse de existir e todos os processos fisiológicos e bioquímicos ficassem suspensos até que, formalmente, o chamado “treino físico” acontecesse.

Da mesma forma, o desempenho do jogador em jogo está determinado por uma série de decisões que ele toma, expressas pela maneira como age. Então, as suas ações em campo são respostas as situações-problema do jogo (situações-problema que são integralmente físicas, táticas, técnicas e psicológicas), e só são possíveis (as respostas) se o jogador estiver preparado “física-tática-técnica-psicologicamente” ao mesmo tempo para manifestá-las.

Então, se reforçamos a ideia de que a dimensão tática (por exemplo), separada da física, da técnica ou da psicológica é apenas um recurso didático para auxiliar na compreensão do jogo de futebol como “todo”, devemos destacar, que, é preciso sim e também, conhecer cada uma delas (das dimensões) em suas particularidades – sobre isso, inclusive, Morin (1982) cita Pascal para dizer que é impossível conhecer as partes sem conhecer o todo, bem como conhecer o todo sem conhecer particularmente as partes. Outra coisa a se destacar é que, sendo o desempenho do jogador de futebol transdimensional, torna-se mais do que necessário que o treino tático (que é um dos objetos desse texto), a partir dos seus conteúdos, seja concebido como algo integrado as demais dimensões que expressam o desempenho do “jogar” futebol.

Mas, se por um lado, parecem estar na ponta da língua quais são os conteúdos físicos (força explosiva, velocidade, etc.) ou técnicos (passe, drible, desarme, etc.) do jogo, por exemplo, onde estariam e quais seriam os conteúdos táticos que correspondem ao futebol?

E, como se essa já não fosse uma pergunta de interessantes respostas, outra ainda mais ácida: como integrar transdimensionalmente (e não multidimensionalmente e nem interdimensionalmente) esses conteúdos (táticos, físicos, técnicos, psicológicos) e construir o treino?

Quando compreendermos as respostas para essas questões, sentiremos como se houvéssemos descoberto o “passe” secreto de uma mágica; ela quase fica sem graça (só não fica totalmente, porque não sabemos se nós, como o mágico, também conseguiríamos) e, no final, pensaremos; “como poderia ter sido diferente”…

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O Financial Fair Play da Uefa

Caros amigos da Universidade do Futebol,

o mundo do futebol continua a lutar contra os gastos excessivos dos clubes de futebol profissional, e a favor do chamado “financial fair play”.

Esta semana, o Presidente da Uefa e ex-jogador Michel Platini anunciou que uma série de medidas deverão ser tomadas para evitar que clubes gastem excessivamente, principalmente na contratação e pagamento de folhas salariais de jogadores.

Segundo notícia veiculada pela própria Uefa, a decisão está respaldada pelo Comitê Estratégico do Futebol Europeu, que envolve representantes das Ligas (EPFL), clubes (ECA), federações (Uefa) e jogadores (FIFPro).

A questão na Europa é bastante polêmica e pode ser comparada à nossa situação no Brasil. Temos, é claro, que considerar que a Europa vive um estágio de desenvolvimento de seu bloco econômico totalmente diferente do que vivemos na América do Sul. Lá, os países são muito mais próximos uns dos outros, com moeda única, órgãos públicos comuns, etc.

Por essa razão, a diferença entre situações jurídicas dos clubes nos seus diversos países impacta diretamente na questão do “financial fair play”. Exemplo disso é que, na Inglaterra, os investimentos estrangeiros são totalmente liberados nos clubes, ao passo que, em outros países, como na Alemanha e França, existe uma grande restrição ao investimento no futebol profissional.

Desta forma, os clubes ingleses são muitas vezes taxados de estar sob efeito de “doping financeiro” por outros países. Afinal de contas, não é à toa que clubes ingleses estão sempre chegando às semifinais da Champions League, possuem os principais jogadores e têm o maior valor na venda dos seus direitos televisivos (via Premier League).

Uma decisão que vise harmonizar a situação nos diversos países da Europa pode ser uma pista para que a CBF consiga resolver o problema no Brasil. É claro que os clubes devem sempre visar ganhar competições, e montar os melhores elencos possíveis. Mas isso não pode e não deve ser obtido a qualquer custo.

Quem sabe não seria a hora de implementarmos um sistema de licenciamento de clubes no Brasil, adaptado evidentemente à nossa realidade, para que, gradativamente, os clubes possam ser ajudados a sair do buraco.

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Sobre o doping financeiro

Para entender a essência e a importância de se combater o doping financeiro, conforme será tentado pela Uefa, é preciso, antes de qualquer coisa, entender a lógica econômica básica e intermediária do futebol.

Vamos a ela, em cinco fáceis etapas: 1) clubes de futebol existem fundamentalmente para disputar e ganhar partidas; 2) o time que tiver melhores jogadores, tem maiores chances de ganhar seus jogos; 3) times disputam entre si os melhores jogadores; 4) o maior incentivo de um jogador tende a ser dinheiro; e, portanto, 5) quanto mais dinheiro um time gastar, melhor será seu time, logo, maior será a probabilidade de ganhar seus jogos.

Pronto. Economia do Futebol Básica. Partamos agora para a parte intermediária.

Três fatores principais, dentre outros menos importantes, influenciam a capacidade de um time gerar receita: 1) o ambiente econômico da região em que ele está localizado; 2) o número de torcedores que ele tem; e 3) a ligação que ele consegue estabelecer com seu torcedor. Existe, no mercado brasileiro em especial, outro fator, que é a capacidade do clube de revelar jogadores, mas, por conta do espaço da coluna, esse fator será devidamente ignorado.

Portanto, quanto mais rica e desenvolvida for a região na qual o clube se localiza, mais dinheiro haverá disponível para ser aplicado na agremiação, seja pelo potencial de consumo do torcedor ou pela atratividade mercadológica gerada pelo instituição esportiva. Mas isso pouco adianta se o clube não tiver um bom número de torcedores, ou que não consiga estabelecer relações mais significativas com eles como, por exemplo, pouco público no estádio ou pouca vontade desse público em adquirir produtos diretamente ou indiretamente ligados ao clube.

Esses três fatores aplicados à lógica econômica do futebol criam a heterogeneidade competitiva. Clubes que se beneficiam por esses fatores, portanto, têm mais chances de vencer partidas e, consequentemente, conquistar mais títulos.

A etapa 1 da lógica econômica, entretanto, faz com que clubes menos favorecidos economicamente façam o possível para superar essa desvantagem financeira e ambiental. Para tal, normalmente, eles podem fazer duas coisas: 1) pegar um empréstimo, arriscando o futuro financeiro do clube, caso a vitória não venha ou não gere o resultado econômico esperado – dois casos bastante freqüentes; ou 2) deixam de pagar alguém, o que acarreta em um processo de falência – em mercados mais racionais do que o brasileiro – ou complica severamente o clube no longo prazo.

Esse é, em suma, o doping financeiro do futebol. Simples assim. Se no doping fisiológico o atleta usa uma energia a qual ele não teria por processos naturais, no doping econômico o clube gasta um dinheiro que ele também não teria por processos naturais.

Ambas as práticas, logicamente, precisam ser combatidas. Por isso, é importante ressaltar a atitude da Uefa, naquilo que ela denominou como ‘financial fair play’, ou ‘jogo limpo financeiro’. A Uefa, que já vem a certo tempo entrando num processo de maior controle sobre a saúde financeira dos clubes por meio do Uefa club licensnig system, possui a filosofia, os instrumentos e a tecnologia para esse tipo de controle. Coisas que dificilmente um órgão governamental do futebol brasileiro possui. E é por isso que, por mais que ele seja um projeto importantíssimo para a sustentabilidade do futebol brasileiro, dificilmente vai pegar, pelo menos de imediato.

Clubes no mundo inteiro, inclusive aqueles pertencentes à Uefa, são historicamente ótimos em criar mecanismos para burlar restrições. No Brasil, então, nem se fala. Basta estudar a época do ‘profissionalismo marrom’. O futebol no país não tem nem uma década de balanços auditados. É um tanto quanto otimista, portanto, achar que clubes iriam obedecer a essa restrição que seria, essencialmente, controlada pela publicação do balanço. Otimista e ingênuo.

Além do quê, para o jogo ser realmente limpo financeiramente por aqui, outras medidas corretivas precisam ser tomadas antes. Afinal, qual a legitimidade de um clube no Brasil cobrar outro por doping financeiro se as cotas dos direitos de televisão aberta são distribuídas da maneira que são? Aliás, existe algum tipo de doping financeiro maior do que a distribuição da cota de televisão aberta no país, que se baseia em critérios que são tão antigos e obsoletos quanto o próprio profissionalismo marrom?

A pergunta é retórica. De qualquer maneira, a resposta é não. Não existe. E as cotas de televisão vão continuar do jeito que estão, porque quem tem o poder pra mudar são justamente aqueles que são mais beneficiados por ela, que são também aqueles que mais se beneficiam pelos três fatores citados acima. E, curiosamente, são justamente os que aparentemente têm mais aplaudido a ideia do jogo limpo financeiro divulgada pela Uefa.

Por melhor que o projeto do jogo limpo financeiro seja, a sua implementação pura e simples no Brasil está destinada a fazer dele uma regra a ser burlada e ignorada. O problema financeiro do futebol brasileiro é muito maior. O desequilíbrio é mais extenso. O buraco, enfim, é mais embaixo. E, para melhorar a situação, vai ter que cortar a própria pele. E isso não vai ser tão simples.

Afinal, no dos outros, é sempre refresco.

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Medidas impopulares

Minha mãe, até bem pouco tempo, ajudava um hospital-referência no tratamento do câncer, em São Paulo, com contribuições mensais de R$ 20,00 – não lembro se cobradas junto à conta telefônica ou com débito bancário autorizado. Até o dia em que a razão sobrepujou a emoção e a beneficência, ainda que minha mãe desejasse o contrário.

Um telefonema repentino, vindo do respectivo serviço de busca de doações para o hospital, comunicou a ela que seu valor mínimo cobrado sofreria aumento de 20% devido à queda do número global de doadores do programa social.

Por ato intuitivo e natural, no mesmo dia, minha mãe parou de doar sequer os R$ 20,00 e muito menos aceitou o aumento. E se sentiu ofendida nos anseios em ajudar o próximo.

A diretoria do Atlético-PR  resolveu, também repentinamente, comunicar aos seus mais de 25.000 sócio-torcedores um aumento de 40% nas mensalidades pagas ao clube.

Obviamente, a medida provocou discussões entre clube e associados. Claro, pois, a não ser que você seja jogador de futebol, técnico, celebridade, ou trabalhe no Senado Federal, ninguém tem rendimentos reajustados nesse patamar de 40% para bancar seus gastos – muito menos com lazer e entretenimento, onde deve ser incluído nosso futebol.

O clube poderia tentar compensar o alegado desequilíbrio financeiro criando outras fontes de receita, e não testando a elasticidade da demanda pelos pacotes ao ponto de ruptura. Muito arriscado.

Apenas para levantar um exemplo possível: aumentar a gama de produtos licenciados, comercializando-os pela internet dentro do conceito defendido no livro “A Cauda Longa”, de Chris Anderson.

Esse conceito prega que, num ambiente de comércio virtual, os custos de manutenção dos negócios para vender produtos de grande procura são equivalentes aos empregados para comercializar uma série enorme de produtos destinados a nichos específicos de consumidores. A cauda longa tende ao infinito em termos de leque de produtos.

Em outras palavras, para o clube, vender em sua loja virtual camisas oficiais ou canecas licenciadas não significa muita diferença em termos de estoques e custos operacionais.

A história sempre me ensinou, nos bancos da escola, que os monarcas que aumentavam tributos, ao invés de aumentarem o número de pessoas que os recolhessem eram impopulares e capitulavam cedo ou tarde – por pressão do povo ou articulação dos adversários políticos, ou a soma dos dois fatores.

Diz a lenda e se lhe atribui a frase à Maria Antonieta, esposa de Luis XVI, rei da França, às vésperas da Revolução Francesa: “Se o povo está com fome e não tem pão, que coma brioche”.

Nesse caso, “se não querem ir ao estádio e pagar os 40% de aumento nas mensalidades, que fiquem em casa assistindo pela TV no pay-per-view”.

Para ambos os franceses, o resultado foi a guilhotina.
 

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Essa é para vocês, traíras!

A frase acima não é para você, leitor. Mas foi a expressão que coroou o título mundial de 1994. Naquela Copa em que todo o Brasil falou mal do time nacional, o desabafo do então capitão Dunga tinha endereço certo: a imprensa.

Tive a oportunidade de conhecer e conviver um pouco mais com o atual treinador da seleção em 2006, na Copa da Alemanha. Mesmo com o claro oba-oba que existia em torno do Brasil, com a série de desmandos e com a clara pressão da imprensa contra isso, Dunga não concordava, na época, que o jornalista falasse mal da seleção durante a Copa do Mundo.

Aquele time apresentava falhas e cada vez menos a cara de uma equipe. Mas, mesmo assim, Dunga não queria saber. No mês do Mundial, para ele era atentado contra a pátria reclamar de qualquer coisa dos jogadores do país. O momento era de ajudar, e não de atrapalhar.

Dunga era, então, comentarista do BandSports no Mundial. Mesmo em outra função, para ele não tinha cabimento fazer críticas ao excesso de confiança que cercava a equipe. Em 1994, como capitão do time brasileiro, a irritação contra as críticas da imprensa (que não foram poucas) era ainda maior. E, desde 2006, quando assumiu o comando da seleção brasileira, essa tempestuosa relação irrompeu de vez.

Dunga conseguiu ser mais político desta vez, apenas reclamando de que críticas foram feitas ao desempenho da seleção sobre a Argentina, mesmo com a vitória por 3 x 1 fora de casa. Mas está claro que, até o final da Copa da África, o relacionamento do treinador com a imprensa estará muito longe de ser amistoso.

Pior será quando começarem os intermináveis 40 a 50 dias de uma Copa do Mundo. Porque é cada vez mais enorme a possibilidade de o Brasil, do jeito que está jogando, seguir a passos largos para a sua oitava decisão de Copa do Mundo. E, no meio desse caminho, Dunga dizer aos “traíras” que tudo isso é para eles.

Tudo poderia ser resolvido se houvesse mais bom senso no relacionamento entre imprensa e treinador da seleção brasileira. Não é preciso que o Brasil dê um show a cada vitória, algo que a imprensa parece sempre cobrar, mas também Dunga não pode esperar somente afagos e compreensão por parte da mídia.

A pressão exercida sobre o treinador é, acima de qualquer outra, gigantesca. A necessidade de vitória é enorme. Ainda mais quando se trata de seleção brasileira. Dunga precisa entender que essa cobrança é parte do trabalho, e que não é um “traidor” aquele que critica. Boa parte das vezes, a cobrança tem como objetivo melhorar um trabalho bem-feito. Mas também a mídia precisa entender que, contra vitórias, é preciso ter bons argumentos.

Sorte a de Dunga que treinador de seleção brasileira não precisa dar entrevista todo dia…

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O fator Luiz Felipe Scolari e o desempenho da seleção de Portugal sob o comando de Carlos Queirós

Em 2001, publiquei uma coluna, em um jornal eletrônico para o qual escrevia, apontando qualidades do trabalho do treinador Luiz Felipe Scolari.

Naquele tempo, eu já me dedicava a estudar o jogo de futebol, suas dinâmicas, estruturas, etc. Tinha muito ainda por saber (como agora!), mas me chamava bastante a atenção o trabalho do treinador brasileiro, especialmente pela forma diferente de tratar algumas situações dentro do campo e fora dele. Na época recebi muitas críticas pelo meu texto, de leitores descontentes com a atuação de Scolari na seleção brasileira de futebol.

Pois bem, o resto da história (ao menos de 2002 para frente), todos conhecem.

Recentemente, algumas coisas voltaram a me chamar a atenção, indiretamente, sobre a sua atuação como treinador.

Fazendo uma rápida pesquisa na internet, encontrei mais de 30 menções ao seu trabalho, ou melhor, à comparação do seu trabalho na seleção de Portugal com o de seu sucessor, Carlos Queirós.

O mais incrível é que, tomando como referência os textos publicados em Portugal (em blogs, jornais, etc.), existe maior satisfação com o trabalho do atual treinador, do que com o de Scolari (!?).

Como assim???

O atual treinador da seleção portuguesa tem tido enormes dificuldades para conseguir bons resultados, correndo risco inclusive de não classificar Portugal para a Copa do Mundo Fifa de 2010. Seu aproveitamento até o oitavo jogo das Eliminatórias para a Copa da África do Sul (até o presente momento) é de 54,2% do total de pontos disputados.

Luiz Felipe Scolari teve em toda sua participação pela seleção portuguesa 63,4% de aproveitamento, o que já é melhor do que Carlos Queirós. Porém, se considerarmos apenas o desempenho nas Eliminatórias para a Copa do Mundo de 2006, o valor se distancia ainda mais; foi de 83,3% (muito superior ao do atual treinador de Portugal).

O principal argumento para defender que o trabalho do atual treinador de Portugal vem sendo melhor do que o de Scolari é de que agora pode ser observado na equipe portuguesa um “Modelo de Jogo” evidente, com princípios e subprincípios bem definidos, com jogadores bem distribuídos em campo, etc., etc., etc.

E fazer gols, e vencer os jogos, não vale como critério?

No jogo de futebol, especialmente no alto nível competitivo, vencer é a necessidade básica de sobrevivência. Será melhor a equipe que vencer! Será melhor o treinador que vencer!

Quando era treinada por Scolari, a seleção de Portugal, em 12 jogos pelas Eliminatórias da Copa do Mundo 2006, marcou 35 gols (média de 2,9 por partida) e sofreu apenas cinco (média de 0,4 por partida), conquistando 30 pontos. Atualmente, nas Eliminatórias da Copa de 2010, em oito jogos, a seleção portuguesa tem 10 gols marcados (média de 1,2 por partida), cinco sofridos (média de 0,6 por partida) e apenas 13 pontos conquistados.

Isso quer dizer que, como se não bastasse vencer mais e marcar mais pontos, a seleção portuguesa na “Era Scolari” também fazia mais gols e os sofria menos.

Tenho sempre acompanhado os jogos da seleção de Portugal e torço muito para que ela conquiste uma vaga para a próxima Copa. Mas realmente nas próprias estatísticas dos jogos e nos “scouts” que realizo fica difícil de entender como o trabalho atual pode ser melhor do que o do treinador anterior (que eu também analisava profundamente).

Minha impressão, interpretando o que vejo, é que com Scolari a equipe portuguesa buscava mais intensamente o cumprimento da “Lógica do Jogo”, e que hoje com Queirós, o que parece buscar, e acaba por apresentar nos seus jogos, é tornar mais sólido um “Modelo de Jogo” (consistente, bem estruturado, etc.).

Um “Modelo de Jogo” só faz sentido se for construído para cumprir a “Lógica do Jogo”!

Alguém mais insatisfeito com as minhas colocações pode até dizer: “é, mas no Chelsea ele não foi bem“. Realmente, mas mesmo assim o seu aproveitamento na equipe inglesa também foi melhor do que vem tendo a seleção portuguesa no momento atual (Scolari, no Chelsea, teve 68,3% de aproveitamento).

Por fim, Portugal, com Luiz Felipe Scolari, não só foi melhor nesse sentido (o que se reflete em seu aproveitamento em pontos e gols feitos), como também, “de lambuja”, ainda venceu duas vezes a seleção brasileira de futebol (o atual treinador jogou uma vez, e sua equipe perdeu por 6 a 2).

Precisa de mais algum argumento?!

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A coragem de Nelsinho: uma lição a ser trazida ao futebol

Caros amigos da Universidade do Futebol,

Mais uma vez, neste espaço, vamos tratar da tão importante manutenção e preservação da verdade desportiva em prol da credibilidade e sobrevivência do esporte. O doping, as apostas ilegais, o anti-jogo, a falta de fair play, entre outros, contribuem para danificar a imagem do esporte, afastando torcedores, mídia, patrocinadores e investidores, tão importantes para o cumprimento da função social do esporte e também para garantir a viabilidade financeira das organizações desportivas (clubes, federações, ligas, etc).

Ontem, acompanhamos em Monza, o depoimento de Nelsinho Piquet sobre a farsa do acidente que contribuiu para a vitória do seu ex-companheiro de equipe, Fernando Alonso. Segundo o brasileiro, aquele acidente teria sido premeditado pela equipe para beneficiar o piloto espanhol na sua trajetória para a conquista do título mundial de Fórmula 1.

Neste episódio, temos dois fatos a serem abordados, de igual importância e relevância para a questão levantada no primeiro parágrafo desta coluna. Tais fatos podem e devem servir de exemplo para qualquer outro esporte e, principalmente, para o nosso futebol.

Em primeiro lugar, houve uma ordem da equipe para que o piloto praticasse um ato contrário ao princípio basilar do esporte, segundo o qual todos os competidores, sem exceção, devem entrar no torneio para vencê-lo.

Uma ordem dessa natureza pode ter várias motivações. No caso em comento, havia uma preocupação em favorecer outro piloto. Mas existem outras motivações clássicas no futebol, por exemplo, que poderiam acarretar em uma ordem dessa natureza: ajudar ou atrapalhar os planos de outro clube, manipular resultados para fins de apostas desportivas, ou mesmo para favorecer o próprio clube em fases subsequentes da competição.

Independentemente da motivação, temos que repudiar com todas as forças uma ordem dessa natureza. Vale lembrar que cada corrida, cada jogo, cada disputa, individualmente considerados, têm o seu valor, que é literalmente pago por torcedores, mídia, patrocinadores, etc. Esse valor individual não pode ser desconsiderado em prol de toda uma competição. Um torcedor, por exemplo, que vai assistir um jogo de seu time, que está em primeiro lugar, não gostaria de saber que naquele jogo específico o time não vai entrar para ganhar.

Temos que examinar também o cumprimento dessa ordem. No calor dos acontecimentos, os atletas, pilotos, etc, ficam muitas vezes à mercê dessas ordens manifestamente irregulares por conta de pressões de todos os lados, inclusive financeira (e.g. risco de perder o emprego). Sabemos que o ideal seria que essa ordem não fosse cumprida pelos atletas. Mas entendemos também a situação difícil deles, de forma que, apesar de não podermos isentá-los, temos que reconhecer que a culpa mais grave está com quem emite a ordem viciada.

O segundo momento importante desse episódio que gostaríamos de comentar é a posterior denúncia de Nelsinho Piquet. Esse fato (a denúncia) tem um contexto psicológico semelhante ao ato de obedecer ou não a ordem dada. Mas nesse caso, a confissão a posteriori permite que o atleta ouça conselhos de seus assessores, amigos e familiares, e possa tomar uma decisão com mais tempo e calma.

Não é nada fácil abrir o jogo, mesmo porque os atletas sabem que, anos depois, serão eles os mais lembrados pelo ato equivocado, e, eventualmente, os únicos a serem efetivamente punidos.

Nesta medida, temos que incentivar os atletas para levarem a diante tais denúncias, promovendo, na medida do razoável, a redução de pena para o atleta confesso. O importante é cercar o mal, e cortá-lo pela raiz, ou seja, punir e eventualmente eliminar as pessoas que costumeiramente emanam tais ordens contrárias à natureza do esporte, bem como punir os atletas envolvidos, mas garantindo a eles a possibilidade da justa reinserção no esporte.

É por isso que esta coluna é dedicada ao Nelsinho Piquet. E que ele sirva de exemplo para todos os outros atletas. Não por conta do seu envolvimento no acidente alegadamente forjado. Mas pelo ato corajoso de trazer a verdade à baila e permitir que os culpados sejam devidamente punidos.

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Roleta II

Na semana passada eu sugeri que a retração do mercado de transferências europeu pode ter criado um problemão para os clubes brasileiros e apontei as causas para essa retração. Também prometi que iria dizer quais seriam as possíveis consequências dessa retração para o mercado nacional. E não fui nada otimista.

Eu, que sou um homem de palavra, vou tentar explicar essas conseqüências, as razões para o pessimismo e, quem sabe, o título dessas duas colunas.

Como você sabe mais do que eu, há um forte processo de retorno de jogadores brasileiros ao seu mercado natal em andamento. Vagner Love, Edu, Rochemback, o outro Edu, e por aí vai. Clubes como Grêmio, Corinthians, Palmeiras e Inter estão reforçando suas equipes com jogadores que, teoricamente, ainda tem mercado em outros países, principalmente da Europa.

Parte do processo pode ter sido iniciado com o retorno do Ronaldo. Ronaldo! Ao mesmo tempo em que atletas de fora se sentem mais propensos a voltar para o país pelo fato do jogador estar disputando o campeonato e adicionar certo glamour à competição, os clubes rivais ao Corinthians também se sentem mais propensos a adquirir um jogador de status. Se o Corinthians pode, eu também posso.

O atleta que está fora do país pode ser convencido na base do argumento da saudade de casa ou por acreditar que o mercado brasileiro oferece mais chances de um eventual retorno à seleção. Mas nada disso adianta sem dinheiro. E os clubes, aparentemente, estão pagando, e bem, por esses atletas. Se o rival se reforça, você tem que se reforçar também. Se não, você vai ficar para trás. E o clube é muito grande para ficar para trás. Tem que arranjar dinheiro. Não sei de onde. Se vira, mas acha. Não pode ficar para trás. Depois a gente paga. A torcida precisa de satisfação. O conselho está em polvorosa. Está todo mundo cobrando. Tem que dar um troco no rival. A pressão está grande. Tem que dar um jeito. Se vira, rapaz.

A questão é: de onde vem esse dinheiro?

Já há relatos que alguns clubes estão rolando a dívida com credores para contratar atletas de fora. Isso é, obviamente, um problema de grandes proporções. A dívida pode demorar a ser paga, mas um dia ela será paga, e com juros. Os clubes sofrem hoje pela enorme bola de neve de débito criada pela irresponsabilidade fiscal presente desde a metade do século XX. Não fosse essa bola de neve, parte significativa dos problemas do futebol brasileiro poderia estar resolvida. E, ao invés de aproveitar a nova grana do contrato de televisão para diminuir a bola de neve, os clubes estão aumentando-a. O problema, então, ficará para o próximo.

Adicione-se a isso o outro problema da não venda do jogador e a consequente necessidade de se aumentar o salário do atleta que fica no país, uma vez que, a partir do momento em que o clube opta por não negociar um jogador, ele impede que o atleta tenha acesso a uma gratificação das luvas da transferência, a um salário possivelmente maior, e, por que não, a uma parcela da transferência, já que muitos jogadores são donos de uma porcentagem dos seus direitos. Como o clube não quer vender o jogador, o clube tem que oferecer alguma coisa em troca ao atleta. E essa coisa, normalmente, é aumento de salário, o que implica em mais custos.

Com mais custos e menos receita, a equação não fecha. A aposta, aparentemente, é que os novos jogadores vão gerar mais dinheiro e acabarão se pagando. Porque, com eles, o clube se classificará para a Libertadores, será campeão brasileiro, essas coisas.

O problema é que só um clube vai ganhar o campeonato. E, talvez, nem seja o clube que contratou tantos jogadores. Não vai dar certo. Não deu certo em um monte de clubes durante toda história. Mas ninguém aprende. O risco é estupidamente alto, que diga o Palmeiras e o Pierre.

A lógica desse tipo de pensamento de geração de receita é tão boa quanto a lógica de ficar rico apostando na loteria. Você só vai ganhar se você gastar. E quanto mais você gastar, mais você vai ganhar. E se ganhar, você vai ser o rei do mundo. Você só esquece que o risco é gigante, e que a chance de você quebrar também é enorme. Igual a um cassino. Igual a uma roleta.

Sacou?

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Ajuda divina

Torcedores do Fluminense, no fim de semana, antes do jogo da rodada, protagonizaram uma cena, no mínimo, caricata e altamente simbólica do nosso futebol ao se reunirem nos pés do Cristo Redentor para rezar e pedir aos céus que o clube não seja rebaixado. O Globo Esporte mostrou o ato ecumênico-esportivo com destaque.

Mas o teor da reportagem foi sério demais. Para mim, deveria ter sido mostrado no Pânico ou no Casseta e Planeta.

O povo brasileiro, historicamente, sempre foi acostumado e se acostumou a descarregar as tensões e problemas sociais na esperança de contornos religiosos, de que o amanhã será sempre melhor que o hoje.

A famosa transferência de responsabilidades que, nesse contexto, podemos resumir no famoso “Se Deus quiser”…

Reputam-se todos os males que se nos ocorrem ao alheio as nossas ações e ao aleatório. Nunca a nossa omissão ou falta de discernimento para tomar decisões de forma coerente e implementá-las. Razão e religião costumam vir no mesmo pacote, para consumirmos misturadas.

Afinal, não foi um movimento lógico e possível de mercado a contratação de Kaká pelo Real Madrid junto ao Milan. Segundo sua esposa, Deus colocou o dinheiro do mundo em crise nas mãos do clube espanhol para contratá-lo.

A Fifa, por outro lado, apressa-se para coibir manifestações religiosas excessivas nas competições oficiais organizadas pela entidade. A Associacao Dinamarquesa de Futebol emitiu nota oficial reclamando do fervor religioso da comemoração de nossa seleção na Copa das Confederações deste ano.

A mim, não resta dúvida: se olharmos para o microcosmo social que é nosso futebol, Deus é brasileiro, mesmo!

Eis uma pequena história, já bem antiga, para ilustrar como nosso futebol precisa de mais razão e menos religião: 

Em um dia de tempestade, um padre estava em sua igreja temendo que alagasse tudo, e começou a rezar e a pedir: “Deus, por favor, me ajude! Não me deixe morrer se ocorrer uma enchente… O Senhor bem sabe que eu não sei nadar!”.

Um pouco depois, dois homens apareceram num carro e um deles pergunta:

– Padre, quer uma carona? Acho que vai alagar tudo por aqui!

– Não, meu filho, obrigado… Deus vai me salvar! – responde ele.

A chuva começou a aumentar e o padre, confiante, permaneceu no mesmo lugar.

Um pouco mais tarde, quando já estava quase tudo alagado, um homem apareceu com uma lancha, e falou para o padre: 

– Padre, vamos sair daqui! Está tudo alagado, e o senhor pode até morrer!

– Não, meu filho, ficarei aqui. Deus vai me salvar – responde o padre insistentemente.

A chuva não parava. O padre resolveu ir até o telhado da igreja e viu um helicóptero de resgate. O piloto gritou:

– Ei padre, venha rápido! A igreja vai desmoronar com a enchente! Mas o padre, muito confiante, respondeu-lhe: 

– Não, ficarei, meu filho. Vá, pois Deus irá me salvar!

Não deu em outra! A enchente aumentou, a igreja desmoronou e o padre morreu. Quando o padre chegou ao céu, deu de cara com Deus, e Lhe perguntou:

– Meu Senhor, por que não me salvastes?

E Ele respondeu:

– Ora, Eu tentei! Mandei homens te buscar de carro. Depois, mandei um homem de barco, e por fim, mandei um rapaz te pegar de helicóptero, e você não quis ser salvo…

Muitos barcos já passaram e continuam passando para tentar salvar nosso futebol. A saída escolhida pelos dirigentes, até agora, é subir no telhado e rezar.

Para o Fluminense e muitos outros clubes do Brasil, a tábua da salvação deve ser mais gestão e menos religião.