Olá amigos!
Convido-lhes para mais uma discussão sobre um tema intrigante aqui neste espaço. Quem vive o ambiente de formação sabe que, invariavelmente, por motivos diversos, deparamo-nos com o problema exposto no título desta coluna. Atento ao fato de que, novamente, não irei propor simplesmente a defesa de uma das ideias, e sim provocá-los a mergulhar (fugindo da superfície) numa análise mais aprofundada.
Primeiramente, nosso principal papel é contribuir com a formação de pessoas. Pessoas estas que podem vir (assim imaginamos) a se tornar futebolistas de alto nível. Penso que aqui cabe a primeira observação: a especificidade do jogador de futebol é jogar futebol! E isso passa por entender o jogo, conseguir jogá-lo e fazê-lo bem.
Olhemos para o futebol de alto nível, e perguntemo-nos: como se joga o futebol hoje? Se buscarmos referência nas principais equipes do mundo, poderemos enumerar diversos jogadores que fazem mais de uma posição em campo (inclusive em diferentes setores), e isso torna-se uma virtude na resolução de problemas de uma ou mais partidas. Pep Guardiola faz esta manipulação com maestria, tanto no Barcelona quanto no Bayern, trazendo volantes e laterais para o centro da defesa (ou primeiros atacantes) afim de melhorar o processo de construção ofensiva; no Barcelona trouxe Mascherano para trás, utilizou Lionel Messi em várias funções (inclusive de “falso 9”), também alterou constantemente o posicionamento de Iniesta, entre outros. Poderíamos citar aqui uma grande quantidade de outros atletas (no Brasil e na Europa) que foram muito bem aproveitados em mais de uma função em campo – Lucas Leiva, David Luiz, Alaba, Di Maria, Philip Lahm, Zé Roberto, Jadson, Danilo, Renato Augusto. Em contraponto, alguns atletas foram, ao longo de sua carreira, especialistas em somente uma posição – Ibrahimovic, Ronaldo, Adriano.
Voltemos nosso olhar para a formação de atletas. Quando pensamos em formar para o alto nível (lembrando que o topo da pirâmide é restrito a pouquíssimos), obviamente estamos pensando em atletas que vão se destacar por algum ponto forte, muito claro aos olhos dos espectadores. Porém, os motivos para oferecermos a versatilidade na formação são mais relevantes. Lidamos com pessoas e, como professores, temos a obrigação de oferecer um ambiente rico de possibilidades, além de incentivar o desenvolvimento da autonomia. Proporcionar variadas vivências durante treinos e jogos na formação permitirá um desenvolvimento rico do repertório essencial para se jogar futebol (relação com bola, leitura de jogo, estruturação de espaço) e também contribuirá para que o atleta pense, crie, erre e vá se tornando cada vez mais autônomo nas decisões necessárias para resolver os problemas do jogo. A partir destas vivências, naturalmente, ao longo do processo ele tenderá a contribuir em melhor rendimento em um leque menor de posições no campo – salvo exceções. Saliento aqui que estimular diferentes vivências nos treinos e jogos não elimina orientações voltadas para regras de ação predominantes para cada posição.
Ao final do processo de formação devemos ter atletas que compreendam e joguem em alto nível o jogo de futebol, da maneira mais inteligente possível. Muitos são os exemplos de jogadores que ganham grandes oportunidades durante contratações ou trocas de técnico nas equipes principais, atuando em outras funções, e isto só é possível a partir de uma formação realmente enriquecedora para o seu repertório de jogo. Acredito ser inadmissível que um atleta transite da formação para a equipe principal tendo passado todos os anos anteriores jogando só numa função. Nós, formadores, não somos “deuses” para determinar tão cedo o que é e o que fará aquele ser humano. Portanto, proponho que constantemente façamos reflexões sobre o quanto nosso treino e nossas escolhas em jogos estão sendo favoráveis para criar um ambiente rico e desafiador, visando o desenvolvimento de cada um dos nossos atletas.
E você, leitor, o que acha deste tema? Escreva para rafael@universidadedofutebol.com.br e vamos debater!
Um grande abraço e até a próxima!