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Fatos e valores

Em obra que, em língua portuguesa já tem quinze anos (refiro-me ao livro Razão, Verdade e História, Dom Quixote, Lisboa) Hilary Putnam radicaliza a recusa em aceitar a pertinência epistemológica da divisão entre juízos de facto e juízos de valor. De acordo com Moore e Russell, o termo fato denota um conjunto complexo de entidades que existem, independentemente do modo como são pensadas. Moore argumentava que o termo bom, por exemplo, era uma propriedade não natural e não cabia às ciências da natureza estudá-la, pois que as suas propriedades não eram de ordem física. A introdução, na Idade Contemporânea, da dicotomia fato-valor foi elaborada por Max Weber, dado que lhe parecia perniciosa a influência dos valores ocidentais sobre as demais formas de vida do planeta. Ele afadigava-se em encontrar resposta, para a questão de saber se as normas de ação e os pressupostos de validade tinham um caráter de universalidade ou se decorriam de um determinado contexto cultural. Max Weber julgou ter solucionado o problema da objetividade, nas ciências sociais e humanas, ao adiantar que, sempre que um investigador procura compreender um fenômeno social, deve fazê-lo, tendo em consideração quatro tipos ideais de comportamento:

– o comportamento que utiliza meios racionais, para alcançar fins racionais;

– o comportamento que, ao utilizar meios racionais, visa atingir fins irracionais, isto é, o comportamento orientado por valores;

– o comportamento que é guiado pela emoção;

– o comportamento que se rege pelos costumes e hábitos.

Weber foi-se apercebendo que o tipo de ação predominante, no século XX, era a do pensamento tecnocrático, ou seja, o que utilizava meios racionais (físicos e matemáticos), tentando alcançar fins também racionais. Com uma dinâmica muito especial, a burocracia não aceitava, nem o caos, nem a desordem, “propondo uma seriação e uma planificação da acção social, assente sobre os critérios de rigor, de sistematização e optimização dos recursos humanos e materiais”. Foi neste quadro que se potenciou a implementação das instituições sociais e governativas e se fixaram as regras e os modelos de acção das referidas instituições. Só que, ao julgarem-se possuidoras de uma racionalidade impecável, as instituições governamentais e as que vivem do erário público solidificam-se num modelo fechado de organização e alérgicas à transformação e à crítica. O próprio Max Weber nos alerta para que não deixemos que os juízos de valor se intrometam nos processos de investigação e nas instituições, afim de que a racionalidade tecnocientífica, e só ela, seja o princípio norteador. Para Weber, “a escolha que um ser humano faz, em qualquer momento da sua vida (e as escolhas do homem de ciência não são exceção) manifestam a presença de certos valores (…). Mas esse nível de subjectividade deve desaparecer sempre que o trabalho científico se impõe, já que, para Weber, este domínio da pesquisa humana se caracteriza pela procura da objetividade de um conhecimento que se quer da ordem do empírico e não da ordem do preferível (…). Para Weber, é a verdade factual que deve orientar a atividade analítica do cientista, independentemente dos motivos pessoais que o levaram a escolher os problemas e os temas que investiga”. Para Max Weber, um juízo de valor não pode ser verdadeiro, porque não pode ser aceite por todas as pessoas.

Daqui se infere que, fundamentado mesmo em Max Weber, é difícil a um governo aceitar críticas, pois que as julga decorrentes de juízos de valor e não de juízos de facto. E às críticas mais sonoras e de comentadores mais conhecidos o governo normalmente responde que elas refletem os anseios dos partidos da oposição e não têm por si qualquer solidez científica ou racional. Se não há pressupostos universais onde assentam os critérios de racionalidade, o governo observa que é ele que a possui, já que é ele que se encontra ao serviço do País, ao mesmo tempo que os discordantes dos órgãos da Comunicação Social se encontram, sem o dizerem, ao serviço de interesses inconfessáveis. Mas uma pergunta se impõe, aliás na esteira de Apel e Habermas: há, ou não, um discurso ético, que possa informar a ação dos agentes sociais? A tecnocracia resolve, absolutamente, todos os problemas? Pode, ou não, a ética transformar-se num método racional de resolução dos conflitos e de observação do trabalho executado? Estas questões podem aplicar-se às políticas desportivas. Podem (disse eu). É que nem sempre há a vontade de algumas pessoas responsáveis. É bem mais fácil continuar com os mesmos métodos e portanto onde praticamente os valores não cabem. Dá menos trabalho. Depois, um “agente do desporto” com valores morais torna-se incómodo, para dirigentes ditos desportivos, que toda a vida viveram sem eles e que são afinal verdadeiros semeadores de demagogia. E nem por isso deixam de falar, com ênfase professoral, a uma legião de basbaques, que os escutam, como se lhes devessem vassalagem. Como se, no Desporto, factos e valores não despontassem do mesmo paradigma científico.É que o Desporto nasceu como Ética e, sem Ética, não se entende como prática desportiva.

*Manuel Sérgio é antigo professor do Instituto Superior de Educação Física (ISEF) e um dos principais pensadores lusos, Manuel Sérgio é licenciado em Filosofia pela Universidade Clássica de Lisboa, Doutor e Professor Agregado, em Motricidade Humana, pela Universidade Técnica de Lisboa.

Notabilizou-se como ensaísta do fenômeno desportivo e filósofo da motricidade. É reitor do Instituto Superior de Estudos Interdisciplinares e Transdisciplinares do Instituto Piaget (Campus de Almada), e tem publicado inúmeros textos de reflexão filosófica e de poesia. 

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As marcas da Fifa na Copa

A Copa do Mundo se aproxima e com ela algumas situações bastante peculiares começam a despontar e o mais recente diz respeito às marcas registradas pela FIFA (mais de 200).

Chamou ainda mais atenção o registro da palavra “pagode” e do termo “Natal 2014”.

Segundo a Lei Geral da Copa, o Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI) deverá promover o registro do alto renome das marcas que consistam nos seguintes Símbolos Oficiais de titularidade da FIFA, nos termos do artigo 125, preexistente da Lei de Propriedade Intelectual.

Além disso, o INPI deverá registrar as marcas notoriamente conhecidas de titularidade da FIFA, conforme estabelece o preexistente artigo 126, da Lei de Propriedade Intelectual.

Essas anotações de titularidade da FIFA produzirão efeitos até 31 de dezembro de 2014.

Os pedidos de registro poderão ser contestados no prazo de sessenta dias da publicação.

Segundo o artigo 124, VI da Lei de Propriedade Intelectual, palavra de uso comum na composição de uma marca não recebe proteção da legislação de propriedade industrial, logo, não se pode impedir seu emprego por qualquer empresa, mesmo concorrente.

Destarte, os termos “pagode” e “natal” são palavras de uso comum e, ainda que a FIFA consiga o registro, não poderá se opor contra o uso por terceiros. Este, inclusive, é o entendimento do Superior Tribunal de Justiça em uma série de casos semelhantes.

Dessa forma, o fato da FIFA encaminhar as marcas para registro não lhe garante o uso exclusivo sobre elas, eis que a legislação e os Tribunais brasileiros.

Portanto, os empresário e cidadãos brasileiros podem ficar tranquilos, pois nem a Lei Geral da Copa, nem a Lei de Propriedade Industrial asseguram à a FIFA o direito de se apropriar de nomes comuns como “pagode” e “natal”. 

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Performance em tempo de mudanças

O futebol é um universo em constante mudança, não bastasse a troca de comando a cada nova eleição para presidência de um clube, nós presenciamos as mudanças nos cargos que dirigem o futebol e as frequentes e conhecidas mudanças no comando técnico do time.

E como o atleta pode se manter focado em seu melhor desempenho nesse ambiente em constante mudança?

Aliás, este ambiente de constante mudança não é um privilégio dos atletas de futebol, na vida das pessoas em geral atualmente este jogo da mudança vem acontecendo de maneira cada vez mais acelerada. Este impacto é tão grande na vida de todos que o Instituto de Kansas City, realizou um importante estudo para determinar que habilidades seriam as mais valiosas para o sucesso e felicidade das pessoas no século XXI. O resultado de uma longa investigação foi que a qualidade mais importante que as pessoas podem desenvolver numa época marcada pelas mudanças é a flexibilidade. Por sua própria essência a mudança é imprevisível e muitas vezes nos obriga a rever nossos planos e ideias de um momento para outro. Agora, imagine no cotidiano do atleta como isso deve ter um grande impacto no seu desempenho profissional?

Muitas vezes a própria mudança já é um componente que gera stress no atleta e como já vimos o stress pode contribuir imensamente para um quadro de lesão no mesmo.

Mas como então o atleta pode se manter flexível ao ponto de encarar as mudanças como algo presente em suas vidas e inevitável, sem que isso deteriore sua performance esportiva? Trago algumas sugestões de Brian Tracy sobre como se manter no propósito e com isso não ser consumido pela mudança, quando ela se apresentar diante do atleta.

1. O atleta pode se fazer regularmente a seguinte pergunta: o que realmente eu quero fazer na minha vida profissional? Com isso ele poderá se certificar de que suas metas atuais estejam de acordo com a reposta dada.

2. O atleta deve ser honesto e realista a respeito de sua vida e de suas metas. Com isso ele pode tomar a decisão de encarar o mundo como ele é, e não ficar na suposição de como poderia ser e a partir ele pode refletir sobre quais mudanças práticas ele deve promover para ajustar sua rota em direção ao melhor desempenho.

3. Sempre que a situação ou ambiente mudar ou se dispor de novas informações sobre o momento atual em que se encontra, o atleta pode e deve estar pronto para mudar alguma ideia e tomar uma nova decisão para ajuste de rota com base nos fatos da situação atual. O atleta, com a consciência mais elevada, pode recusar-se a continuar num direção que não faça mais sentido para ele.

Ao desenvolver sua habilidade de ser flexível, o atleta da atualidade estará mais preparado para lhe dar com toda de qualquer mudança que se apresente, bem como manter-se no caminho do seu melhor desempenho profissional. Com isso ele assume o protagonismo de sua carreira, buscando os melhores resultados e não se tornando vítima de si próprio.

Afinal de contas, como já disse Albert Einstein: “Insanidade é continuar fazendo sempre a mesma coisa e esperar resultados diferentes”.

Se tudo ao redor do atleta muda, ele também pode mudar e ao ser flexível compreende conscientemente que os ajustes em suas atividades, para melhoria do desempenho e a consequente conquista de sua meta, são sempre bem-vindos, além de necessários.

Até a próxima! 

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Esperando acontecer!!!

Tenho frequentado algumas mesas de debates e discutido bastante com colegas da área (ou não), há algum tempo, a busca de soluções para o financiamento do esporte de uma maneira geral. Mais das vezes, a “grande solução” recai, quase que invariavelmente, no “dever” de um “sujeito oculto” chamado Estado cobrir e fechar a conta.

Como muita gente aparece com visões megalomaníacas sobre o esporte, pautado, sobretudo, em um discurso midiático, quando se coloca a proposta no papel percebe-se que a conta não fecha no final para que o tal projeto seja efetivamente pago pelas demandas criadas e geradas no mercado a partir de um processo lógico de desenvolvimento, como em qualquer indústria. Sim, bons projetos levam anos e não meses para perceber resultados.

Estou fazendo esta abordagem de maneira genérica para chegar em uma questão objetiva: de onde surgiu o conceito de que o Estado deve ser o provedor de tudo o que ocorre no esporte nacional? Seja para o bem, seja para o mal, o Estado ou é vítima ou é tido como o “salvador da lavoura” no meio esportivo.

Tal reflexão tem respaldo em muitos dos acontecimentos recentes, que vão desde o financiamento de estádios para a Copa até as soluções para salvar o endividamento contraído pelo futebol (e tantos outros que surgem nos meios de comunicação).

Não que o Estado não tenha um papel importante no fomento do esporte em âmbito global: como exemplo, tem-se o fato de que mais de 60% dos estádios de clubes de futebol na Europa são públicos; também que as franquias de Ligas Profissionais dos EUA usam o argumento de “investimento em instalações esportivas” como poder de barganha para permanecer ou sair de uma cidade.

O Estado é sim um ator historicamente relevante para investimentos em esporte, que só se torna efetivo quando congrega os interesses da sociedade e consegue explicar de forma adequada (e decente) os porquês de fomentá-lo. Sem uma política pública adequada, não passa de um gasto desnecessário.

O cerne desta questão passa, na realidade, por uma crítica a muitos projetos esportivos, que criam e pensam em ações belíssimas e que cabem muito bem ser escritas em algumas folhas de papel, mas que por serem inexequíveis sob o ponto de vista prático e relacionado às demandas do mercado, acabam por transferir a responsabilidade para o tal “sujeito oculto”, que, segundo se pensa, “é quem deve pagar a conta”. Terceirizar problemas é o que mais vemos por estas bandas…

Penso que, se quisermos evoluir e consolidar a indústria do esporte definitivamente como negócio, é fundamental pensar com a cabeça de quem financia. Do contrário, continuaremos a ver projetos com início, mas sem meio nem fim… 

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Experiência

Um evento-teste. Menos de 30 dias. Muita coisa a ser feita. Inaugurado oficialmente no último domingo, o novo estádio do Corinthians, situado na Zona Leste de São Paulo, passou pela maior prova antes de 12 de junho, quando receberá a abertura da Copa de 2014. A partida contra o Figueirense, válida pela quinta rodada do Campeonato Brasileiro, escancarou muitos aspectos que precisam ser ajustados até o início do Mundial. Mas a operação do evento também mostrou que a casa não será suficiente para ter depois da competição um novo patamar de evento.

O jogo entre Corinthians e Figueirense teve 36.123 pagantes, com uma renda de R$ 3,02 milhões. O time paulista amealhou R$ 2,3 milhões em receita líquida (valor que considera os descontos em impostos, taxas e despesas do evento), maior lucro do futebol brasileiro em 2014.

Houve muitos pontos positivos – o transporte público mostrou-se alternativa viável para o estádio, os orientadores funcionaram e o gramado foi elogiado por atletas e técnicos, por exemplo. Mas o primeiro jogo oficial também escancarou falhas da arena: goteiras, sinal intermitente de telefonia, falhas na conexão com a internet, elevadores que deixaram de funcionar e longas filas nos poucos bares que estavam em funcionamento.

O torcedor que foi ao estádio também saiu frustrado com o que aconteceu em campo. O Corinthians mostrou futebol pobre de ideias, com poucas alternativas ofensivas, e perdeu por 1 a 0 para o Figueirense, que ocupava a lanterna do Campeonato Brasileiro e ainda não havia anotado um gol sequer na competição.

Entre o que não funcionou, é possível que muito seja acertado até a Copa do Mundo. O estádio teve muitos problemas decorrentes de uma operação incipiente, e isso pode ser revisto antes de 12 de junho. Elevadores deixaram de funcionar por quedas de energia e manutenção, por exemplo. Sinais de telefonia e internet terão reforços até 12 de junho.

Mas um estádio é apenas uma casca, e o jogo é apenas um trecho do produto que ela envolve. O torcedor não compra uma partida de futebol, mas uma experiência. E isso é o que os organizadores precisam entender sobre a nova casa do Corinthians.

O torcedor precisa ser visto como um consumidor comum. E a experiência de um consumidor comum não se limita ao tempo em que ele está dentro do estádio. A avaliação sobre o aparato está intrinsecamente ligada ao que acontece antes e depois.

A preocupação com o torcedor, portanto, deve começar com um exercício de promoção dos eventos. Quem sabia, afinal, qual seria o jogo em Itaquera no último domingo e em quais condições o Corinthians enfrentaria o Figueirense? Onde estava a comunicação visual no bairro e nas zonas em que o público-alvo mais circula?

Depois disso, é importante convencer as pessoas a comprarem o evento. Isso envolve oferecer condições, prover serviços e entregar a elas os ingressos. Também é fundamental planejar deslocamentos e a experiência que os torcedores terão no interior da arena.

Tudo isso faz parte do tal “padrão Fifa”. A entidade estabelece uma série de parâmetros para assegurar prestação de serviço e uma parte da experiência do público – é por isso que o posicionamento de cadeiras no interior dos estádios de Copa é sempre similar.

A questão é: e o intangível? Em que pontos o torcedor foi surpreendido e recebeu mais do que o pacote padrão? O que ele teve, do momento da compra até a hora em que voltou para casa, que fez o jogo ser um evento inesquecível?

É isso que os organizadores de jogos no Brasil precisam considerar. Planejar a experiência do torcedor não pode ser apenas zelar pela excelência de serviços, mas criar realmente um ambiente que transforme o significado do evento.

Essa é a lógica que os parques da Walt Disney ensinam para o mundo há anos. Os brinquedos de lá também têm filas, mas aproveitam o momento de espera para bombardear os usuários de vídeos, atividades e informações. Até o posicionamento de lixeiras é pensado para balizar a experiência de quem frequenta as atrações.

A Fifa segue algumas dessas premissas ao criar padrões para a Copa do Mundo, mas o futebol ainda está longe da realidade que os parques vivem há décadas. E se o futebol de Copa sofre, o esporte do cotidiano tem uma necessidade ainda maior de assimilar esse tipo de conceito.

O novo estádio do Corinthians pode ter um público orgânico nos primeiros jogos, formado por curiosos e carentes por outros tipos de espetáculo. Depois, porém, a sobrevivência do aparato dependerá muito do que for proporcionado ao espectador.

Nesse caso, vale para o estádio a lógica de um bar ou restaurante: a inauguração pode ser um sucesso e atrair muita gente. Depois, alguns curiosos podem querer conhecer e ver as atrações locais. O desafio é segurar esse fluxo.

E fluxo, em qualquer empreendimento comercial, só se constrói com experiências. É isso que o futebol precisa aprender a vender. 

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Minha casa, minha vida em Itaquera

Guerrero, autor do gol mais internacional da história corintiana, deu o primeiro toque na bola da mais corintiana casa.

Assim começou o primeiro jogo alvinegro no estádio de todo o povo (para os muitos que não aceitam dinheiro público em sua construção, e para os que jamais imaginaram que um dia “eles” teriam estádio).

E que belo estádio. A casa do Corinthians começou a ser usada segundos antes de uma chuva de granizo derrubar troncos na região do Morumbi – onde tantas vezes o Corinthians foi Timão, como em 13 de outubro de 1977, como na conquista do primeiro Brasileiro, em 1990, como no início da campanha do primeiro Mundial, em 2000.

No Pacaembu, 16h33 do domingo de estreia em Itaquera, chovia como havia dias não chovia tanto e tão feio.

É a hora desta foto que mostra as torres de iluminação que ficam atrás da arquibancada central do velho Paca. De onde saíram os fogos de artifício em 4 de julho de 2012, na celebração da Libertadores que, como a casa do tamanho da torcida alvinegra, parecia que nunca aconteceria. Nunca existiria.

“Nunca serão”?

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Em Itaquera, quando esta foto foi tirada, eram 31 minutos de jogo ruim. Corinthians estreando em sua casa, sua vida, contra o Figueirense.

Chuva fortíssima nos estádios onde mais jogou o Corinthians em São Paulo. Tarde feia, fria. Sem vida como ficou o estádio de todos os paulistanos, e ainda mais dos corintianos. Não tinha nada além de água no Paulo Machado de Carvalho numa tarde de futebol (por mais que não tenha jogado futebol o Corinthians em 90 minutos inaugurais em Itaquera).

Só sei que tudo que não se via no Pacaembu era saudade.

Só sei que aquela água toda pela cidade não era comum.

Não vou tentar explicar. Não sei. Como também não sei como o Corinthians jogou tão mal contra um rival tão frágil. Vai ver que a Fifa pediu para poupar o gramado, as traves, sei lá.

Só sei que não importa tanto a derrota feia para o Figueirense na festa tão bonita. O que vale, depois de décadas de tentativas frustradas, de gozações alheias, de dinheiro mal empregado, de negociações bizarras, e de um estádio erguido a toque de caixa (e que caixa, e que toques), o corintiano tem sua casa, sua vida.

Onde, depois do primeiro toque de Guerrero, ele verá outros batalhadores em português guerreando, lutando, brigando, corintianando.

Para o bem dos corintianos, para o mal dos adversários, Itaquera não é logo ali. É bem longe daqui.

Mas vai ficar cada vez mais perto. Não vai ter em campo tanta gente ótima de Neco e Neto, de Luizinho a Rivellino, de Marcelinho a Tevez, de Rincón a cada canto do novo campo. Mas surgirão novos nomes próprios e muito comuns de uma paixão inominável. De um estádio que não gostam que chamem de Itaquerão e nem de Arena de São Paulo. De uma praça multiuso que é Arena do Corinthians enquanto não se vende o nome de direito.

Mas que é de cada José, Maria, João, Pedro, Mariana, Wallyson, Shirley. Nomes que vão contar muita coisa no novo lar. Nomes que ainda não sabemos como serão, quando serão, quantos tantos serão.

Só sabemos que tantos serão como nunca. Ou como sempre.

Bem-vindo à casa, Corinthians. 

 

*Texto publicado originalmente no blog do Mauro Beting, no portal Lancenet.

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O jogo de futebol, a saída jogando e a posição do corpo

O jogo de futebol moderno exige, cada vez mais, qualidade nas decisões e ações sob pressão espaço-temporal. É tendência no jogar das equipes de alto nível o adiantamento coletivo das linhas de marcação e a indução do adversário ao erro na tentativa de recuperação da posse de bola mais próxima da meta oponente.

Em resposta ao pressing do adversário, equipes que priorizam o jogo construído, e não a ligação direta, necessitam de mecanismos individuais e coletivos devidamente ajustados às circunstâncias do jogo para retirar a bola do setor de pressão e dar sequência ao momento ofensivo na tentativa de concluir a jogada com finalização.

Tais mecanismos individuais e coletivos, como abertura de linhas de passe, desmarcações, ampliação do espaço efetivo de jogo, formação de triângulos e qualidade técnica de passes curtos e longos, são competências que, se aplicadas, minimizam a ocorrência de perda da posse de bola e, estatisticamente, aproximam a equipe da vitória (se aliadas às demais ações relativas ao cumprimento da Lógica do Jogo).

O treinamento de todas estas ações em especificidade, como habilidade aberta, imprevisível, logo semelhante às situações-problema que acontecem no jogo, pode potencializar os acertos no ambiente competitivo. Uma tarefa complicada tanto na formação quanto no profissional se inserirmos no contexto a pressão por resultados (e o consequente detrimento do espetáculo), o risco de perder a posse de bola em regiões do campo próximas à própria meta e a qualidade técnica contextualizada especialmente de zagueiros e goleiro que, em linhas gerais, são pouco estimulados em fases sensíveis de aprendizado das competências essenciais (relação com a bola, estruturação do espaço e comunicação na ação).

Os treinadores que mesmo cientes do referido contexto e, respaldados ou não, optam pela saída jogando com qualidade precisam atentar-se a todos os detalhes que darão efetividade a esta ação ofensiva.

Um detalhe que, recorrentemente, necessita de ajustes refere-se ao posicionamento corporal dos jogadores responsáveis pelas ações iniciais de construção.

O goleiro tende a ficar com o tronco de frente para a bola, semelhante ao posicionamento para defender. Desta forma minimiza a participação na saída jogando, pois reduzem o campo de visão e, consequentemente, as possibilidades de ação caso receba um passe.

Bolas recuadas para goleiros, geralmente, exigem dos zagueiros um posicionamento corporal que deixem suas costas voltadas para a linha de fundo ou para a linha lateral. Caso estejam próximos à linha da bola a primeira opção é a mais recomendada, caso estejam à frente da linha da bola, a segunda opção tende a ser mais efetiva. Em ambos os casos o posicionamento ideal busca um maior alcance da visão para o processo de decisão-ação. É muito comum observar em bolas recuadas para o goleiro, os zagueiros correrem de costas para o gol adversário, esta ação restringe sistemicamente as opções de passe do goleiro que acaba forçado ao chutão.

Laterais e volantes também necessitam de ajustes constantes no posicionamento corporal. Laterais que recebem a bola de costas para a faixa lateral do campo tendem a perder boas opções de progressão vertical no campo de jogo por condução ou passe. Se optarem por voltarem o corpo para a meta adversária após receberem o passe, perdem segundos preciosos na busca por desequilíbrio na organização defensiva adversária.

Do mesmo modo, volantes que recebem a bola de costas para a meta adversária têm como opção predominante o passe para trás, que distancia a equipe da meta adversária. Logo, movimentar-se para receber em diagonal pode facilitar a percepção da chegada de adversário e se é possível girar o corpo (para ficar de frente para a meta adversária) para dar sequência à ação ofensiva.

Como sabemos, a equipe é um organismo vivo em que suas ações influenciam e são influenciadas por todos os elementos do sistema, inclusive os adversários. Posicionar bem o corpo para sair jogando é apenas mais um dos milhares de ajustes que devem ser feitos em uma equipe para a boa prática do jogo de futebol.

Já cansamos de ouvir que futebol é um jogo de detalhes. Então, é melhor não duvidarmos e treinarmos todos eles.

Abraços e até a próxima semana.

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Machismo também é preconceito

Realmente muito bonita, a assistente de arbitragem Fernanda Colombo Uliana, de 23 anos, iniciou o clássico entre Atlético e Cruzeiro recebendo todos os holofotes da imprensa.

Após a partida os holofotes novamente se voltaram para a assistente, mas, desta vez pelos erros cometidos, especialmente, por um impedimento inexistente em um contra-ataque, onde o meia-atacante Alisson sairia de frente para o goleiro do Atlético.

O diretor de futebol do Cruzeiro manifestou publicamente sua insatisfação com os erros, e, mais precisamente teceu comentários polêmicos acerca da bandeirinha Fernanda Colombo Uliana. Segundo o dirigente, ela deveria posar na “Playboy”.

Logo o Cruzeiro que, meses antes, ficara marcado pela luta contra o racismo no futebol em razão das manifestações da torcida peruana contra o volante Tinga na partida contra o Real Garcilaso pela Libertadores da América, acabou por protagonizar atos de preconceito contra uma mulher.

Ora, machismo é tão preconceito quanto racismo.

Segundo o artigo 243-G, do Código Brasileiro de Justiça Desportiva, constitui infração disciplinar praticar ato discriminatório, desdenhoso ou ultrajante, relacionado a preconceito em razão de origem étnica, raça, sexo, cor, idade, condição de pessoa idosa ou portadora de deficiência.

Assim, as declarações do dirigente mineiro são passíveis de suspensão de pelo prazo de cento e vinte a trezentos e sessenta dias, além de multa, de R$ 100,00 (cem reais) a R$ 100.000,00 (cem mil reais).

Infelizmente, o machismo é uma constante em nossa sociedade, sobretudo no futebol e a reação do dirigente celeste corrobora isso. O machismo deve ser combatido tanto quanto o racismo, a homofobia e a intolerância religiosa.

Em nome do machismo homens agridem suas mulheres física e psicologicamente e isso precisa acabar.

Na sociedade atual não há mais espaço para atitudes machistas. Lugar de mulher bonita não é na “Playboy” e lugar das “mães de família” não é na cozinha.

As mulheres, após décadas de repressão, já provaram que podem ser melhores e mais competentes que os homens em áreas antes predominantemente masculinas e o medo de perder espaço tem reacendido perigosamente a chama machista.

Se houve erro, que a assistente catarinense receba a punição aplicável e não seja achincalhada pela sua beleza física e que a Justiça Desportiva aplique punições severas contra atos de discriminação no futebol e em qualquer modalidade esportiva. 

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A importância de escutar

Ano de Copa do Mundo de Futebol no Brasil, com campeonato Brasileiro das séries A e B e Copa do Brasil em andamento, muitos desafios tanto para os treinadores das seleções quanto para os treinadores dos clubes do Brasil.

Muitos esperam brilhar na competição mundial e outros anseiam por bons resultados nos campeonatos nacionais, porém todos estão conseguindo escutar de maneira eficaz seus atletas?

Todo treinador pode desenvolver sua capacidade de escutar ativamente seus atletas e com isso colher ótimos benefícios para o seu trabalho. Mas não pensemos que escutar de maneira adequada e estruturada é tarefa fácil, afinal de contas o ser humano gosta muito mais de falar do que escutar. Ainda mais em tempos de tecnologia cada vez mais presente em nossas vidas.

Escutar ativamente o atleta pode contribuir para solucionar pequenos problemas que ao serem deixados de lado, podem causar enormes impactos no rendimento do atleta e também das equipes.

No livro Ferramentas de Coaching encontramos uma boa referência sobre a escuta estruturada, na qual podemos compreender que a escuta estruturada parte do pressuposto que todo treinador passa a ser um bom ouvinte quando ele consegue:

Encorajar ou outro a falar – Ao se transmitir sinais verbais e não verbais ao atleta, o treinador demonstra que está envolvido na conversa e com o que o atleta deseja falar. Os sinais como pequenos acenos de cabeça, sorriso leve e a sua postura corporal são capazes de demonstrar seu interesse. Tudo aquilo que seja genuíno como sinal de encorajamento pode ser aplicado pelo treinador, para que sua escuta seja favorecida.

Clarificar aquilo que se houve – O treinador enquanto bom ouvinte pode mostrar com frequência que está compreendendo o que o atleta está falando. Ao solicitar regularmente que o atleta esclareça alguns pontos da conversa, o treinador está demonstrando que está realmente escutando interessadamente o que está sendo dito.

Sintetizar – O treinador pode desenvolver a percepção de saber encontrar os momentos certos na conversa para solicitar ao atleta que resuma ou sintetize o que ele disse, evitando com isso que o atleta se perca em detalhes menos importantes para o contexto da conversa e perca o foco.

Refletir sobre o que foi falado – Este é o momento no qual o treinador e o atleta podem compartilhar o que cada um percebeu de mais importante na conversa, é um momento muito importante para o treinador, pois aqui ele demonstra que escutou efetivamente seu atleta.

Cabe a cada treinador procurar desenvolver sua capacidade de ouvir seus atletas, pois esta competência é muito importante para o seu trabalho diário e pode fazer uma enorme diferença nos relacionamentos e na gestão do ambiente de sua equipe.

Até a próxima! 

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O problema é…

Vejo muita gente criticar setores específicos dentro de clubes e entidades esportivas, como o “Departamento de Marketing”, a “Comissão Técnica” ou o “Departamento de Base”, para ficarmos em três exemplos. Nestas críticas, os questionamentos passam pela inoperância do setor ou mesmo incompetência dos profissionais que atuam naquela área.

Mas poucos vão a fundo nestas análise, indicando até uma visão míope sobre o modus operandis destas organizações. Poucas vezes vi uma crítica clara sobre a gestão (ou inexistência de) que, mais das vezes contribui para que não haja qualquer pensamento criativo ou inovador.

Em processos de consultoria que participei recentemente, na grande maioria dos casos, boa parte das soluções estava “dentro de casa”. Profissionais desmotivados ou sistema político turbulento impediam qualquer avanço organizacional, apesar da competência de muitos colaboradores que estavam ali dentro.

O que estou querendo dizer é que, ao criticarmos determinados setores dentro de organizações esportivas, não se é possível olhar com uma visão minimalista e simplista sobre uma única área. Às vezes o problema pode estar ali sim, mas tenho certeza que na grande maioria dos casos o problema é muito maior e tem a ver com uma gestão que não dialoga com o todo.

Pensar mais na gestão como facilitadora para o crescimento organizacional talvez seja o primeiro passo para o desenvolvimento das entidades esportivas.