Categorias
Conteúdo Udof>Artigos

Treinar pra que?

Começo esse artigo aproveitando a famosa frase do artilheiro genial Romário: “treinar pra que, se eu já sei o que fazer?”.

Por mais que pareça engraçada essa frase e em especial a forma como ele a citava, podemos nós profissionais do futebol, abrirmos espaço para uma análise desde conceitual até metodológica.

Cada vez mais o futebol moderno com sua alta demanda de competitividade e o pouco tempo de treinamentos e preparação para jogos e campeonatos, necessita de treinos pontuais relacionados à forma da equipe atuar.

Se treina para resolver um problema. Essa solução de problemas vem desde os aspectos individuais, tanto coletivos. O treino descontextualizado com o modelo de jogo caracteriza apenas desgaste para os jogadores e uma perda de tempo para a equipe e o ambiente que a cerca.

Até ai nada de novo, todos nós já lemos e estudamos isso há algum tempo…

O desafio é como detectar quais são os problemas que a equipe técnica quer resolver, e dai em diante modular as sessões de treino pautadas nessa diretriz.

Definição de modelo de jogo

O primeiro passo para pensar em elaborar as sessões de treinamento é definir como a equipe irá atuar, quais são os princípios estruturais e operacionais e com eles definir os aspectos metodológicos da sua equipe.

Como pretendo atacar o adversário?

Qual será minha postura defensiva?

Como irei transitar do ataque para a defesa no momento em que perder a bola? 

Como farei a transição defesa/ataque no momento em que minha equipe recuperar a bola do adversário?

Essas questões devem ser respondidas pelo treinador e sua equipe técnica antes de se pensar em elaborar sessões de treinamento. Definir a postura do time nas quatro fases do jogo é o primeiro passo quando se imagina alinhar o modelo de jogo a ser adotado.

Para entender melhor…

Se a definição do modelo de jogo, dentro da fase ofensiva da sua equipe for um time que procura o gol utilizando passes verticais, no corredor, com ataques rápidos em velocidade, treino de posse de bola, com passe apoiado e troca de corredores buscando a superioridade numérica para infiltração e finalização, terão pouca transferência com o modelo de jogo escolhido.

Com isso, se o treinador buscar nos treinos atividades que priorizam a posse de bola e circulação através de passe apoiado, no momento do jogo, dificilmente a equipe conseguirá atuar com passes rápidos, verticais como foi definido e certamente solicitado aos jogadores.

A forma da equipe atuar será um reflexo dos treinos aplicados pelo treinador e sua equipe técnica.

O mesmo exemplo vale na organização defensiva.

Se pretender que minha equipe marque pressão, em bloco alto, buscando recuperar a bola do adversário o mais rápido possível, meus treinos devem estar voltados para essa característica.

Treinar a marcação zonal em bloco baixo com o balanço defensivo e suas respectivas coberturas e ocupação de espaço, não irá gerar uma adaptação individual e coletiva para a marcação pressão que havíamos definido anteriormente.

A montagem dos treinos é a ferramenta mais importante na criação e transformação de sua equipe.

Conceitos de jogo.

Além das fases do jogo, um detalhe é fundamental para estarmos atentos na elaboração dos treinos: os conceitos que se pretende trabalhar na equipe.

Os conceitos são a base de sustentação do jogo e também devem estar relacionados com a forma como os jogadores e a equipe reagem durante as partidas.

Se quiser que minha equipe marque em bloco alto, dependo de uma série de conceitos que devem ser treinados para que os jogadores consigam de forma sincrônica atuar dessa maneira.

Ao definir e aplicar os conceitos que seus jogadores e equipe pretendem atuar, isso estará vinculado à forma que os mesmos se comportarão no treino e por consequência no jogo.

Se pretendo que minha equipe circule a bola de forma dinâmica e agrida o adversário com infiltrações, triangulações (através de superioridade numérica) e finalizações de fora da grande área, os conceitos no treino devem estar modulados a essa forma de atuar.

Essa sintonia fina entre ideia de jogo e metodologia é a base para elaboração e aplicação dos treinamentos.

Efetividade no treinamento

Um erro muito comum é pensar em elaboração de treino visando apenas o dinamismo da atividade e alta complexidade de regras e pormenores.

O treino deve ter um porque, uma tarefa a ser cumprida.

Por vezes, a alta criatividade e a busca por atividades cada dia mais complexas, geram um grande problema a sua equipe, pois se não treinar da forma como pretende atuar, não existirá transferência para o modelo de jogo, e possivelmente não gerará assimilação àquilo que propõe o treinador.

Primeira pergunta que o treinador deve fazer antes de elaborar o treino: Qual o objetivo da sessão do treino?

Após entender esse objetivo, os exercícios devem estar relacionados para essa pergunta pois, treinar sem objetivo é apenas desgastar sua equipe sem atingir os resultados esperados.

O treino é a principal arma que o treinador tem para modular sua equipe, quanto mais ele for aproveitado e otimizado, maior será a chance dos jogadores e da equipe evoluírem e se adaptarem ao modelo de jogo pretendido.

Categorias
Colunas

Campeonato Mineiro merece um Ouvidor

Na última semana foi divulgada a tabela e o regulamento do campeonato mineiro de 2018. A competição será, novamente, disputada por 12 equipes, mas, ao contrário dos anos anteriores, 8 equipes se classificarão para a próxima fase.

Assim, as 12 equipes jogarão em turno único e as 8 melhores disputarão as quartas de final em partida única, enquanto, as semi-finais e a final permanecem disputadas em duas partidas.

Proposta pelo Villa Nova de Nova Lima, a alteração foi aprovada pelos demais 8 clubes do interior. Atlético, América e Cruzeiro votaram contrariamente.

Logo que a novidade foi divulgada, muitas foram as críticas, eis que 11 rodadas serão disputadas para que somente 4 equipes sejam eliminadas, ou seja, serão jogos e jogos praticamente sem motivo.

Conforme estabelece o Estatuto do Torcedor, este regulamento terá que ser mantido para 2019, ou seja, pelo menos 2 anos com 12 equipes disputando 8 vagas.

O campeonato mineiro, que possuía um dos regulamentos mais enxutos do país e garantia a disputa nas duas pontas da tabela até a última rodada, agora, por interesse individual dos clubes do interior, tenderá a ficar sem graça e com menos atratividade.

As competições esportivas precisam adotar fórmulas que atraiam o público e não que facilitem a classificação dos clubes, uma vez que se trata de um produto sedento por um mercado consumidor.

Atento a isso, o Estatuto do Torcedor criou a figura do Ouvidor de Competições ao estabelecer que as Federações designem o Ouvidor, fornecendo-lhe os meios de comunicação necessários ao amplo acesso dos torcedores.

O Ouvidor da Competição tem o dever de recolher as sugestões, propostas e reclamações que receber dos torcedores, examiná-las e propor à respectiva entidade medidas necessárias ao aperfeiçoamento da competição e ao benefício do torcedor.

Ao torcedor deve ser garantido o amplo acesso ao Ouvidor de Competições, mediante comunicação postal ou mensagem eletrônica; e o direito de receber do Ouvidor da Competição as respostas às sugestões, propostas e reclamações, que encaminhou, no prazo de trinta dias.

Ademais, o site da Federação deverá conter as manifestações e propostas do Ouvidor de Competições.

Dessa forma, o torcedor pode enviar reclamações ao Ouvidor do campeonato mineiro questionando a fórmula de disputa e, até mesmo, sugerindo alterações.

Ocorre, entretanto, que, em consulta ao site da Federação Mineira de Futebol, não há indicação do Ouvidor de Competições, nem ampla divulgação de acesso.

Após navegar no site, no “fale conosco” há uma lista de e-mails e entre eles a indicação de um e-mail (ouvidoria.estadual@fmf.com.br).

Destarte, o Estatuto do Torcedor exige a nomeação de um Ouvidor personificado e com amplo acesso, a fim de que o torcedor tenha um canal aberto com a Federação.

O campeonato mineiro, um dos maiores estaduais do Brasil, merece uma Ouvidoria forte atuante.

A Federação Mineira de Futebol que tanto se organizou e se modernizou na última gestão, poderia aproveitar a oportunidade para trazer mais profissionalismo e transparência ao promover as suas competições nomeando um Ouvidor independente e com credibilidade, e que seja o “cara” que cuidará do acesso dos consumidores ao seu evento.

Muito embora outras competições e Federações tenham seu ouvidor (do campeonato brasileiro é o Dr. Roberto Sardinha, por exemplo), não há ampla divulgação de acesso.

Assim, eventual medida da FMF no sentido de incentivar a manifestação dos torcedores e aproxima-los da competição por intermédio de seu Ouvidor além de trazer maior público e engrandecer o campeonato, teria um mega impacto para os patrocinadores.

Quem sabe, não chegou o momento da inovação?

Categorias
Colunas

Insatisfação positiva

Quando se busca o alto rendimento, precisamos antes de tudo, saber o que se faz por aí e saber, principalmente, porque obtiveram o resultado que alcançaram. Mesmo ele sendo negativo ou positivo, aliás um dos grandes erros nosso é não saber a razão da derrota e, principalmente, o da vitória. Ao contrário, estamos sempre copiando sem entender o motivo das estratégias utilizadas. Com isso, continuaremos a viver uma carga enorme de emoções insanas ao expectarmos mais do que podemos realmente fazer e/ou do que estamos fazendo para conseguir nossos objetivos. Se é que temos realmente um objetivo, outra falha grave das gestões técnicas e RH.

Insatisfação positiva, uma das essenciais características dos grandes gestores e líderes, na qual queremos mais e melhor e não nos contentamos com o que temos. Ou tentamos ser perfeccionistas para conseguir coisas melhores, ou sempre viveremos à mercê de um sentimento fulgaz, oriundos de resultados medianos e expectativas altas.

O animal acomodado dorme (Guimarães Rosa). E não podemos dormir, muito menos ficar sonolento, quando queremos algo “grande”, ainda mais cobiçado por diversos profissionais tão capacitados quanto nós. Precisamos evoluir sempre, a cada passo e pensamento. A cada ação e tomada de decisão. Necessitamos ser atuais com relação as exigências que nos são apresentadas a cada novo dia, a cada jogo e a cada competição. Nisto nos enganamos, novamente, achando que tudo já está inventado e que não existe novidade. Na minha percepção, há sempre algo novo a ser estudado e observado, tanto individualmente como coletivamente. E também a cada treino, pois o jogador de hoje não é o mesmo de outrora. Atualmente ele tem acesso e busca informações das mais variadas e de diversos níveis. Aumentando exponencialmente seu nível cognitivo e esportivo.

Os grande treinadores, além de encontrarem soluções aos problemas individuais e coletivos, criam obstáculos aos jogadores tirando-os do seu “conforto comportamental”. Onde ele sempre atuou assim e sempre teve determinados resultados. É fundamental fazer com que ele perceba a importância de se reinventar técnica e taticamente. Simplesmente pelo fato de fazer coisas novas para esperar/obter resultados diferentes. Esclareço esta afirmativa com a frase de Julio Garganta: “As grandes equipes, além de solucionarem problemas, geram problemas”. Se não temos jogadores “técnicos”, construiremos uma equipe (conjunto) forte e competitiva. Com ideias consistentes, adequadas e com tempo, utilizando a melhor estratégia possível, pode-se tudo.

Se não houver espaço, deve-se criar espaço. A equipe que não tem a bola, gerencia o espaço de atuação da equipe quem tem a bola. E aquela que tem a bola deve, além de gerenciar a bola, induzir o adversário a se “desorganizar” para que possa ocupar o espaço e progredir no campo até a meta. E alguma das ideias para isso é a mobilidade ofensiva, com triangulações, aproximações, etc. Fazendo com que o adversário se movimente, gerando espaços em amplitude (para o lado do campo) e em profundidade (para o fundo do campo). Sendo fundamental que todas as ideias de jogo para a equipe estejam ligadas e sejam interdependentes. Por exemplo, as ideias de ataque (rápido, em posse, apoiado, vertical,…) são, ao mesmo tempo, o fim e o começo das ideias de construção do ataque (desorganizar a estrutura defensiva do adversário, como mobilidade ofensiva). Um ciclo recursivo onde o fim é o começo de um novo processo, onde o produto desse processo é a causa do início desse processo (Edgar Morin). As interações das ideias produzem o jogo que queremos. Mas o jogo que queremos, por sua vez, produz os jogadores dando-lhes as características desse jogo.

Contudo, não podemos mastigar desilusão. Esperarmos coisas que não trabalhamos para isso. Quais são nossos objetivos? Onde queremos chegar? Qual jogo queremos jogar? Temos fome de que? Respondendo isso, devemos ser coerentes com nossos objetivos. Nosso trabalho e estudo precisa ser específico com o que almejamos. Todavia, somente com muito trabalho e estudo conseguiremos o que queremos. Relembrando da velha máxima “kantiana” (Immanuel Kant) que nos alerta que a experiência sem teoria é cega, e a teoria sem experiência é apenas um puro jogo intelectual.