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Veteranos, nem tanto

O futebol do Brasil ficou agitado com as contratações do espanhol Juanfran e de Dani Alves pelo São Paulo Futebol Clube. Ademais, há sondagens a outros futebolistas de renome internacional. Nada-se em dinheiro? Não. Vive-se um bom momento a situação financeira dos clubes de futebol do Brasil? Muito menos. Do ponto de vista desta coluna, as vindas deles são estratégicas, quer  seja dentro de campo ou fora dele.
Há quem diga que estão em fim de carreira e vomitam argumentos evasivos. No entanto, é completamente o contrário. Também é lugar comum falar que as contratações são importantes para a internacionalização da marca. Já são. Entretanto, é preciso manter esta internacionalização, cultivar, cativar. Em outras palavras, levar adiante, tema que pode ser abordado em outra coluna.

Apresentação de Dani Alves no São Paulo Futebol Clube. (Foto: Divulgação)

 
Para além de contribuírem com a comunicação e o marketing do clube, Dani Alves e Juanfran podem tornar-se ponto de virada a exemplo do que foi Ronaldo Fenômeno no Corinthians, entretanto com outros contornos, inseridos – oxalá – dentro de um planejamento estratégico. São atletas cujas opiniões serão carregadas de extrema peritagem, haja vista o currículo campeoníssimo dos dois atletas. Em outras palavras, serão capazes de quebrar paradigmas.
Desde o relacionamento com a imprensa até ao com os dirigentes e todas as partes interessadas, são atletas com experiência e que vêm de um ambiente de cultura organizacional praticamente inexistente por estes lados. Esta cultura, tema tão recorrente nos textos desta coluna, é fundamental na consolidação de uma identidade para a instituição, que fornece a todos aqueles que fazem parte dela – torcedores, sobretudo – um sentido de pertencimento. Identidade é fundamental para a consolidação e existência da organização, porque ela é capaz de dar sentido a todos os seus planos de ação, potencializa rendimentos (esportivos, estruturais e financeiros), que satisfazem as duas partes mais importantes dentro deste todo processo: o atleta e o torcedor.
Com tudo isso, em boa hora chegam estes reforços. Mais que dentro de campo, serão talvez mais importantes fora dele.

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Em tempo mais uma citação que se relaciona com o tema da coluna:

“Vencer não é tudo, mas querer vencer, é.”

Vince Lombardi (1913-1970), treinador de Futebol Americano

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Sobre as tensões da intensidade – Parte II

Thomas Gravesen: um dos jogadores ‘intensos’ do Real Madrid dos anos 2000. (Reprodução: Diário AS)

 
Faz algum tempo, escrevi neste mesmo espaço sobre algumas das tensões do conceito de intensidade no futebol. Em linhas gerais, compartilhei uma impressão que cresce a cada dia, a saber: o termo intensidade está sendo poluído, banalizado e generalizado. Além disso, ainda é confundido, de vez em sempre, com uma certa noção de eficácia, como veremos a seguir. Ou seja, há quem ache que o futebol só pode ser bom e bem jogado se for ‘intenso’. Um certo ideal de intensidade seria pré-requisito para o bom futebol.
Bom, tenho minhas ressalvas e não sou o único. Gostaria de compartilhá-las com vocês nessa semana. Mais uma vez, sem nenhuma pretensão de acabamento.

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No primeiro capítulo do livro Fútbol: El Juego Infinito, Jorge Valdano faz uma crítica inteligentíssima ao ideal genérico de intensidade – que também se alastra mundo afora. Vamos pensar especificamente em um trecho, em que ele resume, com precisão, parte do envenenamento que os delírios por esta ‘intensidade’ podem causar. Trabalhei este mesmo trecho, de outra forma, alguns dias atrás:
“Se o bom da intensidade é que apazigua as consciências, o ruim é que arruinou um dos conceitos que mais contribuíram para o bom futebol: a pausa. Para jogar bem, é preciso correr, é claro, mas também há que saber parar, pois isso está se enchendo de jogadores que, em sua ânsia de serem intensos, se movem a uma velocidade acima do que podem se permitir, o atentado à precisão é permanente. Se não há precisão, a jogada não tem continuidade e, se não houver pausa, não há surpresa. A precisão e a pausa sempre foram os componentes essenciais do grande jogo, e a intensidade vai contra os dois conceitos. Assim, vamos começar a colocar a palavra “intensidade” como sinônimo de eficácia. Seria como pensar que um relógio é bom porque está se movendo mais rápido do que os demais.”
Vamos pensar sobre este trecho aos poucos. Em primeiro lugar, gostaria de falar um pouco deste ‘apazigua as consciências’. A minha leitura, dentre as várias possíveis, é que Valdano deixa subentendido que falar de intensidade, repetir a palavra intensidade, talvez sem muito rigor, é uma forma de mostrar-se atualizado, de mostrar-se estudado, de mostrar-se moderno e, portanto, é uma forma de se mostrar. É um certo narcisismo, supostamente capaz de tranquilizar a consciência. Talvez a intensidade seja uma dessas grandes commodities do futebol, um desses grandes recursos a serem ‘capitalizados’. E, nesta ansiedade de capitalizar, temos que nos mostrar atuais, reciclados, ‘modernos’, mesmo que o custo disso tudo, para o jogo e para nós mesmos, não nos sejam muito claros. Veja bem: o uso do termo intensidade não é um problema em si. Mas banalizar a intensidade, desgastar a intensidade, esgotá-la e usá-la sem muito critério, traz contribuições muito mais ilusórias do que reais.

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Agora, vamos pensar a relação que Valdano estabelece entre a intensidade e o tempo. Como os amigos sabem, a intensidade, na literatura do treinamento, é a contraparte de uma dupla que ainda tem o volume. Mas enquanto o volume está mais próximo da quantidade de um dado estímulo, a intensidade nos diz, grosso modo, um pouco sobre a qualidade deste estímulo. Como já disse outras vezes, desconfio que este conceito de intensidade, que usamos hoje no futebol, foi importado exatamente da literatura do treinamento.
O problema é que se a intensidade vem atrelada ao jogo, ela ganha enormes traços de complexidade. Os questionamentos metodológicos destas últimas décadas, que encararam os ideais cartesianos por trás do treinamento, nos fizeram pensar se o jogo não deve ser visto por olhos sistêmicos, complexos, que entendam o caráter absolutamente caótico do jogo e que, ao mesmo tempo, entendam que há ordens atrás deste caos. Ou seja, a intensidade, se aplicada ao futebol, não mais é absoluta (não importa apenas a velocidade de um dado jogador em um tiro curto), mas é relativa, relativa ao jogo. Por isso é muito mais do que física, é tática, técnica e mental – mas todos ao mesmo tempo, entrelaçados, complexus. Se falarmos de intensidade no futebol, não apenas temos que ter um certo cuidado com a palavra, como também não podemos afastar o termo da sua relatividade, da sua relação com o contexto, deste novo significado que nasce da irresistível associação à inteireza do jogo.
Por isso o alerta de Valdano é tão importante: ele nos diz que nos tão passivos com este discurso moderno, no futebol e fora dele, este discurso que prega a rapidez, a eficácia, o tempo real, o tempo do instante, este discurso que não admite perder tempo, estamos tão passivos frente a este discurso que não admitimos, por exemplo, baixar o ritmo, não admitimos que existem outros ritmos, outro tempo para o jogo e para a vida vivida que não seja este tempo corrido, imparável, incontrolável, sufocante, intenso. Chegamos ao ponto de achar que uma equipe deve ser intensa durante 90 minutos, e quando ela não consegue sê-lo, ainda que isso seja absolutamente natural, surgem as críticas aos treinadores, especialmente aos brasileiros, como se os problemas do jogo fossem sinônimo de um incompetência geral, uma incapacidade para imprimir este conceito idealizado de intensidade, do qual as equipes europeias de exceção conseguiram se aproximar.

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Como estamos intoxicados por este discurso, às vezes nos escapam detalhes óbvios. Por exemplo, jogos intensos podem ser muito ruins. Porque nos jogos muito intensos às vezes nada acontece, exceto a virulência. Se quiser, assista aos primeiros vinte minutos de Juventus x Ajax, jogado em abril e repare que o ritmo é tão alto, mas tão alto, que tudo é muito rápido, muita coisa se passa, muitos estímulos passam, mas pouca coisa acontece. E o que o jogo parecia pedir, como Valdano nos disse acima, é uma pausa, um pouco de tempo, de respeito ao tempo, de câmbio de ritmo, um tempo para o próprio jogo, ao invés dessa ansiedade desenfreada, que também se estende, cada vez mais à formação dos nossos jovens jogadores. Mas eles, se picados por este mosquito da intensidade, talvez não consigam imaginar que há outras formas, há inúmeras formas de pensar a intensidade no jogo. Penso, por exemplo, se não há pelo menos dois retratos macro da intensidade no jogo: uma em que tudo se passa e nada acontece e outra em que se passa menos, num tempo mais longo, mas mais coisas acontecem. A intensidade, às vezes, está na pausa, na calma.
Mas sobre isso falamos em breve.