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Você não conhece Bo

Seria possível alguém ser tão bom em dois esportes simultaneamente? E ainda, em nível profissional de atuação? Como se, por exemplo, no Brasil, um atleta de vôlei jogar de centroavante ou zagueiro num clube da Série A do futebol?

Você deve se perguntar se isso já existiu alguma vez, em algum lugar do mundo. Eu também tive esta reação: duvidar, até com certo riso de ironia, se isso seria possível em um mundo de limitações ao talento, particularmente em tempos de competitividade acirrada.

Pois saiba que esta história existe e o personagem ainda vive para incontáveis horas de reflexão, deleite e perplexidade. Vincent "Bo" Jackson foi um garoto-prodígio dos EUA. Desde adolescente, era um fenômeno no atletismo do colégio na mesma proporção em que rebatia bolas no beisebol e corria centenas de jardas no futebol americano.

Sua trajetória está muito bem retratada no documentário da ESPN Films intitulado You don’t know Bo (Você não conhece Bo).

 

Dentre seus feitos, foi o único até hoje a figurar em All-Star Game de dois esportes diferentes nos EUA; ganhou o troféu Heisman como melhor jogador universitário do país e o recorde de 100 m em menor tempo no futebol americano.

Intercalava sua atuação entre temporada de beisebol e de futebol americano, mantendo o mesmo nível físico e técnico. Foi um dos primeiros garotos-propaganda da Nike, ao estrelar uma campanha famosíssima que brincava com o fato de que Bo sabia fazer tudo (Bo knows), além de estrelar videogames.

Sua carreira foi prejudicada e dirigida ao final após uma grave lesão no quadril, quando estava no auge e tudo indicava que iria quebrar muitos recordes. Talento puro, pois os treinadores e ele mesmo diziam que não precisava treinar, ou somente muito pouco, para absorver os fundamentos dos dois esportes.

Hoje, outro ícone do esporte mundial, Michael Jordan, completa 50 anos de idade. Todos os números e feitos de Jordan são superlativos e inesquecíveis.

Jordan, de fato, também desfrutava de um talento inato. Porém, ao contrário de Bo, alguns episódios de insucesso em sua infância e juventude forjaram sua obsessão pela dedicação, treinamento, persistência e convicção que errar era preciso.

Sim, errar era preciso, pois isso o fez buscar sempre a evolução. Seu irmão mais velho era também o mais talentoso em casa. Isso lhe impulsionava a treinar mais para não ficar atrás. Suas mais irmãs estudavam mais do que ele.

No colégio, foi cortado do time. Na faculdade, seu colega de quarto foi escolhido o jogador do ano – embora ele discordasse. Nem entrou na lista de prováveis promessas da universidade.

Em 14 temporadas na NBA fez a história se lembrar dele como o melhor de todos. Porque, em todo treino, levava todos do grupo ao limite, inspirando-lhes vontade de competir e avançar.

"Um dia você pode olhar e me ver jogando aos 50. Não riam. Nunca diga nunca. Porque limite, assim como medos, frequentemente são apenas ilusões", afirmou Jordan.

E como diz Jorge Valdano, um dos fatores mais importantes para o talento evoluir é que se lhe dê e se lhe tenha confiança. Seja para Bo ou para Jordan.

Para interagir com o autor: barp@universidadedofutebol.com.br

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Quem conta a história

Jacques Lacan, um dos maiores teóricos da comunicação, certa vez usou o seguinte exemplo para explicar a relevância do tema: "Uma cadeira está em uma sala, mas a percepção sobre isso só acontece a partir do momento em que alguém diz isso".

De uma forma extrema, é como se o elemento só existisse porque alguém o nota. Quem conta a história é tão importante quanto o fato.

Não são raros os exemplos de livros e filmes que se tornaram clássicos a despeito de terem tramas rasas. Muitas vezes, o que define a qualidade de uma história é como ela é contada.

Em um exemplo mais cotidiano, para facilitar o entendimento, é como uma piada. A brincadeira pode até ser sem graça, mas um bom intérprete dá a ela um ritmo e um formato interessantes. Nas mãos de um contador ruim, porém, até uma anedota muito divertida pode perder o élan.

Não vi ao vivo o jogo do São Paulo no último fim de semana. Horas depois, li relatos de portais e redes sociais sobre a vitória da equipe tricolor. Pincei expressões como "frango histórico" e "erro bizarro" para descrever a falha de Rogério Ceni no primeiro gol do Ituano.

A falha de Ceni foi expressiva, e isso é claro. No entanto, quando assisti ao lance, não notei nada de "histórico". O esporte, assim como a vida, é uma enorme sucessão de erros.

Temos uma tendência, sobretudo no Brasil, para o rótulo. O esporte mimetiza isso, e o herói de um fim de semana pode ser questionado na partida – ou até no lance – seguinte.

Em dezembro, quando foi eleito pela Fifa o melhor em campo na decisão do Mundial de clubes, Cássio foi alçado ao patamar de herói. Em 90 minutos, tornou-se um goleiro de talento acima da média e de futuro certo na seleção.

Acabou o ano, e Cássio perdeu o início da temporada 2013 por estar no departamento médico. Voltou à meta do Corinthians contra o São Caetano, e falhou feio no segundo jogo, contra o Palmeiras, no último fim de semana. O camisa 12 tentou cortar um cruzamento de Wesley, mas errou a bola e socou o ar. Atrás dele, Vinícius marcou de cabeça o segundo gol alviverde no empate por 2 a 2.

Os 90 minutos contra o Chelsea não são suficientes para julgar Cássio. Os 90 minutos contra o Palmeiras, tampouco. Análises açodadas podem pespegar em atletas algumas características extremamente injustas.

Pense em quantos jogadores de futebol foram "queimados" por um lance ou por um jogo ruim. Muitos deles mudaram de clube e reagiram. Outros sucumbiram ao julgamento popular.

Sempre que vejo julgamentos apressados, lembro de um exemplo extremo. Em 1994, um colégio foi fechado em São Paulo. Proprietários e uma professora foram acusados de abusar sexualmente de alunos de quatro anos. A mídia e o público julgaram prontamente, e a escola Base foi transformada em antro de tudo ruim.

A vida dos envolvidos no caso foi totalmente estraçalhada. E depois, a Justiça mostrou que todos eram inocentes. Mas quem vai restaurar o abalo causado pelo julgamento público a que eles foram submetidos anteriormente?

Na madrugada de quinta-feira, o sul-africano Oscar Pistorius foi preso. Ele é o principal suspeito de ter assassinado a namorada, Reeva Stenkamp, que trabalhava como modelo e levou quatro tiros na mansão do atleta.

O caso levou a fabricante de material esportivo Nike a interromper uma campanha que era protagonizada por Pistorius. Contudo, a empresa emitiu comunicado oficial para dizer que o contrato com o atleta não será rompido até que a Justiça conclua as investigações.

O mesmo tom cauteloso foi adotado pela BT, empresa de telecomunicações que também patrocina Pistorius. Em nota à imprensa, a companhia pediu calma antes de definir o que será da parceria com o atleta.

As posturas de Nike e BT são exemplos de como a comunicação deve se portar diante de um escândalo. Manter associação com o atleta pode até causar algum problema para as empresas se ele for condenado, mas deixá-lo agora seria fazer um julgamento extremamente precipitado.

É claro que o caso de Pistorius é extremo e que extrapola os limites do esporte. Mas se a cautela é um caminho evidente nessa situação, por que não usamos a mesma parcimônia em análises cotidianas sobre o esporte?

Se fôssemos mais comedidos, evitaríamos a criação de heróis inconsistentes. E isso vale para mídia, clubes, entidades e empresas.

Há um conto de Julio Cortázar no livro "Todos os fogos o fogo" em que os personagens alteram constantemente, às vezes em um mesmo parágrafo, o comando da narrativa. Cada um relata os fatos de um modo, e a sobreposição forma a história.

Na vida, infelizmente, são raros os momentos em que mais de uma pessoa conta uma versão sobre um fato. "A história é contada pelos vencedores", diz o aforismo.

Quem trabalha com comunicação precisa ter a exata dimensão do que isso representa. Singelezas no texto ou na postura podem mudar radicalmente o rumo de uma história.

Tive um professor que era radical ao projetar o futuro ideal para a comunicação. Ele não acreditava em imparcialidade, e por isso achava que um caminho viável era o caminho radicalmente oposto.

No esporte, por exemplo, o professor defendia a adoção de relatos tendenciosos e direcionados. Eles seriam cruzados com os dados dos leitores ou espectadores – um torcedor do Flamengo teria uma visão sobre o clássico do último domingo, mas o adepto do Botafogo veria uma versão radicalmente diferente.

Não sei se esse é o futuro para a comunicação, mas considero o caminho mais honesto. A publicação que defende abertamente um candidato é mais verdadeira na cobertura política, ainda que seja parcial.

Tenho amigos que só leem relatos de jogos nos sites oficiais dos times de seus corações. Assim, evitam ficar nervosos com análises falsamente imparciais.

O problema é encontrar o limite para esse conteúdo parcial. O site da Ponte Preta é um caso de quem extrapolou. No último domingo, a página replicou piada de redes sociais e disse que Neymar havia sido expulso no jogo contra a equipe de Campinas apenas para poder ver a participação da namorada em um programa de TV. Foi uma tentativa de fazer graça, ok, mas é o tipo de provocação desnecessária e desmedida.

Quem conta influencia a história. Não há como ser de outra forma. No esporte, que vive de heróis e vilões, é fundamental que os cronistas saibam conduzir dicotomias e resolver conflitos, mas que não busquem saídas definitivas. As certezas são tão volúveis quanto ameaçadoras.

Para interagir com o autor: guilherme.costa@universidadedofutebol.com.br

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O peso das derrotas

Caros leitores,

Trabalhar no futebol é conviver diariamente com a instabilidade profissional. Seja por questões políticas, administrativas ou técnicas, motivos (???) não faltam para que ocorram trocas constantes nas milhares de comissões técnicas espalhadas pelo país. Como sabemos, um motivo em particular potencializa tal instabilidade: as derrotas.

E é sobre elas que discorrerei esta semana.

Sentar, refletir e escrever quando os resultados são favoráveis é muito mais simples. As ideias surgem com fluidez, os argumentos não faltam e as vitórias (para muitos, somente elas) respaldam cada parágrafo que vai sendo produzido.

Se na última temporada a equipe em que trabalho foi derrotada somente por três vezes em vinte e oito jogos, no cenário atual, após quatro partidas, os três resultados negativos consecutivos (3×0; 3×4 e 3×2) já se equivalem aos reveses de 2012.

Tais resultados negativos causaram reações diversas em todos (imprensa, diretoria, atletas, comissão técnica, torcida). Da insegurança dos jogadores à revolta da imprensa que já questionou a permanência do treinador, o momento pede que a derrota seja bem gerida. Para uma boa gestão do fracasso temporário, analisar TODO o ambiente e tentar ser preciso nos procedimentos até o jogo seguinte é fundamental.

Durante a análise do ambiente, muitas reflexões vêm à mente sobre o que fazer diante das derrotas. Eis algumas delas:

Será momento de mudar a maneira que o trabalho é conduzido? Será momento de achar culpados e transferir as responsabilidades do resultado negativo? Será momento de rebater as críticas que temos recebido? O momento pede (tentativas de) substituições significativas no Modelo de Jogo? O momento pede mudanças de jogadores? O momento pede cobranças excessivas aos jogadores? O momento pede contratações?

Além destas, inúmeras outras perguntas certamente renderiam horas e horas de discussão. Como no futebol não há muito tempo para conversa, após um bom diálogo com o treinador, iniciamos os trabalhos da semana cientes de nossas funções na tentativa de revertermos o quadro atual.

É uma semana de pressão, que deve ser amenizada pela comissão para que os jogadores não transportem esta carga para o jogo de domingo. É uma semana de muito trabalho, nem mais, nem menos que nas semanas anteriores, “apenas” muito trabalho. Semana de um maior número de intervenções, de reforços positivos, de feedbacks.

Semana em que a crise não pode ser instalada, a cobrança deve incentivar a melhora e que a vontade de vencer potencializada no ambiente de treino não se confunda com desespero ou desorganização.

É também uma semana de ouvir os jogadores, escutar o que estão pensando, como estão se sentindo e como estão lidando com a adversidade. Ouvir sugestões de melhorias para o desenvolvimento do trabalho pode deixá-los confortáveis para desempenharem o seu melhor.

Você que trabalha com futebol profissional provavelmente já deve ter passado por situações, sentimentos e sensações semelhantes. Como você se comportou? Para você que almeja trabalhar, prepare-se, pois lidar com as derrotas, mais cedo ou mais tarde, será inevitável.

A partir do dia 17/02 todos saberão se os primeiros passos para a reabilitação foram dados. Se sim, estejam certos de que um grande peso (o das derrotas) terá saído das costas de todos. Se não, vamos erguer a cabeça e continuar buscando soluções cientes de que fizemos o melhor que poderíamos.

Encerro afirmando que o que escrevi referente à maneira de enfrentar/interpretar as derrotas advém de opiniões formadas por experiências profissionais e pessoais diversas. Leituras, relacionamentos, acertos, erros, práticas, vivências, estudos, formam a totalidade que é a minha existência, expressa, neste caso, na minha atuação profissional.

Que as minhas opiniões não sejam consideradas uma verdade absoluta e que as derrotas nos sirvam, no mínimo, de aprendizado.

Até a próxima semana!
 

Para interagir com o autor: eduardo@universidadedofutebol.com.br
 

 

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Depois do carnaval começam os cursos de direito desportivo

É pública e notória a crescente demanda por profissionais com formação nas áreas desportivas, em virtude de Copa do Mundo e Jogos Olímpicos. Neste esteio três cursos para públicos diferentes começaram a receber matrícula.

Para quem procura um curso que traga conhecimentos amplos em Direito Desportivo como um todo e também em Gestão a SATeducacional (www.sateducacional.com.br) oferece curso de capacitação à distância com início em maio. Este curso conta com apoio de entidades internacionais como a Associação Portuguesa de Direito Desportivo e tem sido procurado, além de brasileiros, por angolanos, moçambiquenses e portugueses.

Aos interessados por curso de especialização (pós-graduação lato sensu), a PUC de Minas Gerais (www.pucminas.br) está recebendo matrículas para seu curso presencial e à distância.

Finalmente, para quem já possui algum conhecimento na área de direito desportivo e pretende alçar voos mais altos, está na iminência de ser lançado, pelas Universidade de Limoges (França) e a Universidad Nacional del Este (Paraguay) (ayca_cap@adsl.net.py) com apoio do Instituto Brasileiro de Direito Desportivo, o "Master en Derecho, Economía y Gestión del Deporte".

Com titulação de ambas as universidades, este curso conferirá título de mestrado na Europa e em países signatários de tratado do Mercosul, o que auxiliará no reconhecimento pelo MEC.

Além do conhecimento, o curso oportunizará intercâmbio com alunos e profissionais de todo o mundo, bem como poderá abrir portas no mercado internacional.

Urge acrescer que os interessados em cursos de curta duração também possuem alternativas, como curso da Lex Magister (www.lexmagister.com.br) que trata dos Grandes Eventos Esportivos, Direitos do Torcedor e Marketing.

Diante do exposto, o profissional possui um vasto leque de opções para todos os interesses e bolsos a fim de que possa se capacitar e aproveitar as oportunidades emergentes.

Portanto, mãos à obra.

Para interagir com o autor: gustavo@universidadedofutebol.com.br

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Space dive

Quanto tempo você acha que leva a preparação de um homem para realizar uma grande façanha? Quebrar um recorde mundial? E como se chega até lá? Golpes de sorte, com a ajuda do talento inato? Ou muito planejamento, preparação e capacidade de execução?

Assisti a um documentário que revela os bastidores do fantástico desafio em que se lançou o austríaco Felix Baumgartner, batizado de "Space Dive" (Mergulho no Espaço).

O filme mostra como o "Projeto Red Bull Stratos" (http://www.redbullstratos.com) foi concebido para que um recorde de 50 anos fosse batido: o austríaco voador deveria subir à estratosfera e saltar em queda livre.

O homem que era o detentor do recorde, um coronel aposentado da Força Aérea Americana chamado Joe Kittinger, fora escalado por Felix para ser o chefe de operações na base do Novo México.

Sabiamente, convocou a pessoa que já havia passado por este grande desafio, 50 anos antes, para lhe transmitir toda a experiência e confiança necessárias para alcançar estes números impressionantes: 39 km de altitude; 4min22s em queda livre e a velocidade de 1342 km/h.

Mas, o filme evidencia todas as dificuldades de liderança e gestão de um projeto que envolveu várias pessoas de diferentes especialidades técnicas: médicos, engenheiros, fabricantes de equipamentos.

Foram inúmeros testes e saltos com a roupa que deveria ser utilizada; simulações de laboratório para avaliar riscos de submeter o corpo a situações extremas; uma vez abortada a missão no dia marcado, em decorrência da súbita mudança do clima.

E, após, quatro anos e meio, em 14 de outubro de 2012, os recordes foram quebrados, contando com um investimento de 16 milhões de libras esterlinas.

No futebol, costuma-se analisar e valorizar apenas o momento – normalmente se considera apenas uma dada temporada para que imprensa, torcida e palpiteiros, vaticinem se o resultado final do clube foi de êxito ou de fracassos.

Não se procura analisar um período maior para que, ao menos, uma linha de tendência na evolução ou involução amparasse os acalorados comentários de fim de semana, ao sabor da partida daquela rodada.

Ainda mais constrangedor, nesses casos, é que são poucos os clubes, particularmente no Brasil – o país do futebol, em que todos padecem da soberba e da mania de grandeza – que estabelecem claros e factíveis objetivos.

Todos querem ser campeões de qualquer coisa. Para isso, iludem seus torcedores (sócios) com a anunciação deste objetivo. E se esquecem de bem administrar o patrimônio do clube (aqui incluindo-se a marca e a relação dela com o mercado em sentido amplo); sanar dívidas; não gastar além do que o orçamento indica (que orçamento?); gerir as categorias de base, onde está o DNA criativo do clube e sua fonte permanente de geração de talento e valor financeiro.

Pensa-se que administrar o futebol é um mergulho belíssimo no espaço. Mas não há preocupação com o caminho de volta à Terra.

Muitos não sabem de muita coisa necessária a se fazer no meio desse caminho. Não basta apenas confiar no paraquedas para que abra antes do pouso.

O próprio Felix se equivocou, na fase de testes, sobre qual alavanca acionar. Como estava preparadíssimo, conseguiu ajustar a tempo e chegou bem ao solo.

No futebol brasileiro, sempre houve mais de um paraquedas para salvar os aventureiros. Esse é o problema que impede nossa gestão de evoluir: a crença absoluta na salvação dos devaneios administrativos em clubes e federações.

Ao contrário, Felix acredita em sua competência e em dois paraquedas. Não mais do que isso.

Para interagir com o autor: barp@universidadedofutebol.com.br
 

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Tecnologias e o jogo tradicional

Não é nenhuma novidade o amplo e crescente uso das tecnologias pelo homem, aumentando a conectividade com outras pessoas e substituindo as antigas formas de lazer.

Neste aspecto, os jogos eletrônicos aparecem como uma das principais plataformas de diversão para a nossa juventude. O Brasil é tido como a 4º maior indústria de "games" do mundo, movimentando aproximadamente R$ 1 bilhão anualmente, de acordo com a Abragames em publicação no Portal R7 (http://noticias.r7.com/tecnologia-e-ciencia/noticias/mercado-de-jogos-eletronicos-ja-movimenta-quase-r-1-bilhao-por-ano-no-brasil-20121103.html?question=0).

O breve posicionamento do assunto e a busca por números servem para destacar um fenômeno interessante em face dos esportes tradicionais: a fixação da atenção por crianças e adolescentes para o espetáculo esportivo dentro de uma arena de competição.

Digo isso, pois, nesta semana e na anterior, me deparei com situações similares em dois eventos esportivos que tive presente. Em uma competição de tênis de campo (com grandes atletas de calibre mundial) e um campeonato estadual de futebol (com a presença de grandes clubes em campo), percebi que, enquanto os pais acompanhavam o jogo em si, seu(s) filho(s) jogavam "games" em dispositivos portáteis, com baixa ou nenhuma atenção sobre o que ocorria no evento propriamente dito.

Desta constatação, que muitos já devem ter feito, nota-se um distanciamento da linguagem do jovem para com as modalidades esportivas tradicionais.

E a pergunta que fica é: o que precisa ser feito para que a nova geração tenha apreço significativo sobre o esporte? Será que, em um futuro não tão distante, veremos o sumiço em massa de modalidades popularmente conhecidas nos dias de hoje? Qual a dosagem e a medida para o implemento de inovações?

Para interagir com o autor: geraldo@universidadedofutebol.com.br

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Quando o silêncio é fundamental

Pode parecer paradoxal, mas poucas coisas são mais importantes na comunicação do que o silêncio. Saber quando falar e saber o que falar são coisas que dependem essencialmente dos intervalos. O problema é que a ausência de som tem se tornado cada vez mais rara.

Uma das explicações para isso é a característica da atual sociedade. O advento das redes sociais consolidou um perfil de pessoas que são suas próprias mídias. Todo mundo sempre quis falar e ser ouvido, mas a tecnologia encurtou o caminho para isso.

As redes sociais foram constituídas com a ideia de reproduzir interações reais, ainda que exageradas ou baseadas em personagens falsos. Todo mundo é bonito, inteligente e tem uma vida emocionante na internet – o que, aliás, não é muito diferente do que acontece em um bar ou na pista de uma casa noturna.

A grande diferença entre a internet e o mundo real é o tempo de reação. O comentarista raivoso de um blog ou de um texto talvez fosse amainado se recebesse uma resposta imediata e convincente.

"O que possibilita ou impossibilita a comunicação é, em última instância, o silêncio", escreveu Eduardo Cañizal, pesquisador focado em linguagem não verbal.

Não por acaso, estudos sobre comunicação dão atenção destacada ao silêncio. Até psicanalistas freudianos, que baseiam o tratamento na palavra, valorizam os efeitos promovidos pelos intervalos.

Entender isso é fundamental para qualquer plano de comunicação, e o esporte não é diferente. Ainda assim, há poucos estudos sobre o uso do silêncio nessa seara. E o problema é que, para variar, a ausência de base teórica promove um festival de empirismo, o que aumenta consideravelmente a margem de erro.

Foi o que aconteceu, por exemplo, com o Atlético-PR. O time rubro-negro decidiu valorizar o site oficial. Para isso, limitou drasticamente o acesso da imprensa durante a disputa do Estadual de 2013.

José Roberto Guimarães, técnico do Amil/Campinas e da seleção brasileira de vôlei feminino, causou polêmica semelhante ao reclamar dos microfones durante um jogo da Superliga. Ele pediu que os artefatos fossem retirados e que a transmissão respeitasse a liberdade do trabalho do treinador.

Nos dois casos, porém, faltou colocar as coisas em perspectiva. É válido que o Atlético-PR tente valorizar o site oficial, mas restringir o acesso da imprensa pode diminuir o impacto – e a relevância, por consequência – das notícias relacionadas ao clube. Zé Roberto, por sua vez, tem de entender que as informações e o áudio são diferenciais fundamentais para a TV, que é parceira e parte fundamental para a existência da Superliga.

Blindagem e restrição à informação são fundamentais para planejar o silêncio, mas levar isso ao extremo pode jogar contra. O esporte, assim como outras searas, precisa entender que o silêncio exagerado pode minar o interesse.

Porque restringir, na comunicação ou na vida, é quase sempre a saída mais fácil. A mais eficiente, porém, é mudar a cultura. Nenhuma lei é tão útil quanto ensinar ao público a importância de determinado comportamento.

Um exemplo contrário foi dado pelo Paris Saint-Germain. O time da capital francesa contratou o astro inglês David Beckham, e uma entrevista coletiva foi agendada para oficializar o acordo com o meio-campista. O evento foi sóbrio e minimalista, mas teve transmissão global pelo site oficial da equipe.

Com um assunto relevante e um serviço de qualidade, o PSG conseguiu turbinar de forma consistente o número de acessos da página do clube. E se a diretoria conseguir aliar isso a uma boa estratégia de produção e distribuição, é possível que o interesse se transforme em receita.

Hoje em dia, são poucos os sites ou veículos de mídia que conseguem vender publicidade e viver disso. Essa regra também vale para plataformas oficiais de clubes ou entidades de futebol.

A dificuldade de vender publicidade, contudo, não se deve à ausência de público. Sites de clubes têm alto contingente de acessos, mas não vendem por terem pouca relevância. E o caminho para a relevância não pode exigir restrição a outros conteúdos.

O caminho para a relevância, como ensinou o caso do PSG, é a oferta de serviços. O que pode intensificar a relação do público com uma página oficial é entender quais são as necessidades dessas pessoas.

É por isso que os sites oficiais de clubes e entidades esportivas em outros países investem cada vez mais em opções variadas. As páginas apresentam estatísticas, produtos, ingressos, planos de sócios e notícias. Conteúdo deve ser visto assim, como um aspecto em um pacote.

Há um aspecto de formação cultural aqui: um bebê que chora é normalmente associado a um problema. Ele reclama por ter fome, sono ou carência, por exemplo. É o tal do "Quem não chora não mama", que se torna uma regra tácita com o passar dos anos.

Bombardear as pessoas de informações pode diminuir a relevância do que é dito. Limitar totalmente o acesso também é um caminho complicado. A distância entre os dois casos, que o futebol ainda precisa aprimorar, é percorrida com pesquisa e planejamento.

Para interagir com o autor: guilherme.costa@universidadedofutebol.com.br

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Manutenção da posse da bola no campo de ataque: diferenças entre o FC Barcelona de Guardiola e do FC Barcelona pós Guardiola

Para os que acompanham ou estudam futebol europeu a mais tempo, quando o FC Barcelona venceu o Santos na final do Mundial de Clubes da Fifa 2011, nenhuma surpresa emergiu daquele belo, contagiante e eficaz futebol.

Para os que viam pela primeira vez a equipe catalã, inevitável o êxtase futebolístico.

Uma equipe rápida na transmissão da posse da bola, com grande voracidade para recuperar-la, de pouquíssimos erros de passe, um tempo em sua posse, impressionante e além de tudo, baixa (em estatura).

O treinador na época, Josep Guardiola.

O tempo passou, o FC Barcelona mudou de treinador e aumentou a expectativa para saber se aquele esplendoroso time na forma de jogar era um Barcelona de Guardiola, ou se Guardiola é que era um treinador de Barcelona.

A dúvida que pairava entre linhas, sobre a contribuição do treinador para o “jogar” da equipe, poderia se extinguir com a sua saída – bastaria para isso continuar acompanhando os jogos da equipe catalã.

Pois bem.

O tempo passou, e muitos jogos depois algumas constatações podem ser feitas.

A primeira delas é de que sobre o Modelo de Jogo, em sua essência, nada de muito diferente – e o que se apresenta diferente, talvez seja mais resultado de uma auto-organização coletiva por parte dos jogadores do que de uma concepção diferente para se jogar.

De qualquer forma, é sobre uma dessas diferenças que pretendo debater rapidamente.

E ela trata exatamente de algo que na essência parece não ter mudado, mas que na forma e conteúdo tem lá algumas alterações: falo da manutenção da posse da bola no campo de ataque da equipe do FC Barcelona.

De maneira geral, o time de Guardiola e o time pós Guardiola, apesar de manterem a posse da bola como característica, apresentam algumas coisas que merecem destaque. Especialmente, porque o Barcelona pós Pep parece ter que se esforçar mais para atingir melhores níveis de jogo, com relação a esse quesito, do que o de Pep (Guardiola).

Uma das coisas que mudou tem relação com a diferença na estruturação dos espaços por parte dos jogadores, no momento de compor a geometria da equipe no campo de ataque para tentar circular a bola.

No pós Guardiola, ainda que o esquema tático matriz continue sendo o 1-4-3-3 (variando bem menos para o 1-3-4-3), já no campo de ataque e em organização de posse de bola, ele se transforma dinamicamente em um 1-2-4-1-3 que varia para um 1-2-3-1-4.

Nesses esquemas (1-2-4-1-3 e 1-2-3-1-4), há uma aparente preocupação em tentar construir mais solidamente um 1-2-4-4; porém por vezes a linha do meio e por vezes a linha de ataque “cedem” um de seus jogadores para fazer o “1” entre elas.

Em geral, a linha de ataque de quatro jogadores se constrói com os atacantes e um dos laterais e/ou um dos meias.

Há, porém, no Barcelona pós Guardiola uma dificuldade maior para circular a bola de um lado ao outro do campo sem que ela tenha que passar pelos zagueiros da equipe.

Isso de certa forma aumenta a dificuldade para que a equipe encontre vantagem numérica pelas laterais do campo em jogo apoiado – gerando maior necessidade de que os zagueiros apostem em diagonais mais longas para os jogadores da “amplitude” da equipe.

A necessidade de utilizar os zagueiros com mais frequência acaba baixando muito o jogo da equipe – exigindo maior movimentação vertical de meias, volante, laterais e atacantes.

A posição do “volante” da equipe, seja talvez a mudança estrutural mais importante, por que sua entrada na linha de quatro jogadores do meio campo força muitas vezes a circulação para trás (para os zagueiros) quando a bola está com um dos laterais, ou que eles tentem passes de maior risco buscando pelos meias da equipe.

Na “era Guardiola”, o esquema tático matriz também era o 1-4-3-3 (variando bastante para o 1-3-4-3). No campo de ataque e em organização de posse de bola, uma estrutura bem dinâmica, a partir de um 1-2-1-4-3 variando para um 1-2-1-3-4.

E aí já se evidencia uma grande diferença, porque o “1” nesse caso é uma posição entre a linha dos dois zagueiros e da linha de meio, de três ou quatro jogadores (e não entre a linha do meio e de ataque).

Claro que como a linha de ataque varia entre três e quatro jogadores (1-2-1-4-3 ou 1-2-1-3-4), há uma chance permanente de um jogador transitório estar entre essas linhas quando está trocando de uma para outra.

É importante então destacar que o FC Barcelona de Guardiola conseguia mais facilmente manter a bola no campo de ataque, circulando-a sem ter que baixar demais sua linha, justamente pela preocupação posicional com jogador na função/posição de volante.

A ocupação do espaço do “volante” também garantia maior mobilidade e troca de posições entre zagueiros e o próprio volante – algo muito mais frequente na “era Guardiola”.

A equipe de Josep Guardiola, sempre com muita amplitude na ocupação do espaço de jogo, tratava dessa variável como responsabilidade direta dos laterais e ou meias para dar mais liberdade aos atacantes, tanto do lado da bola quanto o do lado oposto a ela.

Apesar do FC Barcelona pós Pep também fazer uso dos laterais e meias na amplitude da equipe, ele (o uso) se dá mais na região da intermediária ofensiva do que na segunda metade (metade final) do campo de ataque.

A possibilidade direta de contar com laterais e meias trocando de posição para dar amplitude a equipe possibilitava também ao FC Barcelona de Guardiola uma incrível mobilidade por parte dos atacantes (horizontalmente falando) e dos próprios meias entre si.

A disposição diferente para ocupar o
espaço do campo de ataque em posse de bola para circulação, na equipe de Guardiola, conseguia pelo tipo de interação e proximidade setorial entre os jogadores, também ter uma transição defensiva mais agressiva e efetiva – já que muitas vezes permitia a equipe recuperar a bola no campo de ataque e ainda mantê-la por lá (sem sobrecarregar demais, especialmente os laterais do time).

Claro, como mencionei no início, o Modelo de Jogo do FC Barcelona, com ou sem Guardiola, continua sendo, em sua essência, o mesmo – especialmente pela bem definida Filosofia de Jogo do clube.

Mas que as coisas mudaram, mudaram.

Esse foi só um pequeno exemplo, que pode nos ajudar a entender por que certos padrões não se sustentaram facilmente e espontaneamente com a troca de treinadores.

Vamos agora esperar o Guardiola no alemão Bayern de Munique e ver o que acontece.

Por hoje é isso…
 

Para interagir com o autor: rodrigo@universidadedofutebol.com.br

 

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O treinamento da organização defensiva

A construção dos comportamentos coletivos de organização defensiva pode ser feita de diversas maneiras. Com um treinamento em forma de situações de jogo, os atletas vivenciam um ambiente semelhante ao da competição e, dessa forma, podem estar mais preparados para responderem adequadamente a imprevisibilidade, inerente ao futebol.

Estudiosos da modalidade afirmam que defender organizadamente é pré-requisito para atacar bem, afinal, ao se cumprir com o objetivo da organização defensiva (recuperação da posse de bola) a equipe deve estar distribuída espacialmente de forma a facilitar a transição e organização ofensivas.

Dando continuidade às sugestões de regras para treinamentos que favoreçam um jogar de qualidade, tema abordado em quatro colunas ao longo do ano passado (parte I, parte II, parte III, parte IV), nesta semana as regras propostas pretendem levar ao aperfeiçoamento da fase defensiva.

Para aperfeiçoar o pressing setorial, lembrando da importância da manutenção da plataforma de jogo da equipe durante esta ação coletiva, seguem as sugestões de regras:

•Marcar o campo com diversos gols-caixote e dar ponto a equipe que conseguir efetuar um passe certo, ou então conseguir passar com a bola dominada, entre o gol caixote. Distribuir pelo menos quatro gols-caixote ao longo da mesma linha horizontal do campo de jogo. Na medida em que a equipe aperfeiçoar o mecanismo de pressão espaço-temporal, deve-se diminuir a distância vertical entre os gols-caixote. Proteger diversos gols caixote além do gol oficial induz os jogadores a subirem a linha de marcação de acordo com o setor em que iniciará as pontuações;

•Demarcar setores do campo em que, obrigatoriamente, o adversário deverá ter sido pressionado por mais de um jogador antes de efetuar o passe ou sair do setor com a bola dominada. Caso a pressão (espaço-temporal) não aconteça, a equipe que tem a posse de bola pontua;

•Demarcar setores do campo que, estrategicamente, são regiões em que a equipe tentará a recuperação da posse de bola. Recuperar a posse nestas regiões, ou o adversário errar um passe com ao menos um defensor na região (na tentativa de forçar o erro) no momento do passe, vale ponto para a equipe que defende;

•Qualquer troca de passe pra frente vale ponto para equipe que ataca. Se houver quatro passes consecutivos, a pontuação é dobrada. Esta regra pode ser realizada em toda a extensão do terreno de jogo, porém, aconselha-se utilizar a regra, inicialmente, em áreas menores;

Muitas vezes, as ações de reposição e bolas paradas relativamente distantes do gol geram surpresas fatais (que terminam em gols) à equipe que está se defendendo, pois a mesma demora a se organizar após a interrupção do jogo, seja pelo apito do árbitro, seja pela saída da bola.

A equipe ter um mecanismo coletivo defensivo que aumente a incidência de recuperações da posse neste tipo de situação pode ajudá-la a cumprir a Lógica do Jogo. Sendo assim, nos treinamento, deve-se punir a ineficiência desta ação defensiva, pois, com o jogo interrompido, a equipe tem condições de partir da organização no caótico sistema-jogo. E como defender é mais fácil do que atacar, a referida organização deve recuperar a posse de bola ou, no mínimo, afastar a bola do próprio alvo.

Abaixo, alguns exemplos de regras:

•Toda reposição no campo de defesa em que a equipe que estiver com a posse de bola conseguir ultrapassar o meio campo com a bola dominada, por condução ou passe é ponto. Esta regra obriga o rápido posicionamento da equipe sem bola próximo ao setor da reposição, neutralizando adversários e regiões perigosos;

•Toda reposição de lateral cobrada no campo de ataque verticalmente (no sentido da meta adversária) em que a equipe que está com a posse conseguir dominar a bola, vale ponto;

•Toda cobrança de falta na região intermediária de ataque (entre as linhas 2 e 3) em que a equipe conseguir trocar dois passes verticais, invadindo o último quarto do campo, equivalem a ponto. Esta regra induz à rápida organização defensiva, evitando cobranças curtas que terminem em cruzamentos ou finalizações.

•Aumentar a pontuação do gol sofrido a partir de situações de reposição e bolas paradas;

Todo treinamento deve promover o enriquecimento do nível de desempenho coletivo apresentado pela equipe. Com isso, pretende-se que todos os atletas consigam interpretar os problemas que acontecem no jogo da mesma forma e que as interpretações coincidam com aquilo que são suas ideias de jogo. Para facilitar a interpretação dos problemas defensivos por parte dos jogadores, dominar as referências como, regiões do campo, adversários, bolas paradas, reposições e própria meta, será indispensável.

Se este processo for respeitado, seguramente, passos importantes para a vitória estarão sendo dados, pois, ratificando, defende-se bem para atacar melhor!

Para interagir com o autor: eduardo@universidadedofutebol.com.br

 

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Os incidentes ocorridos na reinauguração do Mineirão e os direitos do torcedor

No último domingo, 3 de fevereiro de 2013, enfim, o estádio do Mineirão, em Belo Horizonte, foi reinaugurado após reformas necessárias para receber partidas da Copa das Confederações e da Copa do Mundo. Para tanto, não poderia haver oportunidade melhor do que o maior clássico das "Minas Gerais", um Atlético e Cruzeiro, valendo pelo Campeonato Mineiro.

Entretanto, a organização do evento não correspondeu à sua magnitude. Os problemas começaram já na venda dos ingressos. Sistemas indisponíveis, desorganização e longas filas foram a tônica das vendas. Como se não bastasse, os ingressos estamparam nome incorreto do mandante. Ao invés de Cruzeiro Esporte Clube, constou Cruzeiro Futebol Clube.

No caminho do estádio não foi diferente. Vias congestionadas, filas para entrar no estacionamento, ausência de vagas, transporte público ineficiente. Para piorar, os novos estacionamentos do estádio, além de possuírem menos vagas do que o recomendado pela Fifa (que exige uma para cada seis torcedores), somente foram abertos duas horas antes da partida.

A isto soma-se o fato de não haver placas indicativas de localização e total desinformação dos orientadores que pouco sabiam informar.

Ao adentrar no estádio, os problemas não cessaram. Ao contrário, foram agravados. Havia apenas dois bares abertos para quase 60 mil presentes. Torcedores que se programaram para comer no Mineirão sofreram com a ausência de alimentos. A falta de água para vender foi agravada pelas imensas filas nos bebedouros e, mais tarde, pela interrupção no fornecimento de água.

Nos banheiros, não havia papel higiênico e tampa de vaso, além de estarem sujos e com inúmeras goteiras. Aliás, goteiras, paredes sem reboco, detalhes de construção inacabados encontrava-se em toda extensão do estádio.

Diante de todo caos, o esperado era que os orientadores estivessem preparados. Não obstante isso, os orientadores estavam completamente perdidos, não sabiam conferir as informações adequadas, não controlaram os assentos, deixaram de fiscalizar e permitiram que torcedores assentassem nas escadas, debruçassem nos parapeitos e circulassem livremente entre os diferentes setores e quem procurou atendimento médico surpreendeu-se com a informação de que só havia um posto médico.

Medidas simples de segurança, obrigatórias nos eventos da Fifa foram inobservados, como controle de ingressos metros antes do estádio, retirada de entulhos e escada de construção e controle de circulação de torcedores entre os setores.

Enfim, no que tange ao respeito dos direitos do torcedor, instalou-se um caos e uma tarde de diversão transformou-se em tortura. Muitos torcedores foram embora no intervalo.

Muito se fala da responsabilidade da Minas Arena, concessionária responsável pela administração do local. Entretanto, nos termos dos artigos 3º e 14 do Estatuto do Torcedor, o Cruzeiro, mandante, seus dirigentes e a Federação Mineira de Futebol, organizadora da competição, são corresponsáveis pela atenção aos direitos do consumidor no evento esportivo com a previsão, inclusive, de destituição e suspensão de dirigentes.

O artigo 28 do Estatuto do Torcedor determina que os alimentos tenham qualidade com preços não excessivos. O que se viu, foi a inexistência de alimentos para o volume de torcedores e preços extremamente abusivos com refrigerantes e picolés de fruta a seis reais.

Diante de tudo isso, restou clara a existência de vícios (defeitos) nos serviços prestados, o que enseja nos termos do artigo 20 do Código de Defesa do Consumidor (aplicável subsidiariamente ao Estatuto do Torcedor) restituição ou devolução na quantia paga.

Ademais, estes torcedores sofreram danos morais ao serem submetidos à falta de segurança, à falta de água, de comida, de banheiros adequados, enfim, às condições mínimas de permanência no evento esportivo. A isso, some-se o fato de que, apesar de ter havido venda diferenciada de ingressos, todos puderam compartilhar do espaço como um todo. Enfim, criou-se toda uma expectativa para uma tarde de diversão, que tornou-se um pesadelo.

A fim de buscarem o ressarcimento pelos danos sofridos, os torcedores devem procurar os órgãos de proteção às relações de consumo, como Procon e Juizados Especiais, bem como contatar advogado de sua confiança.

O que se espera é que os fatos lamentáveis não voltem a se repetir e que o cidadão prejudicado exerça seu dever de buscar nas autoridades competentes medidas repressivas e punitivas aos responsáveis, eis que o respeito aos direitos conquista-se pelo seu uso reiterado.

Apesar de ter errado ao receber a obra sem os ajustes finais, o Estado de Minas Gerais deu o primeiro passo ao multar a concessionária Minas Arena em um R$ 1 milhão pelo desrespeito aos torcedores.

Entretanto, as medidas contrárias aos responsáveis pelos fatos relatados devem se estender, eis que tem-se notícias de grupos de torcedores se organizando para adotarem medidas judiciais e de instauração de inquérito civil pelo Ministério Público de Minas Gerais.

Portanto, ante o exposto, percebe-se que houve graves violações ao Estatuto do Torcedor e ao Código de Defesa do Consumidor passíveis de punição e indenização aos torcedores/consumidores prejudicados.

Para interagir com o autor: gustavo@universidadedofutebol.com.br