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Futebol é bola na rede

Biz Stone, um dos criadores do Twitter, em entrevista à Revista Veja desta semana, afirma que o que desperta maior interesse em sua criação são assuntos relacionados às comunidades em que se encontram inseridas as pessoas. Em especial sobre seu microcosmo.

Como um clube de futebol, no qual a paixão é imensa, mas que podemos considerar como algo que provoca interesses específicos ao redor de uma causa, o Brasil tem demonstrado que dispõe de um caldo cultural ávido pelo relacionamento via redes sociais na internet.

O Twitter, no Brasil, é a quarta rede social em número de pessoas que a utilizam. E um dos principais aspectos positivos é a sua utilização como meio oficial de divulgação das informações das empresas: notícias sobre produtos lançados, eventos, promoções.

E o que não falta entre um clube e seus torcedores-seguidores é história pra contar. Alguns deles têm anunciado contratações e até demissões pelo Twitter. Mano Menezes que o diga, pois é uma das pessoas que tem mais seguidores entre todos.

Biz Stone vai além ao fazer uma comparação entre a internet e o telefone celular. Em outras palavras, a evolução ou depuração daquilo que entendemos como comunicação eficiente entre pessoas e empresas sobre o que elas fazem e a quem devem prestar informações sobre isso.

O futuro das redes sociais, preconiza, será de muito mais mobilidade, pelo uso ampliado do celular. Hoje, apenas 1,5 bilhão de pessoas têm acesso à internet no mundo, ante quatro bilhões com celulares nos bolsos. Qualquer pessoa fará parte de uma rede social no futuro, não apenas pela tecnologia de alcance, mas pela própria vontade.

Eu já sou protagonista dessa realidade. Fui ao banco resolver um problema trivial e saí da agência com o DDA autorizado. Débito Direto Autorizado. Todas as contas centralizadas no internet banking e e-mail, mas que também são comunicadas via celular.

E para meu espanto, o tempo que levou entre o clique do gerente no site para liberar o serviço e o recebimento da mensagem de boas-vindas em meu celular foi de dois segundos.

OK, você deve imaginar que futebol, redes sociais, internet e telefone celular são coisas que somente acontecerão daqui a 10 anos, a começar pelos clubes japoneses e coreanos.

Grande engano. O River Plate, no primeiro semestre, lançou o programa denominado Sócios Virtuais, que já prevê a interação entre marketing e tecnologia, entre os torcedores e o clube, numa base dupla de internet e telefonia móvel, com muita inteligência de marketing temperando o meio campo. Já atingiu a marca de 200 mil sócios e o novo museu terá interatividade com os telefones celulares dos visitantes.

No Brasil, temos 180 milhões de habitantes e 162 milhões de aparelhos celulares. Em cada 100 pessoas, tem-se, em média, 85 celulares.

Se considerarmos que de cada 100 brasileiros, 50 gostam e acompanham o futebol, os clubes têm muitos torcedores com celular no bolso, esperando por serviços inteligentes de relacionamento com suas paixões.

Meu caro, se não sabe do que estou falando – eu mesmo sei bem pouco disso tudo – é melhor conversar com alguém de uns 15 anos pra explicar melhor.

Vou ver se acho um sobrinho ou um primo pra me ajudar.

Para interagir com o autor: barp@universidadedofutebol.com.br

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Computação voluntária, um dia, quem sabe: open-football

Olá amigos. Antes que os mais exaltados se preparem, o termo futebol cooperativo não está conotando o aspecto da individualidade, da competição ou dos jogos cooperativos aplicados ao jogo, mas é muito mais no sentido de desenvolvimento de tecnologia e gestão.

Na última semana, durante uma discussão com colegas (naquela já velha e conhecida conversa de bar), surgiu o assunto computação voluntária. Os mais engraçadinhos falaram imediatamente de computadores que se dedicavam a ONGs e projetos voluntários. E apesar das brincadeiras não é que o assunto ganhou corpo?

Resolvi, então, verificar o que seria essa tal computação voluntária e trazer suas reflexões e possibilidades de aplicação para o nosso tão querido futebol.

No site G1*, existe uma série de artigos com definições sobre alguns termos do meio tecnológico. Não é uma fonte cientifica que possa nos dar uma real condição de avaliar e compreender a questão, mas serve de ponto de partida para o contato com o tema. Para quem se interessar vai a dica do portal mais famoso com projetos de computação voluntária: www.worldcommunitygrid.org.

Conceitualmente e conhecido internacionalmente como grid computing e entendido como um “… tipo de sistema de computação distribuída, geralmente associado a grandes projetos científicos, utiliza a capacidade de máquinas ociosas espalhadas pelo mundo para processar grandes quantidades de informação”*.

O funcionamento, como toda inovação, traz dúvidas e receios, mas, em suma, sua idéia permite com que grandes projetos, dentre eles os destaques sobre cura do câncer, Aids, dengue, etc, possam ser viabilizados.

“Esses projetos de grid computing rodam em máquinas que estejam ociosas, bastando que elas estejam ligadas. Normalmente, exigem a instalação de um pequeno programa (que se encontra no site da organização da pesquisa) que verifica se o computador não está sendo usado (esse é o momento em que você estará ajudando justamente quando não fizer nada). Aí, entra em cena um processo que baixa arquivos com dados a serem processados, processa os mesmos e envia os resultados para os organizadores da pesquisa. Caso você precise utilizar a máquina, o programa sai de cena liberando praticamente todo o poder de processamento do equipamento. Muitos deles proveem uma forma de visualizar a evolução do processamento”**.

Por alto, segue-se a tendência já discutida por nós sobre open-source, de criar comunidades abertas, colaborando para o desenvolvimento de tecnologias e soluções de utilização da capacidade intelectual ou estrutural/instrumental de diversas fontes.

Observando essas tendências, reflito e discuto suas possibilidades de desenvolvimento no futebol. Para que uma rede compartilhada de informação, desenvolvimento e estruturação funcione é preciso que os dirigentes do meio esportivo abram as mentes para a inovação, superando a tão chamada resistência à tecnologia, ou o que já discutimos sobre o processo digestivo do impacto tecnológico.

O próximo passo é definir os elementos comuns aos clubes e gestores que podem ser úteis a todos sem que seja estrategicamente inviável.

Alguns poderiam pensar se esse não seria o primeiro passo, pois desta forma seria mais fácil abrir a mente dos dirigentes. Mas temos que extrapolar o que é enraizado como estratégico para os clubes.

Muitos profissionais confundem informação estratégica com informação. O acesso à informação já deixou de ser um tabu no meio tecnológico, o grande segredo é o que fazer com essas informações, que envolvem uma pergunta estratégica: como ler tal informação? Esse o é limiar que deve estabelecer a construção de projetos compartilhados de futebol.

A informação básica é necessária para todos, por exemplo, dados sobre jogadores, desempenhos de equipes, se cada clube ou profissional desenvolver seus mecanismos, todos arcarão com o custo de desenvolvimento, o que é uma das etapas mais caras de qualquer tecnologia.

A partir do momento que consigo extrapolar a visão do que é estratégico, é possível pensar em compartilhamento do desenvolvimento tecnológico, gerando, desta forma, uma diminuição dos custos, “sobrando” dinheiro para investir no que é realmente estratégico: informações aprofundadas e a leitura dessas (seja por meio de componentes tecnológicos ou pela formação e capacitação de profissionais diferenciados que consigam transformar dados em informação).

Quem sabe, em breve, não surjam projetos de um futebol voluntário, ou um open-football ?

*http://g1.globo.com/Noticias/0,,MUL787321-15524,00-O+QUE+E+COMPUTACAO+VOLUNTARIA.html

**http://blog.brasilacademico.com/2009/09/computacao-voluntaria-cure-o-cancer-sem.html

Para interagir com o autor: fantato@universidadedofutebol.com.br

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Ponto corrido ou mata-mata?

A discussão voltou um pouco às manchetes nesta última semana, quando a Folha de S. Paulo e o colega Juca Kfouri levantaram a lebre de que a Globo voltou a mexer os seus pauzinhos para que o Campeonato Brasileiro deixe de ser em pontos corridos, retornando o mata-mata.

Bom, para começar, é preciso ver o que fazer com o Estatuto do Torcedor se isso vier a acontecer. A lei diz que ao longo do ano, ao menos um torneio nacional deve ter seu campeão decidido numa competição que seja em turno e returno. Não, isso não abre brecha para que se façam os dois turnos e, depois, as finais em mata-mata como deseja a Globo e uma parte da opinião pública.

Mas ignoremos a lei e sigamos com o debate. Afinal, pontos corridos ou mata-mata, o que é melhor?

A lenga-lenga de que “brasileiro adora final” é batida. Nos últimos anos, com economia estabilizada, times reforçados e promoção correta do torneio por pontos corridos, a média de público nos estádios só tem crescido. E olha que mesmo com o campeonato tendo o mesmo campeão nas últimas três edições houve esse interesse maior por parte do torcedor.

Não gosto de me ater à questão do mérito esportivo para defender os pontos corridos. Afinal, se um time quiser ser campeão, tem de estar preparado para bater todos os adversários, independentemente do formato da competição. E, além disso, regras são regras. Se estão combinadas desde o início, que o time se prepare a elas e vença.

O que discuto, realmente, é a questão financeira entre as diferentes fórmulas. Para um patrocinador, qual fórmula é mais interessante?

Nesse caso, a balança pende mais para o lado dos pontos corridos. Diferentemente do mata-mata, o torneio em turno e returno garante ao patrocinador a realização de 19 jogos do clube em seus domínios. Isso facilita o planejamento de ações por parte de clube e empresa. Se eu quiser criar uma promoção válida apenas para as rodadas 10 e 36, eu posso planejar com antecedência. E meu time com certeza estará na disputa.

O torneio mata-mata, pela imprevisibilidade maior que tem, não permite um planejamento de longo prazo do patrocinador. Nao dá a ele a certeza de que o time estará em exposição até o término do campeonato. Nos pontos corridos, mesmo sem a chance de conquista de título, um time pode fazer uma partida decisiva, que dê boa visibilidade ao seu patrocinador, por exemplo.

Da mesma maneira, para o clube, uma das piores coisas que podem acontecer é ficar sem atividade, mas precisando investir em atletas. Antigamente, um time corria o risco de em setembro ficar fora da disputa do Brasileirão e, mesmo assim, ter de pagar todos os atletas até o final do ano, sem ao menos ter uma fonte de receita para isso. No torneio por pontos corridos, mesmo que o time esteja cambaleante, ele continua a jogar, a levar torcedor para o estádio, a faturar com a venda de ingressos, etc. É uma forma mais racional de a “empresa” não ter de dar férias forçadas para todo mundo durante três ou até quatro meses!!!!

E, por fim, até mesmo para a TV essa discussão não é tão primordial assim. Jogar na fórmula de competição a queda de audiência dos últimos anos é uma tremenda bobagem. Em média, a TV aberta perdeu parte do alto índice que tinha pelo aumento da concorrência. Internet, TV a cabo, telefone celular, cinema, eventos… Tudo isso contribuiu para que as emissoras tivessem uma queda no número absoluto da medição do Ibope. Só que o share, que é o índice que mostra a audiência a partir do número de aparelhos ligados, continua a ser extremamente favorável, especialmente quando o assunto é futebol.

O torcedor se acostumou aos pontos corridos. E já sabe que, nessa disputa, todo jogo vale. A mídia também já sabe promover muito mais o campeonato com essa fórmula. Afinal, são várias “mini-decisões” apresentadas em jornais, internet e TV espalhadas pelo país. O jogo de domingo entre Palmeiras e Flamengo, por exemplo, foi um deles.

No final das contas, os pontos corridos trazem mais planejamento e menos imprevisibilidade para o futebol. São dois fatores essenciais para gerar mais receita a um clube. E, se bem administrado, esse time consegue trazer jogadores de maior qualidade para defender suas cores. E, consequentemente, isso empolga o torcedor, que passa a consumir mais o produto futebol, aumentando os índices de audiência e, também, a média de público nos estádios…

O resultado disso tudo, porém, nunca aparece de um dia para o outro. Mas, num ciclo de dez anos, será visível essa melhoria na economia da bola. Se tudo não cair por terra numa canetada que envolve muito mais a questão política do que técnica. Para variar. E atrapalhar!

Para interagir com o autor: erich@universidadedofutebol.com.br

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O treinador de futebol vs o jogo de futebol: quem vence essa disputa?

Não vou entrar em muitos detalhes, mas existem no jogo de futebol “forças” (não, não é nada sobrenatural! – são forças inerentes ao jogo, presentes em suas dinâmicas) que levam jogadores e equipes a configurar a ocupação dos espaços e as suas movimentações, de acordo com cada circunstância e problema emergentes nele (no jogo).

São essas forças que, mesmo sem treinamentos adequados, ou boas estruturas táticas, somadas à compreensão que o jogador tem do jogo, fazem com que equipes de futebol ainda sim apresentem aparente organização.

Elas, mais a inteligência de jogo dos jogadores e equipe, é que garantem o emprego de muitos treinadores Brasil afora.

Dia desses, por exemplo, assistindo a um jogo de futebol profissional conjuntamente com uma equipe especializada em análises de jogo, pude observar a glória de um treinador, mesmo com a manifestação real de sua incompetência.

Ao fim do primeiro tempo de jogo, o grupo que o analisava concluiu que certas regras de ação precisavam ser intensificadas por uma das equipes para aproveitar melhor as fragilidades do jogo da sua adversária no segundo tempo. Quase todas as sugestões giraram em torno de deixar o jogo mais rápido, vertical, com constante progressão ao campo de ataque, sem a preocupação com a circulação horizontal da bola.

Antes de começar o segundo tempo, tivemos acesso às instruções do treinador no vestiário, que dentre outras pérolas proclamou: “vamos ficar com a bola, temos que valorizar a posse dela, gastar o tempo e fazer o adversário cansar”.

Por incrível que pareça, totalmente o contrário do que havíamos concluído!

Mas as “forças” do jogo são realmente muito “fortes”! O que o jogo pedia era diferente do que o treinador queria.

Depois do seu reinício, cinco minutos de certa confusão. Claro, o jogo pedia um coisa, o treinador outra. Pobre treinador, sem aparente ascendência sobre seu grupo, foi vencido pelo jogo, e ficou se “esgoelando” na beira do gramado tentando fazer com que seus jogadores executassem aquilo que ele havia pedido no vestiário.

E os jogadores? Nada de jogo de posse de bola, com passes horizontais. Foi progressão ao alvo. Rápida e constante!

E sabem o que aconteceu? O óbvio. A equipe fez o que tinha que ser feito (o que infelizmente, não era o que queria o treinador; “sorte” dele), e goleou sua adversária.

No final, o básico: “glórias ao treinador”.

Por essas e por outras, concordo com alguns formadores de opinião da crônica esportiva futebolística: tem treinador que mais atrapalha do que ajuda…

Para interagir com o autor: rodrigo@universidadedofutefol.com.br  

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Centenário do Coritiba

Permita-me começar essa coluna prestando uma homenagem aos 100 anos do Coritiba Foot Ball Club, completados em 12 de outubro, clube que abriu as portas para que eu pudesse por em prática algumas das poucas coisas que eu conheço e aprender muito, mas muito mesmo, sobre como de fato funciona um clube de futebol.

E, acredite, é bem diferente daquilo que normalmente se imagina.

Os precisos e antecipadamente planejados 365 dias que eu fiquei no clube, de janeiro de 2008 a janeiro de 2009, abriram a minha cabeça sobre o funcionamento de uma associação esportiva e sobre a indústria do futebol como um todo. Fizeram com que eu entendesse pelo menos uma parte das razões que levam a indústria do futebol a assumir a forma que possui hoje.

Antes que você se questione, não. Eu não sou torcedor do Coritiba. Mas aprendi a respeitar a instituição e a sua centenária história. E talvez justamente por não ser torcedor, pude manter uma distância que me permitiu analisar as coisas de uma maneira mais fria, desprovida de emoções excessivas.

Essa distância me permitiu perceber quem são de fato os principais stakeholders de um clube, quem é que, efetivamente, pressiona e influencia o processo decisório e como o que importa, no fim das contas, é o resultado em campo, independente do meio necessário para se atingir isso. Sempre foi. Sempre será. No Brasil e em qualquer lugar do mundo que tenha futebol de primeiro nível, com raríssimas exceções.

Afinal, não se torce para um clube por outra coisa. O que se busca é a vitória. De preferência, no curtíssimo prazo. Se possível, em todos os campeonatos de que se participe.

E está aí justamente o que faz da indústria do futebol um fenômeno que não pode ser observado única e exclusivamente sob a ótica corporativa, tampouco financeira. Se um clube gera dinheiro, ele obrigatoriamente precisa gerar custo. No futebol, principalmente no modelo associativo, não existe superávit. Porque não há redistribuição de dinheiro. Porque, no fim das contas, ninguém quer ganhar dinheiro de volta. Pelo menos não aqueles de boa índole.

A peculiar verdade futebolística é que nenhum torcedor é consumidor. Porque ele não consome produtos. Ele paga para obter a glória refletida. E glória, no esporte, se alcança quase que unicamente através de vitórias. Ninguém consome banheiro limpo, arquibancada confortável, produto de boa qualidade. Não. Qualquer produto que eventualmente seja adquirido só o é por uma razão simbólica e não funcional. De que adianta uma linda camisa de um clube que nunca ganha ou ganhará nada? De fato, nada.

Essa linha de pensamento obviamente não é a ideal, muito menos a corrente entre o intelectualismo existente. Mas é a verdadeira. É a que move um clube de futebol. E não tem como fugir disso. Qualquer alteração nesse pensamento acabaria com a razão fundamental da existência de um clube de futebol. Não pensar primordialmente em obter glórias é uma desvirtuação de sentido de um clube de futebol. Porque ele existe essencialmente para isso. E muito pouco além.

Quem comanda um clube de futebol sabe muito disso. Sente na pele. Aprende. No dia a dia. Nos intermináveis elogios após uma vitória. Nas incansáveis críticas após uma derrota. Dói, mas eventualmente aprende.

Essa é a natureza de um clube de futebol. Pura e simples. Foi por isso que ele nasceu. É a sua essência.

Por isso que eu agradeço ao Coritiba por ter me aberto as portas para que eu pudesse entender esse indispensável ponto de vista. Sem a experiência que o clube me proporcionou, é possível que toda a minha pesquisa adotasse um viés completamente incompatível com a realidade dos fatos.

E sem entender a realidade, não há como sugerir melhorias factíveis.

Parabéns. E muito obrigado.

Para interagir com o autor: oliver@universidadedofutebol.com.br

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Um pouco da minha história…

Na revista Ludens (Outubro-Dezembro de 1979) do ISEF de Lisboa, escrevi um artigo intitulado “Prolegómenos a uma ciência do homem”, isto é, há trinta anos, onde defendia que “o desportista do futuro não vai ser aquele que pratica tão-só, mas aquele que compreende as práticas corporais como formas universais de inteligibilidade” e portanto com a consciência também da necessidade de uma ciência que confira paradigma científico e dignidade universitária aos jogos, aos desportos (e ao treino desportivo), à ginástica. A essa ciência, proveniente de um corte epistemológico, no seio da educação física, entrei de chamar ciência do movimento humano, referindo que se tratava de uma ciência humana, mas confundindo movimento com motricidade, pois que acrescentava que o objecto de estudo deste novo paradigma é o ser humano em movimento intencional.

Ora, movimento com intencionalidade, segundo a fenomenologia, é motricidade. Três anos depois, já falava, nas minhas aulas, na ciência da motricidade humana (CMH) e apresentava o método integrativo (ou da complexidade) como o adequado a esta área do conhecimento.

De acordo com Louis Althusser, se há uma nova ciência, há uma nova teoria, uma nova metodologia e uma nova prática. A teoria é a CMH, a complexidade é o método, e a prática é a totalidade humana, em movimento intencional e não o físico tão-só. Eu sei que nada do que adianto neste artigo é novidade. Mas foi-o, há trinta anos, quando se escrevia: “É no âmbito da fisiologia aplicada, fisiologia do trabalho muscular e fisiologia do exercício que a metodologia do treino desportivo tem a sua fundamentação científica” (Teotónio Lima, Alta Competição – desporto de dimensões humanas, Livros Horizonte, Lisboa, 1981, p. 122). Nesta altura, já eu adiantava que a fundamentação científica do desporto era uma nova ciência humana, onde o físico está integral, mas superado.

Assim, se o desporto é um sistema de acção complexo que exige uma análise sistémica de causalidades múltiplas – na visão global do desporto e na preparação do desportista há muitas dimensões a ter em conta, para além do que geneticamente se é: a física, a psicológica, a sentimental, a moral, a social, a política -, todas elas elementos irrecusáveis do desporto e do desportista! Era o tempo em que se valorizava, com admiração incontida, o futebol-total holandês do treinador Rinus Michels e do jogador Johan Cruyff.

Também, inspirado no futebol-total, os treinadores russos Lobanovsky e Vassiliev criaram, na década de 70, o chamado futebol científico, onde Blokhine era, de facto, um intérprete genial. “Flecha da Ucrânia” assim o cognominavam os jornalistas. E, não sendo um Cruyff, mostrava uma intuição genial. Com mais poder físico do que Messi, aproximava-se dele (sem o igualar), no improviso das fintas. Em 1975, foi distinguido com a Bola de Ouro, sendo assim considerado o melhor jogador da Europa. Mas o futebol científico morreu, logo que Blokhine deixou o futebol.

 

Conheça um pouco mais da história de Oleg Blokhine

 

É que o futebol científico fundamentava-se nos Fundamentos do treino desportivo e em O processo do treino desportivo, de Metvéiev, onde a importância dos factores técnico e táctico se subordinavam à lógica da adaptação funcional do praticante.

“À medida que se aperfeiçoa o processo de treino desportivo, especialmente as suas bases científicas e metodológicas, o seu conteúdo, a sua orgânica, as disponibilidades materiais e técnicas aumentaram o seu efeito, no nível geral dos resultados desportivos” escreveu este autor nos Fundamentos do treino desportivo (1977). Só que os factores dinâmicos da adaptação funcional são simples elementos, ao lado de uma multiplicidade doutros factores que compõe a complexidade humana. No conhecimento científico, hoje, sempre que se pensa em um aspecto da realidade, há muitíssimos outros a ter em conta, sem os quais ele não se entende. A ideia de relação é, hoje, uma ideia nodal. A complexidade é a multiplicidade dos elementos, em relação incontornável, constante.

Portanto, no desporto, o que é humano comporta uma dimensão físico-biológica e o que é físico-biológico integra uma dimensão humana. Criar um novo paradigma (neste caso, uma ciência humana), organizar o desporto à luz deste novo paradigma e apontar a necessidade de aprender a pensar de forma relacional, no desporto, foi talvez a grande novidade que eu, com o pouco que tenho e o quase nada que sou, trouxe para o desporto, há trinta anos. Nós isolamos os factores, para podermos estudá-los. A complexidade, ao invés, diz-nos que tudo está ligado, nada está isolado, tudo é interdependente.

*Antigo professor do Instituto Superior de Educação Física (ISEF) e um dos principais pensadores lusos, Manuel Sérgio é licenciado em Filosofia pela Universidade Clássica de Lisboa, Doutor e Professor Agregado, em Motricidade Humana, pela Universidade Técnica de Lisboa.

Notabilizou-se como ensaísta do fenômeno desportivo e filósofo da motricidade. É reitor do Instituto Superior de Estudos Interdisciplinares e Transdisciplinares do Instituto Piaget (Campus de Almada), e tem publicado inúmeros textos de reflexão filosófica e de poesia.

Esse texto foi mantido em seu formato original, escrito na língua portuguesa, de Portugal.

Para interagir com o autor: manuelsergio@universidadedofutebol.com.br

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Com o dinheiro dos outros

Desde logo, recomendo a quem não assistiu ao filme “Com o dinheiro dos outros”, que inspira a coluna desta semana, que o faça, para ajudar na compreensão da realidade financeira de nosso futebol, num paralelo interessante.

No longa metragem, Danny de Vito interpreta Larry Garfield, um investidor inescrupuloso de Wall Street, especializado em adquirir o controle acionário de empresas à beira da falência.

Para Larry, a única coisa que interessa é o lucro: quanto maior e mais imediato, melhor. Seu apelido é “o Liquidador”, pois compra e liquida empresas que não estejam sendo extremamente lucrativas.

Larry, o Liquidador, quer comprar ações da fábrica dirigida por Gregory Peck no filme – com a intenção final de fechá-la, vender as máquinas, e usar o terreno em alguma outra atividade na qual possa lucrar mais. Milhares de trabalhadores perderão seus empregos? Sem problema, diz Larry, pois o compromisso dele é com os acionistas.

Clubes de futebol, no Brasil, são, em sua maioria absoluta, associações civis sem fins lucrativos.

Isso não significa que não possam perseguir fontes de receita planejadas e duradouras, bem como financiamentos com bancos ou investidores capitalistas. A pergunta não é por que, mas, sim, como isso é feito.

Nessa semana, fiquei surpreso ao ler no jornal Zero Hora que até o cantor Gabriel, o Pensador, é parceiro investidor do Inter e tem jogadores no elenco sub-20 do clube. Disse que gostou da brincadeira e quer ampliar seus investimentos.

Diversos são os exemplos do futebol sendo destino de investidores. O Banco BMG já declarou que organiza um fundo de R$ 50 milhões, voltado ao mercado de direitos econômicos sobre jogadores. O Coritiba seria um dos clubes beneficiados.

A Traffic já realiza este modelo de negócios junto ao Palmeiras. O Grupo Sonda também desenvolve negócio similar com Santos e Inter. LA Sports opera no Paraná Clube e no Avaí.

Existem fatores importantes para atração de investidores, seja qual for o ramo de atividade econômica – o futebol não foge disso. A gigantesca captação na Bovespa, realizada pelo Santander, traduz o grau de confiabilidade dos acionistas na gestão do banco, na sua história, no seu planejamento de curto, médio e longo prazo, além do contexto macroeconômico do país e a perspectiva de realização de lucros e conseqüente distribuição de dividendos.

Quando se investe num clube de futebol, particularmente nos ativos de mais rápida valorização (jogadores), espera-se obter lucro dentro de um prazo contratual estipulado.

Os clubes, em geral, estão numa posição financeira fragilizada e necessitam de financiamento para suas operações, direta (dinheiro) ou indiretamente (projetos co perspectiva de receita futura). Eis a margem de especulações e descaminhos.

O clube não almeja o lucro. Almeja a sustentabilidade financeira. O investidor visa o lucro.

A acomodação destes interesses e dos prováveis conflitos não é simplória. Mas quanto mais transparente e regulamentada for (contratualmente), melhor.

Quem faz o quê. Quem investe. Quem administra. Quem vende. O que se vende. Quando se vende. Como se faz tudo isso.

Para interagir com o autor: barp@universidadedofutebol.com.br

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A graça do futebol

Assim como em qualquer modalidade esportiva, a essência do futebol é a imprevisibilidade. Não saber previamente o resultado de uma disputa é algo que confere uma das maiores graças ao esporte. E, mais do que isso, no futebol, o imprevisto geralmente é maior ainda, permitindo a um time muito inferior a outro alcançar a vitória que parecia improvável.

No último sábado, tivemos dois exemplos de como o esporte depende da imprevisibilidade para se tornar atraente. Claramente, o interesse do torcedor aumenta conforme a incerteza que há sobre o resultado de uma partida.

Na Vila Belmiro, o time feminino do Santos foi a campo enfrentar o Caracas pela Copa Libertadores. Em menos de 20 minutos já vencia por 5 a 0. No final das contas, terminou o jogo com uma goleada por 11 a 0, a segunda com dois dígitos na competição e, como sempre, com um show de Marta, Cristiane e Cia.

No mesmo dia, só que um pouco mais tarde, o estádio Monumental de Nuñes, em Buenos Aires, foi o palco de um dramalhão argentino. Jogando a esperança de classificação para a Copa do Mundo, a seleção comandada por Diego Maradona ganhava no sufoco de um débil time do Peru. O 1 a 0 era sustentado pela fraqueza do adversário.

Aos 45 do segundo tempo, o Peru empatou a partida, em meio a um temporal que impedia até mesmo o torcedor em casa de conseguir ver alguma coisa na TV. O desespero bateu na porta argentina ao mesmo tempo em que o torcedor, de qualquer nação, não desgrudava os olhos da telinha. Três minutos depois, com mais de oito jogadores dentro da área, a Argentina conseguiu a vitória, num gol de oportunismo de Martin Palermo. O resultado devolvia aos hermanos uma condição favorável na tabela.

Na saída de bola, um jogador peruano deu um chute do meio de campo. A bola bateu no travessão argentino, lance suficiente para revirar do túmulo San Martin, um dos ícones do país.

Sim, é isso mesmo. Um jogo que foi 2 a 1 teve muito mais descrição e emoção do que aquele que foi 11 a 0. Assim como o time do Santos, a Argentina era muito melhor do que o seu adversário. Mas as circunstâncias da partida fizeram com que um jogo entrasse para a história, enquanto o outro será apenas “mais um”.

O futebol depende da imprevisibilidade. Desde o início sabia-se que o Santos seria arrasador nessa Copa Libertadores feminina. Mas qual é a graça de já se conhecer o campeão de véspera? Muito mais interessante, para todos, é ficar na poltrona até o final, hipnotizado por uma disputa sem qualquer prognóstico de quem vai vencer.

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A cláusula penal no término antecipado, sem justa causa, de relações laborais no futebol

Caros amigos da Universidade do Futebol,

Antes de iniciar a coluna propriamente dita, me sinto na obrigação de abordar outra modalidade de justa causa. Aliás, uma das mais nobres justas-causas, e aquela que ocasionou a minha ausência nas últimas duas semanas. No último dia 1º de outubro, minha esposa e eu experimentamos a sensação única de ser mãe e pai pela primeira vez. Assim, esta coluna, não por ter um assunto específico, mas pelo momento em que é escrita, é dedicada ao pequeno Alexandre.

Muito discutimos neste espaço, sobre as peculiaridades das relações dentro do futebol e do esporte em geral, por conta do princípio da especificidade do esporte. Comentamos aqui que relações laborais, por exemplo, entre clubes e atletas não devem ser rigorosamente interpretadas perante a lei como qualquer outra relação dessa mesma natureza.

Os jogadores de futebol trabalham nos finais de semana, inclusive aos domingos, fazem pré-temporadas e concentrações por determinação do empregador, existe um mercado internacional envolvendo as transferências desses empregados para outros empregadores, entre tantas outras peculiaridades desta profissão.

Nesses termos, qualquer discussão que envolva uma relação no esporte, e, neste nosso caso, no futebol, deve sempre ser havida tomando-se certo cuidado, para que a lei não acabe por ser aplicada de forma desproporcional ou injusta a qualquer das partes.

Uma discussão importante nessa seara é a da aplicação da cláusula penal existente nos contratos de trabalho dos atletas profissionais de futebol. Cláusula essa que veio, historicamente, substituir o passe que anteriormente existia na relação entre clube e jogador, e que é, atualmente, disciplinada e regulamentada pela nossa Lei Pelé.

A cláusula penal visa, basicamente, estabelecer o valor a ser pago no término antecipado e unilateral de um contrato de trabalho de atleta profissional de futebol. Na letra estrita da Lei: o contrato “deverá conter, obrigatoriamente, cláusula penal para as hipóteses de descumprimento, rompimento ou rescisão unilateral” (art. 28, caput).

Interessante observar que o parágrafo primeiro desse artigo 28 estabelece que “aplicam-se ao atleta profissional as normas gerais da legislação trabalhista e da seguridade social, ressalvadas as peculiaridades expressas nesta Lei ou integrantes do respectivo contrato de trabalho”.

Isto porque a questão que se coloca é: a cláusula penal vale igualmente para rescisões sem justa causa, motivadas pelo jogador (em que o clube faria jus ao valor da cláusula), e também para rescisões motivadas pelo clube?

No recente entendimento do Tribunal Superior do Trabalho (TST), em ação envolvendo a rescisão sem justa causa de atleta do Vitória S.A., a cláusula penal deve valer apenas na rescisão motivada pelo jogador. De acordo com a decisão proferida no caso, caberia ao jogador, quando da rescisão por parte do clube, apenas as indenizações previstas pela legislação trabalhista e não a aplicação da cláusula penal.

Trata-se de uma decisão bastante polêmica, especialmente por conta da redação final do parágrafo primeiro acima transcrito, que abre espaço para disposição em contrário no próprio contrato de trabalho. O que seriam, para o TST, as eventuais peculiaridades integrantes do respectivo contrato de trabalho?

Nosso receio é o de que a interpretação futura dessa decisão coloque em desigualdade as partes em uma relação laboral, o que não é, evidentemente, indesejável.

Caso a cláusula penal fosse aplicada a ambas as partes, entendemos que, eventualmente, teríamos uma adequação dos valores à realidade, de modo a evitar uma majoração desmedida por iniciativa dos clubes. Com a decisão proferida, clubes poderão fixar sempre essas cláusulas penais nos seus tetos máximos, pois saberão, de antemão, que não arcarão, em qualquer hipótese, com esse valor.

Será que o princípio da especificidade do esporte foi devidamente observado para que a decisão em comento fosse tomada? Fica a questão.

Para interagir com o autor: megale@universidadedofutebol.com.br

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Comprando felicidade

Há meses atrás, participei de um debate sobre a Copa do Mundo de 2014, promovido pelo jornal Gazeta do Povo, aqui de Curitiba. Participaram, também, dois jornalistas e um professor de urbanismo da UFPR. O evento foi muito bem organizado e bastante interessante. O local estava lotado.

Mas talvez eu não devesse ter ido. Escapei de um linchamento público. De um tribunal de inquisição. Depois do debate, dei uma fuçada na internet para acompanhar a repercussão. Achei um ou outro comentário em alguns blogs pessoais. Todos os que eu li fizeram muito mal ao meu ego. Enalteciam o debate, mas reclamavam da minha opinião.

Pudera. Não fui nada otimista. Deixei bem clara a minha posição: nenhum estudo sério e independente aponta ganhos reais com a realização de mega-eventos esportivos para as localidades que o hospedam. Muito pelo contrário. Perde-se dinheiro. Algumas vezes um pouco. Muitas vezes, muito. No caso, era a Copa do Mundo. Mas poderia ser a Olimpíada.

A reclamação e as críticas a minha pessoa fazem total sentido. Ainda estou à mercê de uma titulação acadêmica. Por mais que esteja fazendo um doutorado, que já se arrasta há quatro anos, ainda não sou um Doutor. Um Dr. Um vírgula PhD. Minha qualificação como fonte de conhecimento ainda depende de um documento entregue e do crivo de uma banca. De fato, sou e represento muito pouca coisa. Não tenho titulação, tampouco ocupo uma posição de autoridade sobre qualquer coisa. A verdade é que qualquer um pode começar um doutorado, enrolar por um tempo e fingir que sabe alguma coisa. Por isso é justo que qualquer palavra ou conhecimento originado da minha pessoa seja visto com desconfiança. Eu mesmo não confio naquilo que falo.

Portanto esqueçamos a minha opinião. Foquemos no conhecimento alheio. Para buscar uma boa fonte de conhecimento, primeiro, é preciso confiar na plataforma em que esse conhecimento é publicado. Peguemos, assim, um grande jornal do Brasil. Aliás, pensemos grande. Pensemos no melhor, ou pelo menos no mais reconhecido jornal do planeta. Fiquemos com o The New York Times. Agora adicionemos um artigo escrito por alguma real autoridade no assunto. Melhor. Juntemos três. Tem-se, assim, três autoridades discutindo um mesmo tema no The New York Times. Acho que serve. Acho que dá pra confiar.

Pois bem. A primeira autoridade é Robert Barney, professor emérito e diretor do Centro de Estudos Olímpicos da University of Western Ontario, no Canadá, e autor de um livro sobre a comercialização das Olimpíadas. A segunda é Andrew Zimbalist, professor de economia do Smith College, uma reconhecida faculdade americana, e autor de diversos artigos e livros sobre economia esportiva, em especial, sobre estádios e outras estruturas. Por fim, a terceira autoridade é Victor Matheson, professor do College of the Holly Cross, uma das mais tradicionais faculdades americanas, e também autor de uma série de artigos sobre o impacto econômico de megaeventos esportivos. Serve? Ô.

E a qual conclusão chega o artigo do The New York Times sobre o impacto econômico das Olimpíadas para a cidade sede com três autoridades renomadas sobre o tema?

À única possível: megaeventos esportivos, como as Olimpíadas e a Copa do Mundo, dificilmente trazem algum impacto econômico positivo para quem os hospeda. A não ser que os investimentos possuam um grande apelo de massa após o fim dos jogos, o que raramente acontece, as estruturas viram “elefantes-brancos”. Isso aconteceu em Montreal, Seul, Barcelona, Atlanta, Sydney, Atenas e vai, eventualmente, acontecer em Pequim. Se uma cidade pretende ser revitalizada economicamente, o que me parece ser uma necessidade do Rio de Janeiro, existem maneiras melhores para se investir o dinheiro.

Mas não basta dizer, claro. É preciso apresentar dados. Vamos a eles:

– A Olimpíada de 1976, em Montreal, deixou a cidade com uma dívida de US$ 2,7 bilhões que só teve a sua última parcela paga em 2005;

– O Comitê Olímpico (CO) de Barcelona ficou empatado, sem ganho e sem dívida, mas o débito público decorrente dos Jogos de 1992 foi de US$ 6,1 bilhões;

– O CO de Atlanta também ficou na mesma situação. Mas, estudos econométricos indicam que houve ganhos insignificantes em vendas no varejo, em ocupações dos hotéis e no tráfego do aeroporto, durante os Jogos;

– O CO de Sydney também empatou, mas estimativas sugerem que o custo de longo prazo dos Jogos foi de US$ 2,2 bilhões, principalmente, porque custa US$ 30 milhões por ano para manter o Estádio Olímpico.

– Os Jogos de 2004, em Atenas, custaram US$ 16 bilhões, dez vezes mais do que o estimado. Os estádios nunca voltaram a ser devidamente utilizados. O custo de manutenção das estruturas no ano seguinte aos Jogos foi de US$ 124 milhões. A dívida acumulada pelo evento foi de, aproximadamente, US$ 75 mil pra cada domicílio no país. Pior, o fluxo de turistas para a cidade diminuiu 10% durante os Jogos, em relação ao mesmo período em outros anos.

Enfim. Está aí. Não sou eu, um pretendente a uma titulação acadêmica, dizendo que a Copa ou a Olimpíada não trazem dinheiro. É gente que entende sobre o que está falando.

Isso não quer dizer que seja ruim hospedar uma Copa ou uma Olimpíada. Claro que não. Muito pelo contrário. É claro que é legal. É claro que esse tipo de coisa traz felicidade para cada cidadão. Mas essa felicidade tem um preço. Que pode ser bem caro. E deixar muita gente bastante infeliz no futuro.

Para interagir com o autor: oliver@universidadedofutebol.com.br