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A tirania da idade no processo de seleção, formação e detecção de talentos

Como havia adiantado na última semana, durante todo o mês de junho esta coluna será dedicada a discutir assuntos relacionados à seleção, detecção e formação de talentos. O tema desta quinta-feira será a idade como fator de desempenho no futebol de base.

O sucesso no futebol é multifatorial e depende de aspectos coletivos e individuais. No aspecto coletivo, entre outros fatores, destacam-se: entrosamento, inteligência de leitura de jogo e aplicação tática da equipe. No aspecto individual, destacam-se qualidade técnica das habilidades motoras abertas e fechadas (manejo de bola, condução, passe, chute, cabeceio), aplicação tática individual, qualidade das capacidades motoras condicionais (flexibilidade, velocidade, força, potência, resistência anaeróbia e aeróbia) e qualidade das capacidades motoras coordenativas (diferenciação sensorial, observação, representação, antecipação, ritmo, coordenação motora, controle motor, reação motora e expressão motora).

Embora algumas destas classificações sejam mais didáticas do que práticas, indiscutivelmente o período pré-pubertário é a fase ótima para o desenvolvimento das capacidades coordenativas enquanto que o desenvolvimento das capacidades condicionais deve ser priorizado no período pós-pubertário.

Neste aspecto é imprescindível que o processo de detecção, seleção e formação de talentos adote critérios claros para se determinar o período maturacional de cada jogador. Geralmente, as estratégias adotadas para este fim são a utilização de exames laboratoriais de hormônios sexuais, desenvolvimento glandular, avaliação médica, períodos de dentição, velocidade de crescimento da estatura, período de menarca ou espemarca, pilosidade tegumentária de genitais, auto-avaliação das características sexuais secundárias e desenvolvimento ósseo.

O problema é que tais características se manifestam em diferentes idades cronológicas de modo que crianças ou adolescentes com mesma data de nascimento podem apresentar diferentes estágios maturacionais. Assim, indivíduos com atraso maturacional podem sofrer desvantagem no processo de formação já que fisicamente apresentam desvantagem em relação aos que se encontram em estágios mais avançados de maturação.

Um estudo recém publicado por Augste e Lames (2011), investigou o efeito da idade cronológica na seleção de jogadores alemães sub-17. Após analisarem 911 jogadores de 41 equipes diferentes, constatou-se que os times compostos por jogadores de idades mais avançadas tendiam a ter melhores colocações no ranking.

Esse aspecto pode ser um indicativo de que o processo de formação está equivocado, já que muitas vezes o desempenho pode estar baseado apenas na vantagem física apresentada por jogadores mais velhos, a qual tenderá a desaparecer na idade adulta e deixar de ser diferencial.

Com estas informações, a questão parece mais uma vez estar atrelada aos objetivos que se tem em cada clube. Se a categoria de base servir para ganhar títulos, devem-se privilegiar jogadores mais velhos com maturação adiantada. Se for para formar jogadores em longo prazo, outros aspectos além da idade e da maturação devem ser avaliados. Mas este será assunto para as próximas semanas…

Então até a próxima semana!

Para interagir com o autor: cavinato@universidadedofutebol.com.br  

Referências bibliográficas

Augste C, Lames M. The relative age effect and success in German elite U-17 soccer teams. J Sports Sci. 2011 Jun;29(9):983-7.

Helsen WF, Starkes JL, Van Winckel J. Effect of a change in selection year on success in male soccer players. Am J Hum Biol. 2000 Nov 1;12(6):729-735.

Helsen WF, van Winckel J, Williams AM. The relative age effect in youth soccer across Europe. J Sports Sci. 2005 Jun;23(6):629-36.

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