Conforme tratamos na semana passada, o futebol brasileiro proporcionou um dos lances mais bizarros e surreais da história do futebol na partida disputada entre o Tupi de Juiz de Fora e a Aparecidense de Goiás pelas oitavas de final da Série D do Campeonato Brasileiro.
No julgamento, ocorrido nesta segunda, atendendo ao pleito do advogado do Tupi, o STJD desqualificou o fato do artigo 243-A para o 205, e determinou a eliminação da Aparecidense, razão pela qual o placar do jogo, que terminou empatado por 2 a 2 depois que o massagista evitou o terceiro gol do clube mineiro, foi alterado para 3 a 1, garantindo ao time de Juiz de Fora a vaga à próxima fase.
Veja o que estabelece o art. 205, do CBJD:
Art. 205. Impedir o prosseguimento de partida, prova ou equivalente que estiver disputando, por insuficiência numérica intencional de seus atletas ou POR QUALQUER OUTRA FORMA (grifo nosso).
PENA: multa, de R$ 100,00 (cem reais) a R$ 100.000,00 (cem mil reais), e perda dos pontos em disputa a favor do adversário, na forma do regulamento.
§ 2º Se da infração resultar benefício ou prejuízo desportivo a terceiro, o órgão judicante poderá aplicar a pena de exclusão do campeonato, torneio ou equivalente em disputa.
Tanto a Aparecidense quanto a Procuradoria irão recorrer da decisão. Segundo o presidente do clube goiano, a equipe foi incursa em um artigo que não condiz com a realidade, eis que não teria havido impedimento à continuidade do jogo.
No que tange à Procuradoria o entendimento é de que o ocorrido estaria previsto no artigo 243 (atuar de forma contrária à ética desportiva, com o fim de influenciar o resultado de partida, prova ou equivalente), o que faria com que a partida fosse anulada, já que a partida chegou até o final e não foi paralisada no meio.
Apesar de toda a polêmica e de todo debate e embate jurídico, a decisão do STJD é emblemática, especialmente neste momento em que no âmbito judiciário, a Corte maior do país divide-se entre o tecnicismo e a moralidade. No caso da partida entre o Tupi e a Aparecidense, a corte maior do desporto ocupou-se de aplicar o princípio da moralidade (previsto no art. 37, da Constituição Brasileira) em detrimento do tecnicismo jurídico, inclusive, citando Aristóteles..
Ora, caso ocorra nova partida, a Aparecidense terá o benefício de tentar a classificação, apesar dos meios não convencionais utilizados para evitar o gol do Tupi e a decisão do STJD coloca a moralidade e a lisura desportiva no seu prumo, apesar a interpretação extensiva (ao extremo) do art. 205, do CBJD.
O que falta neste país são pessoas de fibra dispostas a fazer diferente, a sair da mesmice e buscar caminhos e soluções alternativas para a crise moral que assola o Brasil. Se hoje os EUA são o que são é porque um dia homens como George Washington e Abrahan Lincoln não pouparam esforços para colocar o país nos trilhos da honestidade.
O fato é que independente do resultado final, a decisão do STJD mostrou que é possível sim aplicar a legislação brasileira de forma principiológica atentando-se à moralidade das instituições, como bem destaca o jurista uruguaio Eduardo Couture:
"Teu dever é lutar pelo direito, mas no dia em que encontrares o direito em conflito com a justiça, luta pela justiça".