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Os mitos fundadores da Modernidade

No início histórico da sua prática, o desporto sempre foi uma regalia, quer da nobreza, quer da burguesia que, na sociedade classista ocupou o lugar daquela, Isto não quer dizer que o burguês do século XIX, nas suas horas de ócio, se tenha convertido no caçador, ou no cavaleiro, como o nobre em largo troço da História.

A sociedade evoluíra; o progresso técnico aumentava; o capitalismo assenhoreava-se, progressivamente (e pela força das armas), do mundo todo – o burguês, mais do que nobre, interessa-lhe passar por gentleman, com uma visão da sociedade, alicerçada no “laissez faire, laissez passer” e procurando semear esta floresta de enganos, donde ressalta a ideia que a democracia participativa e o liberalismo económico sempre coexistem. O Doutor Mário Soares já o disse claramente, no seu livro Dois Anos Depois (Editorial Notícias, Lisboa, 1998, p. 105): “Acrescente-se que não é legítimo estabelecer uma conexão necessária entre economia de mercado e democracia. Se é certo que não há exemplo de democracias plenas, sem economias de mercado (foi a lição que o Mundo tirou do colapso generalizado dos países comunistas) a inversa não é verdadeira, visto que há casos de ditaduras que conseguem obter apreciáveis índices de crescimento económico, pelo menos a curto prazo”.

Mas o Doutor Mário Soares poderia explicitar quais os países onde há “democracia plena”, visto que a democracia económico-social e a democracia participativa e directa não se sabe onde existam, por esse Mundo além. Por isso, a economia está aí ao serviço dos imperativos do mercado e não ao serviço das necessidades de todos e cada um dos cidadãos. A finança desregulamentada trouxe consigo a incontrolada “tirania dos mercados”. E, assim, subordinada à vigilância e à sanção dos mercados, a solidariedade social morre, por maior que seja a boa vontade de alguns governantes.

Como se sabe, os USA são, hoje, o bastião do neo-liberalismo e do famigerado free market global. Ora, a América do Norte é um país marcado e corroído, por insanáveis contradições estruturais. Ao lado do peso crescente dos neo-conservadores e da sua predisposição para uma sociedade classista e para a guerra imperialista (veja-se a guerra do Iraque), a sociedade americana enfrenta, hoje, uma cada vez maior insegurança na economia, que resulta em desemprego e em emprego precário e no aumento espantoso das desigualdades.

Como Le Monde Diplomatique já o acentuou: ”nos USA, o aumento da criminalidade, proveniente do fosso que se vem cavando entre ricos e pobres, faz do Estado norte-americano um Estado carcereiro, ou seja, a população dos condenados a prisão, por homicídios e roubos, cresce assustadoramente”. Ainda que o Sr. Obama porfie em aparentar o contrário. Precisamos, pois, de forma imperiosa e urgente, rever os mitos fundadores da Modernidade, incluindo aquela doutrina da Democracia Representativa, como nova religião, quando sabemos que ela não finda com as desigualdades. Digamo-lo, sem receio: porque os governantes estão, normalmente, ao serviço, mesmo que o não pensem, dos “grandes interesses”, as políticas (uncluindo as desportivas) visam, em primeiro lugar, o lucro e só depois as pessoas. Demais, em total cumplicidade com os governos, a Igreja Católica ainda não varreu da sua doutrina a tese: “Omnis potestas a Deo” (todo o poder vem de Deus), o que leva, sem se dar por isso, à divinização do Poder, aqui e além constituído por verdadeiros adversários da democracia participativa. Aliás, os governos do fundamentalismo islâmico dizem o mesmo, com os resultados que todos conhecemos…

Na Europa, a partir da Idade Moderna, foram o experimentalismo demiúrgico e as revoluções científicas que predominaram, em desfavor das transformações sociais. Mesmo no desporto, o que mais se aplaude não é um verdadeiro desporto-para-todos, decorrente de uma sociedade-para-todos. Mas os recordes e os desempenhos espantosos, grande parte deles empoleirados na prática habitual do “doping”.

É verdade: o desporto que admiramos, embevecidos, é, aqui e além (não sempre, evidentemente) uma verdadeira mentira. Quando, em 1988, o treinador de Ben Johnson (conhecido pelo Químico) asseverou, em pleno tribunal, que a maioria dos atletas norte-americanos competiam dopados, anteviu o que, anos depois, é verdade insofismável: na alta competição, o doping é praticado por muitos atletas que nela participam. De facto, há um esteróide sintético que não só aumenta a massa muscular e reduz a fadiga, mas também ainda é indetetável por qualquer controlo anti-doping. Daí, as vitórias espantosas de alguns atletas, nos Mundiais e nos Jogos Olímpicos!

É preciso rever os mitos fundadores da modernidade… incluindo no desporto. Aceito, com naturalidade, que se recuse, como interpretação verosímil, o que venho de escrever. A sociedade do espetáculo, que é a nossa, queda-se no espetáculo, isto é, no fenómeno, e quase nunca desce à essência. Como canta o poeta: “Ver as coisas por fora / é fácil e vão. / Por dentro das coisas / é que as coisas são”.

 

*Manuel Sérgio é antigo professor do Instituto Superior de Educação Física (ISEF) e um dos principais pensadores lusos, Manuel Sérgio é licenciado em Filosofia pela Universidade Clássica de Lisboa, Doutor e Professor Agregado, em Motricidade Humana, pela Universidade Técnica de Lisboa.

Notabilizou-se como ensaísta do fenômeno desportivo e filósofo da motricidade. É reitor do Instituto Superior de Estudos Interdisciplinares e Transdisciplinares do Instituto Piaget (Campus de Almada), e tem publicado inúmeros textos de reflexão filosófica e de poesia. 

 

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Copa do Mundo: Brasil vs México

Esta semana, Brasil e México disputam a liderança do grupo e quem vencer dará um passo importante para a classificação.

Se não houver vencedor na outra partida do grupo, entre Croácia e Camarões, uma vitória simples de uma das equipes é suficiente para garantir uma das vagas da chave nas oitavas de final da Copa do Mundo.

O México, protagonista contra a seleção de Camarões, apresentou bons comportamentos de jogo que, se aplicados contra o Brasil, podem proporcionar um confronto de sistemas (e não somente de esquemas) bastante interessante. Na sequencia serão discutidos alguns deles:

Organização Ofensiva

 

Em Organização Ofensiva contra a equipe de Camarões, o México abriu o campo e optou pelo jogo construído.

Com passes curtos dos três defensores a bola chegava ao campo de ataque com facilidade, pois a pressão no portador da bola feita pela seleção camaronesa iniciava somente a partir da sua intermediária defensiva.

Para gerar desequilíbrio nas linhas de defesa, Vásquez foi opção de passe para trás para mudar o corredor de jogo e Giovani dos Santos era o principal jogador a receber entre linhas e jogar a um toque.

Os cruzamentos pelo setor direito com Aguilar e as tabelas no corredor central com a participação de Giovani foram, com bola rolando, as ações mais perigosas da equipe de Miguel Herrera.

 

Uma nítida diferença que poderemos observar em relação ao jogo anterior será a linha de marcação da seleção brasileira. Com pelo menos 35 metros mais adiantada do que a de Camarões, fica a expectativa se a seleção mexicana sob maior pressão de espaço e tempo tentará propor o jogo a partir da posse de bola.

Segundo estatísticas da FIFA, Contra Camarões o México trocou quase 600 passes e foi efetivo em 484 (81%).

Outro elemento interessante do jogo, relativo à organização ofensiva mexicana e defensiva brasileira diz respeito aos jogadores que irão pressionar os zagueiros. Se estas regras de ação forem feitas exclusivamente por Fred e Neymar, Oscar e Hulk irão compor as duas linhas de quatro sem bola e dificultar a descida pelos lados de Layún e Aguilar como mostra a figura abaixo:

 

Com o lado oposto negligenciado pela seleção brasileira, correta indução de Fred ao zagueiro portador da bola para não permitir a circulação e o fechamento da linha de passe ao volante central, a Organização Ofensiva mexicana pode ficar encurralada e ser forçada ao passe longo; pouco utilizado no jogo contra Camarões.

Neste caso, o sucesso da fase de construção dos mexicanos dependerá da abertura de linha de passe e da rápida circulação no campo de defesa para, do lado oposto aproveitar a superioridade numérica.

Outra possibilidade para a seleção brasileira é subir a marcação também com o extremo do lado da bola e, dessa forma, tentar forçar o erro adversário e/ou a recuperação da posse no campo de ataque. Para isso, as regras de ação supracitadas geram maiores riscos do lado da bola se não forem corretamente aplicadas:

 

Com mais jogadores no campo de ataque, pode ficar mais difícil para a seleção mexicana realizar a circulação.

Com a pressão do atacante do lado da bola no zagueiro mexicano, provavelmente os laterais brasileiros (também do lado da bola) deverão subir uma linha de marcação para evitar a superioridade numérica do adversário. Caso isso aconteça, abrem-se espaços nas costas dos laterais para diagonais de Herrera, Guardado e Peralta.

Tais movimentações não foram observadas contra Camarões, pois, como mencionado, a seleção africana baixou suas linhas (permitindo cruzamentos e o jogo apoiado na entrada da área).

Organização Defensiva


 

Uma das grandes expectativas em relação à equipe mexicana e seu 1-3-1-4-2 incide no posicionamento sem bola de Aguilar e Layún. Subirão para impedir o jogo de Marcelo e Daniel Alves ou, assim como muitas seleções têm apresentado nesta Copa do Mundo, formarão uma linha de 5 (juntamente com Rafa Marquez, Moreno e Rodriguez)?

A linha de marcação estabelecida contra Camarões foi feita a partir da intermediária ofensiva. Se assim permanecer, alas adiantados no lado da bola deve ser a opção escolhida. Se não quiserem propor o jogo, a segunda opção deverá ser observada. Nas imagens abaixo, as duas opções:

Ala adiantado no lado de bola e ala oposto compondo a linha de defesa

Bloco baixo e a linha de 5 numa proposta mais defensiva

Que Brasil vs México seja mais um dos belos jogos desta Copa! Quais são suas expectativas? Aguardo sua opinião por e-mail.