Quando falamos de esportes coletivos, falamos de equipe, uma união de jogadores com a finalidade de conseguir algo em comum. Todavia, cada jogador tenta alcançar o que é melhor para si, trabalhando no/e para o coletivo, assim como o coletivo tem que extrair o melhor de cada jogador para alcançar o seu propósito enquanto instituição. No intuito de pôr em ordem diversos jogadores, distintos objetivos (que podem se contrariar) e principalmente diferentes formas de interpretar, pensar e “gostar” do jogo de futebol, há a necessidade de organizar esse emaranhado de elementos que constituem o grande fenômeno futebol. Organizar no sentido de tomar forma regular. Equipe com um perfil frequente ao longo do jogo e dos jogos. Regularidade que advém dos hábitos da equipe e do jogador. Hábitos que se adquirem na prática (ecoando, aqui, algumas reflexões de uma coluna anterior).
Portanto, o que dá corpo a “organização” é o que acontece no treino. Contudo, primeiramente precisamos nos desvencilhar da interpretação convencional de “treino”. Devemos pensar o “treino” como prática, sobre o que fazemos diariamente, o que estamos nos habituando a fazer. Tudo aquilo que acontece antes do jogo, com o objetivo de se preparar para este jogo. E nisso entra os exercícios, as orientações, a comunicação (fator crucial), a convivência, as interações, dia a dia, etc. Podendo estes fatores serem arquitetados deliberadamente ou não. Premeditados pelo treinador (ou qualquer outro agente do meio) ou simplesmente fruto das interações dos jogadores (o hábito da convivência edifica, em certo nível, a organização do coletivo). Com essas peculiaridades, o que causa mais inquietação e indagação é a própria construção da organização. Por isso o treino é indispensável. Tudo que precisamos para estruturar uma organização (que pretendemos). Ao meu ver, neste fator que se encontra um dos grandes pontos a ser melhorado em nosso futebol, o treino. Precisamos nos dedicar mais para compreender melhor o treino. Precisamos treinar mais aquilo que queremos fazer no jogo. O treino faz a competição. Treinar de uma determinada forma para jogar desta maneira. Treinar para alcançar aquilo que queremos.
A organização da equipe vem do que ocorre no treino. Aquilo que acontece no treino vai definir a qualidade da organização. Se é oriundo das ordens (ideias pré-concebidas, principalmente pelo treinador) ou da espontaneidade das interações dos jogadores. Se pretendemos uma organização mais complexa (flexível e adaptativa) é preciso saber “consertar” esses convívios. Fazer com que cada jogador faça o seu melhor dentro de uma perspectiva coletiva. Caso se pretenda uma organização mais rígida, quanto mais “ordens”, principalmente de caráter terminante, melhor.
Não sou apologista de deixar “a reveria” o treino. Contudo, precisamos entender que ordens (ideias, princípios, etc.) limitam, coíbem, de uma certa maneira, o desregramento, a desordem. Esta que se manifesta na criatividade, autointerpretação, na tomada de decisão do jogador no jogo. Não obstante, precisamos lembrar que o jogador deva tomar a melhor decisão para ele e o grupo. Pois, a decisão dele depende e é influenciada pela decisão do(s) outro(s) jogadores. Provavelmente essa seja a diferença entre “liberdade” e “libertinagem”.