O Brasil reverencia hoje o futebol do Grêmio. Alguns, mais exagerados, dizem que é nível top europeu. Outros, mais descrentes, argumentam que não se trata nada além de um time apenas bem armado, cheio de jogadores que não vingaram em lugar algum e que só está bem porque as outras equipes são muito medíocres. Juro que já ouvi as duas opiniões. Discordo das duas. Nem oito e nem oitenta. Mas prefiro ressaltar mais os pontos positivos do time do técnico Renato Gaúcho do que alguma possível deficiência.
Primeiramente: a ideia de jogo. O que está por trás de todo esse bom futebol gremista é o gosto pela bola. A proposta ofensiva. O conceito de querer jogar por entender que isso deixa a vitória mais próxima e mais palpável.
Todo ser humano, e aqui no nosso caso incluo times, busca um objetivo ou para se aproximar do prazer ou para se afastar da dor. Ou se é proativo ou reativo. Na vida. No futebol. E nossos times, quebrando toda a história e tradição do futebol brasileiro, preferiram fugir da dor (da derrota) e serem reativos (esperar a ação do adversário). Evoluímos em organização ofensiva. Reconheço isso. Mas não me parece muito lógico você não investir tempo e energia em maneiras de atacar sendo que isso é que te levará a vitória, dentro da lógica do jogo.
Entendido o ‘conceito-mãe’ do futebol gremista dá para entrar em alguns pormenores, mas que são igualmente importantes. Esse jeito de jogar não é de Renato Gaúcho. Não é de Róger Machado, ex-treinador da equipe. É do clube. É da instituição. O Grêmio se propôs a jogar dessa maneira. Tudo que acontece no clube influencia no modelo de jogo praticado em campo. Todos tem influência. Do presidente ao porteiro. Se vier outro treinador, as ideias de jogo não vão mudar. Isso é convicção. É traçar um caminho e não sair dele, independentemente se algum resultado negativo aparecer no meio do processo.
E coloco ainda a qualidade na execução dos conceitos. O ataque organizado, com troca de posição, amplitude, apoio e infiltração não é obra do acaso. Assim como a excelente transição defensiva, em que claramente a equipe busca retomar a posse de bola em alguns poucos segundos. Tudo isso é fruto de uma maestria da metodologia de treinamento e da análise de desempenho.
O Brasil se auto-intitula o país do futebol. Isso até teve um certo sentido quando realmente dominamos o mundo com o nosso jeito de jogar. E esse jeito justamente privilegiava o que o Grêmio vem fazendo agora. Talvez então o surpreendente não seja o que o time gaúcho vem fazendo. A surpresa seja nós ficarmos surpresos quando apenas algumas poucas equipes fazem isso.
Ano: 2018
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Futebol para todos os gostos

A grande quantidade de eventos relacionados ao futebol em um fim de semana destes não chega a ser surpreendente. Entretanto, ao parar para contar quantos foram e sobre o que trataram, dá-se conta de que o “marketing” relacionado ao futebol permite inúmeras possibilidades de produtos. Por “marketing” entende-se como sendo aquilo que será colocado no mercado e que gera uma relação de troca. Geralmente bens e serviços oferecidos, por retorno financeiro e conhecimento.
Os produtos são os mais diversos: desde jogos até seminários; de inaugurações de estátuas a sessões de autógrafos; de eventos acadêmicos a espetáculos de humor relacionados ao futebol, com passagem por um encontro de colecionadores de camisas e de trocas de figurinhas. São vários, certamente. Percebe-se dentro da indústria do futebol a existência de públicos-alvo determinados, uns grandes e outros pequenos. Aquele do torcedor mais fanático que vai em todos os jogos e só quer saber do jogo, outro do mais comedido e que consome tudo relacionado ao clube (ou tudo relacionado ao futebol de diversos países e ligas); aquele que só lhe interessa o futebol do exterior; outro que é colecionador; um mais “estudioso” que prefere as discussões relacionadas a pesquisas e eventos para desvendar os segredos do esporte, quer seja no treinamento, no rendimento, na participação, no Direito ou na Gestão. Já alguns outros são apaixonados pelo futebol e a pela cultura gerada em torno dele.
A especialização das funções, a quantidade de informação disponível, a busca por mais conhecimento e uma gradual abertura da indústria do futebol são fatores que permitem esta variedade de temas relacionados à bola. Outrora fechado (ainda é, mas antes era muito mais), aos poucos trabalhar com o futebol não tem sido restrito. Fazer futebol de rendimento é caro e a busca por mais consumidores, diária. Gradativamente se adquire uma cultura de mercado e mais pessoas passam a se envolver com ele de maneira profissional, uma vez que esta busca por consumidores passa por todos os públicos-alvo e nichos de mercado acima citados. São exemplos os “e-sports”, os museus temáticos, grupos de estudo e eventos acadêmicos.
O futebol existe para todos os gostos e é preciso comunicar-se com todos eles. A comunicação com um viés estratégico é capaz de agregar valor a uma marca e conferir credibilidade a um produto, assunto que já foi aqui tratado por diversas vezes. Às vésperas de uma Copa do Mundo, os eventos e iniciativas relacionadas ao esporte acontecem com uma frequência ainda maior e são certeza de sucesso: além do bom público, a comunicação por eles realizada antes, durante e depois permite com que mais pessoas estejam envolvidas. Ao mesmo tempo que o futebol não está restrito às quatro linhas, é a partir delas que todo um universo de possibilidades é construído. E é infinito.
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Prioridades
Não é exagero dizer que o Grêmio de Renato Gaúcho abdicou da chance de disputar o título do Campeonato Brasileiro em 2017. Com um elenco que era como um cobertor curto, o treinador decidiu priorizar a Copa Libertadores, tirou os titulares do certame nacional sempre que se viu em maratonas de partidas e acabou premiado com a taça da competição continental. Até por isso, a vitória dos gaúchos por 5 a 1 sobre o Santos no último domingo (06) foi uma triste constatação para quem acompanha o futebol nacional: estamos diante de uma das maiores equipes que o clube tricolor já forjou, que reúne talentos como Arthur e Luan, mas o acesso a esse produto de alta qualidade acaba limitado por uma série de fatores externos.
Renato herdou de Roger Machado um Grêmio que tinha vocação para trocar passes e se movimentar em espaços curtos, mas atualizou e burilou de forma espetacular o trabalho de seu antecessor. A atual formação dos gaúchos consegue prescindir de laterais marcadores ou de volantes brucutus. Contra o Santos, os gaúchos tinham Maicon, Arthur, Ramiro, Luan e Éverton atrás do centroavante André. Muito talento para os padrões nacionais, e o reflexo disso foi um primeiro tempo com 67% de posse de bola. Ver o Grêmio jogar é um deleite para quem está acostumado com jogo reativo e as parcas ideias que pululam há anos em âmbito nacional.
Mas o Grêmio também é um retrato de um período mais curto do que o Campeonato Brasileiro. É um time que funciona agora, em maio, e que pode reagir de diferentes maneiras a fatores externos como calendário apertado e a janela de transferências. Todo esse modelo encantador, por exemplo, pode ruir se o Barcelona quiser que Arthur migre para a Catalunha no meio do ano ou se Luan encontrar mercado no exterior.
Esse é, ao mesmo tempo, um dos fatores positivos e um dos problemas do Campeonato Brasileiro. A imprevisibilidade do principal torneio nacional está diretamente ligada à imprevisibilidade dos próprios times. Há poucos exemplos no país de trabalhos que independam de nomes ou de características dos atletas. Um dos segredos do sucesso recente do Corinthians é exatamente a capacidade de subverter isso – o time tem uma estrutura estável e repete o modelo a despeito do que acontece fora de campo.
Do jeito que o cenário está posto, o Campeonato Brasileiro acaba sendo um torneio de recortes. Em 2018, por exemplo, a lista de fatores externos ainda conta com um calendário extremamente apertado e uma parada longa em função da Copa do Mundo. É justo que o futebol nacional pare no período em que for disputada a competição na Rússia, mas não adianta interromper a atividade nesse período e simplesmente concentrar no restante da temporada uma quantidade igual de jogos.
O Corinthians foi o campeão nacional de 2017 porque conseguiu aproveitar um período de calendário favorável e construiu no início do Brasileiro uma distância confortável para administrar no restante da temporada. A narrativa do título passou por um início forte e por um restante de temporada em que as deficiências de elenco do time paulista ficaram evidentes.
O Palmeiras campeão brasileiro de 2016 também passou por uma eliminação traumática na Copa Libertadores e por um calendário que ajudou na consolidação de um time que acabou a temporada com amplo domínio de seus rivais.
Mesmo o Corinthians de Tite, que encantou muita gente para ficar com a taça do Brasileiro em 2015, não foi um time que jogou durante toda a temporada um futebol condizente com a imagem que resultou daquela campanha. Os dirigentes locais são especialmente avessos a qualquer sinal de estabilidade ou convicção – a não ser que essa estabilidade seja a deles.
Esse futebol de recortes impossibilita análises mais profundas sobre a construção de times no Brasil e também serve de argumento para imediatismo. E é exatamente por isso que existe um perigo tão grande em narrativas como a da invasão de um treino do Vasco na última semana. O time carioca tinha acabado de sofrer uma goleada em jogo contra o Cruzeiro pela Libertadores, teve uma tarde de absoluto terror em São Januário e goleou o América-MG na partida seguinte. Existe um risco natural de que uma parcela do público associe uma coisa a outra.
A inconsistência de trabalho no futebol brasileiro não é um problema apenas para ideias e gestores. Em certo nível, também é essa imprevisibilidade um dos sustentáculos de uma espiral de violência e de discurso de ódio.
Estimados amigos,
Meu nome é Julian Tobar e foi com muita satisfação que aceitei o convite para escrever quinzenalmente para a Universidade do Futebol, uma instituição que tem se mostrado extremamente importante para o crescimento teórico e prático do futebol brasileiro, tão rico em conhecimento e, ao mesmo tempo tão carente de produção científico-literária.
Me somo a uma brilhante equipe de colaboradores, onde contribuirei da maneira que puder, a fim de tentar inverter um dos paradigmas brasileiros vigentes, detectado há muito tempo pela Universidade do Futebol – Futebol: admirado por milhões, praticado por muitos, estudado por poucos.
Para facilitar o entendimento e a interação com vocês leitores, nesta coluna sempre que for possível, complementarei os textos e seu embasamento teórico, com recursos de vídeo e imagens, gerando assim maior clareza nos conceitos apresentados.
Pretendo, através de uma perspectiva sistêmica, abordar diversos conteúdos, como:
Conceitos de Jogo:
– Aspectos Táticos (abordagem sobre conceitos táticos do jogo e/ou de um jogar, tanto a nível coletivo, intersetorial, setorial, grupal e individual);
– Análise de Equipes (abordagem dos padrões de jogo que caracterizam as equipes, tanto nacionais como internacionais);
– Análise de Jogo (análise de um jogo em específico, e como/por que as situações do jogo “x” se desenrolaram);
– Análise de Gols (como e por que os gols de determinado jogo ocorreram);
Metodologia de Treino:
Enfoque especial para a Periodização Tática, abordando tanto sua parte conceitual, como operacional.
“Extra”-campo:
Abordagem sobre gestão, liderança, etc.
Sou treinador de futebol (CBF Licença-B); graduado em Educação Física pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e pela Faculdade de Desporto da Universidade do Porto (FADEUP). Autor do livro La Periodización Táctica Es…(2018).
Ao longo da minha carreira, tive a oportunidade de trabalhar com todas as idades do futebol de formação (Sub 10, 11, 12, 13, 14, 15, 17 e 20) até o futebol profissional. Exerci predominantemente a função de treinador principal, embora também tenha sido auxiliar técnico e analista de desempenho. Os clubes que trabalhei foram o São José (RS), Grêmio, Cruzeiro (RS), União Frederiquense (RS), Fragata (RS), Boavista (Portugal) e Joinville (SC), sendo este o meu último trabalho, onde fui treinador da equipe Sub-17, Sub-20 e profissional (esta, interinamente).
Conto com a participação, questionamentos e críticas de vocês para que possamos juntos gerar debates interessantes e construtivos.
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Entre o Direito e o Marketing do Futebol

Bem-vindos ao nosso mês de maio (mas já?) aqui no “Entre o Direito e o Esporte”. Nessas próximas quatro semanas vamos conversar sobre um assunto que é bem importante para o futebol de hoje e a sua indústria. Um assunto que dá a liga entre o futebol como direito e o futebol como negócio. Um assunto que está em todo o futebol, mesmo quando a gente não percebe. Em maio, nós vamos ver o que está entre o direito e o marketing: a propriedade intelectual no futebol.
Para deixar tudo programado, já vamos ficar de olho nas próximas semanas: hoje é aquela introdução do mês, uma base do que é propriedade intelectualno dia a dia do futebol. Semana que vem vamos ver mais sobre o que é conhecido como direito do autor– como o nosso jornal do esporte na hora do almoço. Na terceira semana do mês vamos conversar sobre os sinais distintivosno futebol – tipo o nome doseu time. E fechamos maio com as ideias de criação industriale de segredo industrial– como aquele material novo da chuteira da estrela do seutime e aquele suplemento especial que o fisiologista dá para os jogadores do seu time.
Só que hoje não vai ter regra geral, e sim vários exemplos. Bora lá?
O futebol de hoje não vive sem a mídia, sem propaganda, e sem marketing. O futebol hoje em dia precisa de alguém contando uma história. Uma história que a gente vê em comerciais na televisão, no rádio, e na internet. Um comercial que faz parte do nosso dia a dia – que nem aquele da Coca-Cola®, sabe?
É, você não está ficando louco! Realmente o link é para o YouTube® e esse comercial é um exemplo de direito do autor. Agora imagina só que você é o diretor desse comercial, o que é que você precisa antes? Um roteiro! Um roteiro para contar uma história, um roteiro para criar essa história. Uma história que também aparece no futebol.
Esse roteiro que é transformado em imagem, som, e palavras conta uma história – é a Nike®contando a história da nossa cultura do futebol. E essa gigante do esporte só consegue fazer isso por causa de tudo o que gira com o direito do autor: a música, a fotografia, e o conteúdo desse comercial fazem parte do que a gente vai ver na semana que vem. Tudo isso faz parte do direito do autor no nosso futebol.
Mais do que uma história, mais do que qualquer história. Um comercial conta a história de uma marca até quando traz só uma imagem, a imagem de uma marca – como a Coca-Cola®consegue em suas propagandas. É só ver o branco no vermelho em uma latinha que a gente já sabe o que é!
Esse tipo de conexão tem um valor ($). E esse valor é importante para a marca. Essa marca é o que faz o negócio rodar. E esse negócio também faz parte do nosso futebol. Faz parte do nosso futebol como o swoosh, que é o símbolo da Nike®. Todos sabem o que é, mesmo sem saber que issoé protegido como um sinal distintivo.
É o que a gente vai ver na terceira semana desse mês! Como o nome, a marca, o site e outros jeitos de “ser diferente” dos outros está entre o futebol e o direito da propriedade intelectual. Afinal, é disso que a indústria do esporte vive hoje.
Temos a marca, o nome, e o site. Temos a música certa, a melhor fotografia possível, e o roteiro fera. O que falta? O produto – a base de tudo. De novo, o que vem na cabeça quando a gente lembra da Coca-Cola®? Uma latinha vermelha com o nomeda marca em um tom branco, uma latinha feita de alumínio.
Essa latinha é uma criação industrial. Ela é feita de um jeito certo, com um material certo, e de um tamanho certo. Tudo isso pode ser registrado como uma patente– do mesmo jeito que acontece com as chuteiras. Chuteiras que estão nos pés dos nossos jogadores, chuteiras que são a mais pura tecnologia – como no comercial da Nike®.
E o que tem dentro da latinha? Esse é o grande mistério! A gente sabe o que é o refrigerante, só que a gente não sabe o que é a Coca-Cola®– a gente não sabe qual é a sua receita, qual é a sua fórmula. Esse segredo industrialtambém é usado no futebol para inovar no esporte– do mesmo jeito que a Nike®faz. A criação industrial e o segredo industrial andam lado a lado também no futebol, e são parte do nossodia a dia mais do que a gente vê, mais do que a gente sabe, e até mais do que a gente espera.
O esporte hoje é uma indústria. E como parte do esporte, o nosso futebol depende de como o seuclube consegue explorar o que tem depropriedade intelectual. Da chuteira da fornecedora do uniforme, da logomarca da patrocinadora máster, até a transmissão do jogo na televisão – tudo isso faz parte do negócio, tudo isso faz parte do jogo, e tudo isso faz parte do nossomês de maio aqui no nosso “Entre o Direito e o Esporte”.
Espero que tenham gostado dessa semana na Universidade do Futebol. E nos vemos na próxima sexta-feira para conversar sobre o direito do autorno nossofutebol. Fechou? Deixo meu convite para falarem comigo por aqui, pelo meu LinkedIn ou pelo meu Twitter. Bom final de semana para vocês, e até logo!
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A complexidade da função de treinador
Um dos inúmeros motivos que explicam a disparidade do futebol europeu para o praticado aqui no Brasil, é a formação dos treinadores. Já coloco aqui que não existe nenhum complexo de vira-lata em minha análise. É apenas uma constatação. Ao passo que os técnicos de lá ,há um bom tempo, não conseguem e nem podem trabalhar no alto rendimento,- se não tiverem os cursos básicos da Uefa-, aqui no Brasil só agora a CBF (Confederação Brasileira de Futebol) dá os primeiros passos para formar nossos profissionais – e uma formação que ainda requer inúmeros ajustes, desde o custo até a didática do programa.
Rótulos são péssimos. São superficiais. Rasos. E não aprofundam a discussão. Dessa forma, não há nem treinador ‘boleiro’ e nem treinador ‘estudioso’. Se for para resumir, vamos falar que tem os bons e tem os ruins. Como em toda área de atuação profissional.
Mas dentro de um contexto de complexidade do futebol, ainda não aceito apenas as competências técnicas, táticas e metodológicas de treinamentos para classificar um treinador como bom. É necessário mais do que isso. Parece que nos esquecemos das habilidades interpessoais, que no passado fizeram tanta diferença no futebol brasileiro. Ou alguém duvida que um Luis Felipe Scolari, um Zagallo e até o folclórico Joel Santana não tiveram boa parte dos seus sucessos graças a hábil maneira de fazer o ambiente trabalhar em favor deles?
Por isso quando penso em um bom treinador, penso na junção de inúmeros elementos que dão vida a essa função. É necessário ter conteúdo, ideias de jogo e o conhecimento para operacioná-las nos treinamentos. Porém, haverá momentos que uma liderança eficaz e engajadora é que fará o resultado aparecer dentro de campo.
Talvez o maior modelo disso que estou falando seja Tite, não por acaso quem ocupa o mais alto cargo da função no Brasil. Ele é um gênio tático, um homem que revolucionou o jogo? Creio que não. Ainda vejo poucas ideias ofensivas da seleção brasileira. Mas o “jeito” de Tite cria a percepção no inconsciente coletivo de que ele sabe o que faz e dará conta do recado.
Assim como há cursos como o da CBF para aprimorar as habilidades técnicas dos profissionais de campo, também há formações em liderança, relações humanas, gestão de conflitos, coaching, programação neurolinguística, etc, que ajudam o treinador a responder melhor aos problemas quando eles aparecem. O sucesso custa caro e esforço. Vence quem paga o preço.

Dias atrás a Confederação Brasileira de Futebol elegeu um novo presidente, Rogério Caboclo. O antigo, Marco Polo del Nero, foi banido da modalidade pela Federação Internacional de Futebol. Até que se prove o contrário, nada vai mudar no futebol do Brasil. Haja vista o cenário de como se deu a eleição, e todo o tempo que houve na preparação dos bastidores para que Del Nero pudesse fazer seu sucessor. Cumpre-se o ditado: “Tudo como d’antes, quartel-general de Abrantes”.
Já diz o Professor e Filósofo Manuel Sérgio: “o futebol é um serviço público”. É notável a exigência, por parte da opinião pública, por mudanças na entidade máxima do futebol do Brasil. Torcedores, imprensa e formadores de opinião. Entretanto, é preciso saber de maneira bem clara qual é a mudança que se quer para o futebol do Brasil. Depois disso, exigi-la.
Transparência no processo decisório é um item bastante questionado. Por mais que a confederação e as federações sejam entidades de direito privado, suas atividades comunicadas de maneira clara e acessível são capazes de aproximá-las e conectá-las ainda mais aos torcedores e formadores de opinião. Tomadas de decisão não são simples, levam tempo, e requerem, sobretudo, viés estratégico (o porquê de se decidir por algo, como e com que recursos), além de método e capacidade de execução. Observam-se estas características nas instituições voltadas para o mercado. Orientadas pelo lucro.
As entidades de administração do esporte, sobretudo as do futebol, foram construídas ao longo da história com base no favorecimento de um determinado grupo político, para fortalecimento dele e manutenção do poder. Apoiado pelos resultados dentro de campo (um pentacampeonato mundial, por exemplo), esses grupos ficaram fortes e criou-se uma cultura de poder difícil de erradicar. Toda a mudança que se propõe pode vir de baixo e emanar do movimento entre os clubes. No entanto, qual é o clube forte o suficiente para “comprar uma briga” com a federação estadual? E qual a federação que “compraria uma briga” com a confederação? Ao se colocar em uma balança, o prejuízo político deste clube ou da federação que “briga” pode ser bem alto e, por isso, não valer a pena.
Então quer dizer que as entidades de administração do esporte, especificamente neste caso, do futebol, devem visar sempre o lucro, como capitalistas “famintos” por resultado financeiro? Sim! Agir como “famintos” é apenas como figura de linguagem. Acima de tudo, é preciso respeitar os dois elementos mais importantes do esporte: o atleta e o torcedor, que é o público-alvo. Ademais, fazer cumprir seus papéis que são de difundir e proteger o esporte.
Ao fechar-se em pequenos e restritos grupos, os dirigentes afastam cada vez mais torcida e opinião pública. Não agir de maneira transparente coloca em xeque todo o processo decisório das instituições e permite o levantamento de suspeitas acerca do favorecimento pessoal dos seus membros. A gestão se torna ineficiente, uma vez que tem como base o clientelismo e tráfico de influência. Não o mercado. A prazo, caem em descrédito, perdem a base de torcedores (que vão ver mais jogos de ligas estrangeiras) e a fuga de patrocinadores, que também exigem esta transparência e têm se organizado para apoiar as entidades que cumpram uma série de requisitos, dentre eles, a governança.
Portanto, a mudança acerca do processo decisório é apenas uma característica que a opinião pública exige das entidades de administração do esporte no Brasil. Mudar de presidente e banir o antigo não vai mudar muita coisa. Os problemas não acabarão em curto prazo. É preciso saber, antes de tudo, o que se quer mudar e exigir isso. O futebol mais acessível e ao alcance de todos, dentro e fora de campo. Por que é interesse público.
Todo mundo sabe disso, mas no futebol é comum que a gente acabe se concentrando unicamente em indivíduos, mesmo que o resultado seja devido à um esforço coletivo. Pense em bônus por desempenho, promoções ou contratações. O foco está sempre em um ou outro, e isso acaba sendo um grande erro. Entretanto, para que o todo funcione muito bem, é evidente que se deve escolher corretamente aqueles que exercerão determinados cargos dentro do clube. Neste caso, não se escolhe somente a pessoa, mas fundamentalmente suas ideias e seu comportamento.
Após a escolha, o papel da direção do clube passa a ser um tanto amplo, ou seja, além de compartilhar as informações, deve-se fazer cumprir os projetos do clube por meio de um alinhamento absoluto de objetivo e confiança. Este caminho só pode ser percorrido com conceitos claros, contenção de excessos e um processo de avaliação constante.
Aqui recai uma das habilidades mais importantes de um diretor: a capacidade de perceber e desenvolver o potencial das pessoas. Todos nós temos limitações em determinadas áreas, em contrapartida somos muito bons em várias outras. Em uma equipe, os conhecimentos se completam e o respeito pelas habilidades e limitações de cada um é a chave para o bom andamento do trabalho. Não se trata de saber mais ou saber menos, mas sim de somar e potencializar os “diferentes saberes” em função do clube na busca pelos resultados desejados.
Vale lembrar que o resultado desejado no processo de formação, inclusive para o diretor, é fazer com que jogadores formados pelo clube se destaquem e subam ao profissional, ano após ano! Formar uma grande equipe, constituída em sua totalidade por jogadores do clube, não deveria ser tão utópico como parece; deveria ser o objetivo a ser alcançado. Mas para realizar um trabalho desta magnitude, o diretor não pode tratá-lo como um hobby. É preciso ser bem informado, observar a conduta de todos os envolvidos no processo, estar disponível para os staffs (principalmente para orientá-los), tomar decisões e agir respeitando sempre a identidade do clube, e o mais importante de tudo, ser o responsável pela construção e manutenção deste ciclo bem-sucedido.
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Entre o Intermediário e a CBF
Bem-vindos ao nosso fechamento de abril aqui no “Entre o Direito e o Esporte”. Nesse mês a gente conversou bastante sobre os intermediários no futebol brasileiro e hoje vamos fechar com o sistema registro que a Confederação Brasileira de Futebol (CBF) mantém para e que todo intermediário tem que saber. É um dos primeiros passos para todo mundo que quer trabalhar representando clubes e atletas do nossofutebol.
E para deixar tudo mais tranquilo de seguir, o nosso mapa de hoje é o seguinte: vamos começar falando sobre como os “regulamentos do mundo do futebol” veem esse sistema de registro; para daí conversar sobre os requisitos para o registro do intermediário na CBF; e fecharmos o mês trocando algumas ideias sobre alguns pontos importantes que é bom a gente saber.
Bora?
O “mundo do futebol” vive dos seus regulamentos, certo? E os intermediários dão de cara com essas regras no seu dia a dia – como a gente conversou na segunda semana de abril. Isso vale também para a questão do registro. Registro… é, imagina que é época de Copa do Mundo (FIFA, marca registrada, e tudo mais). Imagina que você é muito fã de tudo isso. Imagina que você é tão ligado no 220v do futebol que coleciona o álbum (Panini, mais uma marca registrada) da Copa do Mundo (FIFA®).
Você recebeu esse álbum em mãos. Esse álbum não tem nenhuma figurinha ainda. Só que no lugar dessas figurinhas já tem o espaço de cada um. Né? Colar a figurinha é só registrar e deixar mais claro (e brilhante) quem é quem ali – e no caso da CBF é a mesma coisa! Esse registro é apenas para deixar mais claro (e transparente) quem é quem no “mundo do futebol”. E cada associação nacional tem que fazer isso – ou seja, é uma ordem da FIFA e não é só por aqui. E mais: esse sistema é público, assim como o álbum (da Panini®).
Na CBF esse registro é anual, é como se fosse um CPF (ou CNPJ) dos intermediários – dá “vida” a essas pessoas (ou empresas) para o “mundo do futebol”. E o intermediário para ter esse seu CPF da CBF tem que mostrar algumas coisas necessárias, algumas exigências que estão lá nesses regulamentos. É que nem no álbum da Copa® que só vão aqueles que “cumprem um pré-requisito” (como a gente fala no juridiquês), e nesse caso são só aqueles jogadores que tem a possibilidade de ir para o Mundial.
Já pelos lados da CBF… os intermediários têm que ter e demonstrar uma reputação impecável. Beleza, e o que é isso? Bom, por aqui o jeito é mostrar as chamadas “certidões negativas” – como as criminais, civis e de protestos de títulos. Além disso, o intermediário tem que entregar uma declaração de que não tem qualquer relação contratual com liga, federação, confederação ou com a FIFA que possam levar a um conflito de interesse – que a gente viu semana passada. Até aí tranquilo, né?
Para conseguir esse “CPF da bola” o intermediário tem que pagar uma “taxa de registro” e juntar uma cópia da apólice de seguro de responsabilidade civil que esteja de acordo com o que a CBF acredita ser necessário – e isso custa dinheiro, que nem o seuseguro de vida, do carro, saúde… Esse seguro é uma maneira de “garantir” os clientes caso “dê ruim” por culpado intermediário. Ou seja, é por um bom motivo, vai!
Beleza, agora é que você me diz que já é intermediário e se registrou. Então tudo tranquilo e favorável, né? Quase… todo e qualquer contrato que você participe (jogador com clube ou clube com clube) tem que ser registrado na própria Confederação Brasileira de Futebol também. Lembra, o sistema é público e tem que ser transparente (mesmo que seja transparente só para a CBF de vez em quando).
Aí é tipo a Receita Federal e o seuimposto de renda, sabe? Lembra da pizzaria? Então, tudo que você vendia lá tinha que ir para o livro-caixa da sua empresa e ser declarada no imposto de renda (de pessoa jurídica) para que tudo fique certinho. E aqui a ideia é a mesma! A CBF quer saber o que você fez e faz (sistema transparente e claro), e por isso cada intermediário tem que registrar esses contratos.
É agora que você vira para mim e fala: “e se eu não quiser?”. Cara, sugestão de amigo… melhor fazer tudo direitinho. A Confederação Brasileira de Futebol pode punir jogador, clube e intermediário se alguém “esqueceu” qualquer um desses detalhes– e vários outros. Inclusive, a CBF pode julgaressas pessoas no seu Comitê Nacional de Resolução de Disputas (CNRD) e decidir um monte de coisa.
Decidir que o jogador não pode mais atuar em qualquer atividade relacionada ao futebol (até treinar!), decidir que o clube vai ser rebaixado (pois é!), e decidir que o intermediário não pode mais trabalhar no sistema CBF (e todos os seusclientes vão embora). Claro, esse tipo de decisão (sanção) só acontece em casos muito absurdos – mas é bom lembrar que é sempre uma possibilidade, né? Imagina acontece com você! É quase como ser dono de uma pizzaria e não poder comprar mais farinha e tomate… o fim!
E, falando em fim, chegamos ao nosso aqui esse mês do “especial sobre intermediários” na nossacoluna. Aliás, pessoal, eu sei que deixei esse ®no mistério aqui hoje, né? Então, é que é esse o tema do nosso próximo mês quando vamos conversar sobre propriedade intelectual no futebol – e deixo assim, no ar!
Espero que tenham gostado desse nossoabril aqui “Entre o Direito e o Esporte”. E nos vemos daqui a uma semana no site da Universidade do Futebol para conversar sobre esse ®. Beleza? Deixo meu convite para falarem comigo por aqui, pelo meu LinkedIn ou pelo meu Twitter. Bom final de semana para vocês, e até logo!

Mais do que ninguém sou apaixonado pela imprevisibilidade do futebol. Um esporte em que nem sempre o melhor vence, é algo que me prende e me fascina. E, entender o caos e a complexidade que circunda o jogo é algo que me move a estuda-lo cada vez mais.
Porém, mesmo diante desse cenário, o sucesso no futebol não é obra do acaso. Ele é planejado. É merecido. E deixa rastros e pistas para todos.
Clubes que foram vitoriosos por pelo menos um período médio de tempo – e não apenas ganharam um troféu aqui e outro alí – tiveram algo em comum na maioria das vezes; a manutenção de uma ideia de jogo. Uma identidade. Uma filosofia.
Vamos lembrar de equipes que ganharam com consistência no futebol brasileiro recentemente? Anote aí: nos anos 90: o São Paulo do inicio da década, o Palmeiras nos meados dela e o Corinthians da virada do século. Nos anos 2000, o Santos ressurgindo com os meninos da Vila, o São Paulo soberano e esse Corinthians que ressurgiu da Série B para ganhar praticamente tudo até agora.
Repare que não falei de jogadores e treinadores. Falei de eras. De conceitos. E todos representado por vários e diferentes atletas, técnicos e estilos. Mas cada um mantendo uma identidade padrão.
Basta uma mínima análise para ver as pistas que esses sucessos deixaram: continuidade, convicção, manutenção de filosofia de gestão e ideia de jogo.
Trazendo para os dias de hoje, qual clube grande paulista é o menos vitorioso dos últimos anos? Será que por mera coincidência é o que mais trocou de filosofia de futebol? – e aí entra no balaio mudança brusca não só no perfil de técnicos e jogadores, mas também de dirigentes. Pois é, falamos do São Paulo.
Que em abril já trocou de treinador. Que em abril tem jogador estreando (Everton). Que em abril já pensa em liberar para outro clube a sua grande aposta da temporada (Diego Souza). Que em abril já sabe que não será neste ano que ocupará sua galeria de conquistas com um troféu da Copa do Brasil.
É fato que no futebol, assim como na vida, sucesso e fracasso são opções. São escolhas. Algumas variáveis não podemos controlar dentro de um jogo de futebol. Mas outras variáveis, principalmente fora das quatro linhas, podemos. E é aí que a interferência deve ser mais assertiva e determinante. Tanto para o bem, como para o mal.