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Espiral do conhecimento

No livro dos japoneses Takeuchi e Nonaka, Gestão do Conhecimento*, existe uma abordagem inicial que trata da “espiral do conhecimento”, detalhando de forma aprofundada as correlações dos conhecimentos tácito e explícito, que passam a ter um papel fundamental e dizem respeito a “abraçar os opostos” ou olhar de forma mais clara para a complexidade nas organizações. De acordo com os autores, as empresas fracassam por se curvarem a rotinas velhas criadas por sucessos passados.

Em outras palavras, podemos traduzir a assertiva para a primordial necessidade de aprendizado contínuo dentro das organizações. Na teoria parece óbvio, mas na prática isso dificilmente ocorre.

Por definição, conhecimento tácito tem relação com o conhecimento que não está na literatura e sim na cabeça e atitude das pessoas dentro de uma organização, incorporado ao longo da história do indivíduo. São difíceis de teorizar e de transmitir para terceiros – nas palavras de João Grilo, do filme “O Auto da Compadecida”, é algo como “não sei, só sei que foi assim…”.

Por explícito se compreende o conhecimento que pode ser teorizado e transmitido de pessoa para pessoa. É, dentre outras coisas e de forma bem sucinta, as informações que recebemos nos bancos escolares.

Nas organizações do futebol lidamos pessimamente com ambos, motivo pelo qual os clubes tendem sistematicamente a repetir erros do passado, com baixa capacidade de inovação. Takeuchi e Nonaka sugerem quatro padrões básicos para se criar conhecimento nas organizações, os quais iremos interpretar para aquilo que poderia ocorrer no contexto do futebol:

1. De tácito para tácito.

Compartilhar o conhecimento tácito de um indivíduo para outro. Seria como um atleta mais experiente a transmitir informações (e “dicas”) para os jogadores das categorias de base de como proceder diante de adversidades ou com relação ao árbitro do jogo. Neste campo, não há geração de novos conhecimentos, mas sim de assimilação e prática para posterior execução – quase que em um método experimental, de tentativa e erro.

2. De explícito para explícito.

Acontece na formalização de relatórios internos, como o de um Conselho Fiscal do clube. Dele não se cria nada, apenas se retrata o status da organização centrado em um único material.

3. De tácito para explícito.

É a conversão do conhecimento prático em um processo científico. Como um auxiliar técnico perceber, a partir de conversa com ex-jogadores, sobre a formação tática de algumas equipes e a dificuldade que encontravam para atacar alguns sistemas defensivos e desenvolver, a partir daí, um software que compila tais informações e possa ser transmitido de forma ordenada e clara para outros atletas na fase de treinamento.

4. De explícito para tácito.

Pode ser incorporado a partir da ideia proposta pelo Prof. Medina de implantação de Universidades Corporativas dentro dos clubes, a exemplo do que acontece em alguns setores dentro da Universidade do Futebol. A medida seria capaz de internalizar informações por parte dos colaboradores, que passariam a utilizar na prática este conhecimento, tornando-o tácito.

As duas últimas interações são as responsáveis por gerar inovações na organização. Ao ampliar a rotatividade de pessoas dentro dos clubes, seja na figura de técnico, jogadores, membros da comissão técnica ou mesmo pessoas de suporte da área administrativa e marketing, estas convergências se tornam imensamente dificultosas, pois cada novo colaborador precisa reaprender processos e conceitos daquela organização, minando em alguma medida a tal “espiral do conhecimento” proposta pelos autores.

Trabalhar de forma ótima a questão da gestão do conhecimento em clubes de futebol parece um grande desafio, mas que pode ser a chave para o crescimento institucional dos mesmos. Se tomarmos exemplos de sucesso recente no futebol brasileiro e mundial, saberemos enquadrar alguns destes ensinamentos da cultura japonesa para tais realidades.

* NONAKA, Ikujiro; TAKEUCHI, Hirotaka. Gestão do Conhecimento. Porto Alegre: Bookman.

Para interagir com o autor: geraldo@universidadedofutebol.com.br

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O treino pautado na complexidade: o processo

Processo tem como um de seus significados no dicionário: “série de ações sistemáticas visando a certo resultado.”No futebol o processo pode ser definido como: “série de exercícios sistematizados visando o desenvolvimento do jogar da equipe e de seus atletas”

 

Uma metodologia de treino pautada no jogo e para o jogo não pode se resumir a uma sequência de mini-jogos. Por isso, antes de chegarmos nas atividades práticas, vamos falar sobre o “processo de treino”.

O processo de treino pode ser definido como uma série de exercícios sistematizados que visam o desenvolvimento constante do jogar da equipe e de seus atletas.

Sistematizar os exercícios significa adotar uma progressão pedagógica entre as atividades, em que cada uma terá ligação com as demais. Além disso, ao longo do tempo, as regras dos jogos evoluirão e submeterão os jogadores a novas situações-problemas.

Pois bem.

Sendo assim, podemos supor que uma atividade de 1 x 1 deve vir antes de uma atividade de 11 x 11; uma atividade com regras de passes deve vir antes de uma atividade com regras de passe, chute, pressão e compactação…

Contudo, elaborar o processo não é tão simples assim!

Antes mesmo de definirmos as atividades, precisamos definir como os conteúdos devem ser distribuídos ao logo do planejamento.

Definir os conteúdos não é trivial e necessita de conhecimento adequado do grupo. A comissão precisa avaliar o nível de entendimento de jogo dos atletas para definir quais conteúdos serão abordados desde o início do processo.

Com a definição do nível dos atletas e levando em conta o Modelo de Jogo, os conteúdos devem ser distribuídos ao longo do planejamento.
A partir deste planejamento, as atividades serão concebidas. No início, as atividades terão um grau de complexidade menor (assim como os conteúdos a serem trabalhados) que será aumentado ao longo do tempo, progressivamente.

Abaixo, temos duas atividades que têm como ênfase o desenvolvimento da marcação zonal e da estruturação do espaço.

Atividade 1
– Atividade é composta por duas equipes de quatro jogadores, mais um coringa que joga sempre para a equipe que tem a posse de bola.

– O objetivo da equipe que está com a posse de bola é fazer o gol no golzinho central (dois pontos) ou derrubar os cones nas laterais (um ponto).

Atividade 2
– Atividade composta por duas equipes de quatro jogadores, mais um coringa que joga sempre para a equipe que tem a posse de bola.

– Objetivo da equipe que está com a posse de bola é fazer o gol no golzinho central (dois pontos), derrubar os cones nas laterais (um ponto) ou receber um passe a frente da linha tracejada (um ponto) – neste último caso o jogo não para.

Note que as atividades obedecem uma sequência lógica. A atividade 2 em comparação com a atividade 1 gera um novo conflito para a equipe que está sem a posse de bola, pois além de se preocupar com o gol e com os cones, agora a equipe precisa evitar a progressão da rival que está com a bola. Com isso um novo conteúdo surge dentro do processo e os jogadores precisam se auto-organizar de uma nova forma. Forma que, se o processo está adequado, deve ser superior a anterior e assim sucessivamente.

O processo não tem fim, porém a busca por uma forma de jogar superior deve ser constante.

Assim como o processo, os conteúdos que envolvem o treinamento no futebol pautado na complexidade parece não ter fim, mas nossa busca por conhecimento deve ser constante…

Até a próxima!

Para interagir com o autor: bruno@universidadedofutebol.com.br  

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O Team Coaching, o futebol e as vitórias

Em diversas ocasiões, os treinadores têm um tempo relativamente curto para reverterem uma situação desfavorável. A preleção para uma equipe que se encontra na zona de rebaixamento da competição, a conversa no intervalo do jogo em que os jogadores parecem ter esquecido tudo o que foi treinado na semana e, inclusive, uma breve conversa antes das cobranças de penalidades máximas numa partida em que “só” faltou o gol.

 

 

Neste pouco tempo, tudo que for pronunciado tem que ser internalizado para que o “jogo jogado” na cabeça do treinador seja o mesmo na cabeça de cada um dos seus jogadores. Muitas vezes, nestas partidas, mais do que usar os minutos que se tem para discutir a tática-estratégia da equipe, usa-se o tempo para questões aparentemente “sine qua non”. Cobranças de atitude, comprometimento, concentração, tranquilidade, foco, coragem, responsabilidade e superação são feitas com o objetivo de melhorar a performance do time.

Enquanto passes errados se quantificam, não se sabe o quanto os jogadores estão comprometidos com suas obrigações profissionais. Enquanto as finalizações erradas aparecerão no canal esportivo no intervalo do jogo, mensurar a tranquilidade da equipe é algo impossível. Conhecer o tempo de posse de bola é seguramente mais fácil do que o percentual de superação da equipe.

Atualmente, métodos inovadores de ensino de futebol têm sido discutidos e aplicados com sucesso, porém, no multifatorial desempenho esportivo, sabe-se que eles não lhe garantirão a vitória. No leque de variáveis, treinar jogando é apenas uma delas. Outra variável, há tempos presente no mundo corporativo (muitas vezes tão distante do mundo do futebol), é a aplicação do Team Coaching.

Resumidamente, o Team Coaching é uma ferramenta de desenvolvimento efetivo de times na busca de um objetivo comum. No mundo empresarial, é missão de diretores, gerentes, coordenadores e supervisores aplicá-lo, para que, ao atuarem como coaches, gerenciem e desenvolvam suas equipes para entregarem resultados.

Já no ambiente esportivo (muitas vezes distante do mundo empresarial?!?!), o coach pode ser o próprio treinador.

A certificação em coaching e as competências para a aplicação do Team Coaching são oferecidas em institutos especializados no Brasil e no mundo. Neles, a observação do estado inicial da equipe e os estágios de formação de times são algumas das ferramentas aprendidas que, posteriormente, serão utilizadas na prática.

A primeira, realizada aconselhadamente com princípios de honestidade, chama-se roda de competências e permite a compreensão do perfil do grupo. Nesta roda, feita individualmente, cada pessoa preenche (sim, com papel e caneta) seu índice (de 0 a 10) em todas as competências analisadas, que são fundamentais para o bom desempenho do time.

Já na formação do time, são aprendidas quais as questões que devem ser trabalhadas em um determinado estágio (formação, conflito, normalização, desempenho, suspensão/término). Por exemplo, no estágio conflito, é momento de encorajar a interdependência entre elementos do time e permitir desacordos produtivos. Já no estágio desempenho, será necessário desafiar o pensamento do time e também propor metas mais desafiadoras.

A execução de todos estes estágios pode durar semanas, dias, horas ou, até mesmo, poucos minutos. Depende, é claro, do coach.

Mas para que melhorar a performance do time? Porque time ideal não existe! Cada um tem seus pontos fortes, que precisam ser extremamente explorados, e pontos fracos, que precisam ser emergencialmente minimizados. E também, porque no multifatorial desempenho esportivo, tudo que puder ser feito para aperfeiçoamento da sua equipe pode lhe proporcionar a esperada vantagem competitiva.

Vocês devem estar se perguntando se eu tenho formação em coaching! A resposta: Não, mas está no meu planejamento de carreira.

No entanto, tive uma grande oportunidade no final do ano de 2010 com o Executive Coach (do mundo corporativo) Rogério M. Z. de Caro. Ser capacitado por ele foi um privilégio e um imenso aprendizado.
Se já tenho um caso de sucesso?

Ainda como técnico do Sub-12, foi definido com o time os cinco grandes pontos fracos:

Três atletas inteligentes para o jogo e habilidosos que discutiam entre si e apontavam erros uns dos outros ao invés de coletivamente tentarem recuperar a bola;

Um atleta importantíssimo que se tornava violento e nervoso quando estava perdendo;

Dois líderes com dificuldade de comunicação;

Fazer com que os suplentes, ainda crianças, não ficassem tristes por jogarem menos;

Dois atletas que tinham medo de errar, logo, eram muito inseguros.

Ferramentas em mãos, várias conversas com meu coach e transferência prática em minha equipe com o auxílio do treinador adjunto.

Em jogos com grandes clubes do futebol paulista, a equipe fez belíssimas apresentações (com exceção do jogo em que o atleta nervoso ofendeu o árbitro) e perdeu na semifinal da competição para o Palmeiras por 1 a 0 com um gol de bola parada, no ângulo.

Continuei sem saber qual a porcentagem de comprometimento dos meus jogadores, o quanto eles se superaram ao enfrentar o campeão paulista do ano anterior (Ponte Preta), ou então, em que nível estavam tranquilos para resolverem os problemas do jogo. Porém, descobri que o Team Coaching faz gols!

Para quem tem me acompanhado com frequência: o espetáculo foi cobrado.

Até a próxima semana e obrigado pelos contatos feitos por e-mail.

Para interagir com o autor: eduardo@universidadedofutebol.com.br  

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No fio da navalha

Saudações a todos!

Grandes resultados, grandes conquistas, ter sucesso, ser destaque, exigem, além de muito trabalho, muita dedicação, muito esforço, muito suor, correr riscos e ir sempre ao limite. Todos gostam dos louros, das medalhas e dos holofotes, mas poucos estão dispostos a realmente ir ao limite para obter esses resultados.

Nas palestras que faço exemplifico sempre esta realidade e pergunto se alguém já viu o Usain Bolt subir no pódio, pegar a medalha, ouvir o hino jamaicano, comemorar bastante e só depois dessa festa toda, alinhar e correr os 100 metros livres. Claro que não, né?

Ele até brinca um pouco antes da prova, mas em seguida se concentra, alinha, ouve o tiro de largada, corre muito, se esforça, vai ao limite, tem o risco de cair, ter uma distensão, mas só depois da prova, de todo esse esforço, do resultado atingido, ele pega sua merecida medalha.

A Fórmula 1 também tem exemplos emblemáticos desta realidade. Vettel, Alonso e Hamilton são sempre os destaques, estão sempre em evidência, são campeões mundiais. E esses resultados são explicados facilmente. Eles são sempre os que vão ao limite máximo, fazem o possível do impossível. Ou seja, andam sempre no fio da navalha. Quem acompanha os treinos da F-1 sabe que para chegar ao limite é necessário muito trabalho. Eles dão várias voltas, saem da pista, acham os atalhos do circuito, avaliam o melhor ajuste para o carro, etc. Conhecem profundamente o que fazem e com isso encontram a melhor forma de fazer o seu trabalho. Empregam muito esforço e com isso chegam ao limite.

Os outros pilotos estão lá, andando rápido, mas nem sempre conhecem tudo sobre seu trabalho, nem sempre se esforçam ao máximo, e por isso não chegam ao limite: ficam no meio do pelotão, sem o destaque que só os campeões têm.

Será que se a nossa seleção, ao invés de se encolher na prorrogação contra o Paraguai e chutar apenas uma bola ao gol, tivesse ido ao limite, tivesse continuado em cima, chutando em gol, o resultado seria outro? Eu creio que sim e obviamente seríamos recompensados pelo esforço e por ter ido ao limite. Se não tivesse, mesmo assim, tido sucesso, ficaria ao menos o sentimento de “fizemos o possível”. Mas isso é passado e ninguém pode ter certeza do que aconteceria de fato.

No mundo coorporativo, esta realidade não é diferente. Os profissionais que têm destaque, aqueles profissionais que brilham e alcançam o sucesso almejado por todos, são aqueles que se esforçam mais, que conhecem detalhadamente seu trabalho e que investem seu tempo de maneira útil no sentido de fazer sempre o possível do impossível, ou seja, quando alguém diz que “não vai dar”, eles vão lá e demonstram com esforço que dá.

Com a combinação de conhecimento do trabalho e esforço verdadeiro (não apenas para mostrar ao chefe ou aos pares), esses profissionais chegam ao limite e então saboreiam o sucesso tão desejado por todos. O sabor da vitória/realização é o alimento dos “diferentes”.

E você, sabe se está preparado para chegar ao seu limite? As perguntas abaixo ajudarão a responder essa questão:

– Você conhece detalhadamente seu trabalho?

– Sabe como fazer da melhor forma?

– Tem se esforçado para atingir pelo menos a média da equipe?

– Tem feito mais do que lhe é pedido?

Se respondeu “sim” para as perguntas acima, você está no caminho certo e mais próximo das medalhas. Se respondeu “não’, comece a correr, pois as medalhas estão bem longe de você.

Para você que respondeu “sim” para as questões acima, fique atento a detalhes tênues, fundamentais para chegar ao limite e considerar-se um vitorioso:

– Você consegue ser bom, ajudar aos outros, cooperar com a equipe, com seus subordinados, pares, ou superiores, sem ser “bobo”, prejudicar suas atividades e sem comprometer seus objetivos?

– Consegue expor suas opiniões, ser enérgico quando é necessário, defender suas crenças e agregar o grupo a você, sem ser estúpido, mal educado e desagregador?

– Consegue pedir e ser atendido, sem ter que mandar?

– Sabe pedir desculpas quando percebe sua falha?

Se as questões acima também foram respondidas com “sim”, parabéns! Suba ao pódio, pegue sua medalha, estoure o champanhe e comemore muito, pois você conhece seu trabalho, se esforça, tem discernimento para resolver questões tênues e sabe como atingir o limite máximo de desempenho e resultados. Se faltou somente esta parte, não desanime, continue correndo que em breve chegará ao seu limite e alcançará as medalhas.

É isto, pessoal! Agora, intervalo, vamos aos vestiários e nos vemos na próxima semana.

Abraços a todos!

Para interagir com o autor: ctegon@universidadedofutebol.com.br

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O futebol para promoção da saúde das mulheres

Na última semana terminei o texto da coluna com uma questão: “Será possível o futebol ser utilizado por mulheres como manutenção da boa forma e de parâmetros relacionados à saúde?”.

Como prometido, aí vem a resposta!

Estudo realizado na Universidade de Copenhagen-Dinamarca mostra efeitos positivos da prática de futebol em mulheres e alguns deles são mais benéficos do que a prática de corrida.

Durante 16 meses, 25 mulheres de 19 a 47 anos foram divididas de forma homogênea em três grupos. Um grupo jogou futebol (GF=7), outro praticou corrida (GR=8), e outro não fez nada (GC=7). O treino de corrida constou de duas sessões de uma hora por semana com intensidade próxima a 80% da frequência cardíaca máxima e o treino de futebol contou de uma hora de prática, duas vezes por semana com jogos de 4 x 4 ou 5 x 5, também com intensidade próxima de 80%. Nos momentos 0, 4 e 16 meses do período de intervenção as voluntárias realizaram as seguintes avaliações: mensuração da composição corporal (absorbância de raio x de dupla energia – DEXA), ecocardiografia, avaliação da força muscular, equilíbrio, tempo de reação e amplitude do movimento do tronco, frequência cardíaca, pressão arterial e glicemia de repouso, teste máximo e submáximo em esteira ergométrica e teste de velocidade.

Para o GF a densidade mineral óssea de corpo inteiro foi de 2,3±0,4 e 1,3±0,3% superior (P<0,05) após 16 meses em relação a 4 e 0 meses, respectivamente, porém sem diferenças entre GR e GC. As mudanças observadas na densidade mineral óssea em GF foram maiores (p<0.05) do que no GR. Para GF, a densidade mineral óssea das pernas foi 2,87±0,12 kg após 16 meses, o que não foi significativamente diferente entre 4 e 0 meses (2,76±0,11 e 2,80±0,12 kg). A densidade mineral óssea da perna aumentou de 0 a 16 meses no GR, mas nenhuma mudança foi observada na densidade de corpo inteiro dos 0 aos 16 meses nos grupos GR e GC.

A massa de gordura total não foi diferente em nenhum grupo entre 16 e 0 meses, contudo o percentual de gordura ginóide foi menor no GF (p<0.05) após 16 meses (41,6±1,7%) em comparação com 0 meses (44,1%±1,9). Para GF a massa corporal magra total foi de 1,0 e 1,7 kg maior (p<0.05) após 16 e 4 meses, respectivamente, em comparação com 0 meses. Nenhuma mudança foi observada na massa magra total de GR nem de GC, porém as mudanças observadas em GF foram maiores (p<0.05) do que em CG.

Nos parâmetros de força dinâmica, o GF teve o pico de força do quadríceps durante ações concêntricas rápidas (240º/s) 17% maior após 16 do que aos 4 meses de treinamento (p<0.05) e 11% maior nas ações lentas após os 16 meses em comparação com os valores basais. Para o GR e GC o pico de força do quadríceps não diferiu nas ações lentas (concêntricas e excêntricas) entre 16 e 0 meses. Já para as ações rápidas, as ações concêntricas de RG foi maior (p<0.05) após 16 meses em comparação com 4 e 0 meses (20% e 16%, respectivamente). Para os isquiotibiais, o GF apresentou pico de força maior (p<0.05) durante contrações concêntricas rápidas após 16 meses do que aos 4 e 0 meses (14% e 24%, respectivamente), assim como as ações excêntricas rápidas foram 21% maior após 16 meses do que o mês 0 (p<0.05).

Para GR e GC o pico de força não foi diferente entre os meses 16 e 0 para ações concêntricas de isquiotibiais. As ações excêntricas rápidas (240º/s) foram maiores para GR após 16 meses em comparação com 4 e 0 (14% e 12%, respectivamente; p<0.05). Nenhuma diferença significativa foi observada na força máxima de isquiotibiais entre os 16 meses comparado ao mês 0 nos grupos RG e CG. Aos 16 meses houve mudanças na força máxima excêntrica do quadríceps e de isquiotibiais durante os movimentos rápidos no GF maiores do que em GR (p<0.05) sendo que todas as alterações observadas em GF foram maiores do que para GC (p<0.05).

Quanto à máxima contração isométrica do quadríceps o GF teve aumento de 12% após 16 meses em comparação ao mês 0 (p<0.05). Para GF a taxa de desenvolvimento de força (TDF) máxima do quadríceps foi 35% maior (p<0.05) após 16 meses em comparação com o mês 0, enquanto a TDF do quadríceps aos 30, 50, 100 e 200ms não sofreram alterações em nenhum dos grupos. Para GF e GR o impulso contrátil do quadríceps em 30 e 50ms foi maior (p<0.05) após 16 meses do que aos 4 e 0 meses. O impulso no GF aos 100ms foi maior (p<0.05) após 16 meses em comparação com 4 e 0 meses em (39% e 41%) e o GR depois de 16 meses em comparação com 4 meses (43%). A contração isométrica máxima de isquiotibiais foi 23% maior (p<0.05) no GF após 16 meses em comparação com o mês 0. Ao comparar 16 meses com 4 e 0, o pico da TDF de isquiotibiais foi 51% e 29%; p<0.05 maior em GF do que nos outros grupos. Nenhuma diferença significativa foi observada na TDF máxima em ações rápidas de isquiotibiais entre 16 e 0 meses nem em RG nem em GC.

Quanto às respostas reflexas, o GF teve o tempo de parada no teste de carga de tronco 27% e 19% menor (p<0.05) após 16 e 4 meses, respectivamente, em comparação com 0 meses, e melhorias na distância de deslocamento do tronco correspondentes a 42% e 28%, respectivamente. Em RG o tempo de parada e a distância percorrida se reduziram em 14% e 29% (p<0.05) após 16 meses em comparação com o mês 0. As alterações observadas em GF foram maiores (p<0.05) do que GC, sem alterações ao longo do tempo para GC.

No teste do equilíbrio em uma perna, o número de quedas durante a posição estática unilateral foi reduzido de 42% e 32% (p<0.05) para a perna direita e 53% e 38% (p<0.05) para a perna esquerda no GF depois de 16 e 4 meses de treinamento respectivamente, em comparação com os valores basais. No GR o número de quedas após 16 meses foi de 38% e 42% menor (p<0.05) para a perna direita e esquerda, respectivamente, sendo que as alterações observadas para GF e GR foram maiores (p<0.05) do que em CG, sem mudanças ao longo do tempo para CG.

Nas variáveis ecocardiográficas, o GC reduziu a velocidade diastólica e o tempo de relaxamento total (0= 10,7±1,8ms; 4meses=8,7±1,8m/s e 16meses=8,3±1,5m/s). O GR melhorou somente a velocidade do pico sistólico (9,1±0,6; 11,0±0,5 e 10,8±0,5m/s aos 0, 4 e 16 meses, respectivamente) enquanto que o GF melhorou aspectos da morfologia e da função cardíaca de quase todas as variáveis, tanto na sístole quanto na diástole. Não houve diferença significante nas variáveis de pressão arterial em nenhum dos grupos.

Nas variáveis cardiorrespiratórias, o consumo máximo de oxigênio foi 14% e 16% maior no GF depois de 16 e 4 meses, respectivamente (p<0.05) em comparação com 0 meses. Os valores correspondentes para RG foram de 13% e 9%. A freqüência cardíaca de repouso foi reduzida em 8 e 4 bat/min (p<0.05) após 16 e 4 meses, respectivamente com mudanças no GR de 7 e 6 bat/min (p<0.05), respectivamente. As alterações observadas para GF e GR foram maiores (p<0.05) do que em GC sem mudanças para GC ao longo do tempo.

Para GF, o desempenho no teste incremental foi 26% e 22% melhor (p<0.05) após 16 e 4 meses, respectivamente, em comparação com o mês 0. O grupo GR teve mudanças correspondentes de 27% e 22%, respectivamente. Além disso, o desempenho do Yo-Yo IE2 foi melhor (p<0.05) após 16 e 4 meses, respectivamente do que ao mês 0 para GF (24% e 20%) e 29% e 27% para GR, porém sem alterações para o GC.

No tiro de 30m não houve diferença em função do tempo para nenhum dos grupos, porém as mudanças observadas para GF e GR na performance da corrida foram maiores (p<0.05) do que em CG.

O estudo conclui que a corrida é melhor do que não fazer nada, mas que o futebol recreativo praticado em longo prazo é capaz de surtir maiores efeitos em variáveis importantes para a manutenção da saúde e qualidade de vida. Os dados indicaram melhoras de maior magnitude na função muscular, na resposta reflexa, no equilíbrio e na densidade m
ineral óssea do GF, o que contribui para diminuir o risco de quedas e fraturas. Além disso, o treinamento de futebol foi capaz de aumentar o tamanho das câmaras cardíacas, melhorar a função sistólica e diastólica do ventrículo esquerdo. Essas adaptações de longo prazo podem ter uma influência favorável sobre a saúde cardiovascular e o desempenho físico das mulheres e pode ser utilizado como forma de prevenção de doenças cônico degenerativas não transmissíveis.

Portanto, caro leitor, não estranhe se daqui alguns anos você vir nas praças de sua cidade algumas senhoras jogando futebol e não vá pensar que alguma delas virou ladra se disser pra você que tomou uma caneta…

Obs.: Se alguém quiser o artigo na íntegra para maiores detalhes, é só me pedir por e-mail que o mesmo será encaminhado. Até a próxima quinta-feira!

Para interagir com o autor: cavinato@universidadedofutebol.com.br  

Referência bibliográfica

Krustrup P et. al. Long-term musculoskeletal and cardiac health effects of recreational football and running for premenopausal women. Scand J Med Sci Sports. 2010 Apr;20 Suppl 1:58-71.

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Lealdade

Diz-se que o torcedor de futebol é dos consumidores mais leais a uma marca se comparado a outras plataformas de consumo. Esse fato pode ser evidenciado ao observarmos que muitos clubes possuem representatividade global, com marcas mundialmente conhecidas, sendo que tanto seu faturamento quanto o número de funcionários o enquadraria em uma classificação de organização de médio porte e não como multinacional.

Sue Bridgewater*, no livro “Football Brands”, cita Reichheld (1997) ao analisar o que seria a evolução de um cliente em relação à marca de um clube de futebol ao passar por estágios de valor crescente ao longo do tempo:

- Retorno inicial (venda de ingressos);

- Aumento do volume da atividade (frequência mais regular de consumo; compra de réplica de camisa oficial ou consumo de produtos em promoção);

- Custos de marketing reduzidos (compra de ingressos para a temporada, com custos de comunicação mais baixos; envolvimento em atividades do clube de forma espontânea);

- Indicações (o cliente traz e pode influenciar positivamente outros clientes);

- Mais valia (indivíduos com mais recursos podem se envolver em patrocínio, eventos e ações corporativas e até mesmo investir no clube)

Essa classificação e evolução sistemática do consumo por parte dos torcedores em relação ao clube chamou minha atenção por perceber que, no Brasil, trabalhamos a partir de um conceito pouco customizado, ou seja, tratamos todos os torcedores de maneira idêntica e, consequentemente, subjugamos todo o potencial que alguns indivíduos podem ter em relação à marca do clube.

A gestão das informações também é falha. Desconheço clubes que alimentem um banco de dados com informações fidedignas sobre os movimentos de consumo de seus torcedores, contemplando uma visão geral sobre estes (ou outros quaisquer) fatores levantados e propostos por Reichheld.

As ferramentas para controle e acompanhamento dos consumidores são fundamentais para otimizar recursos e potencializar a relação de troca com os torcedores. Este é apenas mais um exemplo daquilo que muitos especialistas da área de marketing e gestão do esporte percebem como uma lacuna ainda mal explorada nos clubes brasileiros, havendo enormes possibilidades de avanço com a finalidade de se incrementar novas e duradouras receitas.

*BRIDGEWATER, Sue. (2010). Football Brands. Hampshire: Marwick Business School.

Para interagir com o autor: geraldo@universidadedofutebol.com.br

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Segundo conto

Ela saiu da água com a naturalidade de uma sereia habituada ao livre trânsito entre o mar e a terra. No caminho até o guarda-sol azul das velhas senhoras, foi derrubando, um a um, os queixos dos craques do Jura Que Sabe. Com elas riu, tirou fotos, aceitou a caipirinha e sentou-se na cadeira de pano. Deviam ser suas tias as tais senhoras. Ficou pouco por ali. Inquieta, levantou-se e caminhou, como em câmera lenta, na direção de Guimba. A meio metro do craque, Dolores – era o seu nome – pediu:

– Tio, o senhor tem fogo? – ela segurava o cigarro na mão direita.

Tio! Foi como matá-lo. Tio! Um golpe certeiro, xeque-mate, a classificação final.

Foi a única vez que Guimba lamentou ter largado o vício. Não poderia servi-la, mas André, o antropólogo, sim. O jovem barbudo correu a acender-lhe o cigarro. Dolores agradeceu com um sorriso e voltou às tias, dando-lhes as costas.

Por alguns segundos ouviu-se um profundo silêncio de contemplação. Como se tivessem combinado, os craques respiraram fundo e retomaram, aos poucos, o fôlego e a fala. O assunto voltou a ser o jogo. Vieram a Suarão, ali no litoral Sul de São Paulo, para jogar contra uma equipe local. Apanharam no campo e fora dele. Os adversários eram violentos e o juiz mal intencionado. Depois da partida foram curar as dores da derrota na praia. Bramas e caipirinhas tinham poder de bálsamo. Dolores surgiu como um colírio inesperado, mas apenas para os olhos. Só que André não pensava assim. Os craques duvidando dele, diziam em tom de chacota, “vai lá, vai lá”. E ele foi. Aproximou-se tímido, sorriso amarelo, as tias olhando. E porque não sabia o que dizer, falou:

– Me dá um autógrafo?

E as tias riram, Dolores riu, as senhoras disseram “que gracinha!”, e isso animou André, que repetiu a pergunta.

– Me dá um autógrafo?

– Onde? – perguntou Dolores.

– Na minha mão.

E ela deu, escreveu um D bem grande seguido de seis letras pequenininhas. Por alguns segundos Dolores teve a mão de André entre as suas e ele pôde sentir-lhe o calor e a maciez. Adiou tirar a mão, esboçou um sorriso e um obrigado e voltou ao grupo, cabeça erguida, orgulhoso. Curiosos, os amigos serviram-lhe cerveja, queriam que ele contasse tudo, e André assim, assim, retardando a descrição, fazendo-se de difícil, curtindo o momento de glória!

– A boca, vocês viram? – dizia André. – Os lábios, o que é aquilo? Os olhinhos apertados, o cabelo caindo em cascatas pelos ombros.

– Volta lá, volta lá – diziam todos.

E ele foi. Foi e a convidou para tomar um picolé. As tias fizeram que sim com a cabeça e Dolores aceitou. E saíram os jovens pela praia, arrastando os pés pela areia. Pediram de uva. O sol era forte e o picolé pingou na mãozinha de Dolores. André pediu para limpar e o fez com a boca. Dolores riu. E assim eles andaram pela praia, os amigos acompanhando de longe. Foi quando um rapaz chegou onde estavam as tias e perguntou por ela. O moço era grande, do tipo sarado, um atleta. Disseram-lhe que Dolores tinha ido buscar um picolé, estava quente, que ele fosse dar uma volta, ela já voltava. O moço era calado e grande, e disse que preferia esperar ali.

– Ele vai matar o André – disse o Zoca.

– Se ele engrossar, a gente vai lá – falou o Guimba -, eu bato em cima e você pega por baixo – disse, dirigindo-se ao Zoca.

– Não sei, não – falou o Zoca -, o cara é muito grande.

– É grande mas não é dois. A gente pega ele se ele engrossar com o André – completou o Pé de Valsa, animado pelas bramas.

Daí a pouco chegou o casal.

– Oi, Du, esse é o André, um amigo que conheci aqui na praia. Ele me comprou um picolé.

E Dolores dizia isso como se fosse a coisa mais natural do mundo. André, pela cor do rosto, não parecia achar isso tão natural assim. Foi quando o moço resolveu levantar. E não parava mais de crescer. Olhou André lá de cima e disse:

– Faz o seguinte André, me busca um desse, de uva. Quanto é?

– Nada, não é nada – disse o nosso antropólogo. – Eu busco, eu busco.

E André ainda pôde ver o moço enlaçando a cintura de Dolores, que se entregava ao beijo com ardor.

Do lado do Jura Que Sabe a tensão se estabelecera. Eles eram muitos. Por mais que o moço fosse grande, se tivessem que defender André, o torcedor mais fervoroso do esquadrão, embora não jogasse nada, o fariam destemidamente.

André voltou correndo, para não dar tempo do picolé derreter. Tremia de apreensão quando entregou o sorvete ao moço. O pior de tudo era a calma do rapaz. Ele bem poderia ter visto André limpar o pingo do picolé com a boca.

Mas não, o moço não se alterou. Com Dolores enganchada em seu pescoço disse, simplesmente:

– Obrigado. Pode ir.

E André foi, um tanto cabisbaixo, em direção aos amigos. Chegou, sentou-se, pegou uma brama e bebeu direto da garrafa. Os amigos, indignados, comentavam, “Ele vai deixar barato?”, “Não vai reagir?”, “É muita humilhação, seria melhor apanhar”, “Foi tratado como menino de recados”. André tomava sua cerveja indiferente aos comentários. No guarda-sol das tias, Dolores, enganchada no pescoço do grandão, desfilava sua graça.

Guimba não aguentou. Sentou-se ao lado do jovem antropólogo, prestou solidariedade e perguntou se ele queria ajuda. Ele, Guimba, caso André quisesse, iria ao espaço das tias e chamaria o grandão às falas. Aquilo não se faz, dizia ele, e tamanho não é documento. Um membro do Jura Que Sabe não se curva a humilhações.

Estranha era a calma de André, a tal ponto que irritou Guimba. Quando o craque do Jura Que Sabe já se levantava para ir embora, André abriu lentamente sua mão direita e mostrou-a a Guimba. Lia-se, abaixo de Dolores, escrito em números pequenininhos e delicados, o celular da sereia.

Para interagir com o autor: jbfreire@universidadedofutebol.com.br

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Trilogia dos dólares

A “Trilogia dos dólares” é conhecida como a trinca de filmes que Sergio Leone, diretor italiano, produziu em sequência entre 1960 e 1970.

Por um punhado de dólares, Por uns dólares a mais e Três homens em conflito são os títulos que tornaram mundialmente famosos o gênero western spaghetti e o ator Clint Eastwood.

No primeiro filme, a personagem vivida por Eastwood, um misterioso e desconhecido pistoleiro, chega a um lugarejo dominado por dois grupos rivais, que disputam o contrabando local.

Assim, ele vê uma excelente oportunidade de se envolver com os dois lados, e ganhar dinheiro dos dois lados.

Já no segundo filme, Eastwood e Lee Van Cleef interpretam caçadores de recompensas, na disputa para capturar o bandido mais procurado e perigoso da região.

O dilema está entre eliminar um ao outro primeiro, ou unir forças, capturar o fugitivo e dividir a recompensa.

No terceiro filme – e o melhor – também conhecido como O bom, o mau e o feio, três errantes bandoleiros vão em busca de um tesouro perdido, em que cada um sabe apenas uma parte da localização exata. Eis que se unem, mas não estão dispostos a dividir o tesouro entre si.

Nos três filmes se percebe que os personagens são quase amorais, e que o único valor que enxergam à frente é o do dinheiro.

O futebol mundial e brasileiro, cada qual à sua forma e proporção, tem observado um período maquiavélico em que os fins justificam os meios.

A realização da Copa 2014 e as obras atrasadas, a falta de apoio da CBF ao futebol feminino, a desintegração do Clube dos 13 a partir do fracasso da renegociação dos direitos de TV, a falta de visão do futebol como efetivo meio de transformação social e educacional, a postura sublime dos dirigentes esportivos, perpetuados no poder, a falta de vibração e envolvimento legítimos e comprometidos dos jogadores com a seleção brasileira.

Tenho a impressão que estamos no meio de um cenário de Sergio Leone, numa trilogia de futebol spaghetti.

Ouso indicar três roteiros:

Um agente de jogadores passa a representar um grande treinador, que chega a um grande clube. Ele vê a chance de ganhar dinheiro dos dois lados, ao oferecer jogadores ao treinador representado por ele mesmo. Afinal, quem paga a conta é o clube.

Um jogador e um diretor se odeiam, e um quer que o outro saia do clube. O problema é que dependem um do outro para que o clube possa conquistar vaga na Libertadores. Unir forças ou eliminar a força contrária?

Um governante, um presidente de clube e um dirigente estão às voltas com a construção de um estádio para a Copa. Cada um tem apenas parte da solução do problema. Acabam se unindo, mas não querem dividir os “restos a pagar” oferecidos por uma empreiteira.

O futebol também daria bons filmes.

Para interagir com o autor: barp@universidadedofutebol.com.br  

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O treino pautado na complexidade: trazendo o jogo para o treino

A preparação desportiva por muito tempo teve como objetivo principal o desenvolvimento físico e técnico dos atletas. Esse fato ocorreu, pois o futebol importou e incorporou as teorias provenientes do atletismo e do fisiculturismo.

Com o passar dos anos, as teorias e os paradigmas que norteavam o treino foram se modificando.

Hoje, estamos em pleno processo de integração das componentes do jogo de futebol. A complexidade é o paradigma emergente, porém não é trivial criarmos uma sessão de treino que integre e desenvolva as capacidades física/técnica/tática/mental dos jogadores de forma ideal.

Antes mesmo de pensar a sessão de treino é preciso olharmos para o jogo e fazer uma breve análise de como é nossa capacidade de entendimento do mesmo, pois a forma como enxergamos o jogo reflete diretamente na nossa concepção de treino. Logo, para podermos discutir e criar treinos sobre uma nova perspectiva, é preciso olharmos para o jogo através dos óculos da complexidade.

Com esses óculos podemos observar que o jogo é físico, é técnico, é tático e é mental de forma integrada. A partir dessa análise podemos iniciar o pensamento sobre o treino pautado na complexidade.

Se o jogo é físico, é técnico, é tático e é mental, o treino precisa ser da mesma forma. Se isso não ocorrer, estamos indo contra a especificidade da modalidade. O treino sobre a perspectiva da complexidade deve gerar adaptações específicas no jogar da equipe e não apenas no correr, passar ou ocupar um espaço dos jogadores.

Mas como fazer isso? Trazendo o jogo para o treino!

A resposta parece óbvia, mas carrega uma infinidade de conceitos e conteúdos. Trazer o jogo para o treino significa submeter os jogadores as imposições do jogo, porém de maneira orientada e sistematizada pela comissão técnica.

Trazer o jogo para o treino não significa ainda criar vários mini-jogos ou passar apenas coletivos para a equipe.

Trazer o jogo para o treino é criar um ambiente de desenvolvimento pautado no jogo e para o jogo. Neste ambiente, o DNA do futebol estará presente.

Este DNA nos mostra que o jogo é imprevisível, que seus acontecimentos são aleatórios, que há sempre uma disputa entre duas equipes, que há um campo e uma bola…

Porém, não basta apenas ter o DNA do jogo, senão ficaremos na “metodologia do jogo pelo jogo”. Precisamos ir além e criar regras que potencialize determinados comportamentos que desejamos para a equipe. Por exemplo, se quero trabalhar a manutenção da posse de bola, devo criar regras em que a equipe seja beneficiada quando fica com a posse de bola, ou seja, a equipe marca ponto quando fica com a bola por um determinado tempo ou quando trocar n passes.

Esse tipo de regra não descaracteriza o jogo e cria uma situação onde um determinado comportamento é estimulado.

Cada atividade com sua regra traz uma situação-problema para os jogadores que precisam criar estratégias para resolver cada uma delas. Essa capacidade de resolução de problema deve ser estimulada treino a treino; entretanto, para que isso ocorra de forma gradual, é preciso organizar um processo em que cada atividade terá ligação com as demais e trará sempre uma nova informação para cada um dos jogadores, criando assim um ambiente de aprendizado constante.

Criar as atividades e organizá-las processualmente não é nada trivial, entretanto é um desafio que se faz necessário nesta metodologia pautada na complexidade.

Por conta da “complexidade” do assunto, continuaremos discutindo essa temática nas próximas colunas!

Até a próxima!

Para interagir com o autor: bruno@universidadedofutebol.com.br

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O currículo de formação do atleta – parte III

É consenso que o jogar de uma equipe é construído no dia-a-dia de treinamentos, porém, como construí-lo já não compreende uma opinião comum de todos os profissionais do futebol. No processo de ensino-aprendizagem, os treinamentos analítico, integrado ou sob uma perspectiva sistêmica dividem seus seguidores de acordo com o olhar que cada um tem sobre a modalidade.

Pensando o futebol em sua totalidade e os treinamentos em função do jogo que se quer jogar, o currículo de formação já apresentado em colunas anteriores divide cada jogo (treino) em quatro diferentes classificações de acordo com a lógica do jogo de futebol.

A primeira, denominada jogo conceitual, apresenta dimensões distintas das oficiais, número de jogadores (ou até mesmo de equipes) diferentes e alvos em maior, menor ou igual quantidade em relação ao futebol formal. A manipulação destas variáveis, além das regras do jogo, permite a criação de infinitas atividades para aprendizagem, aperfeiçoamento ou domínio de determinado conceito.

As figuras abaixo ilustram alguns exemplos dos elementos que constituem os jogos conceituais:

Diversas regras podem ser utilizadas nos jogos acima, entre elas: tempo para recuperar a posse, tempo para ultrapassar o meio-campo, tempo para finalizar, limitação de toques, passes errados, drible obrigatório, utilização de perna não dominante, não devolver para o mesmo jogador que fez o último passe, quantidade mínima de passes para finalizar, quantidade máxima de toques para finalizar, setor de recuperação da posse, quantidade mínima de jogadores atrás da linha da bola, defesa completa do goleiro, etc.

Para todas as regras e pontuações que compuserem um determinado jogo, logo, para cada jogo, uma nova lógica interna existirá e que poderá estar muito próxima ou muito distante da lógica do jogo de futebol.

A segunda classificação se refere aos jogos conceituais em ambiente específico, com a mesma possibilidade de intervenções, respeitando o espaço formal de jogo. Neles, mantém-se também a estrutura de alvo a atacar e a defender como podem ser vistas nas figuras abaixo:

Assim como na classificação anterior, as regras do jogo e as pontuações definirão o quanto o jogo criado se aproxima do futebol.

O terceiro tipo de jogo denomina-se jogo específico e assemelha-se ao conhecido “coletivo apronto”. Nestes jogos, com a presença das regras oficiais, observa-se a aplicação do Modelo de Jogo da equipe e a transferência das aprendizagens dos dois tipos de jogos anteriores. Há possibilidade de alterações de caráter estratégico e também de treinos com superioridade ou inferioridade numérica.

A última classificação abrange os jogos contextuais, que são jogos específicos pensados em função das características de jogo do próximo adversário. A plataforma, os comportamentos ofensivos, defensivos, de transições e as características dos jogadores em cada posição tentam ser simulados pela equipe reserva com o objetivo de se aproximar da realidade da competição.

Então, a partir dos quatro tipos de jogos descritos, quais fatores considerar na elaboração do planejamento de treinos de uma equipe? São eles:

– Faixa etária
– Dia da semana
– Nível de aplicação do Modelo de Jogo pretendido
– Competição
– Objetivos do clube

Não existe receita pronta da quantidade de cada tipo de jogo e as melhores combinações para determinada equipe. Esta trabalhosa tarefa deve ser coerentemente definida por todos os membros da comissão técnica a fim de que as demandas técnicas, táticas, físicas e emocionais da competição sejam suportadas e para que as respostas coletivas ideais de cada problema do jogo sejam aplicadas.

Por exemplo, quem trabalha com categorias de transição (sub-11, 12 e 13) deverá perceber qual tipo de jogo melhor se adequa à realidade da sua equipe. Em outra situação, numa categoria sub-20 na antevéspera de uma partida, deverá ser pensado qual o tipo de jogo e por quanto tempo será aplicado.

Outro exemplo, de acordo com o Modelo de Jogo pretendido numa equipe sub-17, em determinada fase do jogo, montar o treino que será mais eficaz para evolução do jogar da equipe. Há também a definição da
atividade de acordo com a situação na competição e, ainda, o que o clube espera do elenco em questão.

Vale ressaltar que a correta distribuição destes jogos num processo de formação é somente uma das inúmeras variáveis que podem trazer resultado (lucro e sustentabilidade) em longo prazo para um clube. Como parte do currículo, os diferentes tipos de jogos estão sendo aplicados em cada categoria do Paulínia FC, considerando os fatores acima identificados.

Em colunas futuras, exemplos de jogos conceituais e jogos conceituais em ambiente específico serão apresentados para propor discussões teórico-práticas acerca do treinamento em futebol.

Treinamento este que, atualmente, é feito correndo em volta do campo, saltando, driblando cones, finalizando sem adversários para aperfeiçoar o gesto técnico; ou então, por meio de jogos reduzidos, de alta intensidade, em que o desenvolvimento da vertente física é a grande preocupação; e até mesmo, através de jogos que levem a performance da equipe ao utópico Modelo de Jogo da comissão técnica. Depende do olhar que cada um tem sobre a vida…

Para interagir com o autor: eduardo@universidadedofutebol.com.br

 

“Como Ensinar Futebol”: conheça o novo curso on-line oferecido pela Universidade do Futebol

Leia mais:
O currículo de formação do atleta de futebol – parte I
O currículo de formação do atleta de futebol – parte II