Categorias
Sem categoria

Tombamento do futebol

Há alguns meses, escrevi a respeito da mobilização de torcedores do Fluminense, junto ao Cristo Redentor, no Rio de Janeiro, pedindo aos céus que livrassem o clube do rebaixamento.

Eu, particularmente, acredito que quem salvou o clube foram Cuca, Fred e companhia.

Entretanto, como havia vaticinado naquela ocasião, nem a reza fora de campo, tampouco o milagre dentro de campo que manteve o clube na elite do futebol nacional são sinônimos de boa gestão no presente e para o futuro da instituição.

Ontem, outra manifestação de amor e fé foi realizada no Rio de Janeiro, na tentativa de salvar mais um clube de futebol.

Dessa vez, o beneficiado foi o América-RJ. Clube histórico, o segundo time do coração de todos na cidade. Também, historicamente, atolado em dívidas que ameaçavam a sede do clube com um leilão judicial.

A saída: decreto do prefeito determinando o tombamento legal do imóvel. O tombamento é a modalidade de intervenção na propriedade por meio da qual o Poder Público tem a intenção de proteger o patrimônio cultural brasileiro.

Desta forma, o Estado intervém na propriedade privada para proteger a memória nacional, bem como a sua história, arte, arqueologia, cultura e ciência, preservando a memória de bens de valores arquitetônicos e históricos.

Assim, podemos dizer que os principais efeitos do tombamento são a vedação ao proprietário do bem em destruir, demolir ou mutilar o bem tombado, bem como a proibição de reforma ou pintura do imóvel, exceto após autorização judicial.

Mais ainda, o proprietário deverá manter e conservar o bem tombado dentro de suas características culturais e, caso não tenha recursos para tanto, deverá comunicar ao órgão que decretou o tombamento, a fim de que obtenha ajuda ou seja substituído por esse na realização das obras necessárias.

Outro efeito do tombamento é conceder o direito de preferência ao Poder Público em caso de alienação do bem tombado, devendo o proprietário notificar o Estado para que exerça esse direito.

Aqui o perigo de que, mais uma vez, o dinheiro público seja gasto para salvar clubes de futebol que fazem parte da história do Brasil e que, historicamente, são mal administrados.

Nada disso impede o leilão judicial. Apenas determina ao novo proprietário que obedeça às normas acima. Esperneio em vão…

A gestão dos nossos clubes de futebol não necessita de decreto de tombamento. Já está “tombada” há algum tempo.

Em tempo: nada contra os clubes cariocas. Fluminense e América-RJ foram objetos das colunas por mera coincidência.

Ou será que são um microcosmo altamente representativo do futebol brasileiro como um todo?

Não sei.

Sei que, se algum dia estiver atolado em dívidas, vou rezar bastante e torcer para conhecer o prefeito da minha cidade, pedindo para decretar o tombamento legal da sede da minha empresa e da minha casa.

Pensar e trabalhar… Deixarei pra depois.

Para interagir com o autor: barp@universidadedofutebol.com.br

Categorias
Sem categoria

Vida de jogador de futebol

Nossas escolhas têm, assim como as escolhas de qualquer outra pessoa, 50% de chances de estarem certas e 50% de chances de estarem erradas.

Claro, cada um de nós se baseia em uma infinidade de conhecimentos e experiências anteriores para tomar decisões, e quando decidimos algo, fazemos com a expectativa de que, ao “consultar” esses conhecimentos e experiências nos nossos “registros”, tal decisão seja a melhor.

O fato é que algumas vezes realmente fazemos boas escolhas e outras tantas, não. A cada acerto ou erro, cada um de nós aprende algo, e esse aprendizado é consequência também daquilo que já havíamos aprendido antes.

Isso quer dizer, em outras palavras, que cada um de nós pode enxergar a mesma situação de forma pouco parecida, de acordo com a maneira que aprendemos a ver o mundo (e essa visão se transforma conforme vamos vivendo novas experiências e acumulando novos conhecimentos).

No futebol, ao longo desses últimos anos, tenho tido contato com vários jogadores profissionais. Alguns começando, alguns terminando a carreira, e outros tantos no auge da profissão.

É comum que aqueles que estão terminando a carreira tenham algum tipo de conselho para dar aos que estão começando. E não são conselhos quaisquer; são conselhos daquele tipo: “siga esse caminho que estou indicando, porque eu não segui e me arrependo”.

Ser jogador de futebol e chegar a uma equipe profissional requer muitas coisas além daquelas que são imaginadas por aqueles que almejam “chegar lá”, ou que estão “lá”, mas não querem ser “mais um” no meio da multidão.

Essas “muitas coisas” (além daquelas imaginadas) envolvem uma série de decisões e escolhas que levarão ao mau, bom, pior, ou, melhor caminho.

O problema é que, no caso do futebol, muitas dessas decisões sofrem interferência de empresários, que se tornam “tutores” (tomam à frente de pais mal instruídos), que quando incompetentes ou mal intencionados condenam ao fracasso adultos jogadores que um dia foram garotos sonhadores cheios de talentos.

No futebol, assim como na vida, de uma maneira geral, uma escolha errada é capaz de desencadear uma série de eventos que podem nos levar a caminhos que não faziam, no início, parte do nosso mapa guia.

Mas no futebol, como, habitualmente, desde as categorias de base, jogadores acabam sendo tutelados por pessoas que se acostumam a tomar decisões por eles: fazer uma escolha errada significa ser passageiro de um ônibus onde o motorista decide para onde virar a direção, de acordo com a sua visão de mundo – o jogador (o passageiro) não sabe que rumo o ônibus vai tomar, e o motorista (o tutor) não faz ideia de onde quer chegar.

Então, se você é pai e seu filho quer ser jogador de futebol, abra bem os olhos! E se está lendo esse texto, não há desculpas; você faz parte do grupo de pessoas que tem acesso a internet, a informação. Por isso, pesquise, leia, ajude.

Se já é jogador, e está começando, está no auge ou no final da carreira, acredite no que vou dizer: se você não se preparar para a vida fora do campo de jogo, e deixar que outras pessoas decidam sua vida por você, no final, possivelmente você não vai estar no lugar que gostaria de estar, mas sim naquele lugar que fizeram você acreditar que era o melhor.

Somos responsáveis em nossas vidas tanto por aquilo que fazemos, quanto por aquilo que deixamos de fazer… Então, decida você mesmo.

Para interagir com o autor: rodrigo@universidadedofutebol.com.br

Categorias
Sem categoria

'Invictus' e simpáticos

Se você ainda não viu, corra para assistir “Invictus”, filme com o sempre simpático vovô Morgan Freeman e Matt Damon, que não é vovô e, também, nem tão simpático assim, e dirigido por Clint Eastwood, que deve ser um dos vovôs mais antipáticos do mundo. Eu, pelo menos, teria muito medo de ser neto dele.

De qualquer maneira, o filme é bacana. Não é nenhuma obra-prima, mas é legal. Não que eu seja um gordo de cavanhaque e que, portanto, tenha uma válida opinião sobre obras cinematográficas, mas o filme é divertido. Flui bem e você sai do cinema se sentindo bem pelas duas horas bem gastas.

Só que se você se interessa pelos macro-aspectos do futebol, você precisa assistir por mais motivos do que puro entretenimento. Primeiro, porque o filme conta a história da eleição de Mandela e a relação entre política e esporte. Quer dizer, como um político pode usar o esporte para atingir objetivos próprios. No filme, isso fica bacaninha. Afinal, é o Mandela sendo interpretado pelo Morgan Freeman. Não dá pra um personagem ficar muito mais simpático do que isso. Mas é bom lembrar que o que acontece ali aconteceu em vários de lugares ao redor do mundo, muitas vezes envolvendo ditadores, chacinas e coisas do tipo. No Brasil, por exemplo, o futebol foi e por vezes ainda é utilizado da mesma maneira que o Mandela usou o rugby. No filme, fica legal. Na vida real, nem tanto.

E segundo, e talvez mais importante, é entender o contexto do filme em si, e não da sua história. Não é coincidência nenhuma que um filme sobre o rugby na África do Sul tenha sido lançado em 2010. Afinal, é o ano em que a Fifa quer fincar sua bandeira e proclamar que a partir de então, a África do Sul é mais um país a integrar a grande nação futebolística. E o filme “Invictus” é apenas uma das maneiras que a IRB, International Rugby Board, tem pra dizer “nã-nã-nã”, a África do Sul não é do futebol. É do rugby. Afinal, conforme você pode ver no filme, foi o rugby que uniu o país no pós-apartheid. Foi o rugby o maior responsável pelo sucesso do Mandela. Foi o rugby que conseguiu se sobrepor à hercúlea tarefa de unir brancos e negros sob o mesmo fenômeno, sob a mesma bandeira e sob o mesmo hino. E não o futebol. Futebol, como um personagem fala no filme, é um jogo de cavalheiros, jogado por hoolingans, enquanto que o rugby é um jogo de hoolingans disputados por nobres cavalheiros.

A batalha do rugby com o futebol vem desde a própria fundação dos dois esportes, um pouco depois da metade do século XIX. A partir de então, o futebol se firmou como o maior esporte global e o rugby acabou se firmando como o maior esporte das colônias britânicas, notadamente na Oceania e África do Sul. Só que o rugby vem se desenvolvendo bem ao longo dos anos. É, possivelmente, o único esporte coletivo capaz de fazer frente à popularidade do futebol. Existem regiões da Inglaterra, principalmente a região norte, em que o rugby é muito mais popular que o futebol. E países com grande tradição futebolística, como Argentina e França, também são grandes redutos do esporte. Isso faz da IRB possivelmente a grande rival da Fifa, ainda que a primeira conte com 95 filiados e a segunda tenha seus 205, 206, 207, dependendo do dia e do humor.

Não que o rugby tenha atualmente qualquer condição de desbancar a popularidade do futebol em escala global, longe disso. Mas o mundo está em um constante estado de mutação, e o fenômeno globalizado do futebol é recente demais para dizer que manterá tal status para sempre. Se há 50 anos o futebol não tinha a força global que possui hoje, quem garante que daqui a 50 anos ele continuará a ter?

Ninguém. Nem o Morgan Freeman. Por mais simpático que ele seja.

Para interagir com o autor: oliver@universidadedofutebol.com.br

Categorias
Sem categoria

Pão caseiro

O processo de formação de jogadores de futebol, no Brasil, ao longo de sua história, foi muito mais intuitivo do que planejado estratégica, cientificamente e pedagogicamente.

Com efeito, a origem multifacetada dos garotos que ascendem das categorias de base dos clubes dificulta a construção de uma metodologia consolidada e condizente com sua história e perfil sociocultural, bem como, econômico.

Dificulta, mas não deveria impedir.

Não são poucos os clubes brasileiros com um belo histórico de formação de grandes jogadores. São Paulo, Santos, Cruzeiro, Grêmio e Internacional, atualmente, são os maiores expoentes. E têm faturado muito dinheiro com transferências internacionais de jogadores a partir da década de 1990, quando se deu a explosão deste fenômeno.

O Internacional acaba de fechar um acordo de colaboração com o Tottenham (da Inglaterra). O que querem os ingleses? Saber quais são os segredos do clube na formação em série de ótimos jogadores.

Fora deste eixo, Vitória, Paraná Clube e, até mesmo, o América-MG, para citar exemplos, tornaram-se referência na revelação de talentos. Os dois primeiros até figuraram em competições regionais e nacionais com competência.

Entretanto, com a velocidade ditada pela globalização mundial – e o futebol é o fenômeno que melhor lhe representa e dela faz bom uso – a grande maioria dos clubes no Brasil negligenciou suas receitas caseiras de formação de jogadores e ficaram condicionados à linha de produção em larga escala, exigida pelos mercados compradores.

O grande problema reside no fato de que não conseguiram valorizar justamente aquilo que sempre diferenciou nosso país e o tornou sinônimo de bom futebol: ter um padrão mínimo de qualidade nessa metodologia de formação.

O resultado é que se confunde formação com revelação. Temos revelado, ainda, bons jogadores. Mas em número cada vez menor, apesar do volume de transferências ao exterior ter crescido.

O grande sintoma da falta de sustentabilidade desse modelo é que, também, o número de repatriados aumenta a cada ano. Por um lado, bom para que nossas competições se fortaleçam com melhor nível técnico. Por outro, o perigo de que se comece a perceber que jogador brasileiro “é tudo igual”, mas pelo lado ruim…

Robinho ilustra boa parte dessa história.

Não há um verdadeiro método de formação de jogadores consolidado no Brasil. Não conseguimos capturar nossa essência e transformá-la numa linha de produção de nível internacional.

O renomado professor João Paulo Medina defende que o futebol brasileiro é forjado em três cenários: a praia, a rua e o futsal. O conjunto deles é que faz imprimir a marca do futebol brasileiro nos jogadores.

Acrescento, modestamente, a necessidade de um componente pedagógico na formação. Isso mesmo, ensinar regras, tática, comportamento, disciplina, aprendizado humano mais amplo, além da própria educação formal nos colégios. Esquece-se da valorização do ser humano, fundamental para formar, e não apenas revelar.

Em recente conversa com um treinador italiano, dizia-me que, em sua época de jogador sub-20 do Genoa, todo mês os boletins escolares eram avaliados pelos dirigentes, como em muitos clubes italianos.

Numa dessas, mesmo ele sendo capitão da equipe, por estar com notas baixas, treinou a semana inteira, mas não jogou no fim de semana.

Não é exagero, portanto, o que se escuta sobre o nível de exigência profissional dos clubes europeus.

Devemos repensar a receita do nosso pão caseiro. Não esquecer a sua essência. Ao contrário, aproveitar-se dela com sabedoria e organização.

Para interagir com o autor: barp@universidadedofutebol.com.br

Categorias
Sem categoria

Os interesses do gestor no desenvolvimento da tecnologia esportiva

Olá amigos!

No texto anterior, fizemos a seguinte pergunta referente aos novos produtos e recursos tecnológicos no esporte: “Quem participa do desenvolvimento desses novos produtos, das inovações que chegam tanto ao publico como ao atleta e treinador?”.

Identificamos alguns segmentos e profissionais que podem ou devem fazer parte do processo de desenvolvimento, cada qual com um interesse específico. Ou ainda com mais de um interesse.

Hoje, damos sequência ao tema, tentando especular sob a ótica do gestor esportivo. Imaginando como ele deve encarar e participar desse processo.

O que representam as inovações para o gestor?

Nesse aspecto, é necessário fazermos, ainda que superficialmente, alguns esclarecimentos e diferenciações. Para ser breve caracterizemos dois tipos e gestor.

O gestor fornecedor é aquele que lida com o desenvolvimento das inovações que chegarão ao esporte, ao público, que busca desenvolver e ampliar mercados por meio de inovações ou melhorias em seus produtos e serviços.

O gestor usuário é aquele que se beneficiará dos serviços e produtos, utilizando-os como instrumentos para alcançar seus objetivos.

Para o gestor fornecedor, é possível identificarmos como interesses:

O desenvolvimento de um produto que ganhe escala ou grandeza financeira;
Fortalecimento da imagem da empresa;
Aquisição de valores agregados, atribuídos pelos consumidores como qualidade e solução.

Para tanto é necessário que sua participação seja parametrada em pesquisa de mercado do ponto de vista de identificar o que o consumidor procura, seja ele o gestor usuário, ou mesmo o grande público. E o mais importante: conseguir gerir um modelo de negócios que contemple ambos, seja aproximando-os sob algum eixo comum do produto em si, seja unindo-os sob o prisma de imagem e publicidade (o que é mais comum).

Uma chuteira pode calçar uma equipe inteira mediante acordos financeiros vantajosos, o que contempla alguns dos interesses do gestor usuário, porém não se pode esquecer da qualidade e inovações para o seu principal usuário no campo do alto rendimento que é o atleta, o elemento comum entre os segmentos de alta performance e o grande público (com este por meio da imagem).

Por outro lado, o produto deve ser pensado como qualquer outro visando o grande público, além das questões comerciais que não entraremos em detalhes, como ponto de distribuição, por exemplo, do ponto de vista tecnológico deve oferecer ao consumidor alguns aspectos primordiais como segurança e conforto, além dos fatores mercadológicos como design e individualidade.

Lembro remotamente de um recente suposto problema com um modelo de chuteira que foi ventilada como possível causa de lesões em atletas de alto rendimento, dada a incidência em curto espaço de tempo de algumas graves lesões de joelhos em atletas de alta performance, que provavelmente afeta a imagem junto ao grande público.

Assim, é imprescindível a participação do gestor fornecedor na concepção do projeto de novos produtos, nas tomadas de decisões estratégicas e no acompanhamento das tendências do mercado consumidor.

Quanto ao gestor usuário, podemos identificar como interesses:

A utilização dos produtos e serviços para otimização dos processos utilizados para alcançar seus objetivos, seja ele gestor de uma entidade esportiva vinculada a resultados de campo, como um clube de futebol ou ainda como entidade organizadora como uma federação;
Obtenção de resultados;
Instrumentos de avaliação e controle;
Ferramentas de apoio e suporte para o desenvolvimento do trabalho.

Para o gestor usuário, o foco vai estar sempre vinculado ao resultado, mas o item relacionado ao suporte ao trabalho ganha importância ímpar nesta questão.

Suporte este que pode estar desde equipamentos de musculação que facilitam os processos de planejamento de treinos, como a aquisição de equipamentos de jogo (chuteiras e uniformes de alta qualidade) a recursos que facilitam e dão suporte ao desempenho dos atletas, como peso do material utilizado, por exemplo.

Neste caso, o sucesso pode ser visto como bons acordos que fornecem materiais e equipamentos em forma de patrocínio para fornecimento de uniformes, por exemplo, como também investimentos feitos pelo gestor em bens ou serviços que possibilitem um bom desempenho tanto do atleta como da comissão técnica. O que é uma boa chuteira e um excelente uniforme para o atleta pode ser um software ou um equipamento especifico para a comissão técnica, mas ambos têm o mesmo significado: suporte e otimização do desempenho, ainda que a questão de fornecimento tenha valores e outros interesses por trás.

Em resumo, enquanto para o gestor fornecedor a tecnologia deve ser desenvolvida com vistas ao mercado, para o gestor usuário o olhar deve ser focado no resultado, e não apenas no resultado medido em numero de vitórias, mas o resultado vinculado a desempenho e performance, permitindo que as qualidades e competências do atleta ou do técnico sejam produzidas nas melhores condições possíveis, sejam elas de estrutura, equipamentos ou sistemas, para aí sim buscar o resultado.

Para interagir com o autor: fantato@universidadedofutebol.com.br

Categorias
Sem categoria

Cabañas e a 'interatividade' do torcedor

O caso é o extremo a que se pode chegar, mas é também emblemático para se pensar um pouco mais sobre a tal “interatividade” que tomou conta da mídia desde que se revolucionou a relação das pessoas com os meios de comunicação.

O tiro dado por um torcedor mexicano na cabeça do meia Cabañas, aparentemente por um desentendimento pela performance do paraguaio dentro de campo, revela um pouco mais sobre a relação cada vez mais bélica entre as pessoas. E que, cada vez mais, se expressa nas ferramentas de interatividade que são liberadas para o torcedor na mídia em geral.

Não, longe de ser contra essa possibilidade de dar “voz” ao consumidor da mídia. Pelo contrário. É fundamental para o desenvolvimento da mídia nos dias atuais colocar o seu cliente na condição de gerador do próprio conteúdo.

Só que a pergunta que não se cala, ainda mais quando acontecem casos como o de Cabañas, é uma só: o consumidor está preparado para essa interatividade?

À exceção de alguns fóruns específicos, geralmente o que se vê por aí é uma agressão aparentemente sem fim de quem tem direito a opinar sobre um determinado assunto. O colunista não falou o que se esperava? É porque ele conspira contra o seu time. O tema não lhe diz respeito? É porque o autor é um “chato”, “vendido”, “desinformado”, e por aí vai…

O pior é que essa agressividade do torcedor, aparentemente, não tem se resumido a veículos em que ele pode se “esconder” sob o anonimato, com pseudônimos, e-mails falsos e afins.

O que era para ser a era em que as pessoas teriam um acesso muito maior ao debate, à troca de ideias, à democratização no consumo da informação tem, infelizmente, revelado o lado mais triste de toda essa história.

E o caso de Cabañas é uma espécie de personificação disso. Em vez de argumentar, de tentar entender a mensagem, de tolerar aquele que erra, ou que simplesmente pensa diferente de você, o torcedor toma a via da agressão. Não tolera o erro, o diferente, o que lhe decepciona.

Não é preciso dar um tiro na cabeça de alguém para que ocorra um crime. É hora de começar a se pensar, mundialmente, numa forma de criminalizar a agressão, a injúria, a difamação e qualquer coisa do gênero também nos fóruns de discussão via web. Só assim, provavelmente, para que as pessoas tenham mais coerência na hora de opinar.

Para interagir com o autor: erich@universidadedofutebol.com.br

Categorias
Sem categoria

De repente Coxixola

Não dormi com o alvoroço. Em dois dias chegaria Raimundo, primo de Oto. Vinha de Coxixola, assim mesmo, com dois xis, uma cidadezinha de dois mil habitantes, sertão do Cariri; Paraíba, é claro. Oto, doido por festa, mobilizou todos os morceguinhos da caverna. Botou-os para caçar mariposas, a iguaria do evento, um verdadeiro banquete para a comitiva de Coxixola. Raimundo não viria só, portanto.

Contou-me Oto que seu primo era poeta, violeiro dos bons, e repentista. Imaginei um morcego de chapéu de couro, gibão e viola. Na comitiva coxixolense, uma equipe completa de Fruitbol, aquele jogo estranho jogado com uma frutinha redonda em vez de bola, passada de bico em bico, até que a fruta seja encaixada num buraco da parede da caverna. Detalhe: essa partida contra o time de Coxixola seria jogada no escuro do fundo da caverna, variação possível somente aos mais habilidosos.

De vez em quando Arnaldo emergia do lago e tragava alguma mariposa desorientada que se desprendia das garras dos quirópteros. Raimundo chegaria dois dias depois.

– Tudo certo? – Perguntei ao morcego.

– Só falta decidir quem será o juiz do jogo. – Ele respondeu.

– E a cantoria, quando?

– Depois do banquete, no mesmo dia do jogo.

Os morcegos da comitiva, como Oto, jogavam Fruitbol, mas eram fanáticos por futebol. Uma parte deles torcia para o Campinense, outra para o Treze, equipes de Campina Grande, já que em Coxixola não havia futebol profissional.

Lá pelas quatro da madrugada os morcegos sossegaram e pude dormir um pouco. Acordei com o sol alto e encontrei Aurora em plena atividade lá fora. Contei sobre a festa que dariam para o primo do Oto. Ela se alvoroçou, perguntou se seria convidada; tive que decepcioná-la. Melhor não, ela não resistiria aos próprios instintos.

No dia seguinte, fim de tarde, aquela revoada de morcegos. Um barulho medonho. Era a comitiva de Coxixola. Bandeiras, apitos, guinchos. Aurora se horrorizou e quis atrapalhar a festa, mas intervim, impedi uma tragédia, tirei um coxixolense do bico da coruja. Os sertanejos se revoltaram, queriam invadir a toca de Aurora. Tive que ser diplomático para acalmar os ânimos. A paz voltou. No fim, foram todos dormir. Morcegos não têm problemas com espaço; penduram-se de cabeça para baixo grudados uns aos outros, sem aquela coisa de se arrepiar ao contato de macho com macho, mesmo sendo paraibanos.

O fruitbol foi marcado para as nove da manhã. Os morcegos contrariam seus hábitos noturnos quando se trata de festa. Os de Coxixola, menos habituados ao esporte, perderam, 6 a 5, para os locais. Tudo bem, não foi uma derrota desonrosa. Animados, foram para o banquete, uma profusão de mariposas, quase mortas. Os locais, capitaneados por Oto, tiveram o requinte de deixar as coitadinhas apenas semi-adormecidas, o suficiente para que voassem, mas presas fáceis dos bicos afiados dos coxixolenses. Em seguida, armou-se a roda, era fim de tarde, hora boa para os violeiros, improvisadores de versos, ágeis na música e na palavra.

A cantoria foi longe, entrou madrugada adentro. O repente juntou Raimundo, grande improvisador e Manoel Osório, morcego que passava as madrugadas dedilhando sua viola e era famoso em todas as cavernas do Cariri. Passaram pelas sextilhas, pelo gênero das sete sílabas, o Brasil Caboclo, o Martelo Alagoano, o Quadrão Perguntado, o Galope à Beira-mar, terminando com o Decassílabo. Transcrevo, de memória, só o finalzinho, um Decassílabo; o mote era “Futebol no Brasil é quase um vício / Nem de longe é o reino da verdade”. Raimundo e Manoel Osório não tocavam em violas, aquelas de cinco cordas que os repentistas usam; raspavam as asinhas, mas o som era idêntico aos dos melhores violeiros. Raimundo começou.

Raimundo

Futebol nesta terra é uma alegria
Vez por outra ele vira uma desgraça
Para alguns ele é como a cachaça
E tem quem ache que é pura fantasia
Quem não gosta dessa tal filosofia
E acha nele só motivo de maldade
Engana o povo de todas as idades
Pão e circo é de tudo só o início
Futebol no Brasil é quase um vício
Nem de longe é o reino da verdade.

Manoel

Volta e meia o juiz mostra o cartão
O povo cala, ele usou o regulamento
Acredita que o tal do elemento
É o homem mais justo da nação
Há quem grite, o sujeito é um ladrão
Traidor, vai perder a liberdade
Foi honesto quando tinha mocidade
Envelheceu, fez do roubo um ofício
Futebol no Brasil é quase um vício
Nem de longe é o reino da verdade.

Raimundo

Veja a vida lá em casa, que tristeza
Falta carne na mesa todo dia
Nem pro trabalho eu tenho energia
Mas o Treze jogando é só beleza
Meu senhor, me desculpe a franqueza
Não há time melhor nesta cidade
Se eu não fosse um homem de idade
Eu jogaria até com sacrifício
Futebol no Brasil é quase um vício
Nem de longe é o reino da verdade.

Manoel

O rubro negro é que faz minha alegria
O Campinense é meu time meu irmão
Meus problemas eu esqueço no Amigão
Mas envergonha a falta de decência
Pelas ruas eu só vejo violência
Tem político que finge honestidade
Jogador que falsifica a identidade
Dirigente que é o rei do malefício
Futebol no Brasil é quase um vício
Nem de longe é o reino da verdade.

Aplausos, todos se diziam vencedores, delírio de alguns, bebedeira, cansaço. Dormiram felizes. Morcegos não podem voar de dia; aguardaram o fim da tarde e, alguns entre lágrimas, despediram-se, os de cá prometendo visita, os de lá cheios de saudades do Cariri.

Para interagir com o autor: bernardo@universidadedofutebol.com.br  

Categorias
Sem categoria

Você está pronto para trabalhar com futebol?

Hoje vou fugir do habitual texto sobre questões táticas do jogo, para dissertar a respeito de algo que, aqueles que trabalham com futebol e passam mais tempo convivendo com as pessoas desse meio (jogadores, treinadores, preparadores físicos, roupeiros, massagistas, fisioterapeutas, médicos, etc.) do que com suas esposas, filhos e pais, vão entender muito bem (e aqueles que não são, mas querem ou já quiseram ser, certamente também).

A motivação para escrever o que se segue, nasceu de uma pergunta feita por um jornalista de conceituada rede de televisão (que estava, havia alguns dias longe da família, para “cobrir” os acontecimentos de uma partida de futebol), a um de meus companheiros de trabalho.

Ele (o jornalista) queria entender como “nós do futebol” conseguíamos ficar tanto tempo trabalhando em cidades distantes e longe da família, vendo filhos ou esposa, apenas 10 ou 20 dias por ano, e passando a maior parte do tempo longe de casa.

A pergunta não foi feita para mim, mas fiquei pensando nela.

Mais tarde, procurei o preparador de goleiros, o massagista (um chileno-brasileiro de grande coração, com duas décadas de futebol) e depois alguns outros amigos do trabalho, e fiz a seguinte pergunta para cada um deles:

Se você soubesse a data exata em que o mundo vai acabar (se é que o mundo vai acabar), onde e com quem, você gostaria de estar e de passar seus últimos momentos?

Com exceção do meu amigo preparador físico, que disse que gostaria de estar em um lugar distante (que tem para ele, um significado particular) aproveitando uma grande festa, com uma multidão de gente (sem a presença de ninguém em especial), todos meus outros companheiros de trabalho não vacilaram em dizer que gostariam de estar perto de suas famílias (filhos, esposa, pais), aproveitando o máximo possível o tempo juntos.

Todos eles amam o que fazem.

Trabalham todos os dias com o mesmo grande entusiasmo do primeiro dia de trabalho. Cada um com sua história diferente, cada um com suas metas e sonhos particulares. Todos com o Futebol (aqui como nome próprio) em comum.

Mas tão certo quanto a necessidade explicita de trabalhar com aquilo que trabalham, há escondido no peito de cada um, um vazio impreenchível, camuflado a não sei quantas dores e hábitos, que vão sendo criados, sem que se perceba, para que possam simplesmente se acostumar.

Interessante e surpreendente para mim, até certo ponto, que além de ter o futebol como elemento em comum, e também as respostas parecidas para a minha pergunta, todos eles estavam bem distantes do lugar e das pessoas que gostariam de passar seus últimos momentos.

Então, se por um lado, cada um deles faz o que gosta profissionalmente, por outro tentam, mergulhando no trabalho, administrar aquilo que lhes falta de mais importante.

O que sei, é que todos, mesmo focados no que tem que ser feito, trazem consigo a companhia da saudade.

Skype, MSN, E-mail, telefones celulares… A tecnologia que cura os sintomas não apaga as causas da dor, da falta de outras pessoas.

Muitos dos meus companheiros de trabalho, no final das contas, dizem que com o tempo vão se acostumando com as ausências… Não sei. Penso que o que deve mesmo acontecer não é um “acostumar com a dor”, mas sim um “ter domínio sobre ela”.

Se me acostumo, nem percebo, esqueço que ela existe (e realmente, não acho que eles esqueçam). Se a domino, sei o tempo todo da existência dela, e apesar dela, caminho controlando-a.

Por incrível que pareça, algumas pessoas no futebol dizem que saudade e dor são sinais de fraqueza. Se tiver saudade, não serve!

Não sei. Acredito mesmo, que fraqueza é perder o controle de si, deixar de ser o que se é.

Talvez aqueles que evitem a dor, tenham medo de perder o controle sobre ela.

Não sei o que está certo ou o que está errado.

O que sei é que eu Rodrigo (treinador, e homem do futebol) não posso me acostumar com ela, porque senão, perco a noção de quando ela se agrava, e se virar sintoma de coisa grave, acabo por ficar sem saber que posso morrer…

O que posso dizer é que não nego a minha, porque não tenho medo dela. O que me resta, é tentar chegar mais cedo em casa depois do trabalho e aproveitar ao máximo o tempo, porque eu não sei quando o mundo vai acabar…

E por falar em “se acostumar”, encerro com um texto de Marina Colasanti. “Acostumaram” a dizer pela internet que ele (o texto) é de autoria de Clarice Lispector (escritora que dispensa comentários – é excelente!). Não é.

“Eu sei mas não devia” (Marina Colasanti – Editora Rocco – Rio de Janeiro, 1996, pág. 09.)

Eu sei que a gente se acostuma. Mas não devia.
A gente se acostuma a morar em apartamentos de fundos e a não ter outra vista que não as janelas ao redor.
E porque não tem vista, logo se acostuma a não olhar para fora.
E porque não olha para fora, logo se acostuma a não abrir de todo as cortinas.
E porque não abre as cortinas logo se acostuma
a acender cedo a luz.
E a medida que se acostuma, esquece o sol, esquece o ar, esquece a amplidão.
A gente se acostuma a acordar de manhã
sobressaltado porque está na hora.
A tomar o café correndo porque está atrasado.
A ler o jornal no ônibus porque não pode perder o tempo da viagem.
A comer sanduiche porque não dá para almoçar.
A sair do trabalho porque já é noite.
A cochilar no ônibus porque está cansado.
A deitar cedo e dormir pesado sem ter vivido o dia.

A gente se acostuma a esperar o dia inteiro e
ouvir no telefone: hoje não posso ir.
A sorrir para as pessoas sem receber um sorriso
de volta.
A ser ignorado quando precisava tanto ser visto.

A gente se acostuma a pagar por tudo o que deseja e o de que necessita.
E a lutar para ganhar o dinheiro com que pagar.
E a pagar mais do que as coisas valem.
E a saber que cada vez pagará mais.
E a procurar mais trabalho, para ganhar mais dinheiro, para ter com que pagar nas filas em que se cobra.

A gente se acostuma à poluição.
Às salas fechadas de ar condicionado e cheiro de cigarro.
À luz artificial de ligeiro tremor.
Ao choque que os olhos levam na luz natural.
Às bactérias de água potável.
Agente se acostuma a coisas demais, para não sofrer.

Em doses pequenas, tentando não perceber, vai afastando uma dor aqui, um ressentimento ali, uma revolta acolá.

Se a praia está contaminada a gente molha só os pés e sua no resto do corpo.
Se o cinema está cheio, a gente senta na primeira fila e torce um pouco o pescoço.
Se o trabalho está duro a gente se consola pensando no fim de semana.
E se no fim de semana não há muito o que fazer a gente vai dormir cedo e ainda fica satisfeito porque tem sempre sono atrasado.

A gente se acostuma para não se ralar na aspereza, para preservar a pele.
Se acostuma para evitar feridas, sangramentos,
para poupar o peito.

A gente se acostuma para poupar a vida.
Que aos poucos se gasta, e que gasta de tanto se acostumar, e se perde de si mesma.

Para interagir com o autor: rodrigo@universidadedofutebol.com.br

Categorias
Sem categoria

Segunda azul

Prepare-se. É bem possível que aquilo que você vai ler a seguir não se encontre em nenhum outro lugar. Nenhum.

Primeiro, porque envolve uma informação retirada de um cartaz de propaganda de um jornal que ficava do lado da porta de um trem e foi vista por mim em 2008, quando ia de Narborough, uma pequena vila do condado de Norfolk, para Londres. Não sei exatamente como, tampouco a razão, mas fiquei com aquela propaganda na cabeça até hoje. E segundo, porque envolve experiência pessoal, que permite contextualizar a razão das ações.

Esses dois motivos somados me permitem sugerir, mas não afirmar, que a história de que o Robinho está voltando para o Brasil por conta da tática que os técnicos usam é a mais balela.

Não conheço o Robinho. Não sei o que ele pensa, tampouco como age. Porém, as coincidências são tão grandes que não há como não imaginar que esse discurso é ensaiado.

A propaganda do jornal no trem, creio que era do ‘The Times’, listava uma série de fatos curiosos e banais e dizia que quem lesse o jornal saberia dessas coisas. Você pode até argumentar que é uma propaganda idiota, mas um ano e meio depois ela ainda está na minha memória. Tudo por conta de um dos itens da lista, que dizia: ‘Você sabia que o dia XX de janeiro é o dia mais deprimente da Inglaterra?’.

Eu nunca me lembrava que dia era esse exatamente. Até o momento em que eu vi que Robinho queria sair do Manchester City. E vi a entrevista dele falando sobre a volta ao Brasil, em claro tom de alívio. A primeira nota a respeito que li, foi no dia 21 de janeiro, logo a notícia é do dia 20.

Algumas palavras jogadas no Google, em sites de jornais ingleses e está lá: o dia mais deprimente da Inglaterra é a terceira segunda-feira de janeiro, também conhecida como ‘Blue Monday’. Em 2010, foi dia 18 de janeiro. Dois dias antes do manifesto interesse de Robinho em voltar ao Brasil. Que, curiosamente, também foi próximo do dia que o Anderson faltou ao treino do Manchester United. A depressão inglesa, portanto, parece ter desempenhado um papel fundamental nessas ações.

Porém, isso está longe de ser algo cientificamente confiável. Muito pelo contrário. A definição da ‘Blue Monday’ é fruto de um release que colocava uma fórmula científica completamente sem sentido, feita por um cara totalmente desconhecido que era meio-professor de uma universidade galesa. Soube-se depois que o release foi obra de um canal de televisão especializado em viagem, o Sky Travel. A equação que determinava qual era a data mais deprimente da Inglaterra era desprovida de qualquer nexo e levava em conta variáveis como tempo ruim, dívidas contraídas no final do ano, resoluções de ano novo já descumpridas, distância para o dia do pagamento, distância do Natal e a ânsia pra tomar alguma ação. Uma equação cientificamente idiota.

Mas que, pelo menos, dá uma referência sobre o que é viver na Inglaterra nesse período.

E eu posso dizer, por experiência pessoal, que morar na Inglaterra não é fácil. E quanto mais para o norte, como é o caso de Manchester, pior. O céu é incrivelmente cinza, a comida é ruim, a temperatura é baixa e o comportamento das pessoas é um tanto quanto violento. Não dá a menor vontade de fazer nada. Para piorar, em janeiro, o sol aparece umas 8h30 – 9h, e some às 16h30. Isso quando ele aparece.

E para piorar mais um pouco ainda, esse é o mesmo período em que todos os seus amigos brasileiros estão de férias, na praia, falando do sol, da cerveja e das outras coisas inclusas no pacote. E você vendo tudo isso pela câmera do computador. Na escuridão das 17h.

Uns alegam que o Robinho e o Anderson são pouco profissionais. Que ganham muito dinheiro e deviam se esforçar um pouco mais. Concordo. Mas também entendo o que eles passam. O tempo frio te faz refletir bastante. Eventualmente, você chega à conclusão que significativas horas de sol a mais valem mais do que alguns milhões na conta. Obviamente que eu nunca refleti sobre isso, mas enfim.

Clubes ingleses, por tradição, pouco se importam com seus jogadores. Eles pagam o salário e, de resto, cada um que se vire. Não é a toa que são raríssimos os casos de jogadores latinos que se dão bem no futebol inglês. Os que se adaptam são mais raros ainda. Tevez, por exemplo, está longe de estar feliz na Inglaterra. Na mesma entrevista que ele chamou o Gary Neville de puxa saco do Ferguson, ele também declarou que apesar de estar a quatro anos na Inglaterra, não fala uma palavra em inglês. E também que está louco de vontade de sair de lá.

Ouvi alguém dizer que o jeito que o Tevez joga em relação ao Robinho mostra que os argentinos são mais profissionais que os brasileiros. Talvez. Mas casos como Crespo e, principalmente, Verón, que foram tão ou mais decepcionantes que Robinho, mostram que o buraco é muito mais embaixo. Mostram que o problema está longe de ser pessoal, mas sim ambiental.

Se ao menos os jogadores pudessem seguir a típica tradição britânica e pudessem descarregar a depressão do inverno na cerveja… Nem isso. Coitados.

Para interagir com o autor: oliver@universidadedofutebol.com.br

Categorias
Sem categoria

Virada de mesa

Vem dos pampas o vento que sopra uma mudança significativa – espera-se – na gestão dos clubes de futebol no Brasil.

O Internacional encaminha mudanças estatutárias para, a partir de 2013, profissionalizar de fato e de direito, a administração do clube, remunerando os quadros executivos do clube.

Não só o presidente, mas também os vices de cada departamento receberão salários, segundo o novo estatuto a ser votado até 2011. O presidente e o vice de futebol deverão ter dedicação exclusiva à agremiação.

Coisa que hoje ocorre apenas com o vice-presidente de marketing do clube, com o segundo e terceiro escalões, passará a estar institucionalmente arraigado de cima para baixo.

Muito se comenta, ao longo da história do futebol brasileiro, o envolvimento pernicioso dos dirigentes dos clubes com as finanças (mal) versadas em causa própria.

Futebol, política e administração pública costumam ter muitos aspectos em comum em nosso país.

A administração pública brasileira, em especial em âmbito federal, tem a ensinar ao futebol.

Antes da promulgação da Constituição Federal, em 1988, na esteira de governadores e prefeitos biônicos, indicados pela ditadura militar, o penduricalho de cargos em comissão e contratados por laços pessoais era o que prevalecia nos quadros administrativos.

A nova ordem político-institucional exigia a qualificação do funcionalismo público, por meio de concursos transparentes, estáveis e com credibilidade. Além de muito bons salários e estabilidade para o desempenho das atividades aos profissionais.

Não à toa vemos a enorme procura por estes concursos nos âmbitos federal, estadual e municipal.

Melhores salários, com a garantia de concorrência leal para a busca das vagas, por meio da seleção em concursos, atraíram os melhores candidatos e melhorou em muito o nível da gestão pública.

Não que isso tenha excluído a lentidão burocrática e a corrupção. Mas todo o processo depurou muita sujeira que entupia nossos canos enferrujados.

Mudança como essa é fundamental e obrigatória, para que os clubes consigam perseguir o equilíbrio financeiro num cenário esportivo nacional ainda em consolidação. Ademais, o sistema atual do futebol, no tocante à gestão dos clubes, tem se revelado, perigosamente, deficitário.

Um exemplo prático de mudança vem do Poder Judiciário que, até pouco tempo atrás, permitia que os procuradores estaduais também exercessem a advocacia. Atualmente, isso não é possível, e as procuradorias melhoraram em muito a prestação do serviço público dela esperado.

O Conselho Nacional de Justiça também cobra produtividade dos Tribunais e seus juízes e desembargadores. Existem metas para o julgamento de processos.

Será que ainda existe espaço para que os diretores e altos executivos dos clubes deem meio expediente? Se sim, o futebol continuará refém de tentativas pouco consistentes de evolução, vindas de fora do sistema, como a Timemania…

Necessitamos de mais dirigentes com coragem para somarem-se aos do Internacional, visando promover a desestabilização do ambiente letárgico de nossa gestão no futebol.

Acredito que o primeiro passo é pagar muito bons salários para atrair pessoas qualificadas. Como num concurso público. Quem sabe, até mesmo com um concurso.

Para interagir com o autor: barp@universidadedofutebol.com.br