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A importância de conhecer o público

Nos últimos anos, canais de TV e salas de cinema do Brasil têm vivenciado uma explosão do número de filmes dublados. Licença para uma constatação extremamente pessoal: eu detesto filmes dublados. Em uma ocasião eu cheguei a procurar a administração de um cinema para reclamar sobre o altíssimo número de atrações assim. “É resultado de pesquisa. A maioria prefere assim”, respondeu o rapaz que trabalhava na empresa.

Continuo achando que filmes dublados são detestáveis. Continuo desistindo de frequentar qualquer sessão ou ver qualquer atração na TV se não há opção de áudio original. Mas desde a resposta do funcionário do cinema eu não discuto mais a opção.

A questão é que a rede de cinemas se esforçou para entender o que o público dela prefere. Ela não deixou de oferecer filmes com áudio original, mas aumentou a incidência de atrações dubladas porque identificou que há mais pessoas que consomem assim.

Corto para o futebol. No último sábado, o Maracanã foi palco de um Fla x Flu válido pelo Estadual do Rio de Janeiro. Um jogo com várias atrações, a começar pela rivalidade acirrada pelo desfecho do Campeonato Brasileiro de 2013 – o Flamengo e a Portuguesa foram punidos pelo Superior Tribunal de Justiça Desportiva (STJD), perderam quatro pontos e evitaram o rebaixamento do Fluminense.

Os ingressos para o jogo de sábado oscilaram entre R$ 100 e R$ 300. Havia opções mais baratas para quem é sócio-torcedor e havia a possibilidade da meia-entrada, é verdade, mas esse era o intervalo para as “pessoas comuns”.

A diretoria do Fluminense chegou a abrir negociação para reduzir os preços. A possibilidade foi rechaçada pela cúpula do Flamengo, mandante do clássico de sábado. Resultado: pouco mais de 15 mil pagantes no Maracanã.

E qual é a relação entre os filmes dublados e os ingressos de R$ 100? Ao contrário do cinema, o futebol não tenta entender qual é o perfil de público que frequenta estádios. Tampouco busca informações sobre as pessoas que pretende atrair.

Ingressos que oscilam de R$ 100 a R$ 300 levam a um estádio um público muito diferente das pessoas que iriam se as entradas estivessem em uma faixa de preço mais baixa. A mudança no poder aquisitivo carrega uma mudança profunda no perfil e no repertório desses consumidores – infelizmente, diga-se.

Um cidadão que decidiu levar a família ao estádio, por exemplo, desembolsou R$ 300 ou R$ 400 apenas com ingressos. Ainda há os custos de alimentação, transporte e conveniências (estacionamento ou “flanelinha”, por exemplo). É um programa que passa facilmente a casa dos R$ 500.

Agora, alguém já se preocupou com o tipo de espetáculo que esse perfil de gente quer ver? Alguém já quis saber qual é o tipo de comida que essas pessoas gostariam de ter em um estádio? E que tipo de produto elas consumiriam?

Alguns clubes de futebol no Brasil trabalham com conceitos de lojas móveis e levam produtos oficiais para todos os jogos. Mas essas lojas levam o mesmo portfólio para qualquer região e qualquer perfil de público.

E a promoção, então? Não há como promover um evento sem saber que tipo de gente você quer levar. Os canais e as estratégias são necessariamente afetados por esses dados.

Notem que aqui não há uma discussão sobre o que representa essa precificação do clássico. É algo diferente, que pode ser abordado em outro momento. A questão é simplesmente conhecer quais são as pessoas que frequentam um jogo de futebol e oferecer um produto condizente com o que elas esperam.

O cinema apostou em filmes dublados porque identificou que essa era a vontade de um grupo de consumidores que as grandes redes queriam atrair. Todo o restante da experiência é moldado por esse perfil.

O futebol, em contrapartida, oferece uma experiência padronizada, sem personalidade. Há o mundo dos camarotes, é verdade, mas essa seara é usada no esporte muito mais para relacionamento do que para venda direta.

Entre as pessoas comuns, não há qualquer estratégia direcionada. Isso vale para antes, durante e depois dos eventos.

Sem isso, é impossível fazer uma promoção adequada de qualquer evento. E sem uma promoção adequada, é impossível aumentar a quantidade de pessoas que vão ao estádio. E sem mais pessoas, é impossível aumentar as receitas geradas no dia da partida (restaurantes, lojas oficiais e outras fontes).

Ainda que de forma incipiente, o futebol brasileiro tem várias iniciativas voltadas a conhecer mais o público. Os planos de sócios das principais equipes do país são atrelados a pesquisas e criação de banco de dados, por exemplo. No entanto, isso ainda não serviu para ocasionar nenhuma mudança profunda na estrutura de evento.

Sabe o tal “padrão Fifa”? Ele existe, entre outras coisas, porque a entidade quer atrair aos estádios um determinado padrão de pessoas. A instituição quer gente com poder de consumo porque isso tem um valor maior para patrocinadores, parceiros e licenciadores das marcas.

E no futebol brasileiro, qual é o padrão? O do clássico do Rio de Janeiro ou o que foi apresentado às 32 pessoas que foram assistir a Ituano x Oeste, válido pelo Campeonato Paulista, realizado em Catanduva?

Já passou da hora de o futebol brasileiro entender que eventos genéricos estão mortos. É fundamental conhecer as pessoas que frequentam os jogos. É fundamental entender como se aproximar mais delas e em que pontos os clubes podem ganhar com isso.

Sem esse entendimento, qualquer discussão sobre preço é inócua. É claro que os ingressos para o clássico do Rio de Janeiro estavam fora da realidade de preços da população brasileira, mas esse não é o pior da história. Se os altos preços fossem fruto de estratégia para atrair um determinado público, menos mal.

O maior problema não é simplesmente o preço. O problema é determiná-lo por simples lei de oferta e procura, sem pensar no que isso acarreta.
 

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Antecipação

O futebol moderno demanda, cada vez mais, rapidez de raciocínio e de execução nos movimentos protagonizados pelos jogadores individualmente.

Coletivamente, isso se transforma em domínio do jogo, uma vez que, ao se antecipar ao adversário e à leitura do cenário – muitas vezes, de forma intuitiva e assentada na complexa trama neural no cérebro – uma equipe se sobrepõe à outra em busca dos gols e das vitórias.

A antecipação é favorecida pelo treinamento, pela repetição, pela sucessão de erros e acertos que fazem com que os comportamentos sejam automatizados de acordo com cada circunstancia que se apresenta nas situações de jogo.

Entretanto, ao contrário do que se possa imaginar, não existem poderes premonitórios, esotéricos ou sobrenaturais quando se trata desta capacidade de prever analiticamente variáveis, executar movimentos e alcançar resultados.

Os mais modernos estudos da neurociência apontam para a direção de que, sim, é possível treinar a mente humana para que a capacidade motora seja aperfeiçoada. O resultado é o corpo e a mente agindo em sintonia e deixando perplexos os admiradores dos grandes craques do futebol.

É disso que vem a expressão “como é que ele consegue fazer isso?” quando uma jogada espetacular acontece nos gramados.

Porém, a cultura, a história e a formação do povo brasileiro sofreram com o pendor das invocações religiosas, em contraponto à racionalidade e ao pragmatismo.

Fosse para explicar o sucesso. Fosse para entender as tragédias.

Sempre a explicação está fora do sujeito. Nunca dele faz parte.

Às vésperas de Copa do Mundo no país e, na esteira, de eleições majoritárias, o que impera é a ansiedade por encontrar culpados pelo sucesso e pela tragédia.

Ansiedade é uma das piores sensações que se pode vivenciar. Paralisa o corpo. Entorpece a mente. Prejudica a visão e a capacidade de crítica e execução.

Não é fato novo a realização da Copa do Mundo no Brasil. Foram sete anos de tempo para se preparar e antecipar-se aos problemas.

Ou só agora o quadro de falta de infraestrutura no país é evidente? Problemas de segurança, transporte, educação, capacitação profissional jamais existiram fora do contexto da Copa do Mundo?

E os órgãos de fiscalização e controle, onde andavam antes e ao longo das obras – incluindo estádios – para que cumprissem seu dever legal e não deixassem haver desperdício e descaminho de dinheiro público?

O problema do Brasil é a transferência de responsabilidade. Como país, parecemos um filhinho mimado que não recolhe e lava a louça do almoço porque sabe que a mãe vai fazer, porque sempre foi assim na casa dele…

Logo, na conjunção de eleições e Copa do Mundo, toda sorte de argumento enviesado pode sofrer apropriação indébita pelos espertalhões.

E os há na política e no futebol aqui no Brasil. Porque ambas as instituições fazem parte da nossa sociedade.

Se você não quer que o Brasil sedie mais uma Copa do Mundo daqui a 50 anos, comece desde já a assumir sua parcela de responsabilidade na decisão e vote bem em outubro.

Se você quer, o caminho é o mesmo.

Mas, sugiro se antecipar a esse momento e começar, desde já, a avaliar o cenário.

Não tem salvação divina ou extraterrena.
 

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O futebol nas páginas policiais

Esta semana cerca de cem torcedores invadiram o centro de treinamento do Corinthians na zona leste de São Paulo ameaçando funcionários e jornalistas, bem como obrigando os jogadores a se refugiarem em uma sala com o consequente cancelamento do treino.

Segundo funcionários do clube, o grupo de torcedores teria, ainda, furtado coletes, equipamentos de treino e celulares.

Diante disso, a ansiedade pelas contratações e jogadas neste início de temporada está sendo substituída pela apreensão.

Alguns torcedores não satisfeitos com a violência dentro dos estádios de futebol acabaram invadindo o Centro de Treinamento de seu Clube e protagonizaram cenas lamentáveis fazendo com que o ano de 2014 comece como terminou 2013, em meio à violência.

Os atos de barbaridade de torcedores devem ser tratados como questão de segurança pública, eis que suplantam o desporto.

A criminalidade cresceu de forma alarmante e este fenômeno tem se refletido no âmbito futebolístico.

Enquanto a impunidade estiver presente, enquanto o Poder Público não adotar medidas enérgicas e efetivas e enquanto os organizadores de eventos esportivos continuarem desrespeitando os direitos do torcedor/consumidor, dificilmente o país vencerá a guerra contra a violência.

O momento exige atenção especial. Nova Iorque venceu a criminalidade aplicando a “teoria das janelas quebradas” e a tolerância zero. A Inglaterra trouxe paz aos estádios de futebol utilizando as premissas do “Report Taylor”. E o Brasil busca “bodes expiatórios”. Primeiro foram as bebidas alcoólicas, agora as Torcidas Organizadas.

Destarte, a minoria de Torcidas Organizadas violentas não pode retirar de outros torcedores o direito constitucional de livre associação para fins lícitos.

A solução para a crescente violência no país deve ser tratada como questão se segurança nacional com punições céleres e severas, além de investimento em educação e medidas pedagógicas.

O limite de tolerância está muito próximo, já que diariamente somos bombardeados com notícias de violência, culminando nas cenas deploráveis ligadas ao futebol, como ocorreu em Joinville e agora, no CT do Corinthians.

Lamentável que a violência esteja maculando uma das maiores paixões do brasileiro, que é o futebol. E, justamente, uma atividade esportiva, tão útil para a saúde e para a promoção da paz.

Dessa forma, é imprescindível que a sociedade civil se una e cobre soluções tanto do Poder Público, quando dos Organizadores de Eventos desportivos e que seja já, antes que não haja mais tempo.

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E agora, qual time usar?

Amigo leitor, em início de temporada é bem comum vermos os grandes clubes de futebol, principalmente aqueles que participam da Copa Libertadores da América, viverem o dilema sobre qual time utilizar no início dos estaduais: o time principal ou reservas?

Na verdade, acho que cada comissão técnica tem suas próprias crenças e convicções pessoais sobre qual caminho seguir em relação a preparação de sua equipe e também quanto a utilizar todos os atletas considerados titulares ou todos os reservas ou até mesclar titulares com reservas nas partidas iniciais da equipe.

Mas, vou incrementar o assunto indo além desta antiga e conhecida discussão, pretendo abordar o quão importante é a questão do planejamento para a temporada e o tamanho da crença que se desenvolve sobre o trabalho, com a consequente confiança de que mesmo com tropeços que por ventura apareçam o melhor está sendo feito para conquistar os melhores resultados na temporada. Aqui, então, quero contribuir com um auxílio para elevar a confiança no planejamento de início da temporada: as metas!

Tratando-se de metas a visualização constante destas pode ser um grande acelerador de confiança para uma equipe de futebol. Então uma vez que visualizar metas constantemente contribui com o aumento da confiança no sucesso, vamos abordar como fazer.

De acordo com Brian Tracy a visualização é composta por quatro partes que todos podemos aprender a praticar para nos certificarmos de conseguiremos utilizar essa enorme força da forma mais proveitosa possível todos os dias.

Com que frequência?
A frequência como primeiro aspecto da visualização é o número de vezes que se visualiza determinada meta como se tivesse sido alcançada ou visualizar a si mesmo tendo um excelente desempenho esportivo. Quanto maior a frequência com que se repete uma imagem mental clara, mais rapidamente esta será aceita pelo seu subconsciente e mais rapidamente se manifestará como parte de sua realidade.

Por quanto tempo?
A duração das imagens é o segundo elemento, ou seja, representa o período de tempo durante o qual você pode manter essa imagem em sua mente toda vez que evoca-la. Quanto maior for o tempo de visualização, mais profundamente ela de gravará no subconsciente.

Com que clareza?
A nitidez é nosso terceiro elemento da visualização. Há uma relação direta entre a clareza com que vemos uma meta ou um desempenho e a velocidade em que ela se materializa em sua realidade. Este elemento da visualização é o que explica a força das leis da atração e da correspondência.

Com que intensidade?
O quarto e último elemento é a intensidade, ou seja, a carga emocional que você deposita na sua imagem visual. No fundo esta é a parte mais importante da visualização!

Assim amigo leitor, penso que ao utilizar, por exemplo, uma técnica como esta, que possa contribuir com o aumento da confiança do que foi planejado para o grupo de futebol podemos compreender que o ponto de discussão não está centrado apenas na melhor estratégia para iniciar uma temporada, mas sim na medida que acreditamos que é possível atingir as metas estabelecidas a partir da confiança do grupo na estratégia adotada pela comissão técnica.

Até a próxima!

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Choque de realidade

Estados Unidos. Em um fim de semana, duas das maiores ligas esportivas do país tiveram eventos muito marcantes. No basquete, saiu David Stern, que ocupava desde 1984 o posto de comissário da NBA. No futebol americano, o Seattle Seahawks atropelou o Denver Broncos e venceu por 43 a 8 no Super Bowl, jogo que decide a NFL.

Brasil. No sábado, torcedores pularam muros e rasgaram cercas para invadir o centro de treinamentos do Corinthians. Armados com pedaços de pau, pedras e até facas, eles queriam fazer cobranças aos jogadores depois de o time ter sido goleado pelo Santos por 5 a 1. Houve roubos, depredação e intimidação dos atletas, que ficaram trancados em um vestiário por quase três horas, sem acesso a comida ou água. No domingo, a equipe do Parque São Jorge entrou em campo e perdeu para a Ponte Preta por 2 a 1 no estádio Moisés Lucarelli, em Campinas.

Brasil e Espanha. Há algo errado na transferência do atacante Neymar, que trocou o Santos pelo Barcelona no meio de 2013. O time catalão gastou um total de 86,2 milhões de euros com a transação, mas ainda existem muitas dúvidas sobre o destino desse dinheiro. Na última semana, o pai do jogador admitiu ter recebido 40 milhões de euros pelo que ele chamou de “adiantamento”. Entre versões e cobranças, ninguém conseguiu dar explicações convincentes para um caso que já causou a renúncia do presidente da equipe espanhola, Sandro Rosell.

Boas práticas não constituem um mundo perfeito. Há exemplos bons e exemplos ruins em quase todos os cenários. Entretanto, é necessário observar o contraste entre os casos para entender o quanto o futebol brasileiro pode evoluir.

Comecemos pelos exemplos dos Estados Unidos, então. David Stern, o cara que deixou o comando da NBA, foi artífice de uma mudança na liga. O campeonato tinha receita total de US$ 165 milhões por temporada quando ele assumiu, em 1984, e atualmente amealha US$ 5,5 bilhões por ano.

Um dos pontos nevrálgicos nessa revolução protagonizada por Stern foi a comunicação. Basta ver que a NBA, que faturava US$ 28,5 milhões por ano da TV quando ele chegou ao cargo, hoje tem receita anual de US$ 5,7 bilhões com a mesma fonte.

Stern fez do basquete um produto mais atraente para a TV. E isso não se faz apenas com mudanças no jogo, mas com práticas que envolvem postura dos atletas e criação de conteúdo.

Há anos a NBA deixou de ocupar espaço na mídia apenas com os jogos. A liga de basquete virou formadora de opinião. Um exemplo disso é a moda do cabelo raspado, que começou a se popularizar na liga antes de ganhar campos de outras modalidades.

Durante os anos em que comandou a liga, Stern tomou várias decisões questionáveis. Ele foi muito criticado, por exemplo, quando exigiu que jogadores usassem terno e gravata nas apresentações. Foi uma reação a uma pesquisa que mostrou que o principal consumidor da liga era o norte-americano de meia-idade e classe média.

Mesmo nesse caso, Stern mostrou uma diretriz que caracterizou a NBA nos últimos anos: a preocupação com o que o consumidor deseja. A liga não tem medo de abrir mão de costumes arraigados e buscar inovações que a aproximem do público. Na atual temporada, por exemplo, as franquias começaram a usar esporadicamente camisas com manga, cujo potencial de venda é superior ao das tradicionais regatas.

A liga que Stern moldou é extremamente alinhada com o que o público consome. E essa sintonia só é possível porque a comunicação da competição é extremamente eficiente. Não faltam exemplos de atletas, times ou jogos que são retratados de forma dramática, até romantizada.

O Super Bowl também é sobre isso, afinal. O jogo aconteceu no domingo, mas dizer que o jogo começou no domingo seria renegar tudo que a organização da NFL fez para transformar a partida decisiva no que ela é hoje.

O jogo entre Seahawks e Broncos foi realizado no Metlife Stadium, em Nova Jersey. O clima da partida, contudo, começou muitos dias antes.

O epicentro disso foi uma vila criada pela NFL em plena Broadway, em Nova York. Brincadeiras como um tobogã gigante, espaços para fotos com imagens e itens raros, interação com estrelas do passado. Tudo para fazer o público circular por ali durante muito tempo.

E o que há por trás do interesse de ter o público ali? A Disney ensina: o parque pode ter montanhas-russas e brinquedos mirabolantes, mas tudo se resume a se aproximar do consumidor para fazê-lo consumir mais e mais. A meta estabelecida pela NFL para este ano foi vender US$ 200 milhões em produtos alusivos ao Super Bowl. US$ 200 milhões. Apenas na semana do evento.

No Brasil, virou costume nos últimos anos o uso de camisetas promocionais para celebrar títulos. Normalmente, atletas vestem essas peças na comemoração e fazem uma espécie de anúncio dos produtos, que são comercializados depois. Um time que vence o Super Bowl costuma ter mais de duas centenas de artefatos alusivos ao título. Tudo isso disponível na loja do estádio, logo depois do apito final.

Agora uma pergunta: entre o torcedor que viu uma conquista pela TV e alguém que esteve no estádio, ainda emocionado por um título, quem tem mais chance de comprar um produto oficial? Ah, um adendo: o primeiro caso tem apenas uma camiseta à disposição. O segundo pode escolher entre centenas de artefatos, com larga variedade de preços.

O Super Bowl (também) é sobre varejo, afinal. Mas essa tática só é eficiente porque o evento sabe criar nos consumidores as condições ideais para isso. É aí que entram as diferentes estratégias de comunicação usadas pelo evento.

Na semana do Super Bowl, por exemplo, tudo é feito para mostrar o quanto o evento é grandioso. Até o atendimento à imprensa é grandiloquente, feito de uma vez, com todos os atletas no gramado a alguns dias da partida. Tudo é pensado para impressionar.

No Brasil, infelizmente, o que impressiona é o involuntário. Não há um aspecto sequer em que o esporte nacional crie deslumbramento por planejamento e mérito de médio ou longo prazo.

Desde o jeito de jogar – nossa característica é o drible, afinal – até a organização, o futebol brasileiro é o esporte em que o impressionante é o inusitado. Até quando o inusitado é absolutamente negativo para o evento, como a invasão de sábado.

Tente isolar os fatos: torcedores invadem o CT , cometem atos de vandalismo e ameaçam jogadores; time joga normalmente no domingo; diretoria dá entrevistas em tom nada contundente, cheias de platitudes. Dessa lista, qual foi o fato impressionante?

A invasão de sábado podia ter sido um estopim para muitas coisas. Podia ter servido como mote para um protesto no domingo ou para uma entrevista enfática de Mário Gobbi, presidente do Corinthians, na segunda-feira. O Corinthians podia ter impressionado por planejar um contra-ataque. Até aqui, nada disso foi feito.

Faltou ao Corinthians uma noção maior
. O time alegou ter entrado em campo contra a Ponte Preta porque tinha compromissos com Federação Paulista de Futebol (FPF) e TV Globo, que transmitiria o jogo ao vivo. E o compromisso com o torcedor comum, que se sentiu igualmente ameaçado pela violência de sábado e espera uma reação enérgica? E o compromisso com o futuro do futebol nacional?

Não fazer nada e não falar nada também são formas de comunicação. Formas que estão entre as piores, aliás.

E aí chegamos ao caso Neymar. Exemplos ruins não são um produto exclusivo do Brasil. Em muitos casos, a comunicação truncada e mal planejada é um modelo que rompe fronteiras de países.

É o caso do imbróglio envolvendo o atacante. O pai de Neymar admitiu que a N&N, empresa que ele criou para gerenciar a carreira do filho, recebeu 40 milhões de euros do Barcelona. O Ministério Público vai investigá-lo para averiguar se não houve fraude fiscal.

Neymar tinha um contrato com o Santos, que aceitou negociá-lo por um valor inferior ao da multa rescisória. Depois de um acerto entre a equipe e o Barcelona, o atacante pediu um alto montante para assinar com o time espanhol. É imoral, mas está longe de ser o suficiente para derrubar o presidente da equipe catalã.

Em Barcelona e em Santos, o caso está sendo conduzido de forma extremamente conturbada. Parece até que os personagens envolvidos também se surpreendem com a divulgação de detalhes de uma história que eles mesmos construíram.

A impressão é que todos nessa história acharam que não teriam de prestar contas. Nem com a Justiça, nem com o torcedor.

A polêmica sobre a transferência do atacante é ainda maior porque não foi tratada com um processo adequado de gerenciamento de crise. Faltou preocupação com temas como criação de conteúdo e aproximação com os consumidores. O risco de Neymar não é ficar mal com o Santos, com o Barcelona ou com a Justiça, mas debelar a imagem que ele construiu com as pessoas que o idolatram.

Crises como a de Neymar e problemas inesperados como o do Corinthians, infelizmente, acontecem em todas as searas. São corriqueiras. O tratamento dado a isso é que não pode ser.

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Futebol: a abordagem sistêmica, o reducionismo camuflado, e claro, a Lógica do Jogo!

A disseminação do conhecimento técnico específico no futebol alcança, a cada dia, maiores magnitudes e atinge, cada vez mais, um número maior de profissionais.

A vasta quantidade de informações disponíveis e organizadas permite uma qualificação maior daqueles envolvidos diretamente com o “campo”.

E se por um lado essa disponibilidade (de informações) tem contribuído, de certa forma, com a evolução do jogo de futebol, por outro acaba gerando, também de certa forma, uma visão distorcida sobre o próprio conhecimento, que tem resultado no que eu chamo da “hipervalorização do um fator”.

O pensamento sistêmico e as teorias da complexidade buscam compreender os fenômenos, sejam eles quais forem, a partir das interações, inter-relações e interdependências dos seus elementos (elementos dos fenômenos).

Isso quer dizer que em ambientes complexos, perde-se espaço a interpretação de eventos a partir de uma linearidade de causa-efeito, e passa à frente a tentativa de entendimento sobre a conexão entre todas as coisas (sobre todos os elementos constituintes dos eventos).

O futebol é um ambiente complexo.

O jogo de futebol é um universo de complexidade.

Quando buscamos explicações para ocorrências de uma partida, quando buscamos explicações para vitórias e/ou derrotas, o mais importante é que não percamos de vista a ideia de complexidade.

Mesmo assim, não é incomum (pelo contrário), atraídos pelo desejo de dar vida concreta e respaldo à visões particulares sobre o jogo, que mesmo sem querer, haja uma simplificação, que condiciona as explicações à uma redução dos fatos.

Por vezes essa simplificação/redução é obviamente cartesiana. Por vezes, ela é um cartesianismo camuflado pelo discurso de uma pensamento sistêmico. E é aí que a “hipervalorização do um fator” se aplica.

Creio, seja conhecimento e consenso de todos que vêm estudando mais pontualmente o futebol e complexidade, que tenha grande significado, simbolismo e importância a frase do professor e filósofo português Manuel Sérgio que diz que para “saber de futebol, é preciso saber mais do que futebol”.

Pois bem.

O futebol vem sofrendo transformações. No Brasil, há um grande e importante movimento em curso, rompendo com paradigmas bem enraizados – o que tem contribuído e muito para boas mudanças.

Esse movimento tem tentado explorar a complexidade sistêmica, tanto para explicar o jogo propriamente dito, quanto para aperfeiçoar o jogar, de jogadores e equipes.

Mas, se olharmos para o jogo, para o jogar, para os jogadores e para as equipes, e sob a justificativa de argumentos inerentes à complexidade, continuarmos pautando explicações sobre fenômenos, valorizando a variável “X” ou o conhecimento “A, Y ou Z”, e minimizando/desvalorizando qualquer outra coisa que se relacione, ou possa se relacionar com o jogo, não estaremos aplicando o pensamento sistêmico!

O que estaremos fazendo é camuflar o reducionismo com uma aparência de complexidade.

Por mais que precisemos de argumentos e fatos para defendermos as mudanças que tão necessárias se colocam no âmbito “técnico-tático-físico-psicológico” do jogo e do jogar, é preciso que não troquemos os pés pelas mãos, e nem que nos apoiemos em cenas vazias expostas a partir de interpretações que nascem enviesadas.

Querendo ou não, a Lógica Inexorável do Jogo se sobrepõe, como referência norteadora da preparação de jogadores e equipes, a qualquer outra coisa!

Por isso, mais do que qualquer coisa, é na abordagem sistêmica que devem se concentrar, tanto as análises daquilo que ocorre em uma partida, quanto na preparação de jogadores e equipes.

E não perdendo de vista o caráter da abordagem, os caminhos escolhidos para análise e preparação são inúmeros – assim como os “jogares” possíveis…

Fecho então o texto de hoje com uma frase do brilhante e vencedor treinador Louis van Gaal, sobre outro brilhante e vencedor treinador, o José Mourinho (que foi seu assistente técnico), por ocasião da final da Uefa Champions League 2009/2010, entre Bayern de Munique (treinado por van Gaal) e Internazionale de Milão (treinado por Mourinho) – vencida pelo time italiano:

"O único aspecto comum entre o meu modo de treinar e o de Mourinho é a atitude com que enfrentamos nossos jogadores. Sabemos ser líderes. Mas ele só quer ganhar, e eu penso também em divertir o público, algo que não pode ser secundário" (…) "cuidar da qualidade do jogo não significa se desinteressar pelo resultado. Sou discípulo de Rinus Michels, pai do futebol total. Sigo um caminho mais difícil do que o de Mourinho, mas respeito"– (disponível em uefa.com).

A beleza do jogo está em nós. A complexidade, no jogo. É isso…
 

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Bahia autoriza venda de bebidas nos estádios

O Estado da Bahia aprovou projeto de lei que autoriza e regulamenta a comercialização de bebidas alcoólicas em estádios e arenas de autoria do deputado João Bonfim. O Projeto, agora, o segue para sanção do governador Jaques Wagner.

Segundo a Lei as bebidas alcoólicas poderão ser comercializado em bares, lanchonetes, camarotes e Espaços Vips, reiterando-se a proibição da venda para menores de 18 anos, prevendo, inclusive multa, suspensão ou proibição da comercialização se esta determinação for descumprida.

A Lei estabelece, ainda, uma série de regras para que as vendas sejam realizadas, como, por exemplo, a necessidade de apresentação de documento de identidade pelo comprador a cada operação e a restrição de retirada, a cada vez, de apenas um copo (plástico), de até 500 mililitros, de bebida por pessoa.

Há também a diferenciação entre os teores alcoólicos das bebidas vendidas em cada área dos estádios. Nos bares, lanchonetes e congêneres podem ser vendidas bebidas com até 20% de teor alcoólico (cervejas, por exemplo), já em camarotes e áreas VIP, estão liberadas bebidas com graduação alcoólica de até 43%, como vodcas e uísques.

Apesar de não haver proibição legal, a venda e o consumo de bebidas alcoólicas cessaram nos estádios brasileiros em 2008, quando o Conselho Nacional dos Procuradores Gerais do Ministério Público e a Confederação Brasileira de Futebol (CBF) assinaram Termo de Ajustamento de Conduta (TAC).

Posteriormente, o Ministério Público firmou TACs semelhantes com as Federações Estaduais, proibindo a venda em torneios regionais.

A bebida alcoólica tornou-se vilã nos estádios de futebol, já que muitos relacionarem seu consumo a violência no estádios e arenas.

Entretanto, não há estudos acadêmicos a respeito e, além disso, de 2008 até os dias atuais a violência aumentou.

As causas da violência nos estádios de futebol e seu combate necessitam estudos mais profundos, eis que são fruto de múltiplos fatores.

O Poder Público a fim de camuflar sua incapacidade de solucionar o problema procura vilões e buscam proibições.

Vale dizer que a venda de bebidas alcoólicas nos estádios de futebol nunca foi proibida no Brasil, eis que o Estatuto do Torcedor não traz nenhuma previsão a respeito e a Constituição Brasileira assegura a todos o direito de fazer ou deixar de fazer algo, salvo por disposição de Lei. Dessa forma, se legislação brasileira fosse respeitada a lei aprovada na Bahia seria desnecessária.

De toda sorte, a Bahia mostrou estar na vanguarda do debate acerca das bebidas alcoólicas nos estádios de futebol. Parabéns ao Deputado João Bonfim, à Assembleia Legislativa da Bahia e ao Instituto de Direito Desportivo da Bahia, na pessoa de seu presidente, o Dr. Milton Jordão, pela iniciativa.

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Motivando atletas para o sucesso

Provavelmente muitos treinadores em início de temporada passam pela mesma necessidade de motivarem seus jogadores para o sucesso, de criarem ambiente de estímulo adequado ao sucesso do grupo e individualmente de cada atleta.

Então, como um treinador pode promover este estímulo de maneira eficaz? Pergunta difícil não é mesmo?

Creio que na maioria das vezes em que pensarmos nisso, sim a resposta será complicada e diversificada e a partir daí devemos refletir sobre a importância de recorrer a técnicas que facilitem o trabalho dos treinadores neste sentido.

Nesta coluna mais do que motivar, quero compartilhar com vocês uma forma de estimular os atletas a seguirem rumo ao sucesso profissional. O que você acha ser melhor para estimular as pessoas: Utilizar a censura e condenação? Ou o elogio? Acredito plenamente que o elogio seja a maneira mais adequada de estímulo ao desenvolvimento, elogiando mesmo os menores progressos fará com que o atleta e qualquer pessoa na verdade continue trabalhando e melhorando cada vez mais.

O psicólogo Jess Lair certa vez comentou: “O elogio é como a luz do sol para o ardente espírito humano; sem ele, não florescemos nem crescemos. Mas, enquanto muitos de nós estão preparados para soprar contra os outros o frio vento da crítica, de algum modo relutamos a dar ao próximo o aquecedor raio de sol do elogio.”

Acredito demais nessa citação e sempre que a releio faço reflexões na minha própria vida profissional e pessoal sobre quantas vezes ou situações umas poucas palavras de elogio poderiam ter transformado minha vida até aqui; e acredito que se você também relembrar alguns momentos de sua vida talvez conseguirá encontrar momentos em que um elogio poderia ter mudado alguma situação importante.

Ao pensarmos sobre a relação dos treinadores com os atletas, as coisas não são diferentes, pois um treinador pode simplesmente anular um jovem talento com sua atitude inadequada. São comuns os relatos de atletas que comentam sobre a soberba ou arrogância de alguns treinadores, fazendo com que a capacidade de performance de alguns atletas acabe se reduzindo naturalmente e quando essa situação atinge a maioria do grupo de atletas a ausência de estimulo culmina em derrotas e resultados em campo negativamente surpreendentes para o clube.

O conteúdo de hoje trata diretamente sobre a mudança genuína nas pessoas, há uma mágica na habilidade de elogiar as pessoas através da qual conseguimos incentivá-las quanto a compreensão de suas possibilidades latentes em suas vidas. Conforme Dale Carnegie escreveu: “Com a crítica, a capacidade do ser humano declina; com o estímulo, ela floresce.”

E fecho nossa coluna desta semana com um importante princípio de influenciar as pessoas do próprio Carnegie:

“Elogie o menor progresso e elogie casa progresso. Seja sincero na sua apreciação e pródigo no seu elogio”.

E você amigo leitor, já fez um elogio hoje?

Abraços e até a próxima!

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A Copa e a rebeldia (com ou sem) causa – parte 01/03

A avalanche de protestos que assistimos no ano passado e estão previstas para ocorrer em um momento pré-Copa 2014 é um importante indicador da insatisfação das pessoas contra o evento e, ao mesmo tempo, uma total falta de senso sobre inúmeros aspectos que norteiam um dos maiores eventos do mundo. Sobre uma série de demagogias e hipocrisias em torno da Copa é que pretendo discorrer meus próximos três textos aqui neste espaço…

Comecemos por esclarecer meu ponto de vista:

– Se acho que está tudo certo? Não! Na realidade vejo tudo como a perda de algumas oportunidades em desenvolver o futebol brasileiro e o país. A Copa em território nacional, se bem aproveitada, pode contribuir e catalisar a transformação do mercado como um todo. Depois, que estamos falando de algo que a população brasileira gosta (e muito – aproximadamente 2/3 dos brasileiros admiram ou consomem a modalidade, segundo inúmeras pesquisas), o que justifica qualquer investimento público nesta área (enfim, aqui cabe uma pausa para não entrar efetivamente no mérito de “políticas públicas”, pois o debate é amplo e complexo, não sendo objeto específico desta coluna, neste momento).

– Se acho que está tudo errado? Não! O que falta, na maioria dos casos, é informação e cobrança maior de quem administra os recursos públicos – que, aliás, não se restringe à Copa.

Para este princípio de discurso, vou me amparar na análise dos “Rebeldes sem Causa”. Vez por outra, pelo excesso de reclamação, caímos na velha mania do brasileiro de reclamar de tudo (com o perdão da redundância…). Aliás, as redes sociais estão virando, ultimamente, um enorme muro de lamentações: se chove, está ruim porque chove; se faz sol, não dá pra sair de casa por que está muito calor; se faz frio, vamos todos ficar resfriados. O estereótipo desta cultura está aí retratado. Ao invés de “fazer do limão uma limonada”, preferimos ficar sentados (ou ir às ruas) reclamar. Simplesmente reclamar, sem uma ação efetiva e objetiva (ou um foco nas reivindicações) ou uma proposição coerente de soluções.

Lembro, usando outra analogia, de muitos ex-alunos meus de cursos de Educação Física ficar uma aula inteira reclamando da ineficiência do “Conselho Regional de Educação Física” (CREF) porque muita gente que eles conheciam trabalhava na área sem portar o registro do Conselho. No final do debate, fazia a simples pergunta: “OK, faça de conta que concordo com vocês… Quer dizer então que vocês já fizeram denúncias destes ‘pseudo-profissionais’ ao CREF? Ela foi atendida?”. Não, nunca ninguém tinha se mexido efetivamente (e nem se mexeu) – é mais fácil falar por falar, de preferência na mesa do bar e deixar tudo como está.

Reformulando a pergunta, vamos ao nosso tema: “Alguém já usou o canal específico do ‘Portal da Transparência da Copa 2014’ para fazer denúncias de desvios? Houve algum resultado?”:

Só para ficarmos em um exemplo de uma forma coerente, legal e que faz parte da cidadania. Outro caminho para reivindicações é procurar o Ministério Público para que este ofereça denúncias – sei que, entretanto, isso é bastante complicado, pois exigiria uma pesquisa minuciosa sobre obras, custos e identificação de desvios.

É muito mais fácil, obviamente, postar alguma coisa qualquer em uma Rede Social insinuando qualquer coisa que não se sabe para depois fazer megaencontros para protestar tudo aquilo que ninguém sabe do que estão falando…

Para fechar esta, cabe esclarecer que eu adoraria que, em havendo tantos desvios quanto se propala em torno da Copa, que tivesse uma infinidade de políticos (ou mesmo empresas privadas) sendo processados e julgados. Só assim conseguiríamos contribuir para a tão sonhada transformação do país.

(continua…)

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Tolerância

O grego Costa-Gravas é um dos cineastas mais relevantes do século 20. Ele lançou em 1969 um longa-metragem chamado “Z”, obra que se desenvolve a partir de uma manifestação popular. Baseada no romance de Vassilis Vassilikos, a obra foi premiada com dois Oscar (melhor edição e melhor filme estrangeiro).

Antes de a ação se desenrolar, um aviso provocativo aparece na tela: “Qualquer semelhança com pessoas ou lugares realmente existentes não é coincidência. É intencional”. O filme foi proibido no Brasil durante o período da ditadura militar.

A história central da obra é o assassinato de um deputado liberal. O romance de Vassilikos tem como ponto de partida a morte de Grigoris Lambrakis, que ocorreu nos anos 1960.

Tente esquecer tudo isso quando vir o filme. Tente deixar de lado a profundidade da trama política, a direção bem conduzida e o ritmo extremamente equilibrado do filme. Dê mais atenção aos diálogos, como os discursos de autoridades logo na primeira cena. Costa-Gravas podia ter escrito tudo isso ontem.

Em 1993, como bem lembrou João Pereira Coutinho, colunista da “Folha de S.Paulo”, Samuel Huntington publicou na revista “Foreign Affairs” um artigo intitulado “The clash of civilizations” (algo como “o embate de civilizaçãoes”, em tradução livre).

No texto, Huntington diz que é impossível imaginar a repetição de guerras econômicas ou políticas, como as que aconteceram no século passado. Findaram as lutas clássicas entre Estados.

No entanto, isso não quer dizer que os conflitos tenham cessado. Ele ainda identifica enorme tensão formada pelo multiculturalismo. Huntington podia ter escrito isso ontem.

Costa-Gravas e Huntington não escreveram nada sobre o Brasil. Tampouco tentaram deslindar o atual momento do país sul-americano. Com distanciamento histórico e geográfico, contudo, as obras de ambos servem muito para analisar o que tem acontecido aqui.

No último sábado, 13 capitais do Brasil receberam um protesto chamado “Não vai ter Copa”. A manifestação acabou em tumulto em muitas delas, e São Paulo foi o foco mais conturbado. Houve mais de cem detidos, e um estoquista de 22 anos foi baleado por policiais militares.

Os policiais militares alegaram legítima defesa. Disseram que Fabrício Proteus Nunes Fonseca Mendonça Chaves tinha material explosivo na mochila, portava um estilete e tentou golpear um oficial.

A tese da defesa do garoto é dicotômica. Segundo Daniel Biral, advogado que tem cuidado do caso, Chaves portava um estilete porque usava no trabalho. O jurista sustenta que o estoquista foi abordado por policiais, ficou com medo, correu e foi alvejado.

Ainda é cedo para teorizar sobre a história. Faltam elementos que indiquem qual versão é real (ou qual se aproxima mais da verdade). Entretanto, a história do manifestante baleado por policiais militares já serve para mostrar o quanto a guerra cultural e a repressão descabida são problemas latentes no Brasil atual.

Afinal, se a Copa do Mundo de 2014 já conseguiu produzir algo de relevante no país, definitivamente é isso: antes mesmo de ser realizado, o evento mostrou o quanto ainda somos imberbes como sociedade e o quanto precisamos evoluir como palco de massas.

Porque tem sido assim em todas as manifestações populares: elas têm servido, antes de tudo, para mostrar o quanto nós precisamos adquirir cultura de discussão (e aí a generalização é pertinente).

Enquanto não discutirmos ideias e não estivermos prontos para contrapor argumentos, sempre correremos riscos de explosões de violência. Isso vale para todos os lados.

Enquanto acharmos que o caminho correto para qualquer discussão é destratar o argumentador e diminuir os méritos de quem diz, perderemos tempo que podia ser gasto com questões realmente relevantes.

Policiais militares não são treinados para discutir. São treinados para cumprir e dar ordens. São raros os que sabem conversar e improvisar quando a autoridade conferida pela farda não é suficiente para impor respeito.

Manifestantes não são treinados para discutir. A tensão dos protestos também tem a ver com gente que extrapola e que não sabe debater ideias. Não existem apenas culpados ou apenas mocinhos.

Tudo isso tem importância para o esporte em diferentes âmbitos. A começar pela organização de eventos – não conseguiremos fazer sequer jogos locais enquanto não estivermos preparados para discutir e buscar soluções em vez de impor autoridade.

O curioso, porém, é ver que essa cultura se alastra até para o que acontece dentro das quatro linhas. Impregnados por essa cultura militarizada e sem contestação, formamos atletas que se preocupam apenas com o cumprimento de ordens e dão pouco ou nenhum espaço para o entendimento do jogo.

Esporte é transgressão, improviso e arte. Mas esses elementos só podem ser combinados por quem tem domínio do jogo, ainda que esse domínio seja totalmente empírico. É o que algumas pessoas chamam de “antevisão”.

Somos um país jovem e temos uma sociedade ainda mais nova. Ainda temos muitos problemas decorrentes disso, e obras antigas mostram que essa mesma ciclotimia atingiu outros países em momentos não tão distantes.

A questão é, e isso vale para todas as searas, o quanto estamos dispostos a mudar. Se continuarmos achando que a formação militarizada é o caminho e que não precisamos aprender a contestar, vamos seguir parados no tempo. No campo e – principalmente – fora dele.