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De volta ao basicão

Seja no âmbito pessoal ou profissional, observo as pessoas quebrando a cabeça em busca de soluções "inovadoras" para resolver seus problemas. Depois de muito tempo e esforço, em geral, chegam a soluções por vezes complexas e difíceis de serem implementadas. E pode ser pior, como nas vezes em que encontram a solução, mas, já se passou tanto tempo que um pequeno problema se transformou em um desastre, com sérias consequências para as pessoas ou organizações.

Ao ser consultado sobre algum problema, recomendo soluções simples, rápidas e práticas. Isso não quer dizer soluções simplistas. Percebo que durante a explanação da solução pessoas fazem anotações e no final olham como se estivessem diante de um gênio. Tenho certeza que minha vó ficaria feliz se isso fosse verdade, mas sou apenas um sujeito atento, experiente e uso a técnica de relembrar o passado, vendo se problemas semelhantes já existiram, como foram solucionados e como posso dentro de novas "combinações" propor soluções simples e de fácil realização. Enfim, faço o "basicão".

O que seria fazer o "basicão"? É buscar e aplicar soluções simples, diretas e sem rodeios. Eu pratico e estimulo minha equipe a olhar o basicão sempre, pois além de economizar tempo desmistifica a ideia de que soluções complicadas são as mais valorizadas! O termo tomei emprestado do amigo Marcos Nascimento, executivo da ManStrategy Consulting Ltda, após assistir sua palestra para um grupo de executivos sobre execução de estratégias bem sucedidas tendo como premissa "voltar a fazer o basicão".

Exemplos de situações e soluções no estilo "basicão" existem na vida pessoal e profissional, em todas as áreas e segmentos. Vejamos alguns deles:

A maioria dos adultos já teve uma DR – discutir a relação. Já imaginou ter uma DR em plena rede social? Hoje não acontece apenas com os jovens, tem muitos quarentões que, de um pequeno problema em casa, reclamam do cônjuge em pleno Facebook. Eles contam suas histórias e pedem ajuda para toda a rede de amigos.

Além de todos ficarem sabendo da intimidade do casal, os palpites vêm de todos os lados e as consequências são em alguns casos desastrosas. Como isso era resolvido fazendo o basicão?

A pessoa até pedia conselho para amigos, os mais próximos, não para os 2.807 do seu Facebook. Refletia, conversava em casa e tudo se resolvia aos poucos de maneira íntima e menos traumática.

No esporte, pequenos problemas se transformam em problemões, mesmo aqueles que seriam resolvidos aplicando a técnica do "basicão". Hoje, na maioria dos clubes de futebol, existe pouca conversa direta e reta entre o presidente e treinador, entre o treinador e atletas e entre os próprios atletas. Quando precisam falar algo, mandam recados pela imprensa ou pelos seus Twitters, entre outros. Muitos treinadores descobrem que estão desempregados pelo rádio ou nas mídias sociais. Como isso era resolvido fazendo o "basicão"?

Com uma boa conversa, olho no olho, em um local neutro e descontraído, por vezes em uma boa churrascaria, restaurante ou bar, seria mais fácil e prático discutir os conflitos e evitar as desinteligências.

Outro bom exemplo é a discussão em todo país a respeito do "apagão profissional". A falta de mão de obra e a dificuldade de reter talentos nas empresas geram reclamações do tipo:

1) Temos muitas vagas que demoram a fechar por falta de candidatos
Eu pergunto: suas vagas são bem descritas e estão bem "embaladas". Nelas, fala-se sobre oportunidades de crescimento e diferenciais da empresa. Você tem um vídeo institucional mostrando como é a cultura da empresa? A resposta é NÃO.

2) Na minha região é complicado contratar
Eu pergunto: sua empresa tem estratégias de atração nas proximidades da empresa? Tem um profissional recrutando ou pensando em estratégias de captação regional? Faz atração em agências governamentais, igrejas, templos, universidades, escolas, sindicatos regionais, feiras e eventos? A resposta é NÃO.

3) Faltam profissionais experientes e prontos
Eu pergunto: sua empresa tem um programa para contratar e formar profissionais menos experientes? Estão treinando e preparando jovens potenciais para assumir mais responsabilidades no futuro?
A resposta é NÃO.

4) O turn over está alto e custando caro. Não consigo reter meus funcionários
Eu pergunto: as vagas são oferecidas aos funcionários antes do selecionador buscar profissionais no mercado? Seus funcionários são estimulados a desenvolver-se, pois podem ser aproveitados internamente e serem promovidos ? Os líderes estão "motivados" com a causa de atração e seleção? A resposta é NÃO.

De fato, existem alguns setores com mais dificuldades em contratar funcionários, mas, após ouvir os NÃOs, os lembro de como tais problemas eram resolvidos no passado e que contratar bem e formar para o futuro sempre foram fatores cruciais de sucesso para os negócios. Por esta razão, no princípio os próprios donos de empresas eram responsáveis por contratar. Falo de estatísticas que mostram que as empresas de maior longevidade são as que contratam melhor, ou seja, novamente a solução está em olhar o passado, pensar em novas combinações e fazer o "basicão".

Arrisco uma explicação para a dificuldade em fazer o "basicão", atualmente. Em primeiro lugar, somos ensinados nas instituições educacionais a decorar coisas e seguir modelos prontos, ao invés de pensar no sentido e no porquê das coisas. Em segundo lugar, hoje se emprega pouco tempo na atividade de pensar sobre como as coisas funcionam.

As diversas distrações e facilidades tecnológicas acostumaram as pessoas a chegarem às respostas. Isso as tem levado a não usarem seu tempo para estudar e entenderem o princípio das coisas, enfim, como são feitas as coisas e quais os conceitos que dão sustentação à sua existência. Posso dar vários exemplos, o meu preferido é o da luz elétrica, então vejamos: A pessoa aperta um botão e a luz acende, e ao perguntar se a pessoa sabe porque a luz acende, a resposta é simples, porque apertei o botão.

Pois bem, de maneira simplista, posso dizer que para a luz acender é necessária uma estrutura sincronizada e organizada, que começa com a armazenagem de água, turbinas poderosas em hidroelétricas, torres de transmissão, postes de distribuição, transformadores de energia, fiação interna no estabelecimento e, por fim, o botão.

Este é um caso típico do que vemos hoje em muitas situações, a perda do contato com o básico, a origem. Graças aos avanços tecnológicos, é verdade que um toque
no botão acende a luz. No entanto, saber como as coisas acontecem e seus princípios básicos nos faz entender as diferentes variáveis que podem, quando necessário, nos levar a pensar em soluções criativas para contornar restrições, assim como imaginar novas combinações que tragam soluções inovadoras.

Reflitam sobre os problemas em seu dia a dia e pensem se fazer novas combinações do que já viram, vivenciaram ou observaram no passado é o melhor caminho para vocês solucionarem problemas e evitarem perda de tempo. Na dúvida optem por fazer o simples, o "basicão".

*Cezar Antonio Tegon é graduado em Estudos Sociais, Administração de Empresas e Direito. É presidente da Elancers e sócio-diretor da Consultants Group by Tegon. Com experiência de 30 anos na área de RH, é pioneiro no Brasil em construção e implementação de soluções informatizadas para RH

Para interagir com o autor: ctegon@universidadedofutebol.com.br

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(Des)construindo um ídolo

Ainda é extremamente cedo para rotular o que está acontecendo atualmente no Brasil. Sem um distanciamento histórico, qualquer análise pode ser tão precipitada quanto o famoso "Taison ou Messi".

No entanto, a enxurrada de manifestações populares gerou reações que podem ser deslindadas. Algumas delas, aliás, são exemplos perfeitos de como a comunicação ajuda a construir (ou destruir) ídolos.

É essa a ideia suscitada por um vídeo gravado por Pelé. Em 1min15, o "Rei" pediu que os brasileiros sejam condescendentes com a seleção que representa o país na Copa das Confederações. Além disso, sugeriu que o povo esqueça os protestos e se concentre na competição.

Pelé chega a dizer que o vídeo é um apelo de Edson Arantes do Nascimento, o torcedor. Mesmo assim, é impossível dissociar uma figura da outra. Declarações como essa, de pura alienação, demonstram falta de compromisso com o povo que moldou o ídolo. Não há como evitar que a imagem do atleta seja debelada.

O mesmo acontece com Ronaldo. Em meio aos protestos em várias cidades brasileiras, circulou em redes sociais um vídeo de 2011 em que o "Fenômeno" cobrou autoridades do país sobre a preparação para receber o Mundial de 2014. Preocupado com os atrasos em obras de estádios, ele disse que "Copa do Mundo não se faz com hospitais" e pediu maior preocupação com os palcos dos jogos.

A distância entre um atleta brilhante em um ídolo tem uma série de degraus: carisma e identificação popular, por exemplo. Quando fazem declarações assim, Pelé e Ronaldo jogam contra a imagem que construíram em campo.

A diferença é que Ronaldo demonstrou preocupação com isso. Quando percebeu a repercussão em torno da declaração, o pentacampeão mundial pediu desculpas, disse que o conteúdo foi "tirado de contexto", culpou "a edição" e usou outros subterfúgios para tentar amenizar um posicionamento extremamente infeliz.

Por tudo que fez como atleta, Pelé expressa excelência. Ronaldo simboliza superação, fé, esforço e outros atributos positivos. Tudo isso tem valor enorme para a publicidade, mas depende de aceitação popular. A preocupação do "Fenômeno" tem muito a ver com o lado comercial.

Ronaldo não demonstrou igual consideração para explicar as funções que ele acumula. O "Fenômeno" é um dos fundadores da 9ine, agência de marketing esportivo que agencia carreiras de atletas. Há clientes da empresa disputando a Copa das Confederações, torneio em que o ex-jogador trabalha no membro do comitê organizador e comentarista da TV Globo.

Na prática, Ronaldo é responsável por organizar a competição e por gerenciar carreiras de atletas que estão em campo. E depois precisa ter isenção para avaliar na principal emissora do país o andamento do torneio e o desempenho de seus clientes.

Ele pode até argumentar que tem reputação ilibada e autonomia para desempenhar todas as funções sem cair em contradição moral. Contudo, vale para Ronaldo a história da “mulher de Cesar”: não basta ser honesto…

Ao se aliar ao poder, Ronaldo empresta credibilidade a muita coisa que ele não pode controlar. E isso é um risco enorme para quem, depois de ter deixado os campos, tem na imagem a principal fonte de negócios.

Outro problema contido nesse tipo de comportamento é que Ronaldo se distancia da figura de homem humilde, que triunfou a despeito de não ter origem nobre. Ao se aproximar do poder, o “Fenômeno” compromete muito do que o conduziu até lá.

Nesse caso, porém, Ronaldo é apenas um exemplo. Não são poucos os atletas que aproveitaram a fama consolidada no esporte e emprestaram esse renome a diferentes instâncias de poder.

Para quem trabalha com comunicação, esse tipo de transição representa um desafio enorme. É fundamental criar um discurso condizente com a nova etapa da vida do atleta, mas que não abra mão de atributos que o moldaram.

As respostas de Ronaldo à disseminação da declaração dele são parte disso. Mais do que apresentar alguma justificativa plausível, o importante era não permitir que o rótulo de opositor ao movimento pespegasse no "Fenômeno". Para isso, ele precisou se posicionar.

As evasivas do ex-jogador também são parte de uma estratégia para evitar rusgas com qualquer lado. Quanto menos ele se posicionar de forma peremptória, menor o risco de aumentar seu nível de rejeição.

Por tudo isso, chamou atenção de forma muito positiva o posicionamento dos jogadores da seleção brasileira de futebol. Incitados a questionar os protestos e as manifestações populares, todos corroboraram o clamor público por uma série de mudanças no país.

Um dos mais veementes foi o atacante Neymar. Ele usou a rede social Instragram para publicar uma foto e um texto sobre a ida do povo às ruas. "Poderia parecer demagogia minha – mas não é – levantar a bandeira das manifestações que estão ocorrendo em todo o Brasil", diz um trecho da declaração do camisa 10.

Neymar foi sucinto, direto e enfático. Ainda que estivesse concentrado na Copa das Confederações, não ignorou um momento importantíssimo para a história do país.

Em campo, Neymar ainda fez pouco para ser comparado a ídolos como Pelé e Ronaldo. Nas recentes manifestações, porém, ele mostrou que já pode dar aulas de comunicação para ambos…

Para interagir com o autor: guilherme.costa@universidadedofutebol.com.br

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O que queremos?

Uma das páginas muito bem-humoradas e inteligentes do Facebook se chama "O que queremos?". Nela, em tirinhas em quadrinhos, com bastante ironia, são levadas ao público, num tom de convocação e intimação para um movimento em torno de determinadas causas, certas mensagens paradoxais, contraditórias, que desafiam a lógica racional.

Num exemplo: "Quem somos? Mulheres! O que queremos? Não sabemos!!! E quando queremos? Agora!!!"

Outro bem sacado: "O que queremos? Que nossas namoradas parem de mandar em nós! Quando queremos?" E a voz pergunta pra namorada: "Quando queremos, amor?" Ela responde: "Depois da novela da tarde." E a voz finaliza: "Depois da novela da tarde!".

As manifestações generalizadas, em todo Brasil, que ocorrem tendo a Copa das Confederações e a Copa do Mundo como cenário e motivação, são legítimas e necessárias.

De fato, a sociedade brasileira precisava dar um claro sinal a todos aqueles que não se acham parte dela e fazem da corrupção prática frequente em sua vida pública, enquanto políticos e mandatários do poder popular, e em sua vida privada, enquanto cidadãos despreocupados em olhar para os lados e que reproduzem a falsa sensação de que vivemos na Noruega ou na Suíça.

Quem vive na Suíça é a Fifa, tão somente. Lá, tudo funciona bem, e, em boa parte, com o dinheiro oriundo do mundo todo custeando seu alto grau de desenvolvimento social, tal qual um paraíso na Terra.

Aqui, do outro lado do Atlântico, não estamos sequer perto do padrão Fifa em termos de desenvolvimento e gestão esportiva, capaz de alçar nosso esporte a um patamar de sustentabilidade plena e dividir esta sustentabilidade com a sociedade toda, devolvendo a ela parte do que o esporte absorve em sua construção, como legado social.

Eis a razão de grita e revolta perante os megaventos esportivos no Brasil, agravados pelo estouro sucessivo nos orçamentos das obras das instalações esportivas, em contraponto ao que se destina aos serviços essenciais a que todos deveríamos ter acesso, como saúde, educação, segurança, transporte público.

O legado social da Copa do Mundo, para o Brasil, é esse: o despertar de todos nós para ocupar posição crítica numa sociedade ainda muito desigual, que pode ter no esporte papel fundamental para transformá-la positivamente.

Contudo, não podemos ficar reféns de uma esquizofrenia social que não sabe pra onde vai e, simplesmente, nega o presente sem, sequer, sugerir e lutar pelo futuro.

Ou…: O que queremos? Que…que… que não seja realizada a Copa da Fifa e a Olimpíada no Brasil!

Por que queremos? Porque isso vai acabar com nossos problemas de corrupção, desvio de dinheiro, falta de escolas, quadras esportivas, hospitais, creches, aeroportos, transporte público, melhores estradas, segurança pública e falta de engajamento político da população na hora de votar e ser votado!

Cuidado com o que desejarmos, pois isso pode se transformar em realidade, e seremos responsáveis pelo resultado.

 

Para interagir com o autor: barp@universidadedofutebol.com.br

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Uma pausa nas questões táticas

Assuntos táticos não faltam para serem discutidos, especialmente neste período de Copa das Confederações. Porém, ter um espaço semanal para publicações num portal que tem um olhar transdisciplinar para o futebol e fechar os olhos para as manifestações da população brasileira que ocorreram nos últimos dias não me pareceu coerente.

É difícil falar de seleção brasileira, Neymar, Paulinho, Posse de Bola, Espanha, Momentos do Jogo, Itália, Modelo de Jogo, Periodização ou quaisquer outros temas num momento em que o povo vai à rua e expressa (nem sempre da melhor forma) tamanha indignação.

Como escrever sobre estes atos não compreendem a minha especialidade profissional, procurei em diversos posts, vídeos e reportagens uma visão que representasse parte da minha opinião.

E foi de um e-mail encaminhado pela minha esposa e escrito pela psicóloga Patrícia Gebrim que encontrei alguns parágrafos de imenso significado.

A Avenida Paulista virou um espelho

“Tenho acompanhado, com o coração apertado, as manifestações que vem acontecendo no Brasil. Moradora de São Paulo, não há como não sentir esse nó na garganta ao ver as imagens da Avenida Paulista tomada por fumaça e toda aquela agressividade. Ao mesmo tempo, a sensação incômoda de me sentir manipulada por informações desencontradas, e como muitos brasileiros, de achar muito difícil saber no que acreditar.

Assim, registro internamente tudo o que li, vi e ouvi na última semana, fecho os olhos e busco informações dentro de mim. Penso que é lá, dentro de nós, que encontraremos sempre a opinião mais sábia e sensata, e peço ajuda para ser capaz de escrever algo que faça algum sentido, algo que possa, de alguma maneira, aliviar essa sensação de impotência que anda tão presente em meu íntimo e servir de alguma ajuda neste momento.

Tenho vivido em um país onde os abusos tornaram-se o "pão nosso de cada dia". Corrupção, péssima educação para nossas crianças, sistema de saúde ineficaz. Respeito e ética tornaram-se palavras que devem morar em algum museu. Os tais vinte centavos são um símbolo. Não estamos aguentando mais. Algo precisa mudar. E após tanto tempo calado, impulsionado por uma energia que vem se espalhando por todo o planeta, amparado pela comunicação facilitada pelas redes sociais, o povo resolveu falar, recuperar sua voz. Nada mais legítimo.

No entanto, quando ocorre um fenômeno de massa como o que está acontecendo, é muito fácil perdermos, na coletividade, aquela fagulha divina que validava o movimento dentro de cada um de nós. Corremos o risco de ter a alma engolida pelo animal que mora em nós, e quando isso acontece, a legitimidade de nossos atos desaparece.

Se, enquanto humanidade, já tivéssemos atingido um nível superior de consciência, os manifestantes iriam pacificamente às ruas, os policiais cuidariam para que a manifestação ocorresse de forma protegida e todos sairiam ganhando. No entanto, enquanto seres humanos, "não importa de que lado estejamos", somos ainda muito falhos. Levamos ainda, em nosso íntimo, uma imensa sombra. Carregamos medos, raiva, ressentimentos, inveja, ódio. E de repente, no meio da multidão, nossa luz se esvai e essa parte mais densa se sobressai. Talvez isso não aconteça com todos, mas basta uma pequena fagulha para que um fogo se faça. Aqui e ali, de um lado ou de outro, nos tornamos animais, os animais que somos também. O animal que ainda não curamos.

Se existem atos de destrutividade por um lado, e resposta truculenta por outro _ e estou certa de que ambos existem _ isso está refletindo o conflito e a agressividade que ainda existe dentro de cada um de nós.

Deixo as considerações políticas aos políticos. As considerações sociais aos sociólogos. Cabe a mim, como ser humano, dizer que precisamos nos tornar maiores do que o animal que mora em nós.

Seja você um estudante cheio de paixão que caminha pelas ruas clamando por mais justiça social, seja você um policial que deixa um filho dormindo no berço para ir às ruas fazer o seu trabalho, vestindo sua farda com a intenção de preservar a ordem; não perca a sua essência, não perca a sua luz, não se perca na histeria das massas, não seja engolido por essa onda rubra que ensombrece nossa alma e amortece nossos corações.

Todos podemos perder nossa essência, e quando nos perdemos do que de belo existe em nós, todos perdem, e as cenas tristes dos últimos dias se repetem.

Assim, não estou aqui para julgar ninguém. Não estou aqui para dizer quem está certo ou errado, para nomear vítimas ou carrascos. Minha intenção é lembrar a todos do perigo intrínseco às generalizações.

Não se trata de “vândalos” versus “policiais truculentos”.

São pessoas. Seres humanos. De ambos os lados, muitas delas bem intencionadas. E muitas delas também tomadas por um lado animalesco, cheio de inconsciência e separatividade, que simplesmente destrói. E se existe algo que possa ser chamado de mal, esse mal estará incentivando a agressividade desmedida, o ódio generalizado por quem quer que more do outro lado da linha que traçamos.

Tudo é uma ilusão. Não há linhas. Somos todos irmãos.

Apenas peço, do fundo da minha alma, seja você quem for, que busque em si mesmo aquele lugar de sabedoria que lhe dirá que a pessoa que está lá, do outro lado, não é o inimigo.

O inimigo real só pode ser vencido dentro de cada um de nós.

Só teremos paz quando, cada um de nós, criarmos paz em nosso íntimo. Enquanto isso não acontecer, continuaremos a ver na tela da televisão o triste retrato de nossa própria distorção.

A Avenida Paulista é um espelho do que acontece dentro de cada um de nós.”

Agradeço a sua compreensão, leitor, por dedicar alguns minutos do seu dia para uma reflexão que não é (será?) relativa ao futebol. Na próxima semana retorno com publicação sobre a Copa das Confederações.
 

Para interagir com o autor: eduardo@universidadedofutebol.com.br

 

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Confederações e manifestações

A festa do futebol que aguardávamos teve sua notoriedade "roubada" pela onda de manifestações que pululam pelo país a fora.

Há de se resguardar sim o direito sagrado ao protesto e à liberdade de expressão. Por outro lado, há de se garantir também o direito de ir e vir daqueles que não participam das manifestações. Equação difícil, mas, deve-se tentar.

O fato é que depois de tanto tempo de espera temos a chance única de causar uma primeira boa impressão. Estamos realizandoo segundo evento mais importante do esporte com mais visibilidade no mundo e o que vemos são nossas mazelas serem expostas nua e cruamente para o mundo.

A chance de causarmos uma boa impressão eh agora. Todos brasileiros devem honrar nossa imagem ao mundo.

Maquiamos nossas mazelas sim. Como maquiamos o rosto para apagar suas imperfeições e marcas do tempo. Como pintamos os cabelos brancos para esconder a idade. Como fingimos riqueza com dívidas e nome no SPC. Como ostentamos carros do ano com parcelas vencidas no banco e risco de busca e apreensão. Como divulgamos vidas felizes nas redes sociais para esconder nossas frustrações. Como escondemos casamentos infelizes sob a hipocrisia de preservar filhos e contexto social. Como arrumamos a casa e ocultamos a bagunça de nossa casa quando recebemos visita. Como sorrimos para os outros quando o coração quer chorar.

Temos problemas sim. Mas, devemos resolvê-los internamente, afinal de contas, Brasil é a nossa casa e já que estamos organizando o evento, devemos mostrar ao mundo que somos bons anfitriões.

A hora de protestar contra a Copa do Mundo passou. Foi em 2007 quando nos candidatamos e ganhamos o direito de organizar os eventos. Foi nas urnas em 2010 quando elegemos os políticos responsáveis por conduzir este processo.

Portanto, agora, devemos nos vestir de verde e amarelo, retirar as bandeiras do armário e fazermos uma bela festa para que tenhamos dias memoráveis e inesquecíveis e para que o estrangeiro possa regressar ao seu país com boas referências.

Tenho certeza que pouquíssimos manifestantes sabem que nosso nordeste recebe menos turistas que a cidade de Cancun. Poucos manifestantes sabe do legado de Barcelona ou do incremento fantástico no turismo da Alemanha pós Copa. O mais triste é perceber que muitos manifestantes lutam pelo que não conhecem ou por interesses de determinados setores da sociedade.

Que caia sobre nós o espírito nacionalista e comunitário para aproveitarmos o momento para nos divulgar para o mundo como um grande país e não como um país cheio de mazelas.

Apesar de tudo, seja contra ou seja a favor das manifestações, esses grandes eventos já trouxeram para o país um legado inestimável: tirou o povo brasileiro de seu berço esplêndido e o devolveu a capacidade de se indignar.

Que essa indignação seja honrada em 2014 com o voto consciente, nossa maior ferramenta contra os governantes brasileiros. Não quero ter a dor de apesar de "termos feito tudo que fizemos ainda sermos os mesmos e vivermos como os nossos pais". No mais, "balança Brasil, adoro te ver contente".

 

Para interagir com o autor: gustavo@universidadedofutebol.com.br

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O gerenciamento de projetos e o futebol

Ao longo de minha trajetória profissional tive a oportunidade de gerenciar projetos e de montar e atuar num PMO (Project Management Office). Atualmente, venho pensando nos desafios atuais das instituições esportivas em melhorar seus resultados e entregar cada vez com mais qualidade seus produtos ou serviços no universo esportivo.

E, por assim sendo, me perguntei: o Gerenciamento de Projetos pode contribuir como disciplina de gestão eficaz para alavancar para o atingimento de novos patamares de resultados no esporte?

A minha resposta é sim! Recentemente, falei aqui sobre o Lean aplicado ao esporte e agora quero contribuir comentando sobre a aplicação do Gerenciamento de Projetos no esporte.

Dentro de qualquer instituição esportiva se faz necessário à aplicação do Gerenciamento de Projetos, sejam em projetos de marketing, projetos de desempenho esportivo, projetos de implementação de novos softwares de gestão, projetos de construção de novas unidades, e muitos outros temas que requerem a aplicação deste conceito.

Isso acontece, pois é comum constatarmos que projetos eventualmente terminem fora do prazo acordado, gastem mais recursos financeiros do que o previsto e não entreguem o que o cliente tinha como expectativa.

E como maximizar os resultados dos projetos nas organizações esportivas? A resposta é: capacitação dos profissionais e a criação de uma cultura de projetos.

Conforme dados do estudo de benchmarking em Gerenciamento de Projetos Brasil 2012, realizado pelos chapters brasileiros do PMI (fonte: http://www.pmsurvey.org), podemos compreender melhor os desafios do Gerenciamento de Projetos para as organizações para os profissionais.

• As principais habilidades necessárias e valorizadas ao gerenciar projetos nas organizações:

o Comunicação
o Liderança
o Negociação

• As principais deficiências dos gerentes de projetos (GP) nas organizações:

o Comunicação
o Gerenciamento de conflitos
o Conhecimentos em gestão de projetos

• Os principais problemas em projetos:

o Problemas na comunicação
o Não cumprimento dos prazos
o Escopo não definido adequadamente

• Os benefícios que as organizações têm obtido com o Gerenciamento de Projetos:

o Aumento do comprometimento com os objetivos e resultados
o Disponibilidade de informação para tomada de decisão
o Melhoria da qualidade nos resultados dos projetos

Podemos perceber que para atingir os benefícios acima citados, as instituições esportivas precisarão superar os desafios também comentados. Eu mesmo já senti na pele a necessidade de entender aquilo que não percebia tão claramente no Gerenciamento de Projetos, ou seja, a parte do iceberg que não podemos ver, mas que interfere diretamente no sucesso que poderemos ter ou não na entrega dos projetos sob nosso gerenciamento.

Dentro do Gerenciamento de Projetos observamos inúmeros treinamentos e formações que nos desenvolvem nas competências técnicas para liderar projetos. Passamos a conhecer o que é um ciclo de vida e a organização de um projeto; o gerenciamento de programa e portfólio; os processos de gerenciamento (iniciação, planejamento, execução, monitoramento e controle e encerramento); e todas as áreas de conhecimento que envolve um projeto, conforme o PMBoK 5ª Edição, do PMI.

Mas, por incrível que pareça, muitas vezes (me arrisco a dizer que na maioria das vezes) não damos atenção a um detalhe de grande importância dentro do ambiente de projetos: tudo acontece por meio das pessoas! E neste podemos somar o coaching como forma de estimular e apoiar o profissional que exerce a função de GP (Gerente de Projetos) na sua atribuição de liderar constantemente equipes de trabalho multidisciplinares e sob condições intensas de pressão.

Um dos benefícios da introdução de uma cultura de Coaching nas organizações esportivas projetizadas, está na melhoria da comunicação na organização e eficiência das equipes de projetos.

E acredito que todo GP sonha com uma melhor comunicação dentro das organizações em que atua. Agora reflita:

• Imagine qual seria o impacto se você conseguisse um ótimo desempenho como um GP coach e que as pessoas desejassem trabalhar em suas equipes de projeto?

• Você como GP acredita na importância de conhecer os estágios da formação de times?

• Saber como proceder em cada estágio desta formação de forma eficaz, seria uma vantagem para você?

• Ter o conhecimento das características de bons times ajudaria na condução de seus projetos?

Ok, as reflexões acima são pertinentes, mas como responde-las?
O Coaching melhora o desempenho do GP como líder. São poucos GPs que aplicam o Coaching, e os que o fazem de forma ativa ajudam seus liderados a aprender, crescer e ter uma vantagem competitiva na entrega dos projetos em que estão envolvidos.

Um GP coach auxilia a sua equipe de projeto a:

1. Diagnosticar problemas;

2. Identificar as opções;

3. Desenvolver estratégias;

4. Estabelecer metas e planos de ação para enfatizar a performance e o desenvolvimento.

Ainda, um GP coach bem sucedido na formação e condução de equipes, tem as seguintes qualidades:

1. Entende e aprecia dinâmica de grupos;

2. Levanta e reconhece seus próprios pontos fortes e fracos, assim como os da equipe;

3. Tem a capacidade de desenvolver comprometimento e compartilha propósito e visão;

4. Foca na realização, no desempenho, no desafio e sabe como demandar tarefas desafiadoras;

5. Tem boas habilidades de comunicação: ouve, questiona e testa todas as premissas;

6. Tem flexibilidade para facilitar ou ser direto conforme a situação;

7. Está preparado para discussões abertas e encoraja diferenças individuais;

8. Sempre sai do conflito na direção de decisões de consenso;

9. Possibilita oportunidades de aprendizado;

10. Fornece feedback regular.

Tornar-se um GP coach é uma visão de futuro extremamente positiva, sobre como os projetos poderiam gerar dados que contrariem a estatística apresentada no estudo de Benchmarking citada no início desta coluna, não é mesmo?

Acredito que um bom programa de liderança coach para gerentes de projeto deve:

• Capacitar os gerentes de projetos para que desenvolvam uma liderança com estilo de Coaching;

• Desenvolver os gerentes de projetos para que foquem em metas, resolução de problemas, utilização dos talentos e potencial máximo da equipe, bem como lidar com estados emocionais e crenças autolimitantes;

• Desenvolver o gerente de projetos como coach, habilitando-o a oferecer coaching informal, elevando substancialmente os resultados da equipe.

• Capacitar os gerentes de projetos para efetuar um feedback eficaz.

• Capacidade de fazer um planejamento de tempo e prioridades com sua equip
e de projetos.

Um GP coach passará a usar o expediente do Coaching informal, conforme alguns exemplos de aplicação abaixo descritos:

1. Quando de forma espontânea, você nota que sua equipe precisa de ajuda com uma habilidade e/ou competência.

2. Quando sua equipe pede por uma solução e você acredita que é a melhor oportunidade de aprendizagem se eles, pelo menos, tentarem mostrar algumas possíveis soluções.

3. Quando você vê a oportunidade de recompensar (reforço) um comportamento desejado no time.

4. Quando um membro da equipe está expressando claramente uma crença que está limitando-o.

5. Quando a equipe quer mudar algo, mas não sabe como.

6. Quando há um choque de personalidades entre os membros da equipe ou grupos de profissionais com grandes interesses. E para finalizar, você como GP gostaria de:

• Ter um senso mais claro de seus compromissos e de sua organização?

• Melhorar seu alinhamento e a capacidade de envolver as pessoas em novas possibilidades?

• Ampliar seu o entendimento da dinâmica organizacional e interpessoal?

• Ajudar os outros a atingirem os resultados?

• Apoiar a equipe a ampliar seus níveis de responsabilidade e sua capacidade de iniciativa e ação?

• Ser mais eficiente como gestor e líder?

• Ter capacidade de desenvolver o tipo de unidade e espírito de equipe, desenvolvendo relações poderosas de trabalho?

Bem, caso tenha respondido sim para alguma das questões acima, tenha certeza de uma coisa: está pronto para se tornar um GP coach!

E consequentemente, as organizações esportivas que passarem a utilizar o Gerenciamento de Projetos com os GPs capacitados nas técnicas de gerenciamento e na competência de liderança coach colherão os frutos diretamente em seus resultados como negócio.

 

Para interagir com o autor: gustavo.davila@universidadedofutebol.com.br

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Copa das manifestações

Nem tanto radical tampouco conformista. Esse deverá ser o tom do texto desta semana, cujo tratarei com o maior cuidado por se tratar de um tema bastante delicado.

E começo muito mais pela reflexão do “Por quê?”, que tem sido a tona de alguns debates que venho tendo com o colega Luis Felipe em meu trabalho. Sempre que vemos algo que trata de investimentos em esporte, nos perguntamos: “tá, mas e por quê?”.

Vejo que muitas das queixas contra a Copa não tem na sua raiz e essência a simples pergunta dos "porquês" – que, aliás, é a primeira questão que é levantada por qualquer criança que começa a querer ter uma percepção de mundo.

Essa resposta, até onde me lembro, nós nunca tivemos: por que queremos a Copa? Ora, um megaevento, que é transmitido para o mundo inteiro, com níveis de audiência altíssimos, com mensagens positivas de uma nação por longos 30 dias (ou mais) – a saber que apenas a guerra é capaz de transmitir com tanta intensidade algo de um determinado local ou país, só que de forma extremamente negativa –, que é catalisador de investimentos e melhorias urbanas nas cidades – como é provado por inúmeros estudos econômicos e sociais mundo afora –, que reúne o mundo para um bem comum, no "país do futebol"… Por que não haveríamos de querer?

A resposta não está estritamente nas causas, mas nas atitudes. O custo da Copa é ínfimo perto do que é reservado constitucionalmente e investido na saúde ou na educação, como se é óbvio imaginar (e tem de ser).

Não é o gasto na Copa que está atrapalhando estes setores – do contrário, parece que antes da Copa (ou dos Jogos Rio 2016) a educação, a saúde e a infraestrutura andavam às mil maravilhas e, após o anúncio de sede do Brasil para estes megaeventos, tudo desandou. Pura visão míope da questão. Culpa de quem não soube responder adequadamente os porquês de se trazer este tipo de evento ao país.

Fazendo uma conta simples e comparativa, a saúde deixou de gastar, no ano de 2012, mais de R$ 9 bilhões por pura ineficiência administrativa (para tanto, merece ser vista a entrevista do presidente do Conselho Federal de Medicina no Jô Soares: http://tvg.globo.com/programas/programa-do-jo/O-Programa/noticia/2013/06/roberto-luiz-davila-afirma-que-o-brasil-nunca-teve-tantos-medicos-como-hoje.html).

Isso mesmo, havia dotação orçamentária, que não foi empregada por não se conseguir gastar. Só a "sobra" da saúde em 2012 daria para fazer duas vezes os estádios para a Copa.

Não que eu concorde com os gastos públicos em estádios. Aliás, entendo que tínhamos potencial para fazer uma Copa quase 100% privada, com eventual financiamento público por parte do BNDES (que o faz com qualquer outro ente privado que deseja investir no país, diga-se de passagem).

Seria melhor, inclusive, para o pós-Copa, visando a gestão e a operação dos novos equipamentos, vide casos do Grêmio e do Palmeiras, com suas novas arenas em parceria com construtoras e operadoras profissionais.

O fato é que a rebeldia contra a Copa está errada. Sim, temos superfaturamentos que não podemos aceitar. Temos gastos indecentes e desnecessários. Essas são causas importantes. Mas, nunca o evento em si.

Do contrário, deveríamos repudiar qualquer apoio público para qualquer tipo de evento – do show do Paul McCartney até o Carnaval – e sabemos que, à sua maneira, cada um contribui, direta ou indiretamente, para movimentar economicamente uma dada região e, impactar, pessoas que gostam ou não daquele espetáculo, embora o dinheiro público seja o mesmo.

Finalizando, o que se deve ponderar é a crítica pela crítica aos megaeventos. A importância deles é inegável e, se o analisamos friamente, sem vícios, é possível perceber benefícios tangíveis e intangíveis atrelados à sua realização.

Que o repúdio venha sobre os desvios, as obras superfaturadas e a falta de entrega do legado prometido – aí teremos um debate inteligente, pertinente e justo.

 

Para interagir com o autor: geraldo@universidadedofutebol.com.br

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Vaias, protestos e a segunda tela

A edição 2013 da Copa das Confederações, competição que tem para a Fifa um status de teste para a Copa do Mundo do ano seguinte, teve início no último sábado. E logo nos primeiros dias, o torneio serviu para escancarar três características em eventos de grande porte: os problemas, as inovações e as grandes histórias.

Falar sobre problemas da Copa das Confederações é praticamente um reducionismo. O torneio teve uma série de problemas próprios, como as imperdoáveis filas para retirada de ingressos e o débil serviço em bares e restaurantes dos estádios. No entanto, por ter relevância global, o evento serve para escancarar uma série de feridas que não são apenas do futebol.

Não é por acaso que manifestações tentam se apropriar do espaço de um evento como a Copa das Confederações. Aliás, isso não é sequer novidade. Basta ver a história recente de outras competições esportivas de grande porte. Classificar atos assim de oportunistas é ignorar a razão de eles existirem.

Portanto, alguns pontos relevantes: toda manifestação é legítima, e o uso do esporte para aumentar a repercussão é extremamente natural. Também é pouco produtivo discutir apenas "os motivos" ou "os culpados". Em situações como a que o país vive atualmente, é fundamental tentar aprofundar um pouco o debate.

E o esporte, dentro e fora do campo de jogo, é feito por homens. Por mais alienados que eles sejam, é impossível descolá-los de recortes ou análises sociais. Ainda que as manifestações e as reações dos últimos dias no Brasil tenham pouco ou nada a ver com o esporte, elas têm tudo a ver com quem pratica e curte o esporte.

É por isso que não se pode apenas “imaginar a festa”. Fechar os olhos para o que tem acontecido nas imediações de estádios brasileiros é ignorar a história. E se a mídia não serve para contar histórias, não tem razão de ser.

Em competições da Fifa, o sinal oficial é gerado pela HBS, uma empresa parceira da entidade. É ela que grava imagens dos jogos e distribui para parceiros de transmissão. Assim, há uma garantia de padronização em enquadramentos e exposição de patrocinadores, por exemplo.

A HBS pode ser parcial. Trata-se de uma empresa que presta serviços para a organizadora do evento. A HBS não é mídia.

Em outros casos, é fundamental entender o limite da parcialidade. Ainda que o esporte tenha se aproximado drasticamente do entretenimento em algumas empresas, não dá para ignorar questões jornalísticas tão relevantes.

Mas há quem ache pertinente ignorar. Foi assim nos primeiros dias da Copa das Confederações, com confrontos entre público e polícia nas imediações de estádios. Em algumas emissoras, o clima bélico e os protestos feitos nos arredores dos campos de jogo foram tratados como assunto alheio ao futebol. Como se o futebol pudesse ficar alheio ao mundo.

Todo esse contexto é fundamental em qualquer análise sobre as vaias que a presidente Dilma Rousseff e Joseph Blatter, presidente da Fifa, ouviram no último sábado. Os apupos foram direcionados aos dirigentes durante a cerimônia de abertura da Copa das Confederações.

A vaia não foi pessoal, tampouco improvisada. Foi parte de um movimento de insatisfação e iniciativa que tem se manifestado no Brasil e que tem usado os eventos esportivos como combustíveis.

A vaia também foi resposta ao sentimento popular diante dos R$ 7 bilhões em dinheiro público que foram investidos em estádios brasileiros. E ao sentimento geral de que a população age de forma bovina e que não responde a nenhum acinte desse porte.

A reação do público para Dilma e o volume das vaias, que ficou ainda mais intenso quando Blatter intercedeu e pediu respeito, não são coisas apenas do esporte. Mas afinal, quando acaba o esporte e quando começa a vida?

Tudo isso, dos protestos às vaias, é positivo. Gera esperança. O problema é que as reações escancaram uma série de mazelas e defeitos da sociedade brasileira. E isso produz frustração em igual proporção.

E aí não entra apenas a ação da Polícia Militar, que tem se comportado como um pai adepto das palmadas. Se uma criança faz algo errado, o jeito é bater para ensinar. Não existe didática ou conversa, mas violência. Eu poderia citar uma dúzia de pedagogos que mostram, há anos, o quanto a porrada é pouco eficiente para produzir aprendizado.

Também frustra a reação de uma parcela da população, a que só quer saber do bem estar individual e que acha que a reação virulenta é a melhor forma de coibir excessos. É em momentos extremos que a sociedade local mostra o quanto ainda precisa evoluir.

Os problemas que o Brasil tem mostrado na Copa das Confederações, contudo, vão muito além da parte ideológica. O país ainda convive com o ranço didático do período militar, mas sofre igualmente com a falta de planejamento e estrutura básica. Novamente, uma coisa não pode ser isolada da outra.

Um megaevento esportivo é a chance que um país tem para mostrar ao restante do mundo o que ele tem de melhor, mas também serve para concentrar e exacerbar problemas. O Brasil precisa trabalhar muito para que essa equação não produza, em 2014, uma imagem que jogue fora os bilhões investidos na Copa do Mundo.

E aí, o que falta é esse conceito de unidade. O Brasil precisa trabalhar, mas para isso é importante o país saber o que quer com a Copa. A sede foi definida em 2007, mas ainda não há sequer uma diretriz sobre o que a competição pode representar.

Potencial os eventos têm, e isso já ficou claro nos primeiros dias da Copa das Confederações. Uma das coisas mais legais em torno de um evento desse porte é a quantidade de histórias que ele produz.

Neste ano, dificilmente aparecerá algo mais legal do que o caso envolvendo Altair, lateral que foi campeão mundial com a seleção brasileira em 1962. Em Brasília para receber uma homenagem, o ex-atleta, que sofre do mal de Alzheimer, saiu perambulando pelas ruas da cidade e foi encontrado por um grupo de jornalistas. O relato inteiro está aqui, ó: http://tinyurl.com/nynpg44.

Um evento do porte da Copa das Confederações também serve como plataforma para uma série de lançamentos. O melhor exemplo até agora é o programa "Cabeça no jogo", que a "ESPN Brasil" exibiu durante a vitória do Brasil sobre o Japão.

O conceito que norteia o programa é o de segunda tela. A ideia é reunir comentaristas, mensagens de redes sociais e muito humor para
servir como um complemento ao jogo. A ESPN não tem direito de transmissão da Copa das Confederações.

Independentemente do tom do programa, que ainda pode ser ajustado, o "Cabeça no jogo" é uma tentativa de visão diferente. É uma linguagem nova, que complementa a transmissão e que coloca em um novo patamar a convergência de mídias.

Que seja apenas o começo. Que os eventos esportivos sirvam como mote para grandes histórias e grandes inovações. E que abarquem também os protestos e as vaias, sem que isso nos jogue na cara o quanto a evolução tecnológica não garante a evolução social.

 

Para interagir com o autor: guilherme.costa@universidadedofutebol.com.br

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Um grande risco de treinar jogando

Treinar situações de jogo apresenta-se como a grande tendência do treinamento em futebol. Seja por autores da corrente pedagógica ou por autores da corrente biológica, a ideia de criar um ambiente que permita aos atletas terem de tomar decisões semelhantes às da competição ganha cada vez mais espaço e adeptos.

Aplicado sob uma perspectiva sistêmica, o objetivo de cada sessão de treino é promover adaptações físico-técnica-tática-mentais positivas, tanto de caráter individual como coletivo. Tais adaptações buscam aperfeiçoar o modelo de jogo do treinador, que deve ser construído em função do jogo e de sua lógica.

Como jogar (em espaços reduzidos, espaços formais, com superioridade numérica, inferioridade numérica, igualdade numérica, com pressão de tempo, com redução de toques, com referências espaciais ou quaisquer outras adaptações propostas pela comissão) passa a ser a essência da periodização, o volume total semanal que uma equipe atinge com esta forma de treinamento ultrapassa 300 minutos.

Isto significa que numa "semana cheia", com apenas um jogo no final de semana, a comissão técnica tem mais de 5 horas de treino (jogo) para efetuar as devidas intervenções (de ordens física-técnica-tática-mentais).

Uma vez que a ação de cada jogador num determinado jogo reflete a interpretação que o mesmo tem das inúmeras situações-problema que o jogo lhe apresenta, toda semana de treino é uma oportunidade de correções e aquisições de comportamentos. Eis a grande solução. E também um grande risco de treinar jogando!

Para exemplificar, imaginemos um zagueiro central que de acordo com os princípios de jogo do futebol moderno apresenta as seguintes dificuldades:

• Mau posicionamento na grande área para proteger o gol em situações de cruzamento do adversário;

• Dificuldade para compor a linha de defesa zonalmente, marcando o adversário de forma individual desnecessariamente;

• Ataque à bola em detrimento ao retardamento, quebrando a linha de defesa e proporcionando uma decisão mais fácil ao adversário;

• Dificuldade para posicionar o corpo entre a bola e o alvo durante a flutuação;

• Dificuldade para participar da organização ofensiva, não realizando coberturas ofensivas e apoios;

• Não participação do bloco ofensivo quando a equipe tem a posse de bola no campo de ataque;

• Dificuldade de decidir rapidamente sobre a melhor opção de passe.

Todos estes comportamentos tendem a ser reproduzidos nas emergências dos jogos ao longo do microciclo. Em uma comissão técnica que resolva treinar com situações de jogo, mas que seja ineficiente nas intervenções, as mais de 5 horas de treinamento semanal serão subaproveitadas e o referido atleta pouco evoluirá.

O subaproveitamento deste tempo de treino gerará a repetição de más decisões que, quanto mais velho for o atleta, mais dificilmente serão modificadas. Ter um atleta formado, habituado a comportamentos de jogo ultrapassados demanda um tempo de treino para correção que o imediatismo do futebol não permite. Além disso, as crenças que o atleta carrega limitam a compreensão de um novo futebol e seu potencial cognitivo já está reduzido.

Multipliquem os "problemas" apresentados de um atleta pelos cerca de 30 jogadores existentes num elenco. Há muito trabalho para uma comissão técnica que, como pré-requisito, deve conhecer quais são os elementos do bom futebol. Ciente destes elementos, inicia-se a constante construção e reconstrução do jogar da unidade complexa/equipe que se adquire na ação.

Que a comissão seja cuidadosa o suficiente para não transformar as mais de 5 horas semanais de treinamento num ambiente que, mesmo jogando, reforce o mau futebol!

Abraços e bom trabalho!

 

Para interagir com o autor: eduardo@universidadedofutebol.com.br

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Movimento “Por um futebol melhor” e a atenção dos consumidores

Neste ano, clubes de futebol se uniram e criaram o Movimento “Por um futebol melhor”, encabeçado pela Ambev, que tem como base mostrar ao torcedor que o dinheiro que ele investir para ser sócio do clube poderá voltar para ele, com descontos em produtos e serviços das empresas parceiras.

A intenção é alcançar os torcedores que não vão aos estádios, pois os programas de "sócio-torcedor", em regra, trazem como atrativo principal o direito a ingressos.

Trata-se de imensa oportunidade para que os clubes tenham maior atratividade e fidelidade na relação clube/fornecedor – torcedor/consumidor.

Como sócio-torcedor do Clube Atlético Mineiro (“Galo na veia”), no último domingo dirigi-me ao Supermercado Supernosso e, ao solicitar o desconto, fui informado que aquele caixa não estava concedendo descontos.

Havia, assim, dois erros.

O primeiro: a não concessão dos descontos; e, o segundo, a falta de informações acerca do problema.

Diante disso, efetuei reclamações pelo site “por um futebol melhor” e pelo Twitter. No dia seguinte, a AMBEV e o Supernosso me contactaram a fim de esclarecer a questão.

Extremamente positiva a preocupação no atendimento célere à reclamação do consumidor, basta agora aguardar a solução definitva.

Espera-se que os envolvidos permaneçam preocupando-se em atender aos anseios do consumidor, eis que tais medidas são indispensáveis para o sucesso do projeto e para o retorno aos clubes de futebol envolvidos.

Ponto para o Estatuto do Torcedor.
 

Para interagir com o autor: gustavo@universidadedofutebol.com.br