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Furacões

A bola já chegava redonda a Gérson. Ou a Rivellino. Se chegasse uma jaca, também não haveria problemas. Os dois gênios a dominariam com o talento que Deus deu a brasileiros como eles. Lá no meio-campo do Brasil tricampeão mundial de 1970, se Gérson a dominasse na intermediária, levantava a cabeça e procurava Jairzinho, com as turbinas aquecidas para se transformar no furacão daquela Copa.
 
Era fração de segundos. Tanto Gérson quanto Rivellino sabiam o que fazer. Tudo dependeria não só da técnica de lançamento de fazer inveja à Nasa. Mas, também, daquele foguete Jair: dependendo do jeito que ele mexia a cabeça, a senha estava dada para “Houston”: se fosse de um jeito que eles haviam combinado, a bola tinha de ser lançada à frente da zaga para que Jair ganhasse na corrida, como fez em gols contra a Tchecoslováquia e Peru; o outro modo era mandar a bola na dividida com a zaga, quase na linha do impedimento, que Jair partiria para a briga.
 
Deu certo. Como deu certo.
 
Mas poderão dar certo lances desse nível no jogo corrido de hoje? Claro: é só conseguir unir talentos como aqueles. Sim, eles ainda existem. Ou você não vê Ronaldinhos e Ronaldos, Kaká, Messi, Riquelme, Pato, Totti? Mas não basta apenas juntá-los, jogar a bola no gramado e dizer “divirtam-se e nos divirtam”. É preciso tempo. É preciso trampo. É preciso entrosamento.
 
Tempo que deve ser ainda maior para fazer times medianos de jogadores abaixo da média funcionarem além do que sabem e podem. O grande problema da bola que rola pelo Brasil é que não se tem tempo para formar grandes parcerias, grandes engrenagens, grandes equipes. Pintou um bom jogador, hasta la vista, baby, vai ganhar a vida dos netos na Europa.
 
Gérson, Rivellino e Jairzinho não faziam tudo aquilo de berço. Aprenderem no campo a se entender. Com o tempo. O Brasil-70 passou mais de quatro meses se preparando para a Copa. Em 2010, se somarmos todos os amistosos e competições, o treinador do Brasil na África do Sul não terá chegado àquele tempo todo. Muito menos àquela bola cheia – que, insisto, não se deveu apenas à qualidade técnica daquela seletíssima seleção.
 
Voltando ao campo dos mortais, fica ainda mais difícil dar liga quando se tem menos de três semanas para fazer uma pré-temporada decente. Como não se tratam os estaduais como eles deveriam HOJE ser organizados (são apenas meros torneios preparatórios), a pressão absurda atrapalha treinadores e jogadores (alguns já despreparados pela natureza e pelo mercado que sangra nossos clubes).
 
Desde 16 de janeiro (e no Paraná ainda antes), as equipes já começam a todo vapor. Ou só expelindo fumaça. Jogando duas vezes por semana, os treinadores mal têm tempo de preparar em treinos as equipes e as possíveis mudanças. Jogam treinando. E treinam mal. Jogam pior.
 
Quem escapa do início ruim de temporada é o Atlético Paranaense, 100% até o ponto final dessas linhas. É possível discutir a qualidade dos rivais (como tudo se discute nessa época do ano). Mas não há como deixar de elogiar equipe que mantém o padrão depois de 11 rodadas. Não por acaso, também por manter a mesma equipe que, com Ney Franco no comando técnico, conquistou 57% dos pontos no BR-07. O Atlético-08 é o modelo 2007. Se não chegaram grandes nomes, a manutenção da base acabou se transformando no diferencial da equipe. Quer dizer, no “igual” da equipe. Quanto mais repetida, quanto mais “manjada” (interna e externamente), mais resultados têm conseguido.
O Gérson, o Rivellino e o Jairzinho do Furacão Paranaense são o conhecimento de cada um do funcionamento do todo. Não há um craque no Atlético. Mas, todos juntos, por um bom tempo, podem virar a referência de um time.

Para interagir com o autor: maurobeting@universidadedofutebol.com.br