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O grande vencedor do ano

Tchau, 2009.
Ainda bem.
Eu realmente estou cansado do bordão ‘dois mil inove’.
Não aguento mais.
A palavra ‘inove’ deveria ser enterrada.
Ou ter sua grafia mudada para qualquer coisa que não envolva um algarismo.
Temo pelo dia que o mundo chegar a 2100.
Dois mil e cem por cento Jardim Irene.

Credo.

Enfim.
O ano acabou.
E eu até faria uma retrospectiva, se eu lembrasse o que aconteceu.
Mas não lembro muito.
Minha memória é patética.

Mas uma coisa salta aos olhos.
2009 teve um grande vencedor.
Ou melhor, vencedora.
E não é a Patrícia Amorim.
Que eu até acharia uma pessoa bacana, não fosse ela política.
Político e presidente de clube de futebol são duas coisas que historicamente não dão certo.
Ainda assim, tomara que dê certo.

E já que estamos falando em Flamengo, a vencedora do ano tem grande relação com o clube.
A grande vencedora de 2009 foi a Vulcabrás/Azaléia.

O motivo é simples: dos quatro primeiros colocados do Campeonato Brasileiro deste ano, todos são patrocinados pela empresa, que é dona das marcas Reebok e Olympikus.
Flamengo, Inter, São Paulo e Cruzeiro. Os únicos clubes patrocinados pela empresa são os quatro primeiros colocados.
É impressionante.

Estou com preguiça de conferir, mas acho que foi a primeira vez na história do futebol brasileiro que isso aconteceu, pelo menos a partir do momento que tinha mais do que duas ou três empresas no mercado.

É óbvio que tem sorte envolvida.
Não é por causa da Vulcabrás que os times acabaram no topo.
Mas é um indício que a empresa sabe escolher bem seus parceiros.
E isso já é muita coisa.

Além do mais, a empresa realmente apresenta, pelo menos aparentemente, um serviço diferenciado aos clubes. Muito do que se vê de ação de marketing desses clubes por aí é mais por conta da empresa do que por conta do próprio clube em si.
E relatos pessoais me passam a impressão que a empresa é realmente diferenciada, principalmente num dos maiores problemas sofridos pelos clubes de futebol: o fornecimento de material de jogo.

Parabéns, Vulcabrás.
2009 foi de grande sucesso.
Espero que o próximo ano seja super dez.

Entendeu?

Para interagir com o colunista: oliver@universidadedofutebol.com.br

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Base do sucesso

Na última rodada do Campeonato Brasileiro de 2005, quando o Flamengo quase foi rebaixado, mas se recuperou e se salvou com Joel Santana no comando, terminando a competição apenas na 15ª colocação, Leonardo Moura era o lateral-direto rubro-negro, na goleada de 4 a 1 no Paysandu.

Na estreia do Brasileirão-06, derrota para o São Paulo por 1 a 0, no Morumbi, apenas Leo Moura já estava no time que parecia coadjuvante na competição. Foi o 11º. Mas ganhou a Copa do Brasil. Na última partida na temporada, 4 a 1 no São Caetano, Leo ganhou a companhia de Bruno, Ronaldo Angelim, Juan, Toró e Bruno Mezenga.

Na estreia do torneio nacional de 2007, derrota por 4 a 2 para o Palmeiras, no Rio de Janeiro, Bruno, Angelim, Juan e Mezenga atuaram. Na derrota para o Náutico por 1 a 0, Bruno, Leo Moura, Angelim, Juan e Toró estavam na última rodada, fechando espantosa recuperação que terminou no terceiro lugar do Brasileirão.

Na estreia do Campeonato Brasileiro de 2008, vitória sobre o Santos por 3 a 1: Bruno, Leo Moura, Angelim, Juan, Toró e Kleberson. Todos em campo. Na derrota para o Atlético-PR, no Paraná, por 5 a 3, na última rodada, todos eles (menos Kleberson), e mais Everton, Aírton e Maxi. O Flamengo acabou na quinta colocação. Com seis titulares que fariam a mais que merecida festa do hexa, contra o Grêmio, no Maracanã, na última rodada do Brasileirão-09.

O modelo de gestão do Flamengo é a exceção que confirma a regra, na análise do jornalista André Rocha. Não é para se repetir o que fez o Flamengo em 2009, e nos últimos campeonatos. São mais de R$ 300 milhões em dívidas, que não são compensadas pela receita triplicada nos últimos cinco anos. Mas, dentro de campo, sob o sereno comando de Andrade, as coisas se acertaram. E foram ainda mais certas pela camisa que veste Andrade. O Flamengo tem algumas coisas a mais quando chega para decidir. E teve algo a mais, como todo clube campeão, por começar a montar esse time de 2009 ainda em 2005. Acertando e errando, o final das contas é muito melhor que a encomenda. Justamente por manter uma base.

Um dos tantos segredos conhecidos do Flamengo foi esse. Um time que apostou em Petkovic para acertar uma dívida contábil risível em maio, e saiu em dezembro com o sorriso mais que escancarado pelo acerto histórico do investimento. Diferente de Adriano, que traz consigo um combo de problemas, mas um pacotaço de soluções, Pet era dúvida, era dívida, virou um mito impagável. Gratidão eterna. Dois dos nomes que fizeram o 4-2-3-1 de Andrade dar certo muito além da encomenda rubro-negra.


Andrade mudou o Flamengo de Cuca

Segredos

Um dos tantos méritos do jovem treinador velho de Gávea é que ele pôs o dedo em dogmas e não saiu chamuscado pelas mexidas ousadas. Saiu campeão. Hexacampeão: ao recuar os alas Leo Moura e Juan como laterais, com mais obrigações defensivas e menos liberdades ofensivas, não perdeu qualidade à frente, e ganhou consistência atrás. Muito pelas apostas pontuais nos experientes Álvaro, que fez ótima parceria com o sempre correto Angelim (mais que merecedor do gol do título), e de Maldonado, volante-zagueiro, zagueiro-volante, que tem a capacidade de arrumar um sistema defensivo.

Não apenas o ajuste na retaguarda foi notável. Andrade não tinha um bom parceiro à frente para o imperador depois da saída do sheik Emerson. Denis Marques não deu jogo. O que fez o treinador? Adiantou o volante Willians como meia aberto pela direita. Mais à frente, ele conseguiu ser o jogador que mais driblou e recuperou bolas. Um assombro. Adriano pôde ficar isolado à frente. Porque os três meias sempre chegaram.

Outra recuperação notável foi anímica, técnica e física de Zé Roberto. O jogador que flanava passou a flutuar entre o centro da armação e o lado esquerdo rubro-negro, trocando de função com Pet. Assim desmontaram o então líder Palmeiras, no Palestra, num jogo-chave. Assim partiram para o hexa incontestável.

Como? Jogando bola. Jogando simples. Usando uma base. Um dos tantos segredos do terceiro colocado São Paulo. Dos principais times do equilibradíssimo Brasileirão-09, foi o que menos mudou de 2008 para 2009. Em time que está ganhando se mexe, também. Mas não muito. Sete titulares eram os mesmos do tri. Mesmo com outro treinador, o 3-1-4-2 foi mantido. E deu em bela recuperação estancada pelo Flamengo. E pelo Inter. Um que teve dois treinadores. Variou de nível e regularidade. Perdeu a promessa de craque Giuliano para a Sub-20. E perdeu um título que parecia ganho. Quase sempre mantendo o 4-2-2-2 padrão, com variação para um 4-3-1-2. Foi outro que pouco mexeu a base: manteve quatro titulares de 2008 para ser vice-campeão nacional.

Belo exemplo é o Cruzeiro. Poderia terminar o ano disputando o Mundial contra o Barcelona. Caiu no Mineirão para o não mais que certinho Estudiantes de Verón. Caiu num bode de dar dó. Mas fez um baita returno, semelhante ao rubro-negro, ultrapassou o rival figadal, e na última rodada venceu o Palmeiras na luta pela vaga na Libertadores-10. Sempre baseado no 4-3-1-2 tão caro a Adilson. Mas quase sempre tão eficiente. Apesar da marcação um tanto frouxa, e da perda de gente de qualidade durante a campanha. Ah, sim: com cinco titulares de 2008 mantidos.

Mas se é para falar de perda, depois de 19 rodadas na ponta, perder o penta e até a Libertadores é demais. O Palmeiras demitiu Luxemburgo em quinto lugar, achou um ótimo interino como Jorginho que deixou para Muricy o clube em primeiro lugar. Até cair pelas tabelas e cair fora do sonho do bi sul-americano. Perdendo titulares, perdendo para os lanternas, perdendo a cabeça, se perdendo. Do 4-2-2-2 básico a um 3-4-1-2 nem sempre bem entendido, alguma coisa deu muito errado ao Palmeiras.

A começar por tantas mudanças. Entre os cinco primeiros do Campeonato Brasileiro de 09, nenhum time mudou tanto desde 2008. Apenas três titulares da boa campanha de então foram mantidos. Não é de um ano a outro que as coisas dão liga. E foi o que também não aconteceu no Palmeiras. Faltou paciência. O que sobrou a Andrade no Flamengo.

Para interagir com o autor: maurobeting@universidadedofutebol.com.br

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O treinador nacional e o estrangeiro

Tratemos, hoje, de um tema que, sem dar ares de adivinho, parece manter alguma actualidade: qual o melhor treinador, para o futebol (ou o basquetebol, ou o andebol, ou o voleibol, etc.) de um país, o treinador nacional ou o estrangeiro?

Em Portugal, a concluirmos pelo enlevo que certas pessoas sentem por tudo o que chega da estranja e o pessimismo demolidor que lançam sobre os homens e as coisas de Portugal, os treinadores portugueses são muitas vezes minimizados, com enfatuada ironia.

A enriquecer esta tese, adianta-se, de fisionomia aberta e jubilosa, o facto incontroverso de, com Luiz Filipe Scolari, Otto Glória, Bella Guttman e Tomislav Ivic, o futebol português ter alcançado êxitos retumbantes (e o mesmo poderia dizer doutras modalidades, como, por exemplo, o voleibol). Eles instigaram-no a novos métodos que nele se repercutiram, durante anos. Mas por que se esquece repetidamente que é nosso o que, há bem pouco tempo, foi considerado o melhor treinador do mundo e ainda Fernando Vaz, José Maria Pedroto, Artur Jorge, Carlos Queirós, Jorge Jesus, Paulo Bento, Manuel José e outros?… Num país de velhas tradições e de longa caminhada histórica, até no futebol gostamos de ser colonizados! E, como veremos, não há razão para mais um complexo de inferioridade.

Mas a pergunta continua teimosamente de pé: qual o treinador que melhor serve o futebol de um país, o nacional ou o estrangeiro? Em igualdade de circunstâncias, o nacional, indubitavelmente! Ao treinador estrangeiro, em terra alheia, sem o domínio da língua nativa (e não é linguagem o desporto?) e desconhecendo o futebol como expressão de uma cultura que lhe é estranha – escasseiam-lhe, normalmente, ao nível do agir e do inteligir, uma larga soma de dados imprescindíveis ao exercício da sua profissão… longe do seu país!

É uma antiga questão esta da existência ou não-existência de características nacionais, no futebol. De facto, que realidade traduz a designação brasileiro, inglês, soviético, aposta ao vocábulo futebol? Há futebol brasileiro, ou futebol no Brasil? Há futebol inglês, ou futebol na Inglaterra? Há futebol coreano, ou futebol na Coreia?

Tentemos estabelecer a noção de futebol: ele é um desporto colectivo, com as regras por todos conhecidas e dependente do génio individual dos jogadores, da capacidade de liderança do treinador-principal e da organização global dos clubes. Mas os elementos raça, geografia, língua, tradições, cultura, etc. singularizam o futebol dos diversos países? Indubitavelmente! Por isso, existe o “futebol sambado” do Brasil, o “futebol atlético” dos ingleses, o “futebol racionalista e geométrico” de alguns Países da Europa Central.

O futebol também interpreta o real, à sua maneira; também ele é uma visão do mundo, existindo no plano do conhecimento não consciencializado; também ele resulta da sensibilidade peculiar de um povo. O futebol pode fazer suas as palavras de Ortega y Gasset: eu sou eu e a minha circunstância!

Tudo isto, para concluir que aposto nos treinadores nacionais, no cotejo com os estrangeiros, para dirigir e orientar as nossas equipas de futebol (ou de qualquer outra modalidade desportiva). Desde que sejam treinadores que aliem uma prática incessante (de treinadores, logicamente) a uma teorização rigorosa.

A grande mensagem que o José Mourinho, Manual Jesualdo Ferreira, o Carlos Queirós, o Nelo Vingada, o José Peseiro, o Mariano Barreto, o Manuel Machado, o Carlos Carvalhal, o Rui Dias e outros mais licenciados em Desporto pretendem transmitir ao futebol português (e não só) é esta: também é preciso estudar, para se obterem vitórias, no futebol. Também aqui a teoria e a prática deverão existir em função uma da outra, visando não só um saber, mas uma sabedoria.

Recordo a terminar Cândido de Oliveira, Fernando Vaz, Mário Wilson, Manuel Oliveira, José Maria Pedroto, Artur Jorge, Jorge Jesus, Manuel Cajuda que, sem um curso universitário de Desporto, anunciaram, à sua maneira, que a teorização é indispensável à prática de treinador de futebol – o que fazem os que tiveram, como professores, o Manuel Jesualdo Ferreira, o Mirandela da Costa, o Carlos Queirós e o Nelo Vingada, no ISEF de Lisboa, e o Vitor Frade, no ISEF do Porto!

No entanto, é de exigir aos licenciados que escutem, com humildade, os que levam anos e anos de futebol. É que também o futebol se teoriza, no quadro de uma inegável dimensão histórica, social e política. Ocorre-me o conceito de “prática-teórica” de Louis Althusser, ou mesmo a “teoria-prática” de Gyorgy Lukács.

Por mim, quero denunciar, tanto o idealismo da “teoria pura”, como o pragmatismo de uma prática a-céfala; tanto uma dialéctica unicamente de categorias e de conceitos, como a “consciência espontânea” (altamente tributária da tradição e do passado) dos que não estudam e abdicam do papel orientador da teoria.

*Antigo professor do Instituto Superior de Educação Física (ISEF) e um dos principais pensadores lusos, Manuel Sérgio é licenciado em Filosofia pela Universidade Clássica de Lisboa, Doutor e Professor Agregado, em Motricidade Humana, pela Universidade Técnica de Lisboa.

Notabilizou-se como ensaísta do fenômeno desportivo e filósofo da motricidade. É reitor do Instituto Superior de Estudos Interdisciplinares e Transdisciplinares do Instituto Piaget (Campus de Almada), e tem publicado inúmeros textos de reflexão filosófica e de poesia.

Esse texto foi mantido em seu formato original, escrito na língua portuguesa, de Portugal.

Para interagir com o autor: manuelsergio@universidadedofutebol.com.br

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2010: o Ano do Kiwi

Chegamos ao momento do ano em que pessoas e empresas planejam.

No caso das pessoas, chama-se de resoluções de ano novo o ato de planejar, naquilo que nos cabe, o ano seguinte.

Nas empresas e instituições, chama-se planejamento estratégico, no mais das vezes, o período em que se discutem as ações vindouras da temporada de negócios.

Uns se socorrem dos seus oráculos: cartomantes, tarólogos, búzios, orixás, santos, videntes, astrólogos, na ânsia de iluminação para conduzir a vida que segue.

Outros se reúnem em intermináveis discussões, com gerentes e diretores dos diversos departamentos, debruçados em relatórios, números, projeções e análises, para tomar as melhores decisões sobre o rumo dos negócios.

De um jeito ou de outro, o planejamento está presente no dia-a-dia de ambos os grupos. Dos indivíduos ou das instituições. Queira-se ou não.

Planejamento é uma expressão que causa arrepio na maioria absoluta dos dirigentes esportivos do Brasil. Ou por não saber fazer, ou por não querer que ele aconteça. Pois dá muito trabalho e pode revelar coisas indigestas.

Tive acesso ao planejamento estratégico da Federação de Futebol da Nova Zelândia para o período 2006-2010.

Os neozelandeses são conhecidos como kiwi, dada a ave-símbolo do país, que também batizou a fruta que conhecemos bem.

Para quem já esteve em contato com a tradicional elaboração de um plano estratégico, não há nada de surpreendente no conteúdo do documento. A surpresa maior são os resultados obtidos – que é o que se espera de um planejamento bem feito…

Em resumo, contém: a visão do cenário e os objetivos gerais; seis desafios estratégicos a superar; o mapa da estratégia; orçamento; análise PEST e análise SWOT.

1. Alinhar o esporte e controlar o jogo. 2. Atingir sustentabilidade financeira. 3. Desenvolver o jogo. 4. Atingir sucesso internacional. 5. Melhorar a comunicação. 6. Otimizar a capacitação interna.

O primeiro desafio diz respeito à necessidade de unificar a gestão, governança e liderança, por parte da Federação, junto a um esporte de prática e controle fragmentados no país.

O segundo e o terceiro desafios são auto-explicativos.

Melhorar a comunicação refere-se ao incremento do nível de relacionamento com todos os stakeholders junto aos processos administrativos da Federação.

Otimizar a capacitação pressupõe a melhoria na formação dos profissionais de todos os setores envolvidos na indústria do futebol do país.

Voltemos ao quarto desafio. Atingir sucesso internacional. Os objetivos específicos, aqui, eram classificar-se para todas as principais competições da Fifa, tanto no masculino quanto no feminino, bem como melhorar a posição no ranking até 2010 (homens entre as 80 melhores seleções do mundo e mulheres entre as 15 maiores).

No masculino, vaga garantida para a Copa 2010. Em abril de 2007,já havia estado na posição 77 do ranking, e manteve até há pouco. Agora está em 82º.

No feminino, está em 23º lugar. A melhor posição foi a 20ª, em 2005.

Esse quadro, grosso modo, comprova o planejamento bem feito e com convicção de propósitos, alinhado às possibilidades de conclusão das metas. Sem segredos, porque o segredo está no trabalho enunciado no meio do planejamento.

Mas, por que planejar as coisas, uma vez que o Flamengo nem sonhava em ser o campeão brasileiro de 2009 e acabou conquistando o título?

De qualquer maneira, meu horóscopo aponta que 2010 será o ano do kiwi, porque, se não fizer minha parte, nenhum santo vai ajudar.

Para interagir com o autor: barp@universidadedofutebol.com.br

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Fim de ano, tudo velho de novo

Fim de ano. Momento de retrospectivas, reflexões, muitas palavras, promessas bonitas, cheias de significados e valores. Período entediante para o aficionado pelo futebol, com poucas opções de jogos, apenas de falação. Período de especulações, negociações, renovações, contratações. Esse é o fim do ano.

Como praxe, a palavra em moda no futebol neste período é ”planejamento”. Novo planejamento, novas abordagens, gestão, profissionalismo, são termos que recheiam os jornais, entrevistas e todos os campus (utilizando aqui a noção de campus de Pierre Bourdieu.

Mas, infelizmente, é difícil ouvirmos falar em novas tecnologias ou, quando ouvimos, ficamos no plano ideológico e conceitual, como nos debates colocados aqui por nós, como no debate feito pelos portugueses disponibilizado na última semana.

O que fazer para que as palavras de fim de ano, em síntese, o dito planejamento, e, sobretudo, novas tecnologias, que nem são tão novas assim, possam chegar ao futebol de maneira objetiva e consistente, sem a batuta da desconfiança e do menosprezo, mas com a chancela de melhoria e inovações na prática do profissional? Eis a pergunta que me orienta para o próximo ano com intuito de discutir a tecnologia na prática.

Peço licença ao amigo para fazer as minhas breves reflexões a anseios de fim de ano. Confesso estar desapontado com o meio profissional do futebol, faço questão de não generalizar, que me desculpem os que se sentirem injustiçados.

Decepcionado por ver uma arrogância nos dirigentes que fecham os olhos para as inovações no futebol, que atinge também o meio acadêmico por rejeitar as “inovações “surgidas no futebol. Vide Dunga (ainda sob suspeita) ou Guardiola (que o tão famoso resultado do futebol o torna incontestável, simplesmente porque ganhou tudo o que disputou - vale a pena ler a coluna do amigo Rodrigo Leitão comentando sobre a estrutura e o planejamento do Barcelona como suporte extremamente importantes).

Decepcionado pelo descompromisso em fazer um futebol sério, e não precisamos ficar aqui na “utopia” (ainda que toda conquista tenha sido uma utopia de véspera) de fazer pensando no futebol como um todo, mas na “utopia” de fazer bem e de forma séria para a própria equipe.

Em síntese, faltam profissionais com visão do negócio e futuro do futebol, que saibam separar a paixão, ou melhor, canalizá-la nos “campus” específicos e pertinentes, para que não vejamos equívocos mil.

Eis meus sonhos para o próximo ano:

O futebol sem os erros absurdos da arbitragem;

Não ver mais os dirigentes, descontrolados com os resultados, tomarem ações ridículas;

Tribunais que desempenham seus papéis o ano inteiro não serem julgados (que ironia) pela pressão (da imprensa e clubes) popular apenas nas fases decisivas;

Que jogadores contratados e anunciados em janeiro como parte do planejamento a médio e longo prazo não sejam dispensados em abril;

Que os clubes comecem a investir em tecnologia e gastar menos com o “achismo” e possam, com base em dados e informações, qualificar, e ai sim, potencializar o feeling de seu profissional.

Enfim, poderíamos ficar até o final de 2009 enumerando algumas situações, ou de 2010, ou de 2011…ou sabe-se lá até quando.

O Papai Noel passou na última semana e disse-me que se eu for um bom menino no ano que vem, terei um grande presente. O problema é que para ser bom menino é preciso estudar, experimentar, vivenciar, planejar e executar…

Que venha 2010. Um grande ano a todos os amigos que me acompanham e que possamos, no próximo ano, debater ainda mais neste espaço.

Para interagir com o autor: fantato@universidadedofutebol.com.br

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Overbola

Desde 6 de dezembro que a bola, no Brasil, parou de rolar. Ou melhor. Pelo menos na teoria, o futebol brasileiro deveria se movimentar apenas nos bastidores nessas últimas semanas do ano. Mas, o que mais tem se visto país adentro nos dias que restam de dezembro é uma infinidade de “peladas” de final de ano.

Amigos do Cafu contra Amigos do Zezinho; Amigos do Zico contra Time das Galáxias; Amigos do Bairro contra Amigos da Rua e por aí vai.

Sim, é legal haver tanta festa assim na época do final do ano no Brasil. É algo que já começa a fazer parte do calendário até do investimento das empresas, interessadas em dar um retorno maior para clientes, amigos, funcionários. Eu patrocino o jogo que terá o Zico e faço uma ação de marketing envolvendo o Galinho. Ou, ainda, levo Ronaldinho Gaúcho para a cidade onde minha empresa tem atuação.

Até aí, nada de mal. Pelo contrário. Uma grande sacada e um novo mercado que se abre para o marketing no futebol. Mas o problema é quando começamos a ver quase todas essas “peladas oficiais” sendo transmitida na televisão. Aí é que a coisa começa a ficar um pouco fora do propósito.

Um dos maiores problemas para o desenvolvimento do esporte no Brasil é a preferência descarada da mídia em falar de futebol, subjugando as demais modalidades e colocando-as num estado de completo abandono.

Quando o privilégio ao futebol é justificado pela qualidade do produto e a relevância dos torneios em disputa, tudo bem. Mas como defender que os principais canais de esporte do país abram espaço em sua grade de programação para exibir partidas com ex-atletas de 40, 50 e até 60 anos de idade?

Sim, tudo bem, é muito legal poder rever Zico, Andrade e Adílio em ação. Além de Júnior, Edu Coimbra e mais um monte de craques por aí.

Mas a overbola começa a ser um problema para o próprio futebol. A overdose na transmissão de bola na telinha no Brasil pode começar a fazer mal para o fortalecimento dos clubes e dos campeonatos pelo país.

Qual a expectativa que se pode criar em torno dos campeonatos estaduais, por exemplo, se só deixaremos de ver futebol na televisão por nem ao menos uma semana (a Copa São Paulo de Juniores já começa logo após a chegada de 2010)?

As maiores audiências da televisão estão no futebol. Isso é inegável. Mas até mesmo o mais fanático consumidor de futebol na telinha precisa de pelo menos umas semanas de férias. É natural. Até para descansar um pouco os ouvidos dos mesmos narradores e comentaristas de sempre.

Mais uma vez a mídia, em busca da audiência, acaba prejudicando o esporte. Que neste 2010 que se aproxima possamos viver uma nova era para a transmissão do futebol na TV. O conteúdo, mais do que nunca, tem de ser valorizado. Pode ter certeza que ele se encarrega de elevar o índice de audiência.

Para interagir com o autor: erich@universidadedofutebol.com.br

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Estudiantes de la Plata vs FC Barcelona: como a equipe argentina “amarrou” a equipe espanhola e, por causa disso, perdeu o jogo

O FC Barcelona parecia preso pelo Estudiantes. Enquanto a equipe espanhola mostrava dificuldades ofensivas estruturais, o que é incomum, a equipe argentina apresentava jogo zonal com estruturas móveis muito bem organizadas. No final, somente no final, o Barcelona conseguiu fazer o que devia…

Muitas matérias, colunas, relatos e análises foram feitas a respeito da partida final do Mundial de Clubes da Fifa 2009.

Li artigos ingleses, espanhóis, portugueses, argentinos, paraguaios, uruguaios, brasileiros, enfim de diversas origens, e com diferentes tipos de abordagem e enfoque.

Muitas coisas boas e interessantes, coisas que não precisam ser ditas novamente, porque já foram muito bem colocadas.

Como também vi o jogo, e inevitavelmente, tive minha atenção captada por algumas questões que envolveram as dinâmicas das equipes, quero apresentar e acrescentar novos ingredientes a todas as discussões já feitas até então.

Vou então, explorar alguns detalhes do jogo que dizem respeito a organização das equipes, sob a perspectiva funcional e estrutural de suas dinâmicas, especialmente sobre o primeiro tempo da partida. Quero chamar a atenção e fazer apontamentos para as dificuldades da equipe do FC Barcelona que pareceu ter seu jogo “amarrado” pelo Estudiantes, o que de certa forma surpreendeu alguns torcedores desavisados, que esperavam um “atropelo” por parte da equipe espanhola.

O FC Barcelona tem um Modelo de Jogo bem definido, credenciado faz anos e posto à prova inúmeras vezes. Manutenção da posse da bola, ataques apoiados, transições defensivas rápidas e agressivas, tentativas constantes de recuperação da posse da bola. Esquema tático base (matriz), o 1-4-3-3. Não foi diferente no jogo (pelo menos em grande parte dele).

O Estudiantes de la Plata, com ações bem definidas e estruturadas, optou por um jogo de progressão rápida ao ataque, com intensas transições ofensivas. Defensivamente, realizou pressões setorizadas tentando recuperar a posse da bola, predominando porém, as ações organizadas para impedir a progressão do Barcelona ao campo de ataque (ações de ocupação racional do espaço, e não de ataque a bola). Sem a bola, estruturou um 1-4-4-2 (com meio campo em losango), que por vezes se pareceu com um 1-4-3-1-2 (mas não era), com excelentes estruturas móveis. Com a bola, construiu em campo um 1-3-4-1-2, que foi mais transitório do que realmente concreto.

Pois bem, com as equipes com propostas de jogo bem definidas, boa parte dos “especialistas” acreditavam que o FC Barcelona ia impor sua maneira de jogar, e que restava ao Estudiantes esperar o apito final do árbitro para formalizar a derrota.

Pois é, mas o que se viu foi um Barcelona, com posse de bola sim, mas com muita dificuldade para fazer evoluir seu jogo ao campo de ataque. A equipe espanhola teve tantos problemas que nem sequer seu jogo zonal de ocupação dos espaços conseguiu predominar.

O primeiro grande obstáculo para o FC Barcelona foi a forma com que o Estudiantes de la Plata estruturou seu posicionamento base (matriz) para a ocupação dos espaços. O encaixe entre os esquemas táticos das equipes, especialmente pela geometria apresentada pelo Estudiantes quando estava sem bola, fez com que a equipe espanhola tivesse quase que a todo tempo desvantagem numérica de jogadores nas regiões do campo onde estava a bola (principalmente a partir da linha do meio-campo, aumentando consideravelmente conforme o Barcelona tentava progredir).

A equipe argentina, apresentou um jogo zonal bastante interessante. Com estruturas móveis bem definidas, alguns jogadores, especialmente no setor de meio campo e na direita da linha de defesa, puderam trocar constantemente de posição nas recomposições após perda da posse da bola. Essas estruturas facilitaram a manutenção do esquema tático proposto por seu treinador, principalmente sem a posse da bola.

Como o jogo definido pelo Estudiantes preconizava, como uma das referências defensivas mestras, a vantagem numérica na região da bola (impedindo progressão, direcionando e depois atacando-a), com certa frequência precisou ter um número grande de jogadores recompondo atrás de sua linha (a linha da bola); o que foi uma vantagem defensiva, mas ofensivamente trouxe dificuldades.

Isso principalmente porque apostou em um jogo de progressão rápida ao campo de ataque – o que demonstrou problemas já que ao recuperar a posse da bola, normalmente tinha poucos jogadores já posicionados a frente dela, em condições de recebê-la e mantê-la no campo de ataque.

O FC Barcelona, com as dificuldades iniciais, desmanchou diversas vezes o seu sempre bem definido desenho tático. Não obteve êxito. Até mesmo o jogador Ibrahimovic, normalmente um dos principais responsáveis por aumentar o espaço efetivo de jogo em profundidade quando o Barcelona está com a posse da bola, passou a buscá-la entrando na linha do meio campo (tentando compensar a desvantagem numérica de sua equipe nesse setor).

O que aparentemente poderia ser parte da solução, na verdade aumentou os problemas da equipe espanhola, já que acabou por diminuir seu espaço efetivo de jogo, e eliminou diversas vezes a possibilidade dos passes em profundidade alongados (o Estudiantes marcava zonalmente, portanto a movimentação de Ibrahimovic não desencadeava desequilíbrios na linha de defesa argentina).

A força defensiva do Estudiantes de la Plata foi aumentada pelas típicas características da equipe espanhola, que nas transições ofensivas, primeiro buscava tirar a bola da zona de pressão para depois progredir; e que nas progressões sempre preferiu o jogo apoiado.

A inteligência do Estudiantes de la Plata, foi fazer com que o jogo preferido do FC Barcelona se tornasse de certo modo confortável a ele (Estudiantes); não tentou mudá-lo. Seus grandes pecados, foram, não estar totalmente pronto para a possibilidade (ainda que pequena) de uma mudança de comportamento típico da equipe espanhola (o que aconteceu no final do segundo tempo), e de ter perdido força ofensiva para cumprir suas referências defensivas.

O resto da história, todo mundo já sabe…

Para interagir com o autor: rodrigo@149.28.100.147

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Estudiantes de la Plata vs FC Barcelona: como a equipe argentina "amarrou" a equipe espanhola e, por causa disso, perdeu o jogo

O FC Barcelona parecia preso pelo Estudiantes. Enquanto a equipe espanhola mostrava dificuldades ofensivas estruturais, o que é incomum, a equipe argentina apresentava jogo zonal com estruturas móveis muito bem organizadas. No final, somente no final, o Barcelona conseguiu fazer o que devia…

Muitas matérias, colunas, relatos e análises foram feitas a respeito da partida final do Mundial de Clubes da Fifa 2009.

Li artigos ingleses, espanhóis, portugueses, argentinos, paraguaios, uruguaios, brasileiros, enfim de diversas origens, e com diferentes tipos de abordagem e enfoque.

Muitas coisas boas e interessantes, coisas que não precisam ser ditas novamente, porque já foram muito bem colocadas.

Como também vi o jogo, e inevitavelmente, tive minha atenção captada por algumas questões que envolveram as dinâmicas das equipes, quero apresentar e acrescentar novos ingredientes a todas as discussões já feitas até então.

Vou então, explorar alguns detalhes do jogo que dizem respeito a organização das equipes, sob a perspectiva funcional e estrutural de suas dinâmicas, especialmente sobre o primeiro tempo da partida. Quero chamar a atenção e fazer apontamentos para as dificuldades da equipe do FC Barcelona que pareceu ter seu jogo “amarrado” pelo Estudiantes, o que de certa forma surpreendeu alguns torcedores desavisados, que esperavam um “atropelo” por parte da equipe espanhola.

O FC Barcelona tem um Modelo de Jogo bem definido, credenciado faz anos e posto à prova inúmeras vezes. Manutenção da posse da bola, ataques apoiados, transições defensivas rápidas e agressivas, tentativas constantes de recuperação da posse da bola. Esquema tático base (matriz), o 1-4-3-3. Não foi diferente no jogo (pelo menos em grande parte dele).

O Estudiantes de la Plata, com ações bem definidas e estruturadas, optou por um jogo de progressão rápida ao ataque, com intensas transições ofensivas. Defensivamente, realizou pressões setorizadas tentando recuperar a posse da bola, predominando porém, as ações organizadas para impedir a progressão do Barcelona ao campo de ataque (ações de ocupação racional do espaço, e não de ataque a bola). Sem a bola, estruturou um 1-4-4-2 (com meio campo em losango), que por vezes se pareceu com um 1-4-3-1-2 (mas não era), com excelentes estruturas móveis. Com a bola, construiu em campo um 1-3-4-1-2, que foi mais transitório do que realmente concreto.

Pois bem, com as equipes com propostas de jogo bem definidas, boa parte dos “especialistas” acreditavam que o FC Barcelona ia impor sua maneira de jogar, e que restava ao Estudiantes esperar o apito final do árbitro para formalizar a derrota.

Pois é, mas o que se viu foi um Barcelona, com posse de bola sim, mas com muita dificuldade para fazer evoluir seu jogo ao campo de ataque. A equipe espanhola teve tantos problemas que nem sequer seu jogo zonal de ocupação dos espaços conseguiu predominar.

O primeiro grande obstáculo para o FC Barcelona foi a forma com que o Estudiantes de la Plata estruturou seu posicionamento base (matriz) para a ocupação dos espaços. O encaixe entre os esquemas táticos das equipes, especialmente pela geometria apresentada pelo Estudiantes quando estava sem bola, fez com que a equipe espanhola tivesse quase que a todo tempo desvantagem numérica de jogadores nas regiões do campo onde estava a bola (principalmente a partir da linha do meio-campo, aumentando consideravelmente conforme o Barcelona tentava progredir).

A equipe argentina, apresentou um jogo zonal bastante interessante. Com estruturas móveis bem definidas, alguns jogadores, especialmente no setor de meio campo e na direita da linha de defesa, puderam trocar constantemente de posição nas recomposições após perda da posse da bola. Essas estruturas facilitaram a manutenção do esquema tático proposto por seu treinador, principalmente sem a posse da bola.

Como o jogo definido pelo Estudiantes preconizava, como uma das referências defensivas mestras, a vantagem numérica na região da bola (impedindo progressão, direcionando e depois atacando-a), com certa frequência precisou ter um número grande de jogadores recompondo atrás de sua linha (a linha da bola); o que foi uma vantagem defensiva, mas ofensivamente trouxe dificuldades.

Isso principalmente porque apostou em um jogo de progressão rápida ao campo de ataque – o que demonstrou problemas já que ao recuperar a posse da bola, normalmente tinha poucos jogadores já posicionados a frente dela, em condições de recebê-la e mantê-la no campo de ataque.

O FC Barcelona, com as dificuldades iniciais, desmanchou diversas vezes o seu sempre bem definido desenho tático. Não obteve êxito. Até mesmo o jogador Ibrahimovic, normalmente um dos principais responsáveis por aumentar o espaço efetivo de jogo em profundidade quando o Barcelona está com a posse da bola, passou a buscá-la entrando na linha do meio campo (tentando compensar a desvantagem numérica de sua equipe nesse setor).

O que aparentemente poderia ser parte da solução, na verdade aumentou os problemas da equipe espanhola, já que acabou por diminuir seu espaço efetivo de jogo, e eliminou diversas vezes a possibilidade dos passes em profundidade alongados (o Estudiantes marcava zonalmente, portanto a movimentação de Ibrahimovic não desencadeava desequilíbrios na linha de defesa argentina).

A força defensiva do Estudiantes de la Plata foi aumentada pelas típicas características da equipe espanhola, que nas transições ofensivas, primeiro buscava tirar a bola da zona de pressão para depois progredir; e que nas progressões sempre preferiu o jogo apoiado.

A inteligência do Estudiantes de la Plata, foi fazer com que o jogo preferido do FC Barcelona se tornasse de certo modo confortável a ele (Estudiantes); não tentou mudá-lo. Seus grandes pecados, foram, não estar totalmente pronto para a possibilidade (ainda que pequena) de uma mudança de comportamento típico da equipe espanhola (o que aconteceu no final do segundo tempo), e de ter perdido força ofensiva para cumprir suas referências defensivas.

O resto da história, todo mundo já sabe…

Para interagir com o autor: rodrigo@universidadedofutebol.com.br

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Avatar

Pela primeira vez, assisti a um filme em 3D.

Não, nada a ver com a tentativa da revista Super Interessante, no início da década de 1990, de demonstrar como funcionava a tecnologia, com os óculos de lentes azul e vermelha e algumas fotos, naquela edição, supostamente apropriados para seduzir e impressionar.

Falo da fantástica experiência proporcionada pelo filme Avatar, em uma tela gigante, de 300m2, e sistema de som mais do que perfeito.

Não só a tecnologia, como a história do filme, nesse caso, nos põe completamente dentro do filme. E ele foi feito para isso mesmo. Levou mais de 10 anos para que James Cameron se sentisse amparado pelos recursos do 3D, além de outros 4 anos produzindo o filme.

Avatar vem do sânscrito, descida, e designa a chegada de uma divindade à Terra e seu aparecimento como um ser mortal. Não é bem a encarnação da teologia cristã, segundo a qual, em Jesus, Deus se fez carne; é mais uma manifestação, uma representação, do deus Vishnu.

Avatar também nomeia desenhos animados da Nickelodeon, é o personagem central da série de games Ultima, fez sucesso mundial com o jogo Second Life, é nome de álbum da banda portuguesa Blasted Mechanism e é, no mais conhecido termo, qualquer representação gráfica de quem está jogando um game.

O avanço da tecnologia favorecerá os filmes, nos quais, o que importa são muito mais efeitos especiais e experiências sensoriais do que artistas desempenhando um papel. Filme e videogame têm em comum o fato de que, através do roteiro e dos controles, transformamos uma figura imaginária numa projeção de nós mesmos – num avatar.

No caso da tradição hindu, o avatar tem poderes especiais, e é isso que certamente nos atrai nesse gênero de diversão. Na ficção habitual, a identificação era feita através da imaginação. Líamos um livro e nos colocávamos no lugar do personagem. Agora a técnica nos faz ir mais adiante, e a identificação adquire uma dimensão sensorial, mais intensa.

O envolvimento das pessoas com o futebol e tudo aquilo que lhe rodeia é, no mais das vezes, desejado que aconteça com a licença poética e ficcional de entrar na pele de outra pessoa, ou de se imaginar ocupando tais funções. Todos nós avocamos o direito de ser jogador, dirigente, narrador, comentarista, jornalista, treinador, torcedor. Ainda que uma vez na vida.

Todos queremos ter nossos avatares no futebol. O problema é que, normalmente, nosso avatar não terá identidade com aquilo que somos realmente. Será o que gostaríamos de ser.

Em breve, com essa tecnologia, é bem provável que tal experiência seja amplificada a níveis inimagináveis de realismo e imersão. Aquilo que desejamos pode se tornar realidade. E o ditado alerta que devemos tomar cuidado com o que desejamos, pois isso pode se tornar realidade mesmo.

O desafio será procurar em nós mesmos a figura que realmente somos e com a qual deveríamos nos identificar, de modo a assumirmos plenamente a nossa personalidade e a responsabilidade sobre atos e omissões.

Essa é a dúvida que surge diante desse admirável mundo novo.

Caberá encontrar o avatar que vai respondê-la, quando estivermos na pele do jogador, dirigente, narrador, comentarista, jornalista, treinador, torcedor.

Ainda que uma vez na vida.

Para interagir com o autor: barp@universidadedofutebol.com.br

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Destino inócuo

Certa vez, alguém disse que futebol não é importante. Mas, que das coisas menos importantes, futebol certamente era a mais importante.

Isso deveria ser um lema.
Um mantra a ser entoado por qualquer pessoa que passa de certo limiar entre o mundo real e o “avataresco” mundo futebolístico.

Afinal, futebol não é mesmo importante.
Mas tem lá a sua importância.

Muito mais importante do que discutir o futuro do futebol, por exemplo, é discutir o futuro da humanidade.
E foi isso que os líderes mundiais resolveram fazer em Copenhagen, noutro dia.
Discutir o futuro do mundo.
Que, de acordo com eles e com um monte de outras pessoas, está a perigo por conta das alterações climáticas derivadas da poluição gerada pela humanidade.
Tem um número considerável de gente que diz que tudo isso é balela.
Que alteração climática é normal e que as conclusões são baseadas em dados limitados e direcionados.
Num dos pontos turísticos de Londres, tem um negócio no chão que conta a história da cidade, acho. E lá diz que, logo depois que a cidade foi criada, o rio Tamisa congelou. E, depois, isso nunca mais aconteceu. Depois que eu li isso, fiquei mais reticente sobre qualquer previsão futura. Basta lembrar que, cerca trinta anos atrás, nevou em Curitiba. Tivesse acontecido isso esse ano, seria um pandemônio.

Mas fiquemos com o “castatrofismo”, que é sempre muito mais engraçado.
O mundo vai acabar se a humanidade não der um jeito de diminuir a emissão de gases poluentes.
E o único jeito de fazer isso é os governos do mundo inteiro convencerem suas respectivas populações a poluírem menos.
E sabe quando isso vai acontecer?
Nunca.
O motivo é simples: do jeito que as coisas são, poluir menos implica em produzir menos. Se você mandar uma empresa parar de poluir, ela vai mudar de país que, por sua vez, vai produzir mais e gerar mais riquezas, o que implica em poder e tudo o que vem junto. E isso nunca irá acontecer.
Ou seja, o único jeito de uma mudança significativa acontecer é se todo mundo concordar em poluir menos ao mesmo tempo. E isso também não vai acontecer.
Porque os países pobres, como o Brasil, querem aproveitar a oportunidade para diminuir o gap existente entre eles e os países mais desenvolvidos. Para isso, ele argumenta que é injusto punir os países que poluem menos por causa de um problema criado pelos países que poluem mais. E os países mais desenvolvidos, que não são bestas, sabem que para manter a vantagem econômica mundial é imprescindível que a diminuição de produção seja igual para todo mundo.

E aí se cria o dilema. E aí nada é resolvido.

E essa é a coisa importante.
Que tem reflexos na coisa que não é importante, mas é importante.
A discussão inócua da redução da emissão de gases poluentes funciona exatamente no mesmo sistema em que funciona a discussão inócua sobre teto salarial, ou outras soluções financeiras, para clubes de futebol.

Igualzinho.

Os dois problemas abrangem a sustentabilidade de um sistema desigual. E, para que o sistema desigual possa sobreviver, é preciso que ele fique mais igual. Mas quem tem mais não quer ter menos. E quem tem menos quer ter muito mais.

É uma equação de interesses insolúvel, que só o tempo vai poder tornar mais contornável.

O mundo não chegará a um consenso sobre o clima. Assim como o futebol não chegará a um consenso sobre seus problemas financeiros.

O problema irá se arrastar.
Mas o mundo não irá acabar.

A não ser que o futebol um dia acabe.

Para interagir com o autor: oliver@universidadedofutebol.com.br