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O espetáculo será cobrado

Como acontece semanalmente, mais um treinador do futebol brasileiro foi demitido. Celso Roth, com 62% de aproveitamento em 2011, “caiu” dias após a derrota por 1 a 0 para o Jaguares, válida pela 5ª rodada da fase de grupos da Copa Libertadores.

O substituto: Paulo Roberto Falcão, ídolo da torcida colorada na década de 70 e um dos grandes nomes do futebol mundial com passagem marcante pelo Roma-ITA, recebeu o convite dos dirigentes do Inter-RS para reingressar à profissão de treinador mais de 15 anos após breves experiências no comando da equipe gaúcha, da seleção brasileira e do América-MEX.

A missão: levar o Internacional à conquista do torneio continental e, consequentemente, à disputa do título mundial após fracasso em 2010 diante do Mazembe-CON.

A declaração: na coletiva de imprensa, com dirigentes, repórteres, jornalistas e alguns jogadores, Falcão afirmou que irá para o banco com a certeza de que verá um espetáculo!

Todo treinador (e sua comissão) deve ter uma ideia de jogo na cabeça. A sua ideia de jogo nada mais é do
que o comportamento esperado por ele (e por sua comissão), de cada jogador, em qualquer ação (ofensiva, defensiva ou de transições), perante cada circunstância (vitória, empate, derrota, tempo de jogo, situação na competição), ao longo de 90 minutos.

Falcão, ex-comentarista, provavelmente deve ter a sua. Para construí-la na prática (afinal, a permanência dela como ideia não se traduz em vitórias) será necessária uma gama de competências profissionais oriundas do conhecimento acadêmico, das ciências humanas, biológicas, da experiência prática e, por que não, do conhecimento empírico.

Não é objetivo desta coluna discorrer detalhadamente sobre as competências do profissional de futebol (principalmente do treinador), porém, é pertinente lembrá-las para reiterar a reflexão final que este texto proporá.

O conhecimento acadêmico específico acerca do futebol cada vez mais se estabelece como um saber significativo para os profissionais da área. Dominar os conteúdos táticos, técnicos, físicos, estratégicos, análises quantitativas e qualitativas de jogos têm sido objetos de estudo. Há ainda, o estudo da ecologia, que entende o futebol a partir de uma perspectiva sistêmica, o domínio da gestão de conflitos, da gestão de pessoas, compreensão do macro-ambiente, liderança, motivação, inspiração, inovação, auto-conhecimento, comunicação, psicologia, filosofia, planejamento estratégico, comportamento humano, coaching, fisiologia, nutrição, bioquímica, enfim, muitas (e complexas) são as competências que devem ser desenvolvidas por um bom treinador.

É certo, porém, que parte importante das demais “competências” compreende tempo de prática, visibilidade atingida como atleta profissional, bom relacionamento com dirigentes e empresários, além de vínculos afetivos construídos com torcedores e agremiações.

Diante disto, permite-se a seguinte pergunta para os dirigentes do Internacional (que recentemente remanejaram Clemer de preparador de goleiros do profissional para técnico do sub-17): quais competências profissionais foram consideradas na contratação de Falcão?

Quase 20 anos como atleta profissional; mais da metade deles na equipe colorada; prestígio mundial que lhe conferiu o título de “Rei de Roma” e inteligência de jogo indiscutível. Com estes fatos a resposta parece fácil!

E, também diante disso, permite-se outra pergunta, agora para os leitores: um indivíduo com domínio exclusivo do conhecimento acadêmico acerca do futebol estaria preparado para assumir a função de técnico do Internacional?

O ambiente atual (torcedores, mídia, diretoria) pede um Inter mais ofensivo; uma derrota no próximo jogo da Libertadores pode custar a classificação para a próxima fase; alguns jogadores estão aquém do desempenho uma vez apresentado; o tempo de treinamento até o jogo de estreia é de somente quatro dias e o resultado precisa ser imediato. A resposta, nesta situação, também parece fácil!

No futebol profissional atual, o predomínio do comando pertence aos ex-jogadores. Nas categorias de base, além de ex-jogadores, profissionais com formação acadêmica conquistam espaço gradativamente. De quem o futebol precisa? De todos os que estiverem dispostos à capacitação. Pois, se de um lado ex-jogadores estão desatualizados ao reproduzirem treinos que fizeram enquanto atletas, por outro, treinadores e demais membros de comissões técnicas devidamente graduados insistem em aplicar sessões de treino com exercícios distantes da realidade do jogo.

E o Falcão? Quais (e em que nível se encontram) as competências do novo treinador de um dos maiores clubes do futebol brasileiro?

A resposta poderá ser observada nos jogos da equipe colorada ao longo do ano. A função de Falcão será, partindo da análise do desempenho atual da equipe ao desempenho que é almejado (sua ideia de jogo), construir no processo de treinamento o declarado “espetáculo”.

Espetáculo, que traduzido do dicionário da língua portuguesa, refere-se a tudo aquilo que atrai o olhar e que pode ser contemplado.

Espetáculo, que demanda tempo em ser criado. Tempo que inexiste para os dirigentes brasileiros.

Espetáculo que, a cada apresentação (jogo) de seus artistas (atletas), evidenciará as competências que o diretor (treinador) possui e que foram aplicadas nos ensaios (treinos).

E, para concluir, espetáculo que, com merecimento e reconhecimento da plateia, poderá atrair olhares, receber aplausos em pé e, principalmente, ter o agradecimento do futebol brasileiro!

Você, leitor, pensa que veremos o espetáculo?

Para interagir com o autor: eduardo@universidadedofutebol.com.br