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Os conceitos do jogo – parte III

Para encerrar o tema conceitos de jogo e sua relevância em debatê-los nos ambientes em que se discute futebol, será apresentado um pequeno vídeo com exemplos de transições ofensivas sendo realizadas por algumas equipes do futebol mundial.

Se você não acompanhou as duas publicações anteriores (parte I e parte II), sugiro que retome as leituras para que o vídeo e esta última discussão tenham, de fato, significado.

Aproveito para agradecer a participação dos profissionais Douglas Tales Jr., Marcelo Salazar, Marcelo Padilha e Lucas Almeida com comentários e opiniões que enriqueceram a argumentação.

Antes do vídeo, no entanto, serão deixadas mais algumas reflexões que visam contribuir com a temática proposta.

A primeira, feita por Paulo Jorge Ventura de Sousa em sua dissertação de mestrado, intitulada Organização do Jogo de Futebol (2005), em que cita José Guilherme e escreve:

“O momento de transição defesa/ataque é caracterizado pelos comportamentos que se devem ter durante os segundos imediatos ao ganhar-se a posse da bola. Estes segundos são importantes porque, tal como na transição ataque/defesa, as equipas encontram-se desorganizadas para as novas funções e o objectivo é aproveitar as desorganizações adversárias para proveito próprio.”

A segunda, publicada pelo treinador Carlos Carvalhal em 2011:

“Hoje em dia é recorrente falar-se em transição ofensiva, mas tenho a convicção que este termo é, na esmagadora maioria das vezes, usado de uma forma inadequada. É comum as pessoas associarem este momento a saídas em ataque rápido ou contra-ataque. (…) A Transição ofensiva pode ser caracterizada pelo preciso instante em que se recupera a bola! O que fazer a partir deste instante? Sim, instante!”

Assista, na sequencia, ao pequeno vídeo com alguns exemplos de transição ofensiva:

https://vimeo.com/130678985

A transição ofensiva, para muitos, é vista como a saída do campo de defesa para o campo de ataque. Sob este viés, a transição seria de terreno e não podemos nos esquecer que tratamos de uma transição de momento, neste caso, do defensivo para o ofensivo.

Outra confusão na interpretação conceitual do jogo que influencia o entendimento sobre as transições, é assumir que a equipe está em Organização Ofensiva somente quando, sob os olhos do treinador/observador, está organizada. Esta interpretação fere o caráter de oposição que o Jogo de Futebol possui e a própria semântica da palavra organização. Pois, primeiramente, o jogo e o nível das equipes permite que simultaneamente uma delas esteja organizada sem que a outra também esteja. E o fato de uma equipe não estar organizada, não significa que ela está em transição. Pois, organização não significa estar organizado e sim ato ou efeito de organizar-se. Ação permanente durante o jogo de futebol.

Para concluir, vale lembrar que sob a perspectiva sistêmica, o jogo é, por característica, indivisível. Não devemos separá-los em ataque, defesa, transições, posições, ou qualquer outra divisão/fragmentação que pretendamos. No entanto, para atingirmos objetivos globais com as equipes que construímos, treinos fractais (de partes do todo) devem ser realizados. Senão, bastaríamos fazer os populares treinos coletivos.

Bom trabalho e até a próxima. 

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Cruzeiro é multado pela Conmebol

O Cruzeiro foi eliminado da Copa Libertadores pelo River, mas, fora de campo, seu departamento jurídico continua trabalhando. Isso porque o Clube foi denunciado em razão do laser lançado no rosto do Rogério Ceni pelos torcedores e pela utilização de fogos de artifício e fumaça colorida na partida contra o São Paulo, válida pelas oitavas de final da competição.

Naquela oportunidade, o clube mineiro promoveu festival pirotécnico no início da partida o que, segundo a Conmebol teria infringido o artigo 11, 2, “b”, do regulamento disciplinar da competição, que pune a equipe por comportamento de seus torcedores que prejudiquem o andamento da partida ou ascendam fogos artificiais ou outros objetos pirotécnicos.

A infração pode ser punida com perda de mando de campo, multa, advertência ou até mesmo eliminação.

Em defesa, o Cruzeiro argumentou que o espírito do regulamento disciplinar é impedir que torcedores, incapacitados para a utilização de artigos de pirotecnia, possam causar violência ou expor os presentes no estádio a situações de risco e que, no caso em questão, o “show” de fogos de artifício foi realizado por empresa especializada e contratada para este fim. Além disso, o regulamento proíbe o torcedor e não as equipes participantes.

Ora, o regulamento, de fato, prevê a responsabilidade dos clubes pelos atos de seus torcedores, mas não faz qualquer menção à proibição das equipes utilizarem fogos de artifício, fumaça colorida e outros artigos, até mesmo porque, neste caso, existe todo um aparato técnico e de segurança.

Diante disso, o Tribunal Disciplinar da Conmebol acatou parcialmente a defesa da equipe celeste e aplicou a pena de multa de aproximadamente cinco mil dólares, de certo, apenas em razão do laser lançado, eis que a íntegra da decisão ainda não foi divulgada pela entidade.

Insta destacar que, além de não proibir a orquestração de pirotecnias e outros efeitos nas partidas, a Conmebol deve incentivá-la, já que tais medidas, quando realizadas de forma organizada e dentro das melhores técnicas de segurança só tem a engrandecer o espetáculo.

A Copa Libertadores da América deve se mirar no exemplo dado pela Uefa Champions League que oferece ao torcedor um verdadeiro espetáculo a cada partida. 

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Liga?

A criação de uma liga de clubes para a gestão das competições do futebol brasileiro se tornou o tema do momento após a deflagração dos escândalos de corrupção na Fifa e que se lastrearam para as principais entidades do futebol das Américas, incluindo a CBF. Mas o que é uma Liga de Clubes? Para que serve? É a solução para todos os problemas no âmbito do futebol? Será que todos os que defendem uma liga sabem responder a essas perguntas…

Novamente e, infelizmente, o debate sobre este tema importantíssimo para o futuro do futebol brasileiro está pautado por um ambiente estritamente político, emotivo e com baixíssimo amparo técnico. A Liga por si não fará o milagre da transformação! Mas, se bem estruturada e pensada, poderá sim ser um marco para a consolidação do nosso futebol em um produto de referência em termos globais.

As colocações aqui posicionadas parecem óbvias: ambiente político x argumentos técnicos e estruturados. O grande problema é que, há pelo menos duas décadas, insistimos no viés político, o que gera baixíssima taxa de mudança por razões óbvias, que é a da proteção ao ambiente interno. Como querer que os clubes liderem a mudança se o sistema político destes é idêntico ao de federações e da confederação, mudando apenas o “colégio eleitoral”?

Se não pensarmos em um projeto que olhe para a questão com múltiplas visões, incluindo o respeito às instituições e seu sistema político e, ao mesmo tempo, busque alternativas exequíveis no tempo com uma percepção sobre o mercado, continuaremos a conviver com debates sem qualquer efetividade. A temperatura do tema uma hora vai cair – logo logo o assunto do momento será outro! Se não se elevar o nível do debate para o campo prático e estrutural, não será possível conseguir nada.

Trocar o poder de mãos para uma nova gestão que contém uma mesma linha de raciocínio tende a não fazer muita diferença – apenas alimentará o embate político citado acima. Também não vejo amadurecimento suficiente, ainda, dos clubes trabalhando como “sócios”, que é o que se preconiza de forma bem básica um ambiente de Liga.

Por isso e por muitas outras coisas, é preciso pensar em um formato inicial de Liga que seja híbrido e com transição gradual, por mais que isso não seja o ideal em termos de alavancagem e estruturação de negócios (já tivemos algo nesta linha com o finado “Clube dos 13” – e todos sabem também no que ele se transformou e como acabou). Não adianta querer forçar goela abaixo um modelo que não é nosso em estruturas viciadas de poder. Isso só será feito se um bom projeto for montado com base no mundo real e não no de fantasias que boa parte da opinião pública está tentando construir.

Mas como pensar em progressão e longo prazo no Brasil é tão utópico quanto sonhar com uma Liga totalmente profissional e independente como muitos desejam, muito provavelmente continuaremos assistindo um “discurso para a torcida” em contraposição a ações voltadas para dentro com o intuito de proteger o ambiente político!

Reiterando: enquanto não se apresentar e se alinhar com TODOS os agentes envolvidos o seu papel dentro de uma possível Liga, mostrando quanto que cada um ganha e qual a respectiva função de todas as partes, não teremos efetividade alguma. É preciso aumentar a régua do debate para que tenhamos algo verdadeiramente transformador! 

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Coisas que não se misturam

Neymar é um verdadeiro fenômeno. Seguramente, a despeito de ainda ter apenas 23 anos (23!), o camisa 11 do Barcelona é um dos maiores talentos que o futebol brasileiro produziu nas últimas décadas. Todo esse potencial ficou claro (mais uma vez) no último sábado (06), no triunfo da equipe catalã por 3 a 1 sobre a Juventus, na decisão da edição 2014/2015 da Liga dos Campeões da Uefa. O brasileiro participou do lance do primeiro gol, anotou o terceiro e se colocou entre os artilheiros do principal torneio de clubes do planeta. Dois dias depois, porém, nada disso repercute mais do que uma faixa usada pelo atacante durante a comemoração.

Ainda no campo do estádio olímpico de Berlim, Neymar amarrou na testa uma faixa com a inscrição “100% Jesus”. O adereço religioso faz parte da trajetória do atacante – ele já havia usado em outras conquistas e até em jogos quando estava nas categorias de base. No entanto, o uso suscita uma importante discussão sobre limites e imagem do ídolo.

Antes, porém, cabem aqui alguns preâmbulos. O primeiro e mais premente: qualquer um jogador ou não, deve ser livre para ter a fé que quiser e manifestá-la como julgar mais pertinente. Não tenho qualquer pretensão de discutir o que é certo ou errado sob esse ponto de vista.

Outro aspecto é a legitimidade. Neymar repercute e forma tendência, e um dos grandes motivos para isso é que ele consegue vender naturalidade. Ele é um moleque que se comporta como moleque, que toma decisões (em campo e fora) com as quais o público consegue se identificar. O uso da faixa seria desastroso se o atacante tivesse usado um momento de glória para fazer publicidade ou vender qualquer produto, mas soa natural quando ele aproveita para reconhecer a relevância de algo como a fé no cotidiano. Neymar não vive disso e não se comporta de maneira oportunista quando o assunto é religião.

Fé é um assunto extremamente pessoal, mas tem repercussões que vão muito além disso. Não são poucas as guerras e as mortes causadas por disputas religiosas, e qualquer coisa que flerte com esse assunto costuma ser extremamente delicada. No domingo (07), a transexual Viviany Beleboni, 26, chocou ao fazer manifestação contra a homofobia na Parada do Orgulho LGBT, em São Paulo – ela vestiu roupas que remetiam a Jesus Cristo, pintou o corpo com tinta que emulava sangue e se amarrou a uma cruz de madeira.

Fotos de Beleboni circularam em redes sociais, e a transexual foi muito criticada por algo que algumas pessoas identificaram como “desrespeito religioso”. A atriz chegou a ser ameaçada. “Nunca tive intenção de atacar a Igreja”, disse ela ao site “G1”.

Neymar não ofendeu ninguém ao usar a faixa com a estampa “100% Jesus”. Contudo, é fundamental considerar que a decisão da Liga dos Campeões da Uefa foi exibida em 200 países, com mais de 180 mil espectadores em todo o mundo. O adereço escolhido pelo brasileiro impõe limites ao personagem que ele representa.

Como atleta e figura de mídia, Neymar é um alguém seguido, avaliado e copiado em todo o planeta. O brasileiro não fala apenas com fãs de seu país ou de sua religião, e o uso da faixa para comemorar o título limita demais o público que se identifica com ele.

O colunista Marcelo Rubens Paiva, de “O Estado de S. Paulo”, lembrou bem: o mundo tem mais de 1 bilhão de hinduístas, e 32% dos chineses são agnósticos. A faixa distancia Neymar de todo esse público.

Neymar tinha direito de mostrar fé e de usar o que quisesse para comemorar um título, mas a atitude dele levou a público um aspecto que deve ser privado para um formador de opinião. A não ser que o interesse dele fosse justamente uma segmentação de alcance.

É por isso, por exemplo, que o inglês David Beckham decidiu, em dado momento da carreira, vetar associação de sua imagem a produtos como refrigerantes. Foi uma segmentação planejada – ele não queria falar com o público que consumia esse tipo de produto porque achava que a imagem de um atleta não devia estar vinculada a algo que não seja totalmente saudável.

Nenhum outro jogador do Barcelona fez algo parecido com a faixa escolhida por Neymar. Não houve demonstrações políticas ou religiosas no restante do elenco. Nem um “100% Jardim Irene”, estampa feita pelo lateral direito Cafu em sua camisa antes de erguer a taça da Copa do Mundo de 2002.

Numa seara bem menos polêmica, Cafu também limitou o alcance daquela mensagem. A decisão da Copa do Mundo foi vista por bilhões de pessoas, e o lateral demonstrou entendimento sobre isso – antes de levantar a taça, subiu em um pedestal e se colocou num patamar superior ao dos dirigentes que entregaram o troféu. Mas as pessoas que não conhecem os bairros de São Paulo não entenderam a referência que ele colocou no uniforme.

A mensagem de Neymar não foi cifrada – mesmo as pessoas que não acreditam em Jesus entendem a referência. Do ponto de vista de comunicação, a questão ali é outra: Neymar é um produto, e rótulos que pespegam em produtos limitam o alcance.

Note que isso é totalmente diferente de Neymar adotar posicionamentos claros – mesmo se forem sobre religião. As coisas em que ele acredita e os pontos que ele defende contribuem para o personagem Neymar, mas a questão é como isso é feito. Ele não precisa omitir a fé ou as questões religiosas, mas talvez limitar esse tipo de manifestação a alguns fóruns adequados.

A limitação de espectro também cria uma limitação de abrangência. Neymar passa a ser um personagem menos viável, por exemplo, para marcas que tiverem intenção de falar com um público menos religioso.

“Ah, mas ele nem pensou nisso no momento da conquista de um título”, vão dizer alguns. É, pode não ter pensado. Mas devia.

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Renúncia de Blatter: e agora?

Após as denúncias de corrupção, o mundo do futebol foi, novamente, sacudido. Desta vez, pela renúncia do presidente da Fifa, o suíço Joseph Blatter, que acabara de ser reeleito para permanecer no cargo até 2019.

Outrossim, sob o ponto de vista jurídico, Blatter ainda não renunciou, mas, apenas informou que o fará em Congresso Extraordinário da FIFA. Ou seja, o suíço ainda é presidente da entidade.

Caso a renúncia se confirme, os artigos 30 e 32, do Estatuto da Fifa, estabelecem que o vice-presidente de maior antiguidade (mais tempo de serviço) assuma até a eleição do novo mandatário.

Eventuais candidatos à Presidência da Fifa deverão encaminhar o pedido à Secretaria Geral da entidade juntamente com o apoio de, ao menos 5 Federações Nacionais, no prazo de 4 meses antes do Congresso, donde se conclui que a eleição não ocorrerá em data próxima.

Além do apoio de 5 Federações, o candidato deve comprovar o exercício de "papel ativo" no futebol por pelo menos 2 dentre os 5 anos anteriores à apresentação da candidatura e idoneidade moral.

Importante destacar que, conforme prevê o art. 22 do estatuto da Fifa, o Congresso Extraordinário poderá ser convocado a qualquer tempo pelo Comitê Executivo com antecedência mínima de 2 meses da data de sua realização.

Diante dos indícios de corrupção, do risco de debandada de patrocinadores e da ameaça de boicote da Uefa, Joseph Blatter tomou uma decisão corajosa e importante para o futebol, eis que a sua permanência traria um ambiente de desconforto de consequências inimagináveis.

Além disso, após 17 anos na presidência da Fifa, a entidade e o futebol precisavam se arejar e se modernizar e, para isso, a alternância no poder é essencial.

Ainda não se tem notícia dos candidatos, mas, alguns nomes já começaram a ser especulados, dentre eles Michel Platini, ex-jogador francês e atual Presidente da Uefa, Michel van Praag, dirigente holandês, Luis Figo, ex-jogador português, Ali Bin Al Hussein, príncipe jordaine, derrotado nas últimas eleições e, finalmente, o ex-jogador Zico.

Seria de extrema valia para o futebol que a Fifa fosse presidida por um ex-atleta de alto nível, com reputação irrefutável, bem como força e carisma para conduzir e administrar o futebol em um período tão conturbado.

De toda sorte, as últimas semanas trouxeram um enorme alento para os amantes do futebol que aguardam ansiosamente para um final feliz. 

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Ética no futebol?

Em meio a tantas situações de corrupção no mundo em geral, o futebol não passaria imune a este cenário. E assim, vimos as recentes situações envolvendo a Fifa e algumas confederações de futebol pelo mundo.

Se pensarmos que o ser humano é a mola propulsora de cada cidade, estado e país, que tudo que vivemos e materializamos é realizado pela vontade humana em promover o desenvolvimento da humanidade e do nosso planeta, fica bem fácil imaginarmos o quanto poder cada um de nós possui para materializar ideias maravilhosas em coisas de muito valor para cada um e para os demais. Como também podemos presenciar o poder temos, ser praticado de forma negligente, egoísta e destruidora.

No futebol, os casos recentes envolvendo a Fifa coloca em cheque a conduta de dirigentes das instituições ligadas ao futebol, pois estamos falando de um ambiente no qual os volumes monetários são de montantes muitas vezes pouco imaginados por muitos que militam nesse meio.

Aí entra uma questão humana muito importante: a Ética nas relações e no trabalho. O filósofo Mario Sergio Cortella define a ética como a concepção dos que escolhemos. Ele explora ainda mais essa questão, compartilhando que a ética também pode ser compreendida como o conjunto de princípios e valores de uma pessoa que serve para orientar as suas condutas. Sendo a moral a pratica de suas condutas éticas. Em sua visão mais prática a ética é o conjunto de valores e princípios que usamos para responder a três grandes questões da vida:

• Quero
• Devo
• Posso

Ou seja, na sua opinião estas questões refletem as seguintes situações: “nem tudo que nós queremos, nós podemos fazer”, “nem tudo que podemos fazer, nós devemos fazer” e “nem tudo que devemos fazer, nós queremos fazer”.

Ele ainda conclui que as pessoas passam a ter paz de espírito quando aquilo que se deseja é ao mesmo tempo aquilo que você pode fazer e também é o que você deve fazer.

Então, se pensarmos no mundo do futebol, como no nosso cotidiano em geral, os dirigentes devem colocar em prática ações que tenham congruência com aquilo que se espera dos ocupantes dos cargos que eles representam. Ou seja, que eles possam fazer da melhor forma suas atividades para as quais foram destinados, de forma que elas representem o que deva ser feito para o melhor da entidade a qual ele representa e que também possa ele ter o prazer e o interesse genuíno de fazer o trabalho que lhe cabe da melhor forma possível.

E aí, caro leitor como percebe a ética no futebol atualmente? 

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A necessária revolução na gestão das entidades esportivas

Na semana passada tivemos dois fatos diretamente ligados a FIFA e a seus dirigentes, que impactaram não somente na imagem da entidade como também abalaram o prestígio da modalidade futebol.

No primeiro fato, como forma de chamar a atenção para as condições de trabalho utilizadas nas obras no Qatar com vistas a Copa de 2022, designers internacionais criaram uma série de “anti-logos” utilizando como base as logomarcas oficiais das grandes multinacionais patrocinadoras do mundial naquele país. O trabalho pode ser visto pelo link http://goo.gl/OzJq4R.

No segundo, 8 dirigentes do alto escalão da entidade foram presos, acusados de diversos crimes, entre eles, pagamentos de propinas e subornos em diversos níveis. Neste mesmo processo, também estão envolvidos alguns empresários, donos das agências responsáveis por negociar os principais ativos da entidade e acusados de operar e distribuir os recursos do esquema.

No dia 02 de junho, Joseph Blatter anuncia sua renúncia ao cargo de Presidente da FIFA, confirmando apenas o início de um processo que pode transformar amplamente a gestão do mundo do futebol.

Infelizmente e pela forma mais dolorosa, tudo indica que desta vez a entidade irá finalmente entender que o esporte é um dos segmentos da indústria do entretenimento e, como tal, não está isolada do mundo e isenta de sofrer as consequências pelos atos que emanam de seus poderes.

Apenas em pouco mais de uma semana e após a notícia das prisões, as repercussões demonstram que como qualquer outra empresa, a entidade precisa entender e se preocupar como suas ações impactam nas empresas que se dispõe a investir em seus produtos, na mídia que os divulga e nas pessoas que se propõe a consumi-lo.

A ocorrência de escândalos na entidade que rege o maior esporte do mundo tem sido tão frequente e intensa que a credibilidade da modalidade e de suas instituições está profundamente abalada, ameaçando inclusive a percepção do público sobre as marcas que com ela se relacionam.

A Visa, por exemplo, em uma tentativa clara de resguardar sua imagem, foi a primeira das patrocinadoras a deixar claro por um comunicado oficial público que irá reavaliar sua posição de manter o patrocínio a entidade se algo não mudar rapidamente.

Os fatos ocorridos nos últimos dias corroboram uma tendência que vem aos poucos se consolidando principalmente na Europa. É necessário que as entidades de administração do esporte incorporem ao seu dia a dia os conceitos da boa governança. Conceitos como transparência, equidade, formato adequado de prestação de contas, responsabilidade corporativa e profissionalização da estrutura diretiva devem ser colocados em prática o mais rápido possível.

O Comitê Olímpico Internacional (COI) é um exemplo de entidade que historicamente já tem e agora vem reforçando sua preocupação em relação ao movimento olímpico, que é, no final de tudo, o seu maior ativo!

A partir de inúmeras reflexões que remetem a vários questionamentos sobre o movimento olímpico, que vão desde os gastos assustadores e desproporcionais nas últimas edições dos Jogos Olímpicos e Paralímpicos (de verão e de inverno) até a percepção sobre o afastamento significativo do público jovem de suas ações, o COI publicou em dezembro de 2014 a Agenda 2020 (pode ser acessada aqui: http://goo.gl/0OtH6j), que nada mais é do que um conjunto de 40 recomendações que visam mostrar claramente para a sociedade como ele, COI, pretende resgatar seu prestígio e se reaproximar dos valores olímpicos.

A governança das entidades tem lugar especial na Agenda 2020. E a lógica para o COI é óbvia e reta: é preciso afastar qualquer malversação de processos que denigram a imagem do esporte. Isto é fator básico para a sobrevivência das organizações que atuam neste setor.

Além disto, os debates e fóruns que discutem os princípios de governança no ambiente das entidades esportivas vem ocorrendo com muito mais frequência também. Movimentos como o do “Play the Game” (www.playthegame.org), além de realizar conferências sobre o tema, vem desenvolvendo em conjunto com 6 universidades europeias e o Centro Europeu de Jornalismo uma ferramenta para analisar e avaliar a qualidade da governança nas entidades de prática e administração do esporte.

Mesmo aqui no Brasil, temos realizado trabalhos para algumas entidades esportivas com o intuito de iniciar a aplicação destes conceitos no dia a dia de suas atividades. E por mais que o termo “governança” às vezes assuste um pouco, na realidade temos pontuado que se trata de um processo que está ao alcance de todos e, com um pouco de boa vontade, é possível realizar ações estruturantes que de fato irão impactar no desenvolvimento do esporte como um todo.

A verdade é que está cada vez mais claro que os conceitos da boa governança não se aplicam apenas para o mercado corporativo. Eles também não são direcionados exclusivamente a megacorporações com ações cotadas na Bolsa de Valores. Os princípios da boa governança se aplicam a todas as instituições que de alguma forma tem que se relacionar com a sociedade.

Independentemente dos devidos processos legais, que devem sempre ocorrer, neste momento os fatos colocam em suspeição os envolvidos em negócios com a FIFA. Aqueles que tem seu nome e/ou marca ligados a entidade passam a ser vistos com desconfiança e isso, naturalmente, não é bom para ninguém, mesmo para aqueles que não praticaram atos ilícitos.

A sociedade tem clamado por atitudes verdadeiras e coerentes. Esta tem sido a nossa evolução natural. O fato de participar de um movimento com mais pontos de interrogação do que de exclamação sugere uma reflexão mais profunda e a escolha por caminhos mais corretos por parte de todos. Em se tratando do mercado do esporte, cada vez mais, a paixão cega menos. A tolerância está cada vez menor e, por isso, precisamos de mudanças que sejam exequíveis e que falem a verdade.

Para finalizar, deixo algumas questões para reflexão: Você gostaria que a marca da empresa que seu pai fundou e você dirige estivesse na lista de logos citada acima, ou na homepage do site de uma entidade envolvida em um escândalo de tamanha proporção? Como acionista daquelas multinacionais duramente criticadas por seus clientes, por manter relação com uma entidade supostamente corrupta, como você agiria? Vale a pena estimular seus filhos a participar de um ambiente que vá claramente contra seus princípios fundamentais e contra aquilo que ele mesmo defende?

Talvez, antes que o ambiente ext
erno responda estas questões pelo sistema esportivo, é de extrema urgência que as organizações do esporte se antecipem em dar melhores respostas se quiserem se manter vivas no coração e na mente das pessoas e nos investimentos das empresas, governos e veículos de mídia. Se o esporte não mudar por si, alguém mudará pelo esporte! 

 

*Autor original do texto: Luis Felipe Monteiro de Barros, sócio-diretor da Inspire Sport Business

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Crise ou Oportunidade? Você decide

Se tomarmos como parâmetro os indicadores básicos da economia: dólar elevado, juros alto, PIB negativo, expectativa de inflação acima da meta, oportunidades de emprego em baixa, entre outros, somados à ênfase que a mídia dá para notícias ruins, fica fácil acreditar que não estamos vivendo uma crise e sim uma situação catastrófica, uma crise profunda, na qual todos afundaremos sem perspectiva de retorno.

Tenho sido frequentemente questionado sobre esse tema: "Cezar, o cenário que vivemos é de fato tão catastrófico? Existem alternativas? Oportunidades? O que preciso fazer para amenizar os efeitos da crise?" 

O fato é que estamos sim vivendo um momento preocupante e, confesso, é difícil não nos contaminarmos com o pessimismo que nos rodeia.

Não sou um expert em todas as áreas, no entanto minha primeira sugestão é mudar esse sentimento de pessimismo. Em um momento de turbulência, todos somos afetados – empregados, empresários, estudantes – mas apenas acreditar nas manchetes e lamentar não resolverá nada. É importante deixar de achar que aqui é o pior lugar do mundo, que as coisas erradas só acontecem no Brasil e que "não temos jeito". Temos no Brasil a tendência de falar mal do nosso país e não ficamos constrangidos quando outros falam mal de nossa pátria. Um absurdo!

Acreditem: temos que mudar esta postura. Basta olhar como outros povos lidam com situações semelhantes. É evidente que existe o fator cultural, somos latinos, mais emocionais e essa mudança de postura não ocorrerá do dia para a noite, mas é importante aproveitar o momento, focar nos exemplos positivos e começar a mudar imediatamente.

Tenho uma teoria de que vivemos 95% de nossas vidas de maneira agradável e alegre, mas por conta de nossa cultura de "enfatizar o que é ruim", lembramos e conversamos apenas sobre os 5% do que não funcionou como era planejado ou previsto. E isso se aplica à vida pessoal, profissional e até afetiva, portanto mudar esta percepção é a tarefa principal para viver de maneira mais alegre e feliz.

Por exemplo, os Estados Unidos também vivem um momento de crise. Lá se fala sobre o tema? Sim! Mas ao contrário do que se faz por aqui, não focam nos problemas, sabem que eles existem, não ignoram os riscos, mas focam nas soluções, enfatizam o que acontece de bom, destacam as melhorias. O americano típico não fala o tempo todo sobre a crise e por outro lado não são massacrados por uma mídia que gosta de vender desgraça. E ouse falar mal dos EUA ao americano, você ganhará um inimigo. Esse "jeito" faz com que a crise, apesar de existir, se torne um fardo mais leve e menos traumático.

Após esse primeiro preâmbulo, sugiro que você pare por alguns segundos e reflita se você pratica o pensamento otimista e se esforce para se distanciar do sentimento pessimista, de acreditar que tudo está muito ruim. Tenho algumas sugestões práticas que podem ajudar nesta dura tarefa de se tornar menos pessimista:

1 – Não forme sua opinião com base em manchetes ou posts no Facebook
É importante ler sobre o momento que vivemos, leia a notícia toda. Pesquise outras opiniões e busque números e fatos relevantes que envolvam o assunto, veja se você está inserido no contexto da notícia. O que parece ruim para alguns, pode ser oportunidades para outros, pode ser uma mudança positiva para o seu segmento, para o seu negócio. Muitas pessoas se tornaram especialistas em espalhar manchetes sem sequer ler a notícia!

2 – Tenha calma e não se deixe contaminar
Após conhecer com mais detalhes como você está inserido no momento “crise”, tendo sua própria opinião formada sobre o assunto e sendo necessário tomar alguma decisão, tenha serenidade. A oportunidade está em suas mãos. Avalie todas as possibilidades, visualize 2 ou 3 passos posteriores que envolvam a decisão que vai tomar. Pesquise e interaja com pessoas que vivam uma realidade parecida com a sua, veja acertos e erros cometidos. Aprenda com a experiência dos outros!

3 – Reveja seu modo de vida, corte gastos desnecessários
Quando existe abundância, não reparamos em pequenos desperdícios e em processos que possam ser melhorados e otimizados. A oportunidade é agora, pense detidamente no que pode ser mudado, o que pode ser melhorado, com menos tempo e menor custo e o que pode ser extinto. Essa sugestão vale para sua vida profissional e pessoal. Fazer mais com menos é a realidade do momento!

4 – Se você está empregado
Mesmo que esteja em um segmento favorecido pelo momento “crise”, não se sinta confortável. Trabalhe mais, dedique-se, estude, mostre comprometimento, sua oportunidade de crescimento ou preservação é agora. Se for necessário, abra mão de regalias neste momento, com certeza você será reconhecido e os frutos virão assim que o cenário melhorar. Lembre-se de que existem ótimos profissionais disponíveis no mercado e de olho no seu emprego, portanto se você não for o melhor profissional, a empresa terá a quem recorrer. Trabalhe todos os dias como se fosse seu primeiro dia no emprego!

5 – Se você está desempregado
Não desanime. Revise o seu currículo, o "produto você" precisa estar atrativo para o mercado. Fique atento às vagas divulgadas e se inscreva em todas as que julgar viáveis para você. Mantenha aquecido seu círculo de relacionamentos, evite reclamar pois ninguém gosta de gente "negativa" por perto. Participe de grupos de discussões nas mídias sociais, lembre-se de participar sempre de forma positiva, sendo o portador de soluções. Participe de cursos e eventos em sua área, existem muitos bons e que são gratuitos. Participe de trabalhos voluntários. Persista e não desista de seus sonhos!

Não existe fórmula para se tornar um otimista ou menos pessimista, no entanto, acredito que utilizando algumas dessas sugestões, mesmo com a crise e com as dificuldades, as alternativas e oportunidades aparecerão. Sempre que vejo a palavra CRISE me lembro do saudoso escritor e palestrante Marco Aurélio Vianna, que sabiamente ensinou em outros tempos não menos turbulentos que a solução ideal é tirar o “S da Crise”. CRIE! Reflitam e decidam qual caminho é melhor para você.

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Os conceitos do jogo – parte II

As equipes podem fazer gol de transição ofensiva?

Sim ou Não? Qual a sua resposta?

Dando sequência ao tema da coluna anterior, será iniciada a discussão do questionamento proposto ao leitor sobre em qual classificação devem ser inseridos os conceitos de contra-ataque e transição ofensiva.
Aproveito a oportunidade para agradecer a participação de Willians Alves, Carlos Vargas, Baldini Myung, Ricardo Paraventi, Diogo Pereira e Rafael Bertelli. A contribuição de vocês foi fundamental para confirmar a relevância de discutir o tema.

O Rafael Bertelli, inclusive, disponibilizou uma entrevista de Júlio Garganta, referência mundial em pesquisa na modalidade. Abaixo, segue um pequeno trecho da entrevista:

“Que importância atribui à utilização de um léxico claro e universal no futebol?

Alguém disse um dia que uma rosa, ainda que se chamasse outra coisa, não deixaria de ter o mesmo perfume! Contudo, podemos rememorar o odor desta flor pelo simples facto de invocarmos o nome “rosa”. De facto, um léxico é um facilitador da comunicação e, no caso do Futebol, poderia ser um promotor da relação entre pares (atletas, treinadores, pesquisadores) e do avanço do conhecimento, porque permitiria centrar a atenção mais nos conteúdos do que nas respectivas designações ou “rótulos”. Por analogia com o exemplo anterior, permitia, precisamente, que não perdêssemos tempo à procura de vários nomes para “rosa” e nos detivéssemos nas suas características, nomeadamente no seu odor. Se, por exemplo, no domínio da medicina, ou da farmacologia, houvesse várias designações para cada órgão, cada patologia, cada princípio activo de um medicamento, imagine a confusão e as repercussões de tal profusão. Quem beneficiaria com isso? Nem o médico, nem o doente, nem a ciência! Só os falsos médicos e /ou os fraudulentos. É o que acontece com o desporto, onde a dispersão e a “inflação” terminológica, ao invés de se revestirem de alguma riqueza lexical, geram confusões recorrentes e desacreditam quem pretende ter uma atitude rigorosa e construtiva face à interpretação da realidade. Cada um inventa os termos a seu bel-prazer! De certo, haverá sempre espaço para inventar palavras, para criar neologismos. E ainda bem que assim é. Mas uma coisa é a arte de criar termos, criando sentido, outra é a proliferação obsoleta de termos sem que haja o mínimo consenso sobre os mesmos, o que “intoxica” a comunicação e embaraça a acção.”

Retomando aos conceitos de transição ofensiva e contra-ataque, para muitos estamos diante de uma classificação com CONCEITOS DIFERENTES E SIGNIFICADOS IGUAIS. Nessa perspectiva, transição ofensiva e contra-ataque dizem respeito a um momento do jogo que precede a organização ofensiva. É muito comum observarmos em ambientes em que se discute futebol expressões como: “a transição ofensiva da equipe A é muito veloz”, “a equipe B precisa de mais velocidade nas suas transições”, ou então, “a equipe C fez um gol numa grande jogada de transição ofensiva”.

Porém, quando se avança em leituras científicas sobre o jogo de futebol (sua interpretação e elementos que constituem sua organização), depara-se com uma classificação distinta da apresentada acima. Sob este viés, transição ofensiva é um conceito e contra-ataque é outro conceito. Logo, a situação apresentada refere-se aos CONCEITOS DIFERENTES E SIGNIFICADOS DIFERENTES. Lembrando que são as situações mais fáceis de serem solucionadas desde que não haja variações em suas interpretações.

Ao ter como sustentação teórica o pensamento sistêmico, assume-se que o jogo de futebol não deve ser divido (e pensado) nas quatro vertentes sabidamente conhecidas: Física, Técnica, Tática e Psicológica. Quando uma equipe (constituída por elementos) Joga, todas as suas ações com ou sem bola, quaisquer que sejam (não fazer nada, inclusive) são a manifestação da sua inteligência coletiva, que é tudo (Física, Técnica, Tática, Psicológica) ao mesmo tempo o tempo todo, como bem afirma Rodrigo Leitão.

Sendo assim, a divisão didática que faz sentido à observação do Jogo, deixa de ser a de suas vertentes e passa a ser a de seus Momentos (Organização Ofensiva, Transição Defensiva, Organização Defensiva e Transição Ofensiva), em função da posse de bola. Se considerarmos o Futebol como um jogo de oposição, quando uma determinada equipe encontra-se em um momento (p.e Organização Ofensiva), inevitavelmente o adversário estará em um momento oposto, seguindo o exemplo, em Organização Defensiva.

E é na divisão dos Momentos do Jogo e na tendência de fragmentarmos (bem como nas vertentes) o conhecimento (presos ao paradigma do pensamento cartesiano) que surge o conflito conceitual que, consequentemente, se estende à aplicação prática.

Para tentar facilitar a interpretação vamos continuar a discussão através de algumas imagens: 

Quando uma equipe tem a posse de bola ela está em Organização Ofensiva
Assim que uma equipe perde a bola ela está em Transição Defensiva
Quando uma equipe não tem a posse de bola ela está em Organização Defensiva
Assim que uma equipe recupera a posse de bola ela está em Transição Ofensiva

Funcionalmente, ou seja, para o jogo acontecer, as equipes apresentam comportamentos operacionais em função dos diferentes Momentos do Jogo. São eles:

Qualquer equipe executará (em diferentes níveis, logicamente) estas referências ao longo de um jogo.
Quando uma equipe está em Organização Ofensiva, executando as referências operacionais relativas a este momento do jogo, em linhas gerais, ela possui três formas de atacar o adversário. Veja quais são na imagem abaixo:

Caro leitor, convido-o novamente para contribuir com a coluna, agora com mais elementos. A pergunta que deixo, é a mesma do início do texto: As equipes podem fazer gol de transição ofensiva?
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Uma chance para aprofundar o debate

Ainda é impossível medir com exatidão as consequências e a abrangência do escândalo que chacoalhou o mundo do futebol na última semana – sete dirigentes ligados à Fifa, incluindo o brasileiro José Maria Marin, foram presos na quarta-feira (27) em operação liderada pela polícia federal dos Estados Unidos (FBI). A credibilidade da entidade internacional foi abalada, é claro, mas não impediu a reeleição do presidente Joseph Blatter, apoiado pelo baixo clero do futebol mundial e aclamado pouco mais de 48 horas depois das detenções. Marco Polo del Nero, atual mandatário da Confederação Brasileira de Futebol (CBF), também foi citado (não nominalmente) na investigação, mas concedeu entrevista coletiva cínica para tentar evitar que os descalabros pespegassem em sua imagem. Entre as denúncias, o trabalho de comunicação para gerir crises e as negativas de todos os lados, o episódio já serve como um excelente exemplo para discutir semântica e responsabilidade.

Vivemos uma era de rótulos, e há vários fatores que contribuem para essa discussão rasa. As redes sociais inseriram mais gente no debate e reduziram o espaço para as ideias, por exemplo, e isso criou um perigoso cenário em que apontar dedos é mais simples do que tentar entender contextos.

Na última sexta-feira (29), mesmo dia em que Blatter foi reeleito e Del Nero negou qualquer envolvimento com os esquemas, um episódio em São Paulo mostrou o quanto a sociedade brasileira atual tem sofrido uma crise de ideias e valores. Protesto realizado na Universidade de São Paulo (USP) acabou com cinco manifestantes feridos, um deles detido. Uma garota levou UM SOCO NO ROSTO de um POLICIAL MILITAR, oficial que em tese vive para proteger os cidadãos.

Instantes antes, o mesmo policial disparou spray de pimenta na jovem e em outra manifestante. Tudo que elas faziam de extremamente perigoso era mexer na mochila de um jovem que havia sido detido, e a ação foi inteiramente gravada. O oficial não tentou conversar ou controlar a situação em momento algum.

O caso de abuso é apenas um exemplo da falência da PM como instituição. O modelo militarizado e opressor simplesmente não condiz com a sociedade moderna. Não cabe e não pode ser admitido. E aqui não interessa se ela começou, agrediu, incitou ou provocou – nem foi o caso, mas esses são os primeiros argumentos usados por qualquer defensor da Corporação. Os policiais trabalham para a sociedade e não para combater a sociedade. Essa violência – como tantas outras, aliás – é simplesmente inaceitável.

A digressão e a relação com o exemplo do PM serviram apenas para mostrar que temos vivido uma crise de ideias. Nosso padrão de debate tem sido cada vez mais o que se viu no vídeo do protesto da USP: violência, confronto, excesso de força e poucas palavras.

O risco que se corre, nesse caso, é perder a razão. Ainda que a manifestante estivesse errada, o policial acabou com qualquer chance de discussão ao partir para a agressão. Ainda que ela tivesse feito isso antes, NÓS NÃO PODEMOS ADMITIR UMA SOCIEDADE DE OLHO POR OLHO.

Por tudo isso, é fundamental ter cautela quando acontece um escândalo de proporções tão grandes quanto o da Fifa. Como escreveu o jornalista Juca Kfouri, o benefício da dúvida a Del Nero só pode ser má fé ou ingenuidade. No entanto, não se pode confundir a convicção com base jurídica.

Enquanto houver uma investigação em curso, suspeitos são apenas suspeitos. Sobre isso, costumo citar sempre o filme “12 homens e uma sentença”, obra de tribunal dirigida por Sidney Lumet em 1957. Sem qualquer comparação com o caso atual, aquele é baseado em um júri de assassinato: todos os indícios levam à condenação do réu, mas um dos jurados começa a desconstruir os argumentos até incutir a dúvida na cabeça de todos.

Nesse caso, portanto, não se trata de ingenuidade, promiscuidade ou pusilanimidade: os fatos são suficientemente fortes para que sejam apurados e causem impacto nos alicerces do futebol mundial. Transformar isso em rótulos rasos só faz mal para o debate.

O futebol mundial tem atualmente uma oportunidade rara para criar uma discussão ampla, que inclua diferentes segmentos e que contribua para a evolução do jogo como evento social. Para isso, porém, é fundamental que o debate supere os rótulos ou a gritaria.

Marin foi preso, e Del Nero ainda deve sofrer consequências. Apontar dedos, porém, vai apenas mudar as moscas. Como disse o Ulisses Guimarães, em frase relembrada pelo jornalista Luis Augusto Simon, “não existe vácuo de poder”. Derrube os atuais comandantes do futebol e mantenha as estruturas intactas, e os problemas vão persistir.

É claro que achar culpados é relevante. É claro que necessitamos de um trabalho de investigação que seja minucioso e que indique as pessoas que se beneficiaram ilegalmente de um jogo que é paixão global. Contudo, o que está em jogo é a cultura de todo o esporte, e nesse cenário os nomes importam menos do que a discussão.

Como segmento, o futebol precisa de auditoria. Ainda que instituições como a CBF e a Fifa sejam privadas, elas são foco de interesse público. Por isso, devem prestar contas à sociedade – e não apenas no aspecto financeiro. Saber quanto essas entidades ganham e como elas gastam esses recursos é relevante, mas aqui a palavra “auditoria” é mais abrangente: é preciso saber por que elas tomam determinadas decisões e como elas usam a influência que o esporte oferece.

Pela abrangência que tem e pelas paixões que desperta, o futebol é um agente social com enorme potencial de formação e transformação. Até por isso, é fundamental que criemos ambientes em que o segmento seja discutido – esses debates não podem ficar restritos ao ambiente acadêmico ou às pessoas que fazem parte do segmento.

Como em qualquer crise, o futebol tem agora uma chance de autoanálise, e isso tem de ser muito maior do que apenas algumas prisões. Resta saber se as pessoas que comandam a modalidade terão maturidade para enxergar numa crise de imagem uma chance de reinvenção. Sem rótulos e com profundidade.