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Precisamos pensar fora da Caixa

Convivemos diariamente com a paixão que o futebol desperta em todo o Brasil, chegando ao ponto de sermos considerados um país de monocultura esportiva. Consumimos futebol durante os 365 dias do ano, e, apesar desse potencial, não evoluímos, ficando cada vez mais distantes do que acontece no futebol europeu, com suas ligas fortes, bilionárias e globalizadas.

Como o futebol que mais conquistou títulos mundiais não consegue avançar para um campeonato de excelência e que desperte mais desejo e respeito?  Vivemos em um círculo vicioso que ainda não fomos capazes de nos desvencilhar. A organização do campeonato não é de qualidade, o calendário inchado prejudica o desempenho dos atletas e das comissões técnicas, os jogadores saem cada vez mais cedo para todos os cantos do mundo, os clubes (salvo raras exceções) não conseguem equilibrar as suas contas por serem geridos de forma amadora e não costumam trabalhar o potencial de suas enormes marcas como deveriam.

Tratando especificamente sobre o potencial dos clubes como marcas, olhemos como o patrocínio é visto e trabalhado no futebol brasileiro. Ser um país menos desenvolvido do que os europeus e passar por um momento econômico complexo são elementos que atrapalham o nosso amadurecimento, porém não podemos nos esconder atrás somente desses fatores.

Quando falamos em patrocínio dos clubes brasileiros, invariavelmente ficamos presos ao chamado patrocinador máster, aquele que terá exposição de marca na camisa. Em sua maioria, os clubes viram reféns dessa receita, não desenvolvendo alternativas que possam minimizar essa dependência e também aumentar o potencial de faturamento com novas propriedades. Quando concretizam a venda da cota máster, é comum ver o clube ter como meta obter novos acordos sempre envolvendo a exposição da marca na camisa em espaços menores, fazendo com que a camisa perca a sua identidade.

Hoje, entre os 20 clubes da Série A do Campeonato Brasileiro, 15 possuem um banco estatal como patrocinador principal, sendo 13 clubes patrocinados pela Caixa e 2 clubes pelo Banrisul. Apesar de ser uma marca de varejo que compete com os bancos privados e a estratégia de associação com o futebol ser uma plataforma consistente, esse monopólio da Caixa não é saudável, pois escancara a fragilidade do mercado de patrocínio em nosso território.

É importante registrar que os clubes não são os únicos culpados dessa situação. A mídia esportiva, em sua maioria, trata o assunto sempre de olho na marca que estará estampada na camisa, sem que haja uma visão mais ampla se o clube desenvolve ações diferenciadas que trarão benefícios e novas receitas em um médio prazo. Pelo lado das empresas, o futebol normalmente é visto como forma de gerar mídia espontânea por um custo menor se comparado à compra de mídia tradicional (publicidade). Dessa forma, destinam parte de sua verba de mídia para esse fim, porém pouco ou nada fazem de ativação desse patrocínio.

Vale a ressalva que alguns clubes e empresas desenvolvem projetos interessantes, seguindo a cartilha de como executar um bom programa de patrocínio. Fica a torcida para que esses modelos se solidifiquem e não sejam abandonados nas primeiras dificuldades que surgirem.

Para fazer um contraponto, vamos avaliar um clube europeu gigantesco como o Barcelona (poderíamos falar de tantos outros clubes da “La Liga” Espanhola, “Premier League” Inglesa, “Bundesliga” Alemã, “Serie A” Italiana ou “Ligue 1” Francesa). Recentemente, o clube publicou o seu balanço financeiro com recorde de faturamento no valor de € 679 milhões (algo em torno de R$ 2,3 bilhões), sendo o marketing responsável por € 268 milhões (algo em torno de R$ 907 milhões). As parcerias de material esportivo com a Nike e de patrocínio máster com a Qatar Airways representam um volume importante desse montante, porém devemos considerar que o clube possui outros 7 parceiros premium, 8 parceiros oficiais e 15 parceiros chamados regionais. São 32 marcas diretamente associadas ao clube.

Se pegarmos a receita de patrocínio no balanço de 20 clubes brasileiros, chegamos ao total de R$ 500 milhões, um pouco mais da metade do que o Barcelona arrecada sozinho. Sem sombra de dúvida, esses números não são reflexo somente da situação econômica do país e do nosso nível de desenvolvimento, mas sim da diferença entre os modelos de negócio.

O Barcelona possui 4 marcas expostas em sua camisa, sendo a Nike como material esportivo, a Qatar Airways com a propriedade máster, a Beko na manga e o UNICEF (parceiro institucional) na parte inferior nas costas. O que então os outros 29 parceiros têm direito a explorar, se a marca não tem exposição na camisa? Eles efetivamente executam um plano de  patrocínio, envolvendo ações de relacionamento, ativações junto aos torcedores, experiências nos dias de jogos, desenvolvimento de conteúdo nas redes sociais dos clubes, entre outros.

Um exemplo prático é o que a Audi desenvolve há alguns anos com os clubes que patrocina. A empresa entrega, a cada temporada, um novo modelo de carro para as estrelas do time e faz um trabalho de relações públicas muito forte para que essa notícia obtenha o máximo alcance. Junto com essa entrega, sempre criam alguma ativação única utilizando os atletas. Nessa temporada, os jogadores protagonizaram uma série de provas de habilidades ao volante, divididos em equipes. Em temporada anterior, criaram uma gincana, onde equipes de jogadores precisavam fazer embaixadinhas e pedalar uma bicicleta que gerava energia. Além de serem ativações muito criativas, mostram um lado diferente dos jogadores extra campo de forma descontraída e divertida, entregando valor direto para a marca.

Adaptar o modelo de patrocínio do futebol europeu para o nosso mercado não é algo fora da realidade, pois temos capacidade e criatividade para fazer, haja visto o reconhecimento e respeito mundial que nossos publicitários e produtores de evento adquiriram ao logo do tempo. Vejamos um caso de sucesso de patrocínio criado no Brasil que pode servir de referência ao futebol.

O Rock in Rio, um dos maiores festivais de música no mundo, arrecada cerca de R$ 120 milhões em patrocínio para um evento que ocorre durante 7 dias. Esse sucesso só acontece por haver um trabalho conceitual para a construção de um plano de comunicação de marcas, com um planejamento estruturado de mídia, propriedades de ativação e criação de experiências inesquecíveis. Os 7 dias de evento tornam-se parte de um plano muito mais robusto executado durante todo o ano.

Precisamos pensar fora da caixa para que, ao invés de haver uma marca patrocinadora dominante em todos os clubes, tenhamos inúmeros empresas buscando soluções em conjunto e alcançando os seus objetivos estratégicos de marca com o futebol sendo a plataforma escolhida.