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As redes sociais e a saúde emocional dos atletas

Crédito imagem: Reprodução/Instagram/José Mourinho

A “era da informação” é um termo utilizado para se referir a todo aparato de tecnologia digital responsável pela mediação das relações humanas e das interações entre máquinas, que são cada vez mais autônomas. O futebol recebeu grande influência dessa evolução tecnológica, tanto na questão técnica e preparação física de atletas quanto na mercadológica, passando a constituir um evento midiático de grande interesse econômico por parte dos seus agentes e patrocinadores.

A partir da década de 1980, um grande fluxo de atletas brasileiros passou a se dirigir à Europa, pois esse mercado era (e continua sendo) atrativo pela possibilidade de altos salários e pela qualidade de vida que oferece aos seus cidadãos. Quando isso acontecia, geralmente o atleta caia no esquecimento do torcedor local, salvo quando demonstrava um rendimento acima da média em seus clubes estrangeiros e acabava convocado para servir à Seleção Brasileira. Atualmente, porém, muitos atletas fazem questão de expor suas vidas privadas nas redes e, mesmo os mais discretos, podem ser expostos por veículos midiáticos especializados em “fofocas em troca de cliques”.

Além de toda a pressão emocional a que estão sujeitos para o alcance do alto rendimento esportivo, atletas também começam desde muito jovens a construir a necessidade de trabalhar a sua imagem pública por meio das redes sociais, buscando alcançar o maior número de seguidores possível. No geral, quanto mais populares, maiores as chances de obter ganhos com investimentos de marketing e patrocínio de marcas, o que pode, inclusive, facilitar a sua contratação pelos clubes. Mas, não é só isso: muitos atletas passaram a depender emocionalmente das redes e da aceitação social que seus seguidores lhes proporcionam. Essa realidade tem produzido nos últimos anos uma verdadeira epidemia de depressão e outros transtornos psíquicos e emocionais em um grande espectro de pessoas que utilizam a internet para a autopromoção, como youtubers, influencers, atores, cantores, atletas, entre outros.

Longe de querer encerrar o assunto e tirar conclusões precipitadas sobre esse cenário, é importante compreendermos que estamos diante de um fato econômico, social e cultural, com importantes desdobramentos na forma como vivemos em sociedade.  A vida moderna passa a ser estruturada em torno de objetivos provisórios, superficiais que são confundidos com os fins. O indivíduo vive pressionado, tenso, esperando algo que nunca parece chegar e, suas finalidades últimas se perdem no horizonte.

O dinheiro e uma noção ilógica de poder se colocam entre o homem e o que ele quer, como se fossem facilitadores, criando a ilusão de que tudo pode ser alcançado através deles. O consumo desenfreado estimula a ansiedade, reproduzindo a ilusão que aquilo que vai lhe dar trégua pode ser obtido facilmente na posse de uma determinada quantia ou posição social. As propagandas são exemplos que parecem ser bem apropriados: elas exploram o universo simbólico dos consumidores sempre de forma hiperbólica, pois talvez do contrário, sem este estímulo adicional, não obtivessem o resultado desejado. Nesse momento de concretização do que o escritor Guy Debord ainda no séc. XX chamou de “sociedade do espetáculo” e em que vários clubes adotam o modelo de Sociedade Anônima do Futebol (SAF), mais do que nunca, as relações de trabalho com os atletas serão mediadas a partir de índices e métricas de “investimento x lucratividade”. Por isso, os clubes formadores e a sociedade como um todo deverão estar muito atentos à educação emocional dos nossos jovens atletas, para que possam desenvolver uma base sólida capaz de equilibrar o rendimento esportivo e a satisfação perante a vida.

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Rótulos e modismos no futebol brasileiro

Crédito imagem: Divulgação/Al-Duhail

Dezembro de 2016. O Corinthians ainda sentia a ausência do técnico Tite, que alguns meses antes havia saído do clube para assumir a seleção brasileira. Sem treinador, o Corinthians não sabia muito bem que rumo tomar. Tentou alguns nomes, cada um com um perfil, ouviu alguns nãos, e de repente, muito de repente mesmo, sem qualquer tipo de convicção, com a temporada 2017 prestes a começar, pinçou o então auxiliar Fábio Carille. Uma solução barata, acessível e que faria os dirigentes ganharem tempo na busca por um nome de mais peso. 

Mas Carille tinha qualidade. Passou muito tempo aprendendo com Tite e Mano Menezes. A solidez defensiva que marcou a década vitoriosa do clube tinha o dedo de todos e Carille soube transportá-la ao seu trabalho autoral. Pelo tempo de casa, ele conhecia muito bem o clube, o ambiente interno e a torcida. E os resultados positivos passaram a acontecer. De quarta força a campeão Paulista e Brasileiro. 

Vendo o Corinthians vitorioso com essa “fórmula” os outros times passaram a copiá-la. Oras, se deu certo lá pode dar certo aqui, pensaram vários dirigentes pelo país. A moda então passou a ser apostar em técnicos jovens. Vindos da base ou auxiliares permanentes… só que pouca gente entendeu que o contexto vitorioso de Carille no Corinthians era extremamente único. Como todo contexto é: não dá para desprezar as relações internas e externas, a identidade, a história, as finanças, enfim, cada cenário é de uma forma e pede uma intervenção única. 

Como não se tratou de apenas uma temporada, em 2018 o campeão brasileiro foi o Palmeiras com o experiente Luis Felipe Scolari no comando. Adivinha qual foi a tendência? Exato, técnicos medalhões. Com vivência. Que conseguiam dominar o vestiário, coisa que os mais jovens não sabiam… veja que aí o exemplo de Carille em 2017 já não valia…

Nesta linha do tempo, está mais do que claro porque todo mundo quer em 2022 um técnico português… isso mesmo, porque as últimas três Libertadores foram vencidas por Abel Ferreira e Jorge Jesus. 

Enquanto não houver qualificação profissional, convicção, visão de médio e longo prazo e embasamento técnico em quem tem a caneta nas mãos, o futebol brasileiro seguirá refém de rótulos e modismos.

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O palmeirense pode não comemorar. Mas o futebol sulamericano sim!

Crédito imagem: Fabio Menotti/Palmeiras

Sei que é demais pedir para o palmeirense comemorar a atuação contra o Chelsea na final do Mundial de Clubes. E está ok o torcedor ficar triste pelo segundo lugar. Torcedor torce! É passional. Tem que ser assim mesmo! Mas o desempenho do Palmeiras foi gigante. Imponente. Brigou sim de igual para igual com o poderoso campeão da Champions. Excelente alento para todo o futebol sulamericano.

A diferença econômica existe, é um indicador importantíssimo, mas não pode nunca ser um confortável limitador. Maior poderio financeiro e mais recursos para investir claro que trarão melhores jogadores. O elenco do Chelsea vale vinte vezes mais do que o do Palmeiras. Porém, insisto, que mais qualidade individual de um lado não deve significar para o outro pobreza de ideias, fraco jogo coletivo e um espírito derrotista e resignado. E foi possível enxergar nitidamente no Palmeiras de Abel Ferreira um bom plano de jogo, um comprometimento absurdo dos jogadores com e sem a bola e uma crença inquebrantável de que a vitória era possível.

Não podemos comparar cenários por conta de um jogo. Sim, a Premier League é infinitamente melhor do que o Brasileirão. A Champions League dá um banho em absolutamente tudo na Libertadores. Dentro e fora de campo. Mas essa final do Mundial de Clubes mostrou que os times sulamericanos não precisam ser tão diferentes dos europeus. Mesmo com muito menos dinheiro. No futebol globalizado de hoje, arrecadar menos não pode significar conceitos defasados, intensidade rasa e mentalidade de baixa performance. Parabéns Palmeiras! Você mostrou que o futebol da América do Sul sobrevive e compete!

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Sylvinho e a cultura…

Crédito imagem: Rodrigo Coca/Agência Corinthians

A demissão do técnico Sylvinho no Corinthians escancarou problemas crônicos do nosso futebol. Claro que saídas de profissionais são legítimas e acontecem no mundo todo – muito mais no Brasil do que em outros lugares, mas tudo bem. E você, corintiano, pode estar neste momento enumerando erros de escalação, formação e substituições que Sylvinho cometeu nesses oito meses de trabalho… porém um olhar global para essa demissão mostra que estamos na contramão do que pede o sucesso.

Em primeiro lugar, o futebol brasileiro superdimensiona o papel do técnico. Quando ganha ele leva méritos que não são dele. E quando perde é crucificado e apontado como o grande vilão sem também merecer. O jogo é do jogador! Quem executa, quem toma decisão é o atleta! O treinador tem um papel fundamental, entretanto o protagonista é sempre aquele que entra em campo. 

E no caso do Corinthians o elenco é mal formado. Há excesso de jogadores que já passaram da idade de alta performance e também lacunas importantes, como a ausência de um centroavante e de um primeiro volante. Quando a atuação no mercado prioriza desejos de patrocinadores e não aspectos técnicos fica difícil criar um elenco homogêneo…

Reconheço que a comunicação de Sylvinho não foi das mais assertivas. No discurso e na linguagem não verbal faltou se adaptar ao “público-alvo”, que é o corintiano. Ele foi demitido por causa disso. E isso é muito grave! Foi avaliada a embalagem e não o conteúdo! A partir do momento que o personagem Sylvinho caiu em desgraça o campo passou a não importar. Nada que ele fizesse iria agradar a opinião pública. Nenhuma fala de jogador atestando a qualidade do trabalho convenceria o torcedor e por consequência o dirigente. 

A gestão não profissional gera isso. A arquibancada deve ser ouvida, mas não pode ser determinante na condução do processo. Nunca que três jogos de início de temporada podem culminar na saída de um treinador. Agrade o torcedor e jogue a pré-temporada no lixo! Qualidade do jogo nesse contexto incoerente? Esquece…

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Palmeiras e o investimento na base

Crédito imagem: Reprodução/Palmeiras

O sucesso nunca é fundamentado em um único elemento. É a junção de algumas variáveis que compõe um sistema vencedor. No futebol isso é colocado à prova toda hora, pois trata-se de um jogo que é aleatório, imprevisível e caótico. Pode-se fazer tudo certo e mesmo assim o resultado positivo não aparecer. Sobretudo no curto prazo. A tendência natural, porém, é que no médio e longo prazo boas convicções, trabalho duro e foco no processo tragam vitórias convincentes.

O Palmeiras atual é um exemplo disso. Dentro desta reconstrução, o objetivo nunca foi ganhar a Libertadores novamente. Nas categorias de base, a meta não era ganhar a Copa São Paulo. No mercado, o foco não está em contratar os jogadores mais famosos e badalados do mundo. O olhar esteve, sim, sempre em criar uma cultura vencedora. Um sistema de processos e ações que paulatinamente aproximasse o clube do sucesso.

Meta de ser campeão todo time tem. A diferença está no modelo planejado e executado para chegar lá!

Sabe porque o Palmeiras nunca tinha vencido a Copinha? Porque nunca havia sido criada uma metodologia de trabalho na formação e o departamento de base nunca tinha recebido a atenção e os investimentos necessários. Para ir além da conquista de um campeonato, basta ver a quantidade de jogadores que o clube revela hoje e a quantidade que revelou em toda a história…

Ter um plano, acreditar nele, possuir humildade e sabedoria para em tempo real mensurar resultados e ir aparando arestas, mas sem sair da rota, não é para todo mundo. Todos querem ganhar não só no futebol, mas também na vida. Entretanto, poucos conseguem criar com paciência e persistência um meio consistente para atingir os fins. Tenha metas muito claras. Mas trabalhe arduamente para ser integrante ativo de um contexto que o aproxime de fato do sucesso.