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Raio X da gestão do marketing nos clubes de futebol – O planejamento

Na terceira parte da série sobre a gestão do marketing iremos abordar como os 14 clubes analisados realizavam o planejamento da área de marketing. Os modelos teóricos sobre o tema indicam que o planejamento do marketing deve ser baseado no do clube e, assim, os entrevistados foram questionados sobre o planejamento e os objetivos das suas equipes. Dos 14 clubes três não possuíam um planejamento geral, cinco possuíam planejamento, mas não estratégico (focando apenas na parte esportiva ou financeira), e em seis havia um plano estratégico, com a definição de itens como missão, visão, valores e objetivos de médio e longo prazo.

Sobre os objetivos dos clubes, cinco entrevistados não souberam cita-los, cinco indicaram objetivos esportivos e os demais citaram itens como a criação de uma imagem profissional, o crescimento sustentável e a busca pelo reconhecimento nacional. Destaque para o fato que nenhum indicou que o clube possuía objetivos relacionados ao marketing, como conquista e fidelização dos torcedores, desenvolvimento de novos produtos e serviços e obtenção de novas receitas.

Especificamente sobre o planejamento do marketing, quatro clubes não o possuíam, em seis ele existia, mas era informal, e em quatro ele era claro e documentado. Em apenas um a duração do planejamento era superior a um ano, com a maioria o utilizando de forma anual ou por competição. A criação do planejamento ocorria de diferentes maneiras nos 10 clubes que o possuíam: em três era definido pela diretoria, em dois em conjunto entre diretoria e o marketing e em cinco pela área de marketing, sendo que destes em dois ele era baseado em diretrizes gerais do clube, como o indicado pela teoria. Por fim, sobre os objetivos do marketing, três entrevistados afirmaram que não possuíam, sendo que dois deles eram de clubes em que havia departamento de marketing. Os objetivos dos outros 11 clubes envolviam aspectos como a geração de receitas, por patrocínios ou venda de produtos; a melhoria no atendimento e relacionamento com o torcedor e o sócio-torcedor; o atendimento aos patrocinadores; a afirmação do posicionamento do clube; e a transmissão das partidas.

Também foram abordados os principais elementos estratégicos do planejamento de marketing. Começando pela análise da situação, que visa analisar o ambiente interno e externo do clube, foi identificado que poucos clubes realizavam tais análises de forma sistemática, clara e constante. Na maioria tal análise era baseada em percepções e opiniões da equipe de marketing, sem nenhum clube possuir documentos formais sobre o tema. Dos 14 clubes apenas dois não realizavam e utilizavam dados de pesquisas de mercado de forma constante. Contudo, a principal pesquisa utilizada focava apenas no retorno de mídia e era obtida de forma compulsória pelos clubes junto à Federação Paulista. Pesquisas sobre os torcedores eram realizadas com menos frequência e apenas três clubes já haviam contratado empresas especializadas para realizá-las, com muitos fazendo pesquisas por conta própria principalmente em redes sociais, por e-mail ou durante os jogos, mas, sem a correta orientação, os dados obtidos eram limitados e superficiais.

Sobre a segmentação do mercado, ou seja, a criação de grupos/nichos de torcedores/consumidores para um melhor atendimento, apenas quatro clubes indicaram a possuir. Já a definição de mercados e públicos-alvo era presente em cinco clube, sendo que em apenas dois ela era clara e relacionada com a segmentação existente, seguindo o indicado pelos modelos teóricos sobre o tema.

Outro elemento fundamental do planejamento estratégico de marketing é o posicionamento, que indica a vantagem que a organização oferece e como ela se posiciona no mercado, sendo fundamental para a realização de todas as atividades e ações da área. Dos clubes analisados em cinco o posicionamento não era claro enquanto em nove ele era bem definido e envolvia aspectos esportivos, desde a formação de atletas até a conquista de títulos; tradições e valores dos clubes; e características como profissionalismo, seriedade e transparência. Importante ressaltar que a utilização de aspectos esportivos, especialmente de conquistas, não é recomendado, pois a imprevisibilidade do futebol pode prejudicar, na prática, tais posicionamentos.

A área comercial em todos os clubes analisados era de responsabilidade do marketing, diferentemente de alguns modelos teóricos e de clubes europeus onde as duas áreas são distintas, havendo em todos um planejamento comercial, ainda que informal e sem clara documentação. O mesmo era definido pelo marketing em quatro clubes, sendo que nos outros dez os planos comerciais eram oriundos da diretoria, com o marketing apenas o executando, por mais fora da realidade ele fosse: apenas um entrevistado citou que questionava abertamente as determinações da diretoria. Os objetivos comerciais focavam principalmente na busca de patrocinadores/parceiros, no atendimento e fidelização dos patrocinadores existentes, cumprimento de metas financeiras e obtenção de contratos de longo prazo. Já os principais produtos disponibilizados ao mercado eram:

  • Patrocínios nos uniformes, nas redes sociais, permutas e outras formar de parcerias;
  • Estádio e centro de treinamento: comercialização de publicidades diversas; locação de cadeiras e camarotes; locação de espaços para eventos/shows; e acordos para o direito de venda de alimentos e bebidas;
  • Ações e ativações voltadas para os sócios-torcedores e no estádio durante os jogos;
  • Direito de transmissão das partidas;
  • Leis de incentivo ao esporte;
  • Produtos e serviços: ingressos, licenciamentos, escolas de futebol e sócio torcedor.

Apesar da aparente variedade de opções, na prática poucos produtos e serviços eram realmente comercializados na maioria dos clubes, com o foco sendo majoritariamente nos patrocínios dos uniformes; na publicidade nas instalações, especialmente nos estádios por meio de permutas; e nos programas de sócio-torcedor, tidos pela maioria dos entrevistados como o principal produto dos clubes e foco de parte das ações comerciais.

No geral, podemos observar que o planejamento do marketing na maioria dos clubes era restrito, de curta duração, criado de forma limitada e sem conexão com o restante do clube. Elementos estratégicos fundamentais para a correta gestão do marketing são ignorados, com a análise da situação, pesquisas com torcedores/consumidores e a definição da segmentação de mercado e do mercado e público-alvo, o que acaba por limitar as ações e os resultados da área.

A parte comercial possuía um planejamento mais desenvolvido, apesar da tendencia dele ser definido pela diretoria sem a participação clara do departamento de marketing, o que gera objetivos e metas irreais, além da limitada opção de produtos e serviços oferecidos aos diferentes tipos de públicos e mercados. Por fim, foi contatado que o processo de planejamento do marketing é um dos principais problemas da gestão do marketing dos clubes analisados, sendo que tal situação afeta diretamente os resultados obtidos pela área, especialmente a geração de novas receitas a fidelização dos torcedores/consumidores.

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Futebol Feminino – Preconceito X desenvolvimento da modalidade

Crédito imagem – Pedro Ernesto Guerra Azevedo/Santos FC

O amor pelo futebol é universal. Homens e mulheres, adultos e crianças, compartilham dos mesmos sentimentos quando torcem pelo seu time de coração: felicidade, tristeza, desespero, euforia. No entanto, infelizmente, uns e outros ainda possuem aquele pensamento retrógrado de que futebol não é local para mulheres.

O ingresso das mulheres no futebol é recente comparado com o surgimento dessa modalidade de esporte.

Há 40 anos, as mulheres ainda eram proibidas por lei de praticar esportes, incluindo o futebol, sendo permitido somente aos homens jogar e participar de campeonatos.

Em que pese esta proibição ter caído em 1979, muitas mulheres ainda são impedidas de jogar bola, quer seja pelo machismo enraizado nas famílias, quer seja pela dificuldade de adentrar no ambiente futebolístico.

Por isso, exigir igualdade de desempenho entre homens e mulheres é, no mínimo, hipocrisia e falta de empatia da parte de quem faz tal comparação.

Recentemente, o sócio e ex conselheiro do Santos FC, Sérgio Ramos, se envolveu em uma polêmica ao ser divulgado trechos de uma transmissão do Blog Soul Santista, onde ele dispara comentários de cunho misógino e de incitação à violência contra a mulher.

Durante a transmissão, o sócio proferiu ofensas às jogadoras do Peixe, afirmando que “campo de futebol não é lugar de mocinhas” e que “mocinhas no campo de futebol são aquelas que a gente enche de porrada e tira de lá”. Referido senhor disse ainda que o futebol feminino é um lixo e que não o assiste de jeito nenhum, além de muitas outras barbaridades.

Os comentários arrancaram risadas do grupo, sendo que os demais participantes da live se limitaram a alertaram o ex conselheiro de que tais comentários poderiam ser considerados politicamente incorretos.

O discurso viralizou na internet e nas redes sociais, causando repúdio e diversas manifestações contrárias às ofensas disparadas pelo ex conselheiro do Peixe. O próprio clube chegou a emitir nota de esclarecimento, afirmando que as providências em face da Sergio Ramos já estão em andamento. Além disso, o Blog Soul Santista também se pronunciou, afirmando que a opinião do convidado Sérgio Ramos não representa a do Blog.

Infelizmente, comentários desse tipo são comuns em nossa sociedade. O futebol feminino é desprestigiado por muitos, o que acaba refletindo diretamente no desenvolvimento, rendimento e orçamento dos times de futebol feminino.

Mesmo com todos os entraves, é notória a evolução do futebol feminino. Prova disso foi o sucesso da Copa do Mundo Feminina, onde os jogos alcançaram visibilidade, boa audiência e repercussão a nível mundial. Se a sociedade valorizasse e incentivasse as mulheres à prática desse esporte desde a infância, e investissem em categorias de base e profissionalização, como ocorre com os homens, certamente o nível e a qualidade técnica dos times femininos progrediriam satisfatoriamente.

Nada impede que as jogadoras e times femininos sejam cobrados quando não apresentam o rendimento desejado, como ocorreu com a seleção brasileira feminina na Copa do Mundo.

Entretanto, o que não pode ocorrer é a comparação desleal com o futebol masculino, o qual, desde sempre, teve prestígio e altos investimentos, e a perpetuação de pensamentos e práticas preconceituosas e misóginas, que só afastam a possibilidade de o futebol feminino alcançar o lugar merecido dentro do ambiente futebolístico.

Infelizmente o preconceito contra o futebol feminino está enraizado na sociedade e comentários como o do sócio e ex conselheiro do Santos FC, Sergio Ramos, são ainda comuns, o que só ressalta a importância de combatermos a discriminação e intolerância dia após dia, visando, inclusive, a evolução da nossa sociedade.

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A decisão nas mãos do torcedor

Na era da economia da atenção, os clubes de futebol entram em uma nova disputa. Precisam vencer as plataformas de streaming e os jogos eletrônicos, valendo justamente a atenção de seus torcedores. Para isso, utilizar ferramentas que possibilitem que os torcedores tomem decisões pelo clube pode ser fundamental para trazer o engajamento necessário para manter este fã por perto. Este texto busca explicar como funcionam iniciativas nesse sentido, trazendo alguns exemplos tanto do mercado brasileiro, quanto de fora.

Conforme o mundo evolui, vamos sendo apresentados à novos conceitos. Um dos mais recentes é o da Economia da Atenção. Esta ideia começa a surgir quando o tempo passou a ser um recurso cada vez mais escasso. Não foi coincidência a enorme quantidade de publicações nas redes sociais com dicas de produtividade no home office na época em que a quarentena foi instaurada no Brasil, em março de 2020. Além de atividades de trabalho e estudos, existem diversas opções de entretenimento disponíveis, como séries, redes sociais e vídeo games. Com diversas informações a serem consumidas, a atenção das pessoas virou o principal desejo de produtores de conteúdo de diferentes formatos, pois é a partir de sua conquista que os produtos e serviços serão vendidos com maior facilidade.

Como mais um produto de entretenimento, o futebol e outras modalidades esportivas entram na briga pela atenção dos torcedores, tendo os serviços citados no parágrafo anterior como concorrentes. O futebol já sai atrás no placar quando lembramos que seu principal produto, uma partida, possui 90 minutos, tempo muito longo para alguém prestar atenção sem interrupções. Em pesquisa recente, a consultoria PwC analisou o comportamento de consumo de torcedores ao redor do mundo. Estes dados mostraram que as gerações mais jovens estão se desligando da partida ao vivo, buscando consumir conteúdos como os melhores momentos para se manter informada.

Para ter vantagem neste jogo, existem alguns conceitos que podem ser utilizados pelos profissionais do esporte para criar um bom relacionamento com seus fãs. Um destes, cada vez mais utilizado por clubes e outras empresas, é o de dar poder de decisão aos torcedores sobre questões da entidade. Essa prática ganha força no momento em que os fantasy games e novos modos de jogo dentro de FIFA e Pro Evolution Soccer passam a entregar aos usuários a opção de montar suas próprias equipes, se tornando verdadeiros gestores responsáveis pela compra e venda de atletas. As decisões que serão tomadas por torcedores no mundo real não necessariamente precisam ser relevantes. Podem ir de questões mais simples, como escolha do ônibus do time até decisões realmente importantes, como será visto na sequência deste texto.

São duas as vantagens obtidas ao possibilitar que os fãs tomem as decisões dos clubes. A primeira é o próprio engajamento em si. O perfil oficial do Campeonato Brasileiro no Twitter tem feito isso muito bem, permitindo que os torcedores escolham a seleção de cada rodada a partir de votação na plataforma. É possível notar que as enquetes para cada posição movimentam toda a comunidade que segue o perfil, por envolver a paixão de diversas torcidas na ação.

A segunda vantagem é a sensação de pertencimento. Existe muita paixão envolvida no esporte, e o torcedor quer sempre estar próximo. Um clube que já percebeu esse desejo e as oportunidades que isso traz é o Bahia. Desde 2018 o clube define seu uniforme a partir de uma votação popular com seus torcedores, com a vantagem de a camisa de jogo da equipe ser produzida pela Esquadrão, marca própria do tricolor baiano. Na votação de 2019, foram cerca de 50 mil participações no concurso denominado “Manto do Esquadrão”.

No último ano, foram alguns casos de ações nesse sentido no futebol brasileiro. O Atlético-MG utilizou a estratégia para gerar engajamento no início da pandemia, quando as partidas estavam paralisadas. Assim, em parceria com a empresa End to End e a fornecedora de material esportivo Le Coq Sportif, surgiu a campanha “Manto da Massa”. O projeto envolvia ter uma camisa do clube desenhada por um torcedor, fato que seria legitimado a partir de votação popular. Os objetivos iniciais envolviam aumentar a receita do clube, seja com a venda do novo uniforme, seja com o engajamento nas redes sociais e no plano de sócio torcedor. Os resultados superaram as expectativas tanto do Atlético, quanto da End to End, outra parte envolvida na ação. Foram 100 mil camisas vendidas em 8 dias, aumento de 87% da base de sócios do clube e a marca de 22 mil seguidores na conta de Instagram do Galo na Veia, programa de sócio do clube que possuía apenas 5,6 mil seguidores antes do projeto.

No mercado internacional também existem bons exemplos. A plataforma Socios.com utiliza esse conceito em seu produto. A empresa disponibiliza a venda de tokens, um ativo digital ligado a tecnologia blockchain, que permite aos compradores ter poder de decisão em algumas questões dos clubes que possuem acordo com o Socios.com. No futebol, são 14 instituições com contrato, com grandes clubes como Barcelona, Juventus, PSG e Atletico de Madrid. A decisão mais significativa disponibilizada para escolha dos fãs surgiu em outubro de 2020. Através de enquetes no aplicativo do Socios, os torcedores do Apollon FC, do Chipre, puderam escolher a escalação do time no amistoso contra o Aris Limassol, desde a formação tática até os atletas.

Ainda sobre esta plataforma, eles realizaram em 2018, em parceria com a consultoria Nielson, uma pesquisa sobre o relacionamento dos torcedores com seus clubes. 47% destes destacaram que se interessam mais por votações sobre suas equipes do que eleições de seus países. Reforçando a importância de dar voz aos fãs, 52% dos que responderam a pesquisa acreditam que os torcedores precisam ter mais influência nas decisões das entidades esportivas.

Para o futuro, entregar ao torcedor decisões importantes deve ser um fato presenciado mais vezes. Modelos e ferramentas para que isso ocorra não irão faltar, com tantas tecnologias disponíveis no mercado. Caberá aos clubes entenderem essa nova demanda e permitirem que os torcedores assumam seu papel de donos do espetáculo em alguns momentos.

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Raio X da gestão do marketing nos clubes de futebol – as estruturas

Dando continuidade à série que apresenta as informações sobre a gestão do marketing nos clubes que disputaram a Série A1 do Paulistão 2018, hoje iremos tratar de como os 14 clubes analisados estruturavam a área de marketing. Dos clubes analisados 12 possuíam departamento de marketing, enquanto em dois não haviam profissionais atuando na área.

Tomando como base modelos teóricos sobre departamentos de marketing, foi identificado que cinco clubes adotavam o modelo empreendedor, com a área de marketing formada por apenas uma pessoa. Em outros cinco clubes o departamento se aproximava do modelo tido como tradicional, no qual há um departamento de marketing formal, independente, com diretor próprio e formado por uma equipe de três o ou mais pessoas. Dois clubes possuíam departamento de marketing voltado para vendas, formado por uma ou duas pessoas e sem o completo desenvolvimento do marketing. Por fim, um clube adotava o modelo de terceirização, com a área de marketing sob a responsabilidade de uma agência externa.

Em seis dos 12 clubes que possuíam departamento de marketing a área tinha autonomia de atuação e estava em igualdade com outros departamentos. Nos outros clubes o marketing era subordinado a outros setores, como departamento de futebol e a presidência. Apenas em cinco clubes havia funcionários suficientes que permitissem a divisão do marketing em áreas internas, com um total de 15 áreas identificadas.

Destaque para a área comercial e de sócio torcedor, as mais citadas. Ao comparar os resultados com modelos teóricos sobre departamentos de marketing de organizações esportivas e com os clubes europeus é observado a ausência ou o limitado espaço a áreas como ingressos/bilheteira; Relações Públicas; pesquisa e gestão de informações; e promoção e publicidade.

Dos 14 clubes analisados apenas quatro possuíam orçamento anual e formal para a área de marketing. Em sete a equipe de marketing necessitava negociar pontualmente com a direção a liberação de verbas para a realização das ações e em três clubes o marketing não recebia nenhuma verba do clube para a sua atuação, exceto o pagamento de salários.

Um achado interessante foi que em sete clubes a área de Marketing e de Comunicação eram unificadas, situação não retratada pela teoria e pouco usual nos principais clubes europeus. Tal junção foi justificada pelos entrevistados em razão de dois fatores distintos:

  • Opção estratégica, na qual a junção das áreas ocorria no nível superior, com um único responsável. As estratégias e o planejamento eram desenvolvidos em conjunto, com a aplicação sendo feita por equipes próprias para cada área;
  • Falta de pessoal: os poucos recursos financeiros e a limitada visão das diretorias dos clubes sobre ambas as áreas faziam com que não houvesse profissionais suficientes para a Comunicação e para o Marketing. Assim, a mesma pessoa acumulava a responsabilidade por ambos. O excesso de tarefas impedia o foco nas duas áreas, sendo que na maioria dos clubes em que ocorria tal fato o marketing era preterido em relação a comunicação, já que a atuação como assessor de imprensa apresentava uma demanda maior e diária.

Por fim, ao observarmos o cumprimento das exigências das regras de licenciamento da CBF sobre os departamentos de marketing, em especial sobre a presença de um cargo de liderança na área – CMO, diretor ou gerente de marketing, foi verificado que em metade dos clubes que possuíam departamento de marketing não havia tal cargo. Essa ausência acaba por fazer que a área seja gerida por pessoas sem dedicação exclusiva ao clube – caso dos diretores voluntários – ou por pessoas de outras áreas, como o presidente ou gerente administrativo.

Se mostra preocupante que apenas cinco clubes possuíam três ou mais pessoas no departamento de marketing, o que possibilitava a existência de áreas internas e uma atuação mais profunda e ampla. A terceirização da área em um clube se mostrou positiva, apesar de não haver um funcionário da terceirizada fixo no clube diariamente, bem como a junção nos níveis superiores do marketing com a comunicação. Por outro lado, é preocupante a subordinação do marketing a outras áreas ou a pessoas não especializadas, o que acaba por prejudicar em muito a atuação da área. Além da pouca relevância dada ao marketing por algumas diretorias, fato comprovado pela ausência, na maioria dos clubes, de um orçamento anual e formal e pela união do Marketing com a Comunicação sem a existência da quantidade adequada de profissionais para tal.

Clique aqui para ler a primeira parte do estudo.

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O descumprimento da legislação trabalhista e a possibilidade de rescisão indireta do contrato de trabalho no futebol

Crédito imagem – Redes sociais Dedé/Divulgação

O ano de 2021 iniciou cheio de polêmicas envolvendo o cenário futebolístico brasileiro. Inúmeras notícias estão sendo veiculadas, informando que jogadores, em razão de suposto descumprimento do contrato de trabalho pelos clubes, estão pleiteando a rescisão indireta do referido contrato.

O caso que mais chamou atenção foi do atleta Dedé, o qual ajuizou ação trabalhista em face do Cruzeiro, pleiteando, dentre outros pedidos, a rescisão indireta do contrato de trabalho, o pagamento das verbas rescisórias e da multa compensatória, tendo como valor total o importe de R$ 35.258.058,64. A ação ajuizada pelo Dedé foi distribuída perante a 48ª Vara do Trabalho de Belo Horizonte/MG, sob o nº 0010001-30.2021.5.03.0186.

Diante dos fatos acima narrados, vieram à tona discussões acerca do contrato de trabalho do atleta profissional e as situações que ensejam a sua rescisão indireta, ou seja, antes do prazo originalmente pactuado.

Esta coluna pretende trazer esclarecimentos jurídicos ao leitor, acerca do contrato de trabalho do atleta profissional, a possibilidade de rescisão indireta e as suas consequências.

As relações trabalhistas decorrentes do esporte são regulamentadas principalmente pela Constituição Federal, pela Lei 9.615/98, mais conhecida pela Lei Pelé, e, de forma supletiva e subsidiária, pela CLT – Consolidação das Leis do Trabalho.

Nos termos da Lei Pelé, o contrato de trabalho desportivo deve ser celebrado de forma formal e prever obrigatoriamente a cláusula indenizatória desportiva. Ademais, o referido contrato possui prazo determinado, sendo no mínimo de 03 meses e no máximo de 05 anos.

O atleta profissional, como qualquer outro empregado celetista, recebe salário básico, férias + 1/3, 13º salário, repouso semanal remunerado e FGTS. Além de tais verbas, há parcelas específicas pagas ao jogador de futebol, quais sejam, luvas, bichos, direito de arena e direito de imagem, decorrentes do contrato de trabalho firmado junto ao clube.

Ao pactuar o contrato de trabalho, surge tanto para o clube, quanto para o atleta profissional, uma série de obrigações que deverão ser cumpridas. Em suma, as obrigações do clube são:

– Registrar o contrato especial de trabalho desportivo do atleta profissional na entidade de administração da respectiva modalidade desportiva;

– Proporcionar aos atletas profissionais as condições necessárias à participação nas competições desportivas, treinos e outras atividades preparatórias ou instrumentais;

– Submeter os atletas profissionais aos exames médicos e clínicos necessários à prática desportiva.

Além das obrigações acima mencionadas, destaca-se, ainda, o dever do clube de contratação de um seguro de vida e de acidentes pessoais para o empregado, de realizar o pagamento de salários, bem como de despesas quando o trabalhador estiver à disposição do clube, de obedecer aos prazos de inscrição do atleta para a disputa dos jogos e competições, dentre outras.

As obrigações gerais do atleta profissional, por sua vez, podem assim ser sistematizadas:

– Participar dos jogos, treinos, estágios e outras sessões preparatórias de competições com a aplicação e dedicação correspondentes às suas condições psicofísicas e técnicas;

– Preservar as condições físicas que lhes permitam participar das competições desportivas, submetendo-se aos exames médicos e tratamentos clínicos necessários à prática desportiva;

– Exercitar a atividade desportiva profissional de acordo com as regras da respectiva modalidade desportiva e as normas que regem a disciplina e a ética desportiva.

Estabelecidas as principais características do contrato de trabalho firmado entre o atleta e o clube, importante esclarecer o instituto jurídico da rescisão indireta.

A rescisão indireta nada mais é do que a possibilidade de o empregado finalizar o contrato de trabalho como se houvesse dispensa sem justa causa, em razão de descumprimentos perpetrados pelo empregador, no caso, o clube de futebol.

Ultrapassada tal premissa, passa-se a analisar as situações que possibilitam ao atleta invocar a rescisão indireta, como almeja o Dedé.

A Lei Pelé possui expressa previsão sobre a possibilidade de o atleta ter seu contrato rescindido indiretamente caso a clube estiver com pagamento atrasado de salário, de direito de imagem, FGTS ou contribuições previdenciárias, ainda que parcialmente, pelo período igual ou superior a três meses. Cumpre esclarecer que o termo salário, para fins da rescisão indireta, engloba todas as verbas de natureza salarial.

Além da Lei Pelé, a própria CLT traz outras hipóteses de caracterização da rescisão indireta, sendo o descumprimento contratual a mais comum no âmbito futebolístico.

Com a rescisão indireta, o jogador poderá se transferir para outro clube, fará jus às verbas rescisórias e a cláusula compensatória desportiva.

Salienta-se que a cláusula compensatória desportiva, tem a finalidade de proteger o atleta de uma rescisão antecipada e imotivada pelo clube, sendo também aplicada na hipótese de rescisão indireta do contrato de trabalho.

O valor da indenização será estipulado pelas partes, mas devem se atentar para os limites trazidos pela Lei Pelé, quais sejam, máximo de 400 vezes o valor do salário no momento da rescisão e mínimo do valor total de salários mensais a que teria direito o atleta até o término do contrato de trabalho.

Pois bem.

Esses são os principais contornos acerca da rescisão indireta do contrato de trabalho pleiteada por inúmeros jogadores nesses últimos dias, a qual está gerando imensa repercussão no cenário futebolístico, notadamente considerando a crise que assola diversos clubes brasileiros.

Por fim, cumpre destacar que o pedido de rescisão indireta será analisado pela Justiça do Trabalho, devendo o atleta comprovar os atos faltosos praticados pelo clube para ter êxito na sua demanda.

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STF permite recebimento do direito de imagem dos atletas por pessoa jurídica

Crédito imagem – Redes sociais Gabigol/Divulgação

Uma das maiores discussões tributárias no âmbito do futebol e dos esportes em geral diz respeito à utilização do direito de imagem dos atletas e o pagamento do imposto de renda. É de amplo conhecimento que a constituição de pessoas jurídicas por atletas profissionais é uma prática recorrente, seja para facilitar a administração de contratos e o gerenciamento das propostas negociais, seja para otimizar a organização dos diferentes rendimentos auferidos. 

Nesse sentido, uma prática bastante comum é que o atleta transfira para a pessoa jurídica a licença para exploração do seu direito de imagem.

O direito de imagem é assegurado expressamente pela Constituição Federal em seu art. 5º, inciso X, que enuncia ser inviolável a imagem das pessoas. O art. 20 do Código Civil Brasileiro complementa essa proteção, determinando que a exposição ou a utilização da imagem de uma pessoa é proibida, salvo se autorizada. Assim, no caso de atletas profissionais, a permissão para que a pessoa jurídica explore o direito de imagem da pessoa física é, em teoria, permitida.

Desta forma, através da exploração do direito de imagem pela pessoa jurídica (clubes), os atletas passam a auferir renda por duas maneiras: (i) o salário, recebido pela pessoa física por meio da CLT; e (ii) a contraprestação pela exploração dos direitos de imagem do jogador, recebida por meio da pessoa jurídica.

Nos dois modelos há formas diferentes de tributação. No caso dos rendimentos salariais recebidos diretamente pela pessoa física, o Imposto de Renda chega até a alíquota progressiva de 27,5% sobre o total auferido. Já no caso dos rendimentos por exploração da imagem recebidos pela pessoa jurídica, o Imposto de Renda pode ser recolhido no regime do Lucro Presumido, o que equivale a uma carga aproximada de 14,53% do total, sendo permitido então que a pessoa jurídica repasse os rendimentos para a pessoa física na forma de lucros e dividendos, que são isentos do Imposto de Renda da Pessoa Física.

Contudo, essa divisão de rendimentos entre a pessoa física e a pessoa jurídica vem sendo rechaçada pela Receita Federal do Brasil, que considera a operação uma simulação, uma omissão de rendimentos tributáveis por parte da pessoa física, pois se configurariam rendimentos salariais disfarçados.

Por muito tempo o cerne dessa discussão se permeava no fato da fiscalização alegar que o direito a imagem é considerado intransferível e inalienável, conforme previsto na Constituição Federal e no Código Civil. Nessa esteira, vários doutrinadores dividiram o direito de imagem em duas vertentes: (i) o aspecto moral, que se refere a esse direito personalíssimo, inalienável e intransmissível, que impede que a imagem da pessoa seja vendida, renunciada ou cedida em definitivo; e (ii) o aspecto patrimonial, que se trata a imagem como um direito que não é absolutamente indisponível, podendo ser licenciada a terceiros para exploração econômica. 

Tal discussão foi abordada pelo STJ no julgamento do REsp 74.473, ocasião em que a Corte consolidou o entendimento de que “assim como nos direitos autorais, o direito de imagem também possui esses dois aspectos”, salientando que a imagem dos atletas tem uma característica econômica/patrimonial passível de gerar receitas, e que esse aspecto patrimonial pode ser transferido.  

O divisor de águas, que permitiu o exercício de atividade personalíssima por meio de pessoa jurídica, sem que se tratasse de sociedade unipessoal, foi o art. 129 da Lei 11.1961/2005, que surgiu com a finalidade de autorizar de forma expressa a contratação de pessoa jurídica para a prestação de serviços de natureza intelectual, cultural, artística ou científica. 

Até a última semana não havia uma posição unânime na doutrina e jurisprudência em relação à aplicação deste artigo, discussão que se arrastava desde a publicação da lei, ou seja, há mais de 15 (quinze) anos. Durante esse período vários atletas, como os jogadores de futebol Neymar Jr e Alexandre Pato, os técnicos Cuca e Felipão e o tenista Guga Kuerten, enfrentaram processos sobre o tema, alguns ainda em curso.

Neste tempo, inclusive houve a alteração na Lei nº 9.615/98, conhecida como Lei Pelé, que prevê as normas gerais da prática do esporte no Brasil, assegurando proteção aos direitos dos atletas. O art. 87-A, incluído pela Lei nº. 12.395 de 2011, salienta que o direito de imagem do atleta pode ser cedido ou explorado por ele, podendo inclusive ser cedido a um terceiro (pessoa natural ou jurídica). 

Com a disciplina do tema também pela Lei Pelé a tendência era de que os atletas tivessem mais liberdade e autonomia para definir como explorar o direito de imagem, visto que a lei estabelece que a remuneração por essa atividade é inconfundível com o salário do jogador. 

Entretanto, mesmo após essas previsões legais, a RFB continuou autuando as operações, sob o fundamento de que se trata de planejamento tributário abusivo, uma vez que, segundo a RFB, as pessoas jurídicas são utilizadas para pagamento do salário dos atletas e não necessariamente para exploração do direito de imagem – hipótese em que se evidenciaria o intuito de se obter uma carga tributária inferior à que lhe é devida.

Para dirimir estas controvérsias, o STF, no dia 11/12/2020, encerrou o julgamento da ADC nº. 66 que analisou a constitucionalidade do artigo 129 da Lei 11.196/05, ou seja, se esta “pejotização” configuraria uma fraude à fiscalização.

Naquela ação, apesar da Advocacia-Geral da União (AGU) ter alegado que o dispositivo deveria ser afastado “diante da constatação de que a pessoa jurídica foi constituída como forma de dissimular verdadeira relação de emprego e tentar omitir a ocorrência de fato gerador de obrigação tributária”, o STF, por 8 votos favoráveis a 2, declarou a constitucionalidade do artigo e possibilitou aos atletas o recebimento do direito de imagem mediante pessoa jurídica.

A relatora do caso, Ministra Cármen Lúcia, defendeu a constitucionalidade do dispositivo afirmando que “A regra jurídica válida do modelo de estabelecimento de vínculo jurídico estabelecido entre prestador e tomador de serviços deve pautar-se pela mínima interferência na liberdade econômica constitucionalmente assegurada e revestir-se de grau de certeza para assegurar o equilíbrio nas relações econômicas e empresariais”. 

Vale ressaltar que a decisão proferida pelo STF não significa uma presunção de licitude para que todas as atividades prestadas por jogadores, técnicos, artistas, intelectuais, cientistas e demais atletas sejam exercidas mediante a intermediação de pessoas jurídicas, ou seja, não constitui um salvo-conduto para legitimar aqueles que se utilizam desta estrutura de forma irregular. 

Após esta decisão, todavia, deve ser afastada a presunção do fisco de que a utilização do direito de imagem dos jogadores e técnicos por pessoas jurídicas é irregular, sendo necessário comprovar, no caso concreto, a irregularidade da prestação de tais serviços. 

Portanto, resta aguardar os próximos julgamentos sobre o tema, tanto no âmbito do CARF – onde se concentram a maioria dos processos e que até o presente momento possui jurisprudência desfavorável aos contribuintes -, como no Poder Judiciário, para verificar qual o impacto trazido pela decisão proferida na ADC nº 66, que inquestionavelmente constitui importante precedente para os atletas.

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A infeliz e recorrente presença de atitudes racistas no mundo do futebol

Crédito da imagem: UEFA/Redes sociais/Divulgação

Embora a escravidão tenha sido abolida mundo afora há bastante tempo, em pleno século XXI, ainda presenciamos atitudes inaceitáveis de discriminação de pessoas pela cor de sua pele e, infelizmente, esse triste cenário se repete no futebol.

Inúmeros são os casos de atitudes racistas noticiadas no mundo do futebol, situação que, além de configurar crime em grande parte dos países, demonstram a injustificável, mas recorrente, intolerância voltada a pessoas negras, como se, por sua cor de pele, elas fossem de alguma forma inferiores.

Parece absurdo casos assim continuarem a ocorrer, mas, apesar de incompreensível, é sim um problema que precisa ser enfrentado.

No último dia 08 de dezembro de 2020, tivemos mais um exemplo de racismo no futebol, acreditando que a atitude dos jogadores servirá de marco de enfrentamento aos que persistirem eternando esse injustificado ódio.

Durante uma partida da Champions League entre o Paris Saint German, do brasileiro Neymar, e Istambul Basakserhir, após uma discussão, o quarto árbitro, Sebastian Coltescu, proferiu ofensas racistas contra um dos membros da comissão técnica do time turco.

Em ato de protesto pelo ocorrido, os jogadores das duas equipes se recusaram a continuar a partida, enquanto o quarto árbitro, acusado das ofensas, não fosse retirado de campo.

A suspensão se deu aos 13 minutos do primeiro tempo, a UEFA, organizadora do campeonato, chegou a noticiar que o jogo seria reiniciado às 18 horas (de Brasília). No entanto, os jogadores do Istambul se negaram a voltar a campo, fazendo com que o jogo fosse adiado para o dia 09 de dezembro de 2020.

A atitude dos jogadores demonstra que não serão toleradas, dentro de campo, condutas de cunho racista. A união foi a palavra da vez nesse episódio, todos os jogadores, independente da cor da pele, se uniram em prol da causa e deixaram bem claro a todos que assistiam o jogo que vestem a camisa do “não ao racismo”.

Que essa atitude seja bem repercutida por todo o mundo e sirva de lição, e até de reprimenda, aos racistas que insistem em manifestar seu ódio aos negros, para que não voltem a ter atitudes como estas, pois as mesmas não serão mais toleradas.

Além desse caso, ocorrido em 08/12/2020, o racismo no futebol é bastante recorrente e precisa ser firmemente combatido.

Diferentemente da legislação penal, o Código Brasileiro de Justiça Desportiva não faz distinção entre os tipos de injúria racial puníveis, tratando os atos discriminatórios em um único diploma legal, qual seja o artigo 243-G que assim dispõe:

“Praticar ato discriminatório, desdenhoso ou ultrajante, relacionado a preconceito em razão de origem étnica, raça, sexo, cor, idade, condição de pessoa idosa ou portadora de deficiência.”

Embora exista a previsão de punição para atos dessa natureza, em muitos casos a impunidade é o que impera. No entanto, temos alguns exemplos em que os atletas ofendidos levaram o caso até as autoridades competentes e os responsáveis foram punidos. Exemplos:

Tinga, do Internacional, em jogo do campeonato brasileiro, em 22/10/2005, denunciou que toda vez que tocava na bola os torcedores adversários imitavam macacos. Analisando o caso, o Superior Tribunal de Justiça Desportiva (STJD), em decisão unânime, aplicou multa de R$ 200 mil e tirou o mando de campo de duas partidas.

Vanderlei, do Caxias, em jogo do campeonato gaúcho, em 24/03/2012, foi chamado pela torcida rival de macaco insistentemente. Em julgamento no Tribunal de Justiça da Federação Gaúcha de Futebol, o Novo Hamburgo foi condenado a pagar uma multa de R$ 10 mil pelas ofensas.

Aranha, goleiro do Santos, em jogo da Copa do Brasil, em 28/08/2014, foi chamado pela torcida do rival de macaco. O Grêmio foi julgado pelo STJD e foi excluído da Copa do Brasil; recorreu e foi penalizado com a perda de 3 pontos e multado em R$ 54 mil

Como se percebe, as situações racistas são recorrentes no futebol brasileiro e mundial. No entanto, o fato ocorrido em 08/12/2020 no jogo da Champions League, deixa claro que os próprios jogadores não irão mais aceitar essas ofensas.

O caminho ainda é longo, mas certamente esse dia 08 de dezembro ficará marcado na história como um divisor de águas na luta contra o racismo no mundo do futebol.

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Normas desportivas internacionais

Muito se discute acerca da influência de normas internacionais no Futebol Brasileiro, sobretudo considerando que, por sua natureza, referido esporte possui características peculiares, entre elas, a integração pessoal e a inclusão social dos povos e comunidades internacionais, considerando, ainda, a ausência de barreiras geográficas.

Dessa maneira, para unificar e harmonizar a matéria se faz necessário a internacionalização das normas jurídicas.

O futebol é disputado em diversos países simultaneamente e, por isso, houve a necessidade da criação de entidades globalizadas para gerir a modalidade de forma isonômica, determinando, assim, regras globais uma vez que que a modalidade também é disputada internacionalmente.

Assim, podemos dizer que “a ordem jurídica internacional determina os âmbitos territorial, pessoal e temporal de validade dos nacionais, restringindo o âmbito material de validade das ordens jurídicas nacionais ao submetê-la à regulação de matérias próprias, que de outra maneira seriam arbitrariamente reguladas por cada Estado”.(Hernán J. Ferrari, ordenamento jurídico nacional)

Assim, surge o Direito Desportivo Internacional, ramo do Direito Desportivo que trata dos princípios e das regras que determinarão a legislação aplicável às relações jurídicas desportivas de caráter internacional.

O Doutor Rafael Teixeira Ramos em sua obra “Principiologia do direito desportivo internacional” subdivide em nove princípios com os quais concordamos, quais sejam: Universalidade; Comunhão; Não Discriminação Desportiva; Autonomia Desportiva Internacional; Unidade; Especificidades; Ética Desportiva; Solidariedade e Inafastabilidade da Justiça Desportiva dos Institutos Desportivos Internacionais Privados.

Com a internacionalização do desporto de uma maneira geral, tornou-se necessária a elaboração de regras extracontinentais para que todos os países pudessem competir entre si de igual maneira. Assim em 1894, em Paris (França) foi criado o Comitê Olímpico Internacional (COI), que se trata de uma organização não governamental constituída sobre a forma de associação que é regida pela Carta Olímpica, um conjunto de normas e regras criados para a organização dos Jogos Olímpicos.

Referido Comitê é composto por 115 (cento e quinze) pessoas, reservada algumas vagas para ex-atletas, presidentes de Federações Internacionais, dentre outros. Cada mandato tem uma duração de 08 (oito) anos, podendo ser reeleito ilimitadamente. A Comissão executiva é constituída pelo Presidente, quatro Vice-Presidentes e 10 (dez) membros eleitos, com mandato de 04 (quatro) anos, podendo ser reeleito por mais 02 (duas) vezes, após, torna-se necessário aguardar 02 (dois) anos para uma nova candidatura.

E ainda, assim como o Comitê tratado acima, as Federações internacionais também são associações não governamentais que administram um ou mais esportes no cenário mundial, incluindo o futebol.

As Federações são responsáveis pela criação de regras do jogo, fiscalização de transferência de jogadores, organização de campeonatos profissionais, dentre outras atividades relacionadas as competições e jogos profissionais. Para que uma Federação seja reconhecida junto ao COI, deve se valer dos princípios e conceitos destacados na Carta Olímpica.

As Federações poderão também propor aos comitês novas regras, modalidades, emitir opiniões e pareceres e contribuir com a educação desportiva, e sucessivamente as Federações internacionais (FIFA) criam regras que devem ser aplicadas hierarquicamente seguidas pelas entidades que estão vinculadas à ela no cenário continental (COMMEBOL) ou nacional (CBF).

Para resolução de conflitos, existe o Tribunal do Esporte ou Corte Arbitral do Esporte (TAS e CAS), o qual é um órgão criado pelo Comitê Internacional (COI), com sede em Lausanne na Suíça, tendo outros dois postos permanentes em Sydney na Austrália e outro em Nova Iorque nos Estados Unidade. O tribunal tem por finalidade solucionar questões relacionadas ao esporte podendo ser levado a corte as Federações, clubes e/ou atletas.

O TAS foi criado em 1984 em razão da necessidade de foro para soluções de litígios e conflitos esportivos no cenário mundial de forma isonômica e horizontal.

O tribunal é composto por no mínimo 150 (cento e cinquenta) pessoas, o presidente deverá obrigatoriamente ser o mesmo do Internacioanal Concil of Arbitration for Sport (ICAS), – que foi criado para administrar e financiar o Tribunal – de 37 países diferentes.

Os Tribunais são exigidos principalmente em período olímpico ou de Copa do Mundo, quando o mundo se vira à uma só competição de curto prazo, sendo necessário um eficiente posicionamento.

Dessa maneira, conforme abordado acima, as Federações Internacionais criam normas para regular e reger as modalidades pela sua independência e autonomia das atividades. Esse conjunto de normas deu origem a Lex Sportiva, uma espécie de norma geral de princípios únicos aplicáveis a modalidade. A ideia da criação da Lex Sportiva é formalizar regras comuns globalizando as decisões e as competições por todo o mundo.

No âmbito interno brasileiro, pertinente esclarecer que a soberania é um dos direitos fundamentais da República Federativa do Brasil, implicando, inclusive, em autonomia legislativa. Todavia, esse conceito vem se flexibilizando em razão da cooperação jurídica internacional, que diz respeito à segurança e estabilidade das relações transnacionais.

Deste modo, a prática desportiva de cada modalidade é regulada por uma norma internacional e regras impostas pelas Federações que consequentemente são aplicadas no Brasil mediando o aceite das entidades nacionais, como por exemplo a Confederação Brasileira de Futebol – CBF.

Portanto, quando se diz de legislação internacional, precisamos compreender em qual o cenário ela se aplicará, bem como, quais os entes fiscalizadores e reguladores e, qual a sua aplicabilidade nos demais países. O Brasil adota a legislação internacional tendo em vista a autonomia da vontade e a Lei Pelé que nos trouxe essa previsão.

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O Santos atual tem uma força que os livros não explicam

Meu interesse em estudar futebol sempre existiu. Mas se acentuou após a derrota catastrófica do Brasil para a Alemanha em 2014. Eu perdi de 7 a 1. Não foi só o time de Felipão. Eu como jornalista também fui derrotado. Ali no Mineirão todos que de um jeito ou de outro estão envolvidos nessa indústria futebolística brasileira tiveram um grande aviso de que o caminho traçado anteriormente deveria ser revisado.

Sei que o futebol é apaixonante por ter o seu caráter aleatório, imprevisível. Todo jogo por ser jogo carrega isso. Entretanto, por inúmeros fatores,só no futebol a ‘zebra’ aparece tantas vezes. Há inúmeros padrões que se repetem e que devem ser estudados, aprendidos e aprimorados, mas há alguns elementos que nem os mais estudiosos conseguem explicar. E isso vale não só para questões de dentro de campo como também para aspectos de gestão, governança e etc.

E o momento do Santos é um desses que a explicação lógica e racional não consegue embasar. O clube passa por uma situação delicada em sua política, com inúmeros problemas financeiros, banido pela FIFA de realizar novas contratações por não ter quitado dívidas recentes e mesmo assim os resultados dentro de campo são muito bons. A visão humana sobre o jogo nunca pode ser desconsiderada. Estamos tratando de seres humanos e cada um responde de uma maneira aos estímulos, sejam eles positivos ou negativos. E outra coisa que extrapola o entendimento técnico é a formação de grupo, nas suas mais poderosas entranhas, que faz também com que o todo seja maior do que a soma das partes. O atual momento do Santos é uma grande lição a todos que acreditam que só o estudo responde a todas as perguntas do jogo. 

*As opiniões dos nossos autores parceiros não refletem, necessariamente, a visão da Universidade do Futebol

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Política Antidoping – Repercussões no Futebol

A precoce morte de Diego Maradona, um dos maiores jogadores de futebol de todos os tempos, chocou o mundo. O jogador argentino faleceu na última quarta-feira, 25/11/2020, de parada cardiorrespiratória.

A morte do jogador nos faz refletir sobre a sua vida pregressa e seu problema com substâncias entorpecentes. Não é segredo para ninguém que durante a maior parte de sua vida, Maradona enfrentou a dependência química e seus reflexos, o que influenciou e prejudicou diretamente na sua carreira como jogador de futebol, inobstante o seu talento nato.

Em 1991, Maradona foi o centro de um dos maiores escândalos da história do esporte. Em uma partida do Napoli, o jogador testou positivo para cocaína, sendo inclusive condenado a prisão.

No entanto, Maradona pagou somente uma multa e retornou para a Argentina, onde foi detido. Após 15 meses de suspensão, o jogador voltou aos campos para temporada 1992/1993, oportunidade em que marcou 08 gols em 29 jogos.

Na Copa do Mundo de 94, Maradona participou de 02 partidas, sendo que na última, foi escalado para o exame antidoping, no qual testou positivo para efedrina. Diante do resultado do exame, Maradona foi suspenso por mais 15 meses, tendo encerrado sua carreira 03 anos depois, envolto em mais uma polêmica envolvendo o exame antidoping.

Como se sabe, Maradona não foi o primeiro e nem será o último jogador a ter problemas com drogas. Ressalta-se que há inúmeros relatos de jogadores que foram/são viciados em substâncias entorpecentes, tendo alguns superado a doença e outros não.

Considerando que muitos jogadores consomem substâncias entorpecentes, seja por problemas pessoais ou pela própria pressão de querer ser o melhor em sua profissão, é de suma importância o programa antidoping criado pela FIFA e CBF.

A FIFA introduziu controles regulares de doping em 1970 para assegurar que os resultados dos jogos nas competições fossem o reflexo justo e exclusivo da força dos atletas.

Em 2009, a FIFA aceitou o Código Mundial Antidoping, implementando algumas disposições que eram aplicáveis no regulamento antidoping.

O conceito de doping, conforme definição da Conferência Internacional de Lauzane seria, “Uso de um método ou meio (substância química ou artifício) que possa ser potencialmente prejudicial à saúde dos atletas, capaz de incrementar seu desempenho, e que resulta na presença de substância listada e proibida pelos órgãos organizadores da competição ou na evidência do uso de um método proibido no corpo do atleta”.

Também é considerado doping o uso de métodos ilícitos de atitudes ou comportamentos de atletas, técnicos, médicos, dirigentes e/ou equipes participantes da competição.

A fim de obstar o uso ilícito de drogas, a CBF introduziu o Controle de Doping nos Campeonatos de Futebol, tendo como objetivo precípuo promover condições de igualdade para as equipes e atletas participantes, da mesma forma assegurar a proteção da integridade física e psicoemocional dos atletas e respeito à ética desportiva.

Além dos mecanismos criados pela CBF, é imprescindível que o próprio atleta tenha a responsabilidade de não ingerir nenhuma substância ilícita, sob pena das sanções administrativas e contratuais, bem como de prejudicar a sua saúde e reputação.

Hoje, no Brasil, caso seja constatado o uso de alguma substância ilícita no exame de doping, o jogador será julgado pela Justiça Desportiva Antidopagem, composta por um Tribunal e uma Procuradoria, podendo sofrer penalidades.

A Agência Mundial Antidoping alterou recentemente seu Código Disciplinar. A partir de 2021, não punirá mais atletas por uso de drogas sociais, como maconha e cocaína. No entanto, será necessária a comprovação pelo jogador que a utilização de tais substâncias não teve como finalidade obter alta performance.

Segundo a Agência Mundial, o intuito da alteração foi a preocupação com a saúde do atleta, sendo certo que a mera sanção esportiva, como por exemplo, a suspensão, não resolveria o seu problema com o vício e o afastaria dos campos e quadras.

Tem-se que a nova regra possui uma visão mais ampla acerca do consumo de drogas pelos jogadores, passando a dar mais atenção à sua saúde e o enfrentamento ao vício, em detrimento das severas penalidades, as quais somente dificultavam o retorno dos atletas às suas atividades. 

O consumo de drogas vai além de uma mera punição, devendo ser tratado como um assunto de saúde pública. De certo, criando políticas para o combate e prevenção ao consumo de substância entorpecentes, haveria o tratamento do problema como um todo e desde a sua origem. 

A verdade é que se um jogador tem problemas com dependência química e passa por severas punições, como as que o Maradona sofreu, este pode se entregar de vez ao vício, se afastando do esporte e de qualquer chance de melhora.

Talvez, caso houvesse tais regras na época do craque Maradona, este poderia ter vencido o seu vício e nos agraciado com o seu futebol arte e não encerrado sua carreira de forma tão polêmica e precoce.