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Os dilemas de Vitor Pereira no Corinthians

Crédito imagem: Divulgação/Timão Web

Estou muito curioso para acompanhar a evolução do trabalho do português Vitor Pereira à frente do Corinthians. O desafio de todo treinador quando chega em um novo clube é diminuir a distância e ser assertivo entre o que “quer fazer” e o que “dá pra fazer”. É claro que o técnico estrangeiro tem um empoderamento maior no ambiente. Digamos que inovar é um pouco mais fácil  para um profissional que vem de fora do que para um “doméstico”. Porém em alguma intensidade a ruptura com Vitor Pereira irá acontecer, já que o que ele pensa de futebol está muito distante do que vem sendo feito, salvo alguns curtos períodos, há mais de uma década no Corinthians.

A equipe de Parque São Jorge foi vitoriosa com Tite, Mano Menezes e Fábio Carille tendo uma ideia macro muito semelhante. Claro que algumas particularidades eram específicas de cada time, já que jogadores diferentes geram conexões também diferentes. Mas podíamos identificar padrões muito claros que permaneciam ao longo dos anos. Por exemplo, o bloco defensivo variando do médio para o baixo, a linha defensiva sempre com quatro jogadores tanto para defender como para atacar numa construção bem sustentada. Para atacar, e na própria transição ofensiva, a ideia prioritária era o passe vertical, tentando chegar ao gol adversário com poucos toques. Na transição defensiva, uma busca imediata pela recuperação da posse, porém após alguns segundos já uma recomposição da organização defensiva. 

Agora, Vitor Pereira demonstra gostar de outros mecanismos, como a saída de bola com três e não quatro jogadores, o goleiro participando da construção e jogando adiantado para fazer coberturas, já que o bloco de marcação também fica adiantado. Para atacar, jogadores bem abertos dando amplitude, buscando sempre triângulos, mesmo que isso gere passes para o lado e para trás várias vezes. E para executar essas ideias o grande dilema será a escolha dos jogadores. Cássio será esse goleiro que joga com os pés e fica adiantado fazendo coberturas? Gil terá velocidade para acompanhar os atacantes adversários quando vier uma bola longa? Fagner conseguirá jogar por dentro tendo outro jogador aberto pela direita?

É esse tipo de questionamento que será respondido com a sequência de jogos… entretanto a questão central para Vitor será ter o máximo de eficácia com o mínimo de atrito entre o que ele quer fazer e o que de fato dará para fazer.

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Táticas no futebol: por que devemos pensar além delas?

É comum, hoje em dia, ouvirmos algumas discussões, supostamente sobre tática no futebol brasileiro se prendendo aos números envolvidos nos esquemas de jogo: o 1-5-4-1 seria defensivo demais, ou o 1-4-2-4 superofensivo — sim, colocamos o primeiro “1” fazendo referência ao goleiro, por isso não fico espantado quando Jorge Sampaoli pedia no Santos um arqueiro que saiba jogar com os pés.

Sistema de jogo: táticas no futebol são importantes, mas não são tudo

Acredito na ideia do “futebol total”: com a bola, todos atacam, inclusive o goleiro. E sem ela todos defendem, incluindo o centroavante.

Eu amo a tática no futebol e adoro estudá-la. Quanto mais conheço e observo, mais quero aprender. Sei, porém, que ela por si só não traz todas as respostas para os complexos problemas que um jogo de futebol apresenta.

É claro que uma equipe com um jogo minimamente elaborado terá referências coletivas de ataque, defesa e transições. Mas haverá também decisões que serão novas, exclusivas dos jogadores, que poderão fazer a diferença para o cumprimento da lógica do jogo.

É necessário analisar além da formação tática

O que quero dizer aqui é que a análise deve ser muito mais ampla do que o esquema tático do futebol. Até porque ele é circunstancial.

Uma equipe pode se defender com duas linhas de quatro e atacar com uma linha ofensiva de cinco jogadores, dependendo da altura que os laterais e os meias ocupam.

Além disso, por conta das características únicas de cada jogador, da sinergia e dos elos que se formam, toda a equipe terá suas características únicas. Ou alguém duvida que um 1-4-3-3 com Messi de falso 9 é diferente do mesmo 1-4-3-3, tendo Diego Costa como centroavante?

Não quero aqui tirar o peso da tática no futebol na análise. Pelo contrário. Colocar os óculos dos princípios e subprincípios ofensivos e defensivos para tirar padrões de comportamento de um time é superválido.

Mas esses mesmos óculos precisam ser calibrados: se não abrirmos os nossos olhos para a complexidade de um jogo de futebol, continuaremos míopes para entender por que uma equipe ou ganhou ou perdeu, mesmo usando esses óculos.

Quer aprender mais as táticas no futebol, novas estratégias e os princípios de defesa e ataque?

O curso Tática no Futebol da Universidade do Futebol apresenta de forma didática e bem fundamentada todos os conceitos relacionados à estratégia e ao modelo de jogo.

São 4 módulos divididos em 14 aulas com diversos exemplos reais de jogo, a fim de ampliar o seu olhar para o futebol.

Para mais informações, entre em contato conosco.

Gostou deste artigo sobre táticas no futebol? Então, confira outros títulos em nosso blog:

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Tokenização em campo – Novos horizontes das transações no futebol

Diante de um cenário repleto de instabilidade e mudanças repentinas, o universo do futebol, cerne do entretenimento brasileiro (e mundial), se viu diante de uma crise com impactos significativos para a receita de diversos clubes esportivos em todo o mundo, abrindo as portas para novas oportunidades e modalidades no âmbito das transações financeiras.

Desde 2019, alguns clubes têm estudado novas possibilidades de rentabilizar as transmissões esportivas e, agora, diante da crise do coronavírus que se estende há mais de um ano, o mundo das criptomoedas e das transações de ativos digitais já se tornou realidade. Em janeiro, tivemos a primeira transação em criptomoedas envolvendo um jogador do futebol de elite – David Barral, do DUX Internacional de Madrid.

Em outros clubes europeus, as transações envolvendo ativos digitais ganhou destaque com a criação de um aplicativo chamado Fan Token. Sem promessas de retorno financeiro, o aplicativo comercializa ativos que permitem os torcedores a escolherem uniformes de equipe, músicas do estádio, acesso exclusivo ao banco de reservas e outros benefícios indiretos, que se tornam atrativos pela paixão da torcida. Alguns dos times que aderiram à nova modalidade de transações digitais foram Paris Saint-Germain, Juventus, Roma e Atlético de Madrid.

No Brasil, os ativos digitais já se tornaram uma realidade no Vasco da Gama, que lançou o Vasco Token. A partir dele, os sócios que investirem no ativo adquirem direitos de crédito do clube referentes ao mecanismo de solidariedade, que remunera os clubes pela formação dos atletas de base. Assim, cada vez que um jogador da base é transferido, o clube comprador paga o mecanismo de solidariedade e o valor é distribuído aos detentores dos tokens.

No cenário de crise, a proposta de venda dos tokens, que sustenta um sistema ganha-ganha entre clube e torcedores, serviu para angariar mais de R$ 10 milhões em ativos comercializados. Esse valor, que será destinado pelo Vasco para pagamento de salários, virá como retorno a médio-longo prazo para os torcedores que, sem poder comparecer aos estádios, podem ajudar o clube do coração neste momento complicado.

A ideia, que contou com o apoio de uma das gigantes do mercado de criptomoedas, pode ser aplicada por outros clubes, já que foi bem aceita pelos torcedores como investimento de grande potencial – as transações internacionais geralmente são feitas em euro ou em dólar, e o câmbio para a moeda brasileira garante um ganho significativo para os investidores

Apesar de haver um risco de não haver rentabilidade a partir do mecanismo de solidariedade – se, por exemplo, o atleta tiver seu contrato encerrado ou optar por seguir a carreira toda em um mesmo clube e não haja valores de transação para compensar o investimento, o universo do futebol oferece uma série de possibilidades para Tokenização: ingressos, mercadorias e, inclusive, transmissões esportivas, que já estão sendo rentabilizadas de outras formas.

Essas possibilidades são potencializadas através da tecnologia, que garante um avanço exponencial e maximizadas pelo contexto da pandemia ocasionada pela covid-19. Diante deste cenário, os clubes buscaram diversas formas de se rentabilizar, seja abrindo transmissões de seus treinamentos, viagens, bastidores, buscando alimentar os caixas dos clubes, afetados pela ausência do público nos estádios. Em paralelo a isso, um estudo da Binance Research, apontou um crescimento das criptomoedas de 2.300% em 2021 com valor investido na casa dos US$ 40 bilhões, o que torna este novo horizonte ainda mais atrativo para esse nicho.

O Vasco espera arrecadar de cerca de 50 milhões de reais, através da Exchange. Se virtualmente, blockchain e criptomoedas ainda geram muitas dificuldades de materialização, na vida real, 50 milhões de reais soam como algo bem palpável.

Aguardemos as cenas dos próximos [e exponenciais] capítulos.

Glossário:

CRIPTOMOEDA – é um meio de troca que utiliza da tecnologia de Blockchain e da criptografia para assegurar a validade das transações e a criação de novas unidades da moeda.

BITCOIN – É a mais famosa de todas as criptomoedas. Atualmente, um bitcoin vale cerca de R$ 320 mil reais.

TOKEN – Tokens são ativos digitais que representam uma parcela de um ativo real. Por exemplo, caso uma loja seja Tokenização, quem adquirir um token da loja irá obter lucro sob o lucro da loja.

BLOCKCHAIN – De forma resumida, blockchain é um sistema que registra e permite rastrear o envio e recebimento de informações pela internet, e é esse sistema que, assim como um livro de contabilidade não alterável, permite o controle das transações envolvendo criptomoedas.

MINERAÇÃO DE DADOS – É o ato de realizar cálculos matemáticos. Quando um computador realiza esse cálculo criptográfico ele recebe uma recompensa em bitcoins. Dizemos que ele está minerando e permitindo que surjam mais Bitcoins.

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A perda de capacidade da trabalho e as consequências jurídicas no futebol

Crédito imagem: Site Santos FC

Nesta segunda semana de março, um dos assuntos mais comentados no cenário futebolístico, foi o estado de saúde do jovem Raniel, o qual está afastado dos gramados há 05 meses e sem qualquer previsão de retorno.

O atacante Raniel contraiu o novo coronavírus em setembro de 2020. Após a sua recuperação da COVID 19, Raniel viajou para o Paraguai, para participar do jogo contra o Olímpia, tendo retornado sem nenhuma dor. No entanto, no dia seguinte da viagem, Raniel apresentou muita dor na panturrilha direta, sendo constatada a patologia trombose venosa.

Destaca-se que há inúmeras discussões médicas se o fenômeno tromboembólico acima mencionado está relacionado ou não à COVID 19, mas, até a presente data, tal questionamento permanece sem resposta.

Raniel se submeteu a cirurgia para tratamento da trombose venosa aguda na perna direita. Ocorre que, após a cirurgia, o atleta foi acometido pelo encurtamento no tendão de Aquiles, podendo inclusive passar por outra intervenção cirúrgica.

Pois bem.

A situação do Raniel traz à tona debates importantes para o Direito do Trabalho e Previdenciário Desportivo, notadamente no que tange aos direitos dos atletas que são acometidos por doenças, ocupacionais ou não, e ficam impossibilitados de prestarem seus serviços, ou seja, jogar futebol.

A Lei Pelé, em seu art. 45, prevê a obrigação do clube em contratar seguro de vida e de acidentes pessoais, vinculado à atividade desportiva, para os atletas profissionais, almejando cobrir os riscos que estes estão sujeitos. Tal dispositivo legal dispõe, ainda, que a indenização securitária deve corresponder, no mínimo, ao valor anual da remuneração pactuada.

Assim, nos termos da Lei Pelé, o jogador possui o direito à um seguro, o qual lhe garantirá indenização, caso ocorra algum acidente relacionado à atividade desportiva, independente se a lesão for temporária ou definitiva.

Ademais, a Lei Pelé determina que o clube é responsável pelas despesas médicas e de medicamentos ao restabelecimento do atleta, enquanto a seguradora não fizer o pagamento da indenização.

No caso do Raniel, por exemplo, caso seja comprovado que este contraiu COVID 19 no seu ambiente de trabalho e que suas complicações decorreram do novo coronavírus, este terá direito ao recebimento de indenização securitária.

Além do seguro acima mencionado, aplica-se ao atleta profissional as normas gerais da legislação trabalhista e da seguridade social, ressalvadas as peculiaridades da Lei Pelé.

Desta feita, em caso de incapacidade do atleta profissional, este pode ser afastado pelo INSS, percebendo o benefício previdenciário correspondente à sua situação, auxílio-doença comum ou acidentário. Salienta-se que, para recebimento do auxílio-doença comum, o jogador deve comprovar a sua situação de segurado e o período de contribuição mínimo de 12 meses.

Destaca-se, por oportuno, que enquanto o atleta estiver em gozo do benefício previdenciário, o contrato de trabalho estará suspenso, sendo, inclusive, vedado, em regra, o seu encerramento.

Outro questionamento que surge é se o atleta profissional possui estabilidade, em caso de doença ocupacional ou acidente de trabalho. O Tribunal Superior do Trabalho, em recente julgamento (Ag 10173-68.2016.5.18.0011), entendeu que o atleta possui direito à estabilidade provisória ao emprego, em caso de doença ocupacional ou acidente de trabalho, mesmo que seu contrato de trabalho seja determinado e ainda que não tenha ocorrido o seu afastamento previdenciário.

Isso porque, embora o afastamento previdenciário seja um requisito para a concessão da estabilidade provisória, segundo o TST, o clube pode arcar com a remuneração dos atletas durante o seu período de convalescença, sem que estes sejam encaminhados ao INSS, para que não seja caracterizada a garantia ao emprego.

Assim, diante de tal situação, o TST entendeu ser desnecessário o afastamento previdenciário para a concessão da estabilidade provisória.

Em que pese o entendimento do TST acima mencionado, tem-se que não há um consenso na jurisprudência. Há decisões que afirmam que a estabilidade provisória decorrente de doença ocupacional ou acidente de trabalho é incompatível com o contrato especial de trabalho do atleta profissional, por este ter prazo determinado. Outrossim, entendem que o seguro previsto na Lei Pelé se equivale à garantia de emprego prevista no art. 118 da Lei 8.213/91.

O entendimento acima mencionado foi da Nona Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região, nos autos da reclamatória trabalhista distribuída sob o nº 0010561-61.2020.5.03.0006, na qual contendem Lucas Thiago Revuela Billewicz e América Futebol Clube.

Assim, sem ter o objetivo de esgotar o tema, o qual se sabe é muito rico e polêmico, deixa-se aqui as principais consequências jurídicas de eventual incapacidade laborativa do jogador de futebol.

Por fim, estimo melhoras ao Raniel, para que este retorne logo aos gramados, sendo certo que este possui uma brilhante carreira pela frente.

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Clube empresa – A miragem que se aproxima

Via de regra, as situações financeiras dos clubes no cenário nacional não são favoráveis. Em sua grande maioria, para o desenvolvimento de suas atividades, os clubes dependem de patrocinadores, investidores, e até mesmo da anistia por parte do governo.

Neste sentido, uma das esperanças para o desenvolvimento econômico-financeiro almejada é a sistemática do clube-empresa, muito explorado no exterior e, não tão explorada em terras tupiniquins, uma vez que a legislação nacional impõe implicações severas àqueles clubes optantes da modalidade.

Todavia, o cenário tende a mudar, pois, com a recente eleição do Senador mineiro Rodrigo Pacheco, autor do Projeto de Lei nº 5516/2019 que tramita perante a câmara, tem por finalidade a criação de Sociedades Anônimas do Futebol (SAF), basicamente, uma S.A. específica para a modalidade do esporte, voltando a pauta com força total!

Em grave crise financeira e pelo segundo ano consecutivo na Série B do Campeonato Brasileiro pela frente, o Cruzeiro Esporte clube contratou uma empresa de auditoria (Ernst & Young) para dar início aos estudos sobre o plano de recuperação do clube, que se passa pela transição para se tornar um clube-empresa.

Desde o final de 2020, o projeto vem sendo discutido internamente, para isso, foi criado um grupo de estudos internos liderado por Sandro González, CEO do clube, sendo acompanhado de perto pelo presidente e outros nomes de peso dentro do clube.

Outros clubes também se movimentam para adequar as exigências propostas pelo projeto apresentado pelo Presidente do Senado, nesta mesma linha, o Botafogo e América já traçaram estratégias para essa implementação.

Segundo estudos da EY sobre o modelo de negócio, nas últimas duas décadas, o cenário internacional mostra que os clubes-empresas tiveram aumento significativo em suas receitas.

Se nos anos 1990 esse valor chegava a pouco mais de 600 milhões de euros, hoje varia entre 1,9 e 5,8 bilhões de euros. O estudo aponta, ainda, que, na primeira divisão das cinco maiores ligas do futebol europeu, 92% dos clubes são empresas, enquanto na segunda divisão esse percentual é de 96%.

Com exceção da Inglaterra, os proprietários dos clubes são predominantemente empresários nacionais – 58% com alguma ligação pessoal com o clube ou são empresários da região –, enquanto 33% dos clubes que constituídos como empresas são controlados por estrangeiros, sendo 44% investidores americanos ou chineses.

Os números apresentados saltam aos olhos, por esse motivo, os clubes buscam a solução para endividamento e pela falta de investimento e retorno financeiro. A cada dia a ilusão do clube-empresa vem ganhando mais forma e deixando de ser uma hipótese para se tornar uma realidade.

*As opiniões dos nossos autores parceiros não refletem, necessariamente, a visão da Universidade do Futebol  

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O acesso dos clubes de futebol na justiça comum, é possível?

Nos últimos anos, temos visto vários clubes de futebol brasileiros travarem embates com a justiça desportiva.

O mais conhecido deles, talvez aquele que fez com que os clubes dessem maior importância à sua área jurídica, pode ser considerado o caso da reviravolta no rebaixamento para a série B do Campeonato Brasileiro de Futebol, em 2013, protagonizado pelo Fluminense Football Club (“Fluminense”), do Rio de Janeiro, o qual acabou se salvando na via judicial.

Este acontecimento se deveu a um erro da Associação Portuguesa de Desportos (“Portuguesa”), que, por conta de um jogador escalado irregularmente, conforme decidido pela justiça desportiva, perdeu alguns pontos, assumindo assim o lugar do clube carioca na zona de rebaixamento do campeonato.

Ainda no Campeonato Brasileiro de 2013, pode-se revisitar outros casos de relevância, que não tiveram desfechos tão positivos para os requerentes, quando dois clubes brasileiros passaram por punições severas por situações inusitadas.

Ocorre que a Associação Desportiva Recreativa Cultural Icasa (“Icasa”) e o Botafogo Futebol Clube (“Botafogo – PB”) foram excluídos das Séries B e C do Campeonato, respectivamente, por acionarem a Justiça Comum, no lugar da Justiça Desportiva.

O Icasa, motivado justamente pelo fato de Fluminense ter se mantido na série A do Campeonato, conforme mencionado acima, após esgotadas as instâncias na Justiça Desportiva, decidiu recorrer à Justiça Comum, solicitando sua vaga na Série A, alegando a escalação irregular de um jogador do Figueirense Futebol Clube, de forma análoga ao realizado pelo Fluminense, em partida da Série B ocorrida no ano de 2013. Sem sucesso.

Já o Botafogo-PB, teve sua exclusão motivada por ter se valido de uma ação judicial de um vereador para jogar em seu estádio, que fora interditado pelo STJD.

Assim, após os supracitados acontecimentos, um assunto começou a pairar nos programas esportivos e ser amplamente debatido dentre a sociedade civil.

Afinal, os times de futebol podem ou não recorrer à Justiça Comum? Aos conhecedores do direito, a resposta para essa pergunta parece simples: Não. Isso porque a Justiça Comum não tem competência para julgar o mérito das decisões da Justiça Desportiva.

A Federação Internacional de Futebol (“FIFA”), após os acontecimentos mencionados, emitiu uma nota, alertando os clubes brasileiros que não toleraria o uso da Justiça Comum para resolução de questões esportivas.

Nos casos analisados, a instituição considerou as questões discutidas como problema interno, passível de resolução tão somente por autoridades competentes à Confederação Brasileira de Futebol (“CBF”), e, caso se esgotem os recursos na Justiça Desportiva do país, a única via possível a novo recurso seria a Corte Arbitral do Esporte, na Suíça, conforme o Art. 66 do Estatuto da FIFA.

Também no Estatuto da entidade, em seu Art. 68, é prevista a proibição do uso da Justiça Comum para a resolução de conflitos esportivos, podendo esta opção ser aceita somente para casos específicos avaliados e autorizados pela própria FIFA.

Contudo, fato é que podem existir argumentos contrários a tais decisões, como, por exemplo, a ideia de que as mesmas seriam inconstitucionais, eis que seguindo a interpretação do Art. 217 da Constituição Federal, em seu §1º, tem-se a conclusão de que o Estado pode interferir em decisões relativas às competições esportivas.

Ademais, cabe relembrar as várias denúncias de corrupção já ocorridas contra a CBF, algumas sendo provadas, levando, inclusive, ao banimento do futebol, pela FIFA, do ex-presidente da confederação, além do famoso caso da “Máfia do Apito”, em que ocorria a manipulação de resultados no futebol brasileiro.

Tais situações geram uma série de incertezas sobre a índole e funcionamento do órgão máximo do futebol brasileiro.

Por outro lado, permitir que a Justiça Comum interfira no mérito das decisões do tribunal desportivo, poderia ser visto como diminuição e negação dos motivos que levaram à criação de uma legislação própria para o esporte.

Nesse sentido, restou-se cediço que os únicos casos em que a Justiça Comum intervirá em decisões da Justiça Desportiva, serão aqueles considerados extremos, em que as decisões lesem ou ameacem o direito de forma ampla. Neste aspecto, nas palavras do autor Luiz Antônio Grisard: “A Justiça Desportiva é a instância não judiciária, constitucional e legalmente instituída para dirimir os conflitos de interesse que se situem entro de seus limites de competência”.

A chamada Lei Pelé (Lei 9615/98), ainda, cuidou de regrar e enfatizar ainda mais este ponto. Em seu artigo 50, ela afirma que o processo e julgamento das infrações disciplinares das competições devem ser definidos de única e exclusivamente em Códigos de Justiça Desportiva.

Assim, pode-se chegar na conclusão de que, apesar de amplas discussões e polêmicas, o assunto encontra-se bem regrado pela legislação desportiva brasileira e pela legislação da FIFA. E, portanto, resta-se pacificado que a Justiça Comum só poderá intervir em casos de violação ao direito e em casos já avaliados previamente pela FIFA, devendo os casos envolvendo o futebol ser, à priori, encaminhados à Justiça Desportiva.

*Em coautoria com Fábio Gonçalves Soares, membro da equipe societária do escritório Lacerda Diniz e Sena.

*As opiniões dos nossos autores parceiros não refletem, necessariamente, a visão da Universidade do Futebol 

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Governança Corporativa – Parte l

Crédito imagem – Cesar Greco/Palmeiras

Elaborado por: Diego Mello com a colaboração de Alessandro Langone e Marcelo Moraes.

Empresas existem para gerar valor a seus acionistas. Mais especificamente, a criação de riqueza através da operação dos mais distintos negócios é, há séculos, o objetivo primordial de sociedades empresárias em todo o mundo. É chamado de Governança Corporativa o conjunto de mecanismos e práticas criados para otimizar o desempenho de uma companhia e garantir aos provedores de capital retorno sobre seus investimentos. As práticas de Governança portanto representam o modo pelo qual as empresas são dirigidas e controladas, a fim de preservar e otimizar seu valor.

Como aplicar esses conceitos ao contexto do futebol brasileiro no qual, para a grande maioria dos clubes, constituídos como associações civis sem fins lucrativos, a criação de valor não está diretamente relacionada à obtenção de lucros? Quais os principais elementos do sistema de Governança de empresas privadas e clubes do exterior aplicáveis a nossos clubes e até que ponto tais práticas contribuem para que eles se beneficiem dos recursos públicos e privados agregados à cadeia de valor da indústria esportiva? Quais os dispositivos legais já existentes sobre o tema e de que forma as mudanças advindas do Fair Play Financeiro proposto pela CBF e da Lei do clube-empresa tramitando no Congresso Nacional poderão contribuir para, definitivamente, alçar a criação de valor ao cerne do processo decisório? 

Essas serão as principais questões abordadas nessa série de textos sobre Governança Corporativa no futebol preparada em parceria com a Universidade do Futebol. O desenvolvimento do futebol brasileiro como indústria passa necessariamente pela reflexão sobre a forma pela qual nossos clubes, federações e a CBF se organizam e são geridos, independentemente de sua natureza jurídica, e sobre o papel das diferentes partes interessadas (stakeholders) na construção de um ambiente de negócios favorável não apenas aos interesses de associados ou acionistas como também à longevidade das organizações.

Governança Corporativa no futebol – uma breve perspectiva histórica

A importância da Governança Corporativa no esporte deriva da sua relevância em empresas dos mais diferentes setores. As discussões sobre o tema adquiriram importante conotação mediante a deflagração na primeira década do século XXI de escândalos de corrupção em grandes empresas multinacionais nos Estados Unidos. Tornava-se latente a partir de então a necessidade por um sistema capaz de minimizar os inevitáveis conflitos de interesse entre os detentores de capital, donos das empresas, e os dirigentes por eles contratados para geri-las. Relatórios, guias, cartilhas e leis foram então elaborados para fundamentar princípios essenciais de ética e transparência aos negócios, disseminando a necessidade por práticas honestas e responsáveis na gestão das organizações. A partir desse mesmo período a matéria evoluiu também no Brasil como decorrência, não por acaso, do processo de abertura econômica e privatizações que estimulou a chegada ao país de empresas internacionais. 

Particularmente no cenário esportivo nacional o advento da discussão sobre Governança para clubes de Futebol teve como um dos mais importantes marcos a publicação da Lei Zico (Lei nº 8.672/1993), em 1993. Somente a partir de então inclui-se no arcabouço legal sobre o esporte elemento relacionado à organização de entidades esportivas como empresas, estabelecendo-se assim previsão legal para um modelo de gerência esportiva ainda incipiente.

Instituídos em momentos históricos bastante distintos aos de 1993, os dispositivos legais anteriores à Lei Zico que estabeleceram as bases de organização do desporto no Brasil, como o Decreto-Lei nº 3.199/194, primeira lei esportiva oficial do país, e a Lei nº 6.251/1975, refletiam, de forma clara, a intenção do Estado em manter controle sobre o funcionamento do esporte. Com efeito, apesar de relevantes para incentivo e regulamentação das práticas esportivas tais dispositivos pouco favoreceram para fomentar discussões sobre a Governança de associações esportivas na medida em que representaram, em última análise, mecanismos para reforçar a tutela do Governo sobre o esporte. A baixa autonomia conferida às entidades para decidirem sobre sua própria estruturação interna fica evidenciada nos artigos transcritos a seguir do Capítulo IX do Decreto-Lei nº 3.199/1941:

“Art. 48. A entidade desportiva exerce uma função de caráter patriótico. É proibido a organização e funcionamento de entidade desportiva, de que resulte lucro para os que nela empreguem capitais sob qualquer forma.

(…)

Art. 50. As funções de direção das entidades desportivas não poderão ser, de nenhum modo, remuneradas.

Art. 51. As diretorias das entidades desportivas serão compostas de brasileiros natos ou naturalizados; os seus conselhos deverão constituir-se de dois terços de brasileiros natos ou naturalizados pelo menos.

Parágrafo único. Poderá o Conselho Nacional de Desportos abrir exceção para o estrangeiro radicado no país, com relevantes serviços prestados à comunidade brasileira em geral ou aos desportos nacionais em particular.”

O paternalismo estatal e a subordinação das entidades esportivas ao Governo àquela época estavam também expressos nas formas previstas em Lei para intervenção e controle do poder público sobre as práticas esportivas, inclusive no que concerne a fiscalização da aplicação dos recursos financeiros das entidades esportivas, conforme corroborado pelos artigos 3º e 9º do mesmo Decreto:

“Art. 3º Compete precipuamente ao Conselho Nacional de Desportos:

a) estudar e promover medidas que tenham por objetivo assegurar uma conveniente e constante disciplina à organização e à administração das associações e demais entidades desportivas do país, bem como tornar os desportos, cada vez mais, um eficiente processo de educação física e espiritual da juventude e uma alta expressão da cultura e da energia nacionais;

b) incentivar, por todos os meios, o desenvolvimento do amadorismo, como prática de desportos educativa por excelência, e ao mesmo tempo exercer rigorosa vigilância sobre o profissionalismo, com o objetivo de mantê-lo dentro de princípios de estrita moralidade;

c) decidir quanto à participação de delegações dos desportos nacionais em jogos internacionais, ouvidas as competentes entidades de alta direção, e bem assim fiscalizar a constituição das mesmas;

d) estudar a situação das entidades desportivas existentes no país para o fim de opinar quanto às subvenções que lhes devam ser concedidas pelo Governo Federal, e ainda fiscalizar a aplicação dessas subvenções.

(…)

Art. 9º A administração de cada ramo desportivo, ou de cada grupo de ramos desportivos reunidos por conveniência de ordem técnica ou financeira, far-se-á, sob a alta superintendência do Conselho Nacional de Desportos, nos termos do presente decreto-lei, pelas confederações, federações, ligas e associações desportivas.”

Da mesma maneira, já na década de 1970, foi expresso de forma inequívoca nos artigos 8º, 17 e 18 da Lei 6.251/1975 o controle absoluto pretendido pelo poder público na gestão e financiamento do setor esportivo no país:

“Art. 8º O apoio financeiro da União somente será concedido a entidades que observarem as disposições desta Lei e de seu regulamento ou as normas expedidas por órgãos ou entidades competentes do Sistema Desportivo Nacional.”

(…)

Art. 17. Caberá ao Conselho Nacional de Desportos fixar os requisitos necessários à constituição, organização e funcionamento das confederações, federações, ligas e associações desportivas, ficando-Ihe reservado, ainda, aprovar os estatutos das confederações e federações e suas respectivas modificações.

Art. 18. Sob pena de nulidade, os estatutos das confederações, das federações e das ligas desportivas, obedecerão ao sistema de voto unitário na representação das filiadas em quaisquer reuniões dos seus poderes.

§ 1º O Conselho Nacional de Desportos padronizará o sistema de votação nos estatutos das confederações, federações e ligas desportivas.

§ 2º As confederações, federações e ligas desportivas terão, a partir da publicação do decreto de regulamentação desta lei, o prazo máximo, improrrogável, de 90 (noventa) dias para adaptarem os seus Estatutos ao presente artigo.”

Não obstante, ainda que de forma sucinta e pouco específica, os contornos a respeito de maior relevância na participação da iniciativa privada no esporte, em complemento ao incentivo estatal, passaram a ser delineados no artigo 4º dessa mesma Lei, segundo o qual: 

“Art. 4º Observadas as disposições legais, a organização para a prática dos desportos será livre à iniciativa privada, que merecerá o amparo técnico e financeiro dos Poderes Públicos.”

O que então pensava-se representar a modernização definitiva do arcabouço legal a respeito da Governança no esporte, entretanto, foi verificada apenas em 1993 por meio da promulgação da Lei Zico. Dentre outros aspectos de significativa relevância para a gestão dos clubes de futebol, instituiu-se, como anteriormente citado, a possibilidade do gerenciamento do esporte através de empresas, em contraposição ao modelo associativo sem fins lucrativos então, e até hoje, vigente:

 “Art. 11. É facultado às entidades de prática e às entidades federais de administração de modalidade profissional, manter a gestão de suas atividades sob a responsabilidade de sociedade com fins lucrativos, desde que adotada uma das seguintes formas:

 I – Transformar-se em sociedade comercial com finalidade desportiva;

 II – Constituir sociedade comercial com finalidade desportiva, controlando a maioria de seu capital com direito a voto;

 III – Contratar sociedade comercial para gerir suas atividades desportivas.

Parágrafo único. As entidades a que se refere este artigo não poderão utilizar seus bens patrimoniais, desportivos ou sociais para integralizar sua parcela de capital ou oferecê-los como garantia, salvo com a concordância da maioria absoluta na assembleia geral dos associados e na conformidade dos respectivos estatutos.”

Os debates jurídicos acerca da personalidade jurídica dos clubes de futebol incitados pela Lei Zico adquiriram ainda maior importância pela promulgação da obrigatoriamente dos clubes tornarem-se empresas disposta no texto original da Lei Pelé (Lei nº 9.615/1998), de 1998:

“Art. 27. As atividades relacionadas a competições de atletas profissionais são privativas de:

I – Sociedades civis de fins econômicos;

II – Sociedades comerciais admitidas na legislação em vigor;

III – Entidades de prática desportiva que constituírem sociedade comercial para administração das atividades de que trata este artigo.

Parágrafo único. As entidades de que tratam os incisos I, II e III que infringirem qualquer dispositivo desta Lei terão suas atividades suspensas, enquanto perdurar a violação.”

A lógica havia sido portanto invertida: da proibição ao funcionamento de entidades esportivas direcionadas ao lucro, em 1941, à obrigatoriedade de sua constituição como sociedades com fins econômicos, em 1998, a legislação brasileira sobre Governança no esporte evoluiu como resposta às mudanças econômicas, políticas e sociais verificadas no período. Mas esse cenário durou pouco: em razão de controversas jurídicas acerca de sua constitucionalidade a alteração compulsória do modelo associativo estabelecida pela Lei Pelé foi posteriormente revogada, restaurando-se o cenário preconizado pela Lei Zico segundo o qual a conversão é opcional. Apesar disso o artigo da Lei Pelé que trata sobre esta matéria mantém no texto atualmente vigente de seu art. 27 a previsão legal de equiparação de clubes a empresas, particularmente no que concerne à responsabilização dos dirigentes esportivos prevista no Código Civil (Lei no 10.406/2002):

“Art. 27. As entidades de prática desportiva participantes de competições profissionais e as entidades de administração de desporto ou ligas em que se organizarem, independentemente da forma jurídica adotada, sujeitam os bens particulares de seus dirigentes ao disposto no art. 50 da Lei no 10.406, de 10 de janeiro de 2002, além das sanções e responsabilidades previstas no caput do art. 1.017 da Lei no 10.406, de 10 de janeiro de 2002, na hipótese de aplicarem créditos ou bens sociais da entidade desportiva em proveito próprio ou de terceiros.    

§ 11.  Os administradores de entidades desportivas profissionais respondem solidária e ilimitadamente pelos atos ilícitos praticados, de gestão temerária ou contrários ao previsto no contrato social ou estatuto, nos termos da Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002 – Código Civil.”    

Novas perspectivas – cuidado com o que deseja

A partir dessa contextualização histórica é possível compreender o panorama atual e os possíveis rumos para o nosso futebol a respeito das práticas de Governança Corporativa. Considerando-se que apenas a partir do início dos anos 1990, após quase um século do início da prática do futebol no país, os clubes passaram a dispor de autonomia legal para definirem sua forma de organização jurídica é de se esperar que seja longo e penoso o processo de ruptura com o cenário anterior de forte subordinação ao Estado e dependência de recursos públicos. Na medida em que se deparam com a possibilidade de abandonar o modelo associativo e buscar novas formas de financiamento de suas atividades, no entanto, as organizações automaticamente atraem para si maior compromisso com transparência, moralidade, impessoalidade, eficiência e outros temas inerentes a boas práticas de gestão. Seja para atender expectativas de parceiros comerciais, empregados ou órgãos dirigentes da indústria quanto ao uso consciente e efetivo dos instrumentos de Governança, ou mais especificamente para prestar contas a investidores ou acionistas, no caso daquelas constituídos como empresas, é ainda longo o caminho a ser percorrido pelas entidades esportivas na direção de um ambiente de plena confiança, credibilidade e ética nos negócios.

Apesar disso, no que pese o número ainda incipiente de clubes de futebol que formalmente constituíram-se como empresas no país, o notório aumento do nível de profissionalização verificado na última década na forma como nossos clubes e a própria CBF são geridos é indicativo da baixa tolerância do mercado em relação a práticas amadoras, antiéticas e pouco transparentes de gestão. Independentemente se em associações sem fins lucrativos ou em sociedades empresárias, anônimas ou limitadas, é crescente a percepção por parte de nossos dirigentes esportivos do dano ocasionado por irresponsabilidade e ineficiência administrativa e da forte relação causa-efeito existente entre as ações realizadas fora das quatro linhas com os resultados esportivos obtidos dentro delas.

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RAP – Paixão pelo futebol

Crédito imagem – Site oficial CBF

Vou mandar a real pra você, tá ligado?

Tem um esporte aí, que une amor e pecado

É fácil de perceber

A força que vem do gramado

E então compreender

Porque ele é tão amado

Mas não se iluda não

Você vai ganhar e perder

Um dia será campeão

Noutro irá perecer

Mas o que importa é a noção

De compreender

A magia do esporte Bretão

Que nos faz respirar, que nos faz viver

Espalhou-se mundo afora

E seja jogando, seja assistindo

É um sentimento que aflora

Seja chorando, seja sorrindo

E se me perguntarem agora

Que som é este que estamos ouvindo?

É a torcida lá fora

Para o estádio partindo.

Herança de pai para filho

Devoção 100%

Nunca será empecilho

Desfrutar o momento

Mas quando o “trem sai do trilho”

Causando dor, sofrimento

E a lágrima escorre do cílio

Sempre se tem um alento

E como um andarilho

Que caminha ao vento

O futebol tem um brilho

É paixão, sentimento!

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Responsabilidade Civil em eventos desportivos

Não é difícil perceber que o Brasil tem vocação e tradição para sediar grandes eventos esportivos. Nos últimos anos sediamos os Jogos Panamericanos de 2007, a Copa das Confederações de 2013, a Copa do Mundo de Futebol em 2014, os Jogos Olímpicos de 2016, Copa América de 2019, e a final da Copa Libertadores da América em 2021 além de outros eventos de menor porte, mas igualmente importantes para o calendário anual tanto voltado para o futebol quanto de outras modalidades esportivas.

Estes eventos como um todo exigem que o Poder Público, os organizadores e as empresas parceiras e patrocinadoras compreendam e se organizem para cooperar e empreender parcerias para que os grandes investimentos necessários para a realização destes eventos sejam viabilizados e os espetáculos aconteçam com maior frequência em nosso país e principalmente, com a segurança necessária para que imprevistos não ocorram.

Entretanto, é importante frisar que além de todas as questões esportivas e comerciais que envolvem a organização de grandes eventos como os acima citados, cabe aos organizadores se atentarem aos aspectos jurídicos, especialmente aqueles relacionados à responsabilidade civil em eventos Desportivos, um tema em constante desenvolvimento no Brasil, mas que ainda nos dias de hoje não tem espaço de debate suficiente considerando sua relevância e que tem como base o Código de Defesa do Consumidor, o Estatuto do Torcedor, o código civil de 2002, a Lei Pelé e a própria jurisprudência.

Em um breve histórico, lembramos que a responsabilidade civil no Brasil, quando ainda sob a vigência do Código Civil de 1916 era em regra subjetiva, ou seja, para ser caracterizado o dever de indenizar era necessário que a conduta que gerou o dano fosse, além de ilícita, culposa.

Passados os anos passou-se a dar maior atenção aquele que por exemplo tenha sofrido algum tipo de dano ou prejuízo em razão da má organização ou falta de segurança de algum evento desportivo, e com o advento do Código Civil de 2002 mudou-se o entendimento para responsabilidade objetiva do fornecedor que nada mais é do que a responsabilidade advinda da prática de um ato ilícito ou de uma violação ao direito.

Em que pese o assunto ser amplo suficiente para aprofundarmos, o objetivo do presente artigo é apresentar as principais legislações sobre responsabilidade civil em eventos desportivos, sem maiores detalhes sobre o tema e, trazendo ainda leve tendencia para os players envolvidos com futebol, mas deixando claro ao leitor que a legislação aqui trazida é também aplicável a eventos de outras modalidades desportivas.

Posto isso, ainda que aparentemente não tenham relação de proximidade, a Responsabilidade Civil em eventos esportivos está diretamente relacionada com o Direito do Consumidor o que nos traz a lembrança de que a responsabilidade civil em situações que envolvam litígios entre torcedor / participante de um evento e a entidade desportiva / organizador do evento será de natureza objetiva, não sendo, portanto, necessário fazer prova de culpa do organizador, com base na teoria do risco.

Ainda, em se tratando de evento desportivo, o Estatuto do Torcedor (Lei nº 10.671, de 15 de maio de 2003), em seu art. 3º equipara o termo “fornecedor” ao trazido no art. 14 do Código de Defesa do Consumidor de modo que nas relações de consumo existente entre o torcedor e a entidade desportiva a responsabilidade civil da entidade desportiva será em regra objetiva.

Art. 3º Estatuto do Torcedor – Para todos os efeitos legais, equiparam-se a fornecedor, nos termos da Lei nº 8.078, de 11 de setembro de 1990, a entidade responsável pela organização da competição, bem como a entidade de prática desportiva detentora do mando de jogo.”

“Art. 14. Código de Defesa do Consumidor – O fornecedor de serviços responde independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos.”

Dessa forma, os organizadores dos eventos desportivos, bem como as entidades desportivas detentora do mando de jogo (no caso do futebol) são considerados fornecedores, nos termos do art. 3º do código de defesa do consumidor:

Art. 3° Fornecedor é toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como os entes despersonalizados, que desenvolvem atividade de produção, montagem, criação, construção, transformação, importação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços.

Uma vez que os organizadores e detentores dos direitos dos eventos desportivos são considerados fornecedores, os torcedores serão considerados consumidores de modo que as relações que envolvam torcedor e entidade desportiva serão baseadas nas disposições trazidas pelo código de defesa do consumidor.

Este é o entendimento previsto nos art. 12 e 14 do Código de Defesa do Consumidor:

Art. 12. O fabricante, o produtor, o construtor, nacional ou estrangeiro, e o importador respondem, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos decorrentes de projeto, fabricação, construção, montagem, fórmulas, manipulação, apresentação ou acondicionamento de seus produtos, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua utilização e riscos.

Art. 14. O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos.

Perceba que a legislação que protege o torcedor em relação a responsabilidade civil é ampla, sendo que o Código Civil de 2002 traz em seus artigos 389 e 927 que haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos específicos em lei:

“Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.”

Art. 927. Aquele que, por ato ilícito, causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo.

Parágrafo único. “Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem.”

E a Lei Pelé, que em seu art. 42, § 3º trouxe para a justiça desportiva o mesmo entendimento já previsto no Código de Defesa do Consumidor, em seu art. 3º (acima citado), sobre o conceito de consumidor.

Art. 42. § 3º O espectador pagante, por qualquer meio, de espetáculo ou evento desportivo equipara-se, para todos os efeitos legais, ao consumidor, nos termos do art. 2º da Lei nº 8.078, de 11 de setembro de 1990.”

Por fim, citamos o art. 19 do Estatuto do Torcedor, que traz de forma clara e direta a responsabilidade objetiva no âmbito esportivo.

“Art. 19. As entidades responsáveis pela organização da competição, bem como seus dirigentes respondem solidariamente com as entidades de que trata o art. 15 e seus dirigentes, independentemente da existência de culpa, pelos prejuízos causados a torcedor que decorram de falhas de segurança nos estádios ou da inobservância do disposto neste capítulo.”

Portanto, o tema Responsabilidade civil é amplamente previsto na legislação desportiva havendo uma grande preocupação com o torcedor que comparado com consumidor nos termos do código de defesa do consumidor é considerado a parte hipossuficiente da relação e por isso temos atualmente a responsabilidade civil objetiva, presumindo-se a culpa do fornecedor (organizador do evento ou entidade desportiva) – responsabilidade objetiva, ou seja, havendo conflito, caberá a este último comprovar que não agiu com negligência, imperícia ou imprudência para não haver o dever de indenizar.

Dessa forma, o torcedor, ou qualquer indivíduo envolvido no evento esportivo que eventualmente tenha sofrido dano decorrente da falha na segurança do evento esportivo, em qualquer aspecto, poderá exigir justa indenização do organizador, incluisve do responsável pelo mando de jogo, que responderão de forma solidária ficando resguardado a estes o direito de regresso em sendo apurado o responsável pelo dano, ou conhecido aquele que tenha causado a situação de conflito e insegurança.

Ressalta-se, ainda, que a responsabilidade não se limita aos fatos ocorridos apenas no interior do local onde estiver ocorrendo ou tiver ocorrido o evento esportivo e durante sua realização, mas abrange também os arredores e espaço de tempo razoável antes e depois da sua realização.

Como pode ser percebido, o tema responsabilidade civil em eventos desportivos, é amplo suficiente para outros textos e por este motivo não é intenção deste artigo esgotar o tema nem trazer respostas prontas ao leitor, mas apenas demonstrar que há previsão de responsabilidade civil nos eventos desportivos na legislação inclusive a legislação específica relacionada ao Direito Desportivo, sendo certo que aos torcedores são garantidos direitos assim como aos organizadores são previstos deveres para casos em que ocorra danos.

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Raio X da gestão do marketing nos clubes de futebol – O planejamento

Na terceira parte da série sobre a gestão do marketing iremos abordar como os 14 clubes analisados realizavam o planejamento da área de marketing. Os modelos teóricos sobre o tema indicam que o planejamento do marketing deve ser baseado no do clube e, assim, os entrevistados foram questionados sobre o planejamento e os objetivos das suas equipes. Dos 14 clubes três não possuíam um planejamento geral, cinco possuíam planejamento, mas não estratégico (focando apenas na parte esportiva ou financeira), e em seis havia um plano estratégico, com a definição de itens como missão, visão, valores e objetivos de médio e longo prazo.

Sobre os objetivos dos clubes, cinco entrevistados não souberam cita-los, cinco indicaram objetivos esportivos e os demais citaram itens como a criação de uma imagem profissional, o crescimento sustentável e a busca pelo reconhecimento nacional. Destaque para o fato que nenhum indicou que o clube possuía objetivos relacionados ao marketing, como conquista e fidelização dos torcedores, desenvolvimento de novos produtos e serviços e obtenção de novas receitas.

Especificamente sobre o planejamento do marketing, quatro clubes não o possuíam, em seis ele existia, mas era informal, e em quatro ele era claro e documentado. Em apenas um a duração do planejamento era superior a um ano, com a maioria o utilizando de forma anual ou por competição. A criação do planejamento ocorria de diferentes maneiras nos 10 clubes que o possuíam: em três era definido pela diretoria, em dois em conjunto entre diretoria e o marketing e em cinco pela área de marketing, sendo que destes em dois ele era baseado em diretrizes gerais do clube, como o indicado pela teoria. Por fim, sobre os objetivos do marketing, três entrevistados afirmaram que não possuíam, sendo que dois deles eram de clubes em que havia departamento de marketing. Os objetivos dos outros 11 clubes envolviam aspectos como a geração de receitas, por patrocínios ou venda de produtos; a melhoria no atendimento e relacionamento com o torcedor e o sócio-torcedor; o atendimento aos patrocinadores; a afirmação do posicionamento do clube; e a transmissão das partidas.

Também foram abordados os principais elementos estratégicos do planejamento de marketing. Começando pela análise da situação, que visa analisar o ambiente interno e externo do clube, foi identificado que poucos clubes realizavam tais análises de forma sistemática, clara e constante. Na maioria tal análise era baseada em percepções e opiniões da equipe de marketing, sem nenhum clube possuir documentos formais sobre o tema. Dos 14 clubes apenas dois não realizavam e utilizavam dados de pesquisas de mercado de forma constante. Contudo, a principal pesquisa utilizada focava apenas no retorno de mídia e era obtida de forma compulsória pelos clubes junto à Federação Paulista. Pesquisas sobre os torcedores eram realizadas com menos frequência e apenas três clubes já haviam contratado empresas especializadas para realizá-las, com muitos fazendo pesquisas por conta própria principalmente em redes sociais, por e-mail ou durante os jogos, mas, sem a correta orientação, os dados obtidos eram limitados e superficiais.

Sobre a segmentação do mercado, ou seja, a criação de grupos/nichos de torcedores/consumidores para um melhor atendimento, apenas quatro clubes indicaram a possuir. Já a definição de mercados e públicos-alvo era presente em cinco clube, sendo que em apenas dois ela era clara e relacionada com a segmentação existente, seguindo o indicado pelos modelos teóricos sobre o tema.

Outro elemento fundamental do planejamento estratégico de marketing é o posicionamento, que indica a vantagem que a organização oferece e como ela se posiciona no mercado, sendo fundamental para a realização de todas as atividades e ações da área. Dos clubes analisados em cinco o posicionamento não era claro enquanto em nove ele era bem definido e envolvia aspectos esportivos, desde a formação de atletas até a conquista de títulos; tradições e valores dos clubes; e características como profissionalismo, seriedade e transparência. Importante ressaltar que a utilização de aspectos esportivos, especialmente de conquistas, não é recomendado, pois a imprevisibilidade do futebol pode prejudicar, na prática, tais posicionamentos.

A área comercial em todos os clubes analisados era de responsabilidade do marketing, diferentemente de alguns modelos teóricos e de clubes europeus onde as duas áreas são distintas, havendo em todos um planejamento comercial, ainda que informal e sem clara documentação. O mesmo era definido pelo marketing em quatro clubes, sendo que nos outros dez os planos comerciais eram oriundos da diretoria, com o marketing apenas o executando, por mais fora da realidade ele fosse: apenas um entrevistado citou que questionava abertamente as determinações da diretoria. Os objetivos comerciais focavam principalmente na busca de patrocinadores/parceiros, no atendimento e fidelização dos patrocinadores existentes, cumprimento de metas financeiras e obtenção de contratos de longo prazo. Já os principais produtos disponibilizados ao mercado eram:

  • Patrocínios nos uniformes, nas redes sociais, permutas e outras formar de parcerias;
  • Estádio e centro de treinamento: comercialização de publicidades diversas; locação de cadeiras e camarotes; locação de espaços para eventos/shows; e acordos para o direito de venda de alimentos e bebidas;
  • Ações e ativações voltadas para os sócios-torcedores e no estádio durante os jogos;
  • Direito de transmissão das partidas;
  • Leis de incentivo ao esporte;
  • Produtos e serviços: ingressos, licenciamentos, escolas de futebol e sócio torcedor.

Apesar da aparente variedade de opções, na prática poucos produtos e serviços eram realmente comercializados na maioria dos clubes, com o foco sendo majoritariamente nos patrocínios dos uniformes; na publicidade nas instalações, especialmente nos estádios por meio de permutas; e nos programas de sócio-torcedor, tidos pela maioria dos entrevistados como o principal produto dos clubes e foco de parte das ações comerciais.

No geral, podemos observar que o planejamento do marketing na maioria dos clubes era restrito, de curta duração, criado de forma limitada e sem conexão com o restante do clube. Elementos estratégicos fundamentais para a correta gestão do marketing são ignorados, com a análise da situação, pesquisas com torcedores/consumidores e a definição da segmentação de mercado e do mercado e público-alvo, o que acaba por limitar as ações e os resultados da área.

A parte comercial possuía um planejamento mais desenvolvido, apesar da tendencia dele ser definido pela diretoria sem a participação clara do departamento de marketing, o que gera objetivos e metas irreais, além da limitada opção de produtos e serviços oferecidos aos diferentes tipos de públicos e mercados. Por fim, foi contatado que o processo de planejamento do marketing é um dos principais problemas da gestão do marketing dos clubes analisados, sendo que tal situação afeta diretamente os resultados obtidos pela área, especialmente a geração de novas receitas a fidelização dos torcedores/consumidores.