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Estresse coletivo

A cada dia que passa fica cada vez mais a certeza de que, o que era para ser uma grande sacada do futebol como negócio, se transformou no maior vilão da bola neste século XXI. A tal entrevista coletiva pós-jogo é uma das coisas que mais atrapalham e irritam o bom andamento do noticiário esportivo e, também, do dia-a-dia de um clube.

Que o digam Muricy Ramalho, Dunga, Renato Gaúcho, Wanderley Luxemburgo e tantos outros treinadores, carismáticos ou não, que estão atualmente saturados com um modelo adotado no futebol pelos ingleses em meados dos anos 1990.

A entrevista coletiva serve para “livrar” o treinador e os jogadores do calor do jogo. Sim, é muito mais seguro você ter uma entrevista coletiva realizada cerca de uma hora após uma partida do que ali, ainda à beira do campo, irritado ou emocionado pelo resultado.

Quando os ingleses decidiram adotar o padrão de entrevistas coletivas, a idéia era facilitar o trabalho da imprensa e, ao mesmo tempo, reduzir o risco de algo der errado numa entrevista mais acalorada ainda no gramado. Da mesma forma, a coletiva permite agilizar a saída do time para casa após o jogo, uma vez que a imprensa só tem aquela oportunidade para entrevistar os protagonistas da partida.

Mas, num fenômeno mundial, a entrevista coletiva caiu num grande vazio, que destrói o bom jornalismo e altera os ânimos de seus interlocutores. Ainda mais quando o time perde e, à exceção de Muricy Ramalho, quase todo treinador coloca a culpa no árbitro.

Hoje, a coletiva virou também sinônimo para uma enxurrada de repetição de perguntas e respostas com palavras diferentes (ou não!!!) para cada uma delas. “Por que o time perdeu?” e “O time perdeu por que os desfalques fizeram falta” são, necessariamente, a mesma indagação feita com palavras diferentes.

Para piorar, a popularização da TV a cabo, aliada ao fenômeno dos programas pós-jogo, destroçou de vez com qualquer tipo de “glamour” que o futebol tinha no imaginário popular. Hoje é tão banal ouvir os treinadores após uma partida que a opinião deles (e dos comentaristas, claro!) caiu na mesmice.

Atualmente é obrigação um técnico dar entrevista coletiva após o jogo. Os jogadores ainda conseguem se esquivar, mas o treinador nunca pode deixar passar. Isso valoriza a imagem de super-poderosa que é atribuída à classe, mas ao mesmo tempo revela o estado de tensão em que hoje se encontra o relacionamento entre imprensa e clube de futebol.

Nem mesmo quando foi pentacampeão brasileiro Muricy Ramalho aliviou de tom com os jornalistas. Da mesma forma, a cada triunfo ou a cada derrota na seleção, Dunga distribui farpas bem ao seu estilo de quando era jogador.

E isso acontece pela tensão que uma entrevista coletiva carrega em si. Entre os entrevistados está o peso da derrota, a felicidade da vitória ou mesmo a encheção de sempre dizer a mesma coisa. Do lado de quem pergunta, está a ânsia em ser o primeiro, a necessidade em mostrar conhecimento, o desejo de fazer sua pergunta ser “repercutida”.

E o conteúdo, nessas e outras, entra no vazio, fazendo com que aquilo que era para ser uma grande idéia para facilitar o trabalho de todos e tornar a comunicação eficiente se transforme numa fonte constante de gerenciamento de crise.

Entrevista coletiva, hoje, é sinal de estresse coletivo. E a informação que vá para o lixo…

Para interagir com o autor: erich@universidadedofutebol.com.br