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A ciência pode ajudar a marcar gols!

Existe no futebol, uma pergunta típica, mais comum na fala dos dirigentes (também presente em outros escalões) e que representa um dos nortes de decisão para muitas coisas dentro do futebol profissional.

É só o departamento de fisiologia apresentar algum novo projeto, o de nutrição um cardápio mais apropriado ou a comissão técnica um treinamento diferente, que lá vem a pergunta: “isso marca gol?”.

Parece piada, mas por incrível que pareça, tanto a comunidade científica especializada quanto os profissionais diretamente ligados ao futebol com propostas inovadoras ou diferenciadas de trabalho, têm esbarrado em grande parte das vezes, com suas pesquisas ou projetos, na essência dessa questão.

Então, vamos polemizar o assunto.

As equipes de futebol profissional têm, ou pelo menos deveriam ter como objetivo máximo, vencer jogos: a vitória nos jogos leva a equipe à melhores colocações nos campeonatos que disputa à que direciona de certo modo os olhares da mídia em geral, para ela à que leva ao aumento do prestígio dos seus jogadores à e que por vários motivos pode levar à conquistas profissionais e à maiores ganhos financeiros.

Se isso tudo é verdade (ou um fractal dela), como não admitir que estariam certas as pessoas do alto escalão do futebol quando ao aprovar ou desaprovar determinada conduta, procedimento ou ação, estejam levando em conta a pergunta máxima: “isso marca gol?”.

Em outras palavras, quero dizer que em sua profunda ignorância (em muitas e muitas vezes), os dirigentes (ou similares) têm total razão!

Claro, a maior parte deles não deve entender nada sobre a vasta complexidade das dimensões constituintes do jogo de futebol (física-tática-técnica-mental-etc. e tal) e muito menos a importância da compreensão do “todo” para saber porque equipes ganham e porque equipes perdem. Ou seja, não têm a menor idéia do porque das coisas, mas intimamente sabem que algo só é bom, se dentro das regras do jogo e da boa conduta puder “marcar gol”.

Da mesma forma, e por outro lado, profissionais especializados e cientistas em geral buscando melhorar (ou acreditando estarem buscando) o “todo” e potencializar chances de vitória, acabam se distanciando cada vez mais dos problemas que estão realmente interferindo na prática de jogadores, comissões técnicas, treinos e jogos – e portanto apresentam propostas que realmente não vão marcar gols!

A ciência só faz sentido se puder contribuir para a prática real. E se é o futebol “a coisa mais importante dentre as coisas não importantes” do mundo real, por que não levar a ele elementos que possam realmente promover benefícios que potencializem sua evolução?

Na perspectiva das “teorias da complexidade”, fazer gols e vencer jogos representa resolver problemas em todas as dimensões do jogo, ao mesmo tempo e o tempo todo, considerando a totalidade do jogo e dos seus elementos constituintes; integralmente.

Então, se por um lado a comunidade científica especializada tem razão e direito em reclamar das dificuldades que lhe são impostas para abrir as portas do mundo do futebol (e alguns outros esportes também!), por outro em seu “profundo conhecimento” acaba muitas vezes por dar respostas a problemas que não são reais, terminando por investigar um futebol que não existe.

Assim elementos que poderiam se complementar acabam por criar uma guerra entre àqueles que mandam e não promovem melhoras por falta de conhecimento e àqueles que querem melhorar mas não promovem melhoras por não saberem realmente qual é o problema. Entre as armas dessa guerra, vence aquela única que faz todo o sentido: “isso marca gol?”.

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Sobre as apostas desportivas

Caros amigos da Universidade do Futebol,

A questão das apostas desportivas, apesar de variar de país para país, é sempre relevante, uma vez que diz respeito à utilização de propriedades intelectuais de clubes de futebol e de organizadores de competições (ligas ou federações, dependendo do caso). 

Sabemos que a exploração imprópria das propriedades intelectuais (direitos de imagem dos jogos, marcas, logos, nomes, hinos etc.) são a principal fonte de receita dessas organizações. A utilização indevida, por terceiros, pode levar, em última instância, a uma inviabilidade econômica do esporte como um todo.

No Brasil, como sabemos, adota-se oficialmente o sistema do monopólio com relação às apostas esportivas no futebol. Desta forma, o governo é o único a usufruir de tal mercado (loteca – loteria esportiva e, recentemente, a Timemania).

Na Europa, como vigora o sistema liberal, as casas de apostas são formas comerciais que pode ser exploradas pela iniciativa privada. Com isso, e aliado à também recente e crescente indústria das apostas online, temos um cenário de grande e sério risco para o futebol europeu (o que, evidentemente, refletiria inevitavelmente no futebol mundial).

As casas de apostas não pedem autorização aos diversos desportes para promover apostas sobre seus resultados, e, ainda pior, não revertem ao esporte quaquer participação sobre a renda auferida pelas apostas.

Ainda mais grave, nessa grande confusão, há sérios riscos de envolvimento do esporte (e das apostas) com atividades ilícitas, tais como manipulação de resultados, lavagem de dinheiro, fraude, entre outras.

Neste mês, o governo francês publicou um projeto de lei impondo determinadas regras para a atividade desmedida de apostas. Concomitantemente, o Parlamento Europeu também adotou um relatório (chamado de Schaldemose Report, em decorrência da Parlamentar relatora do documento – a dinamarquesa Christel Schaldemose), sobre apostas em geral, mas que contém importantes disposições sobre apostas desportivas.

Amas as iniciativas, em linhas gerais, reclamam por uma maior harmonia entre operadores de apostas e “detentores dos respectivos direitos de propriedade intelectual”, no sentido de haver uma prévia autorização para que sejam promovidas apostas, bem como um retorno justo de parte das verbas arrecadadas (a serem revertidas em todos os níveis do esporte, desde categorias amadoras e infantis, até a profissional).

São discussões que estão no topo da agenda das autoridades desportivas na Europa, mas que devemos observar de perto. A saúde do esporte na Europa, principalmente em época de crise financeira, é crucial para a viabilidade do futebol nas outras partes do mundo.

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Choque de gestão

No final de 2008, o Clube Atlético Paranaense passou por um processo eleitoral no qual, pela primeira vez nos últimos 14 anos, houve o chamado “bate-chapa” na disputa entre grupos oponentes.
 
De um lado, o grupo formado por sucessores da situação, cujo mentor era Mário Celso Petraglia – ícone da história do clube nesse período de calmaria política e de grandes avanços no seu modelo de gestão, dentre os quais a construção do mais moderno estádio do Brasil, um centro de treinamento de nível de excelência, e um título do Campeonato Brasileiro em 2001.
 
De outro, a banda dissidente, representada por renomados conselheiros-torcedores, que criticavam o modelo vigente, amparados, especialmente, na falta de competitividade desportiva vivida pelo clube desde o vice-campeonato nacional em 2004 – sendo apontada a falha maior como falta de gestão das categorias de base para revelação de jogadores com DNA do clube a custos abaixo do mercado de transferências.
 
Em outras palavras, algo que poderia tornar sustentável o modelo de reconhecido sucesso nos últimos anos.
 
Resultado da eleição: ganhou a chapa de situação, com folga. Consequência atual: bate-boca público entre o antigo manda-chuva, Petraglia, e seu sucessor, Marcos Malucelli. Motivos principais alegados: ingerência política nos bastidores e discordância sobre os novos rumos adotados, já mencionados à época do pleito.
 
Dois aspectos ganham relevo nesse episódio, são parecidos nas palavras, complementares nos seus efeitos, mas não devem ser confundidos simploriamente: política de gestão e gestão política.
 
A política de gestão pode ser compreendida como o direcionamento administrativo que se quer imprimir a uma empresa, entidade, instituição, seja qual for, inclusive a um clube de futebol. Diz respeito ao planejamento geral, estratégico, que engloba missão de negócios, visão, valores, objetivos e metas, dentro de um cronograma.
 
Os tomadores de decisão, portanto, determinam as diretrizes administrativas do clube, e podem definir seu modelo de negócio (posicionamento do clube no mercado do futebol) e o modelo de gestão (o que deverá ser feito em termos de processos administrativos para atingir os resultados esperados junto ao modelo de negócios).
 
Modelo de negócio é o esquadro. Modelo de gestão é o dia-a-dia administrativo referente aos processos por ele alinhavados. No meio de ambos e dentro de cada um, há margem para a gestão política de interesses.
 
A política, em si, é praticada por todos nós ao longo do dia. Por mais banal que seja, negociar em seu trabalho, com membros da família, com amigos, na rua, é fazer política. Num sentido mais estrito, dentro da estrutura de um clube de futebol, a política é igual à negociação mais poder visando à tomada de decisão.
 
Historicamente, os clubes de futebol, não só no Brasil como em todo o mundo, são palcos férteis para o desenvolvimento e a presença de lideranças políticas que interferem direta ou indiretamente em sua gestão, sem o devido preparo profissional especializado que o futebol exige em tempos de mercado competitivo global.
 
Isso não é algo fácil de superar ou, ainda menos, erradicar. A gestão desse esporte evolui a cada dia, mas não se pode descuidar desse embate.
 
Portanto, na próxima eleição em seu clube, fique atento na briga entre política de gestão e gestão política.
 
O futebol adverte: a segunda opção pode fazer mal à saúde administrativa, financeira e desportiva do clube.

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Big Brother

Acordei com o barulho dos foguetes. Achei que repercutiam a virada do ano em Copacabana: eram de Gaza. Oto, meu morcego de estimação, me informou – ele ouve como ninguém. Passava da meia-noite. O Hamas e os israelenses comemoravam a virada de mais um sujo ano político. Chorei pelo olho esquerdo, um dos traços que decompõem minha personalidade. No exato instante em que pensei nisto, uma criança morreu vítima de um míssil israelense. Cem olhos por um olho é a lei; se todos esses olhos chorassem, seria um mar de sal no meio do deserto. Mas, tristezas não pagam dívidas, já dizia minha mãe, a mãe dela e a mãe da mãe dela, e a vida continua, pelo menos para aqueles que não forem atingidos pelos bombardeios praticados por governos que substituíram palavras por balas.
 
Já é primeiro de janeiro de 2009 no mundo ocidental e Oto, que também faz as vezes de morcego correio, me avisa que o David Beckham, o ex-jogador de futebol inglês, teria exigido para aparecer no Big Brother dos italianos, quinhentos mil euros. Colheu a informação do Mayerovich, o jornalista. Não me surpreende; o Ronaldo Nazário ganha dinheiro até para mostrar as banhas da barriga. Outro dia, cá com meus botões, imaginei que, se eu fosse o Ronaldo, diria os maiores disparates, de propósito, para ver o que saía na imprensa. Provavelmente, tudo. Eu diria, por exemplo, estar convencido de que havia vida em Marte, de que o Bin Laden estava escondido na Amazônia, e por aí afora.
 
Essa notícia sobre o Beckham é só para confirmar: os grandes nomes do futebol não ganham dinheiro necessariamente para jogar bola; se fosse, a maioria estaria pobre. Um ou outro escapam, como o Messi e o Kaká, pelo menos, por enquanto. Confesso que, para mim, aqui no fundo desta caverna, é muito desagradável ligar a TV e ver, fingindo que jogam, o Ronaldinho Gaúcho, o Ronaldo Nazário, o Denílson, o Robinho ou o Diego, só para ficar nos brasileiros. Mas já não foram bons?, perguntariam os crédulos. Claro que sim, e muito bons. Mas não é o que conta; o que conta é o quanto podem vender dos produtos de seus patrocinadores.
 
Tornaram-se grandes vendedores, os melhores do mundo, de chuteiras, tênis, meias, camisas, calções, óculos, lâminas de barbear, carros, qualquer coisa. Se o Ronaldo usa, eu também quero usar. Cristiano Ronaldo? Seguirá a fórmula: joga bem durante algum tempo, fica conhecido no mundo todo, depois, cai na farra, quando então poderá desfilar pelos campos, fazendo de conta que joga.
 
Quando alguns se escandalizam com a ida do Ronaldo para o Corinthians, é porque não entenderam o jogo. Ele não é funcionário do clube, mas do patrocinador, que não pode abrir mão de seus serviços; gordo ou magro, bonito ou feio, habilidoso ou lerdo, não importa. Ele vende de tudo, desde que apareça. E o rapaz é realmente um fenômeno. Desde 2002 não joga nada parecido com futebol, mas ganha um salário de rei, porque é um fenômeno de mídia; não há quem não o conheça no mundo. Ora, fazer-se conhecido em todos os lugares do mundo é uma arte. Como não se trata de jogar futebol, mas de vender produtos, ele pode seguir sendo rei.
 
Resolvi promover um Big Brother na caverna. Câmeras vão monitorar todos os movimentos e falas meus, do Arnaldo, do Oto, e até da Aurora, lá na porta de entrada. Já providenciei um edredon. A gente não tem cacife para convidar o Beckham para nos visitar, mas quem sabe consigamos, com alguma sorte, o Vampeta, o Marcelinho Carioca ou o Túlio. Esses os que me ocorreram, mas claro que o Arnaldo vai sugerir o Ricardo Teixeira. Já imaginaram o bagre conversando com o presidente da CBF? “E então Arnaldo, o que você acha do futebol brasileiro atual?”. “Nunca esteve tão bem, presidente, desde que o senhor instituiu a fórmula de pontos corridos”. “E de minha presidência, Arnaldo?”. “Um presente de Deus, presidente. Graças a Ele não temos constituição no futebol, essa fórmula estúpida e anacrônica, e o senhor pode se reeleger quantas vezes quiser.”. “Mas, por favor, Arnaldo, não confunda isso com o que faz o Chávez na Bolívia.”. “Em hipótese alguma, meu presidente. Só os estúpidos o comparariam àquele comunista arrogante.”. “E quem você acha que vai ser o próximo presidente da Fifa, Arnaldo?”. “Desculpe, presidente, mas sua pergunta me constrange, tão óbvia é a resposta. Não há outro que ouse usurpar aquilo que lhe é de direito, quase um direito natural. O senhor, só o senhor, poderá assumir o cetro do mais ambicionado cargo do planeta.”.
 
Seria engraçado revelar ao mundo as conversas íntimas de Oto fazendo a corte àquela morceguinha pouco mais que adolescente que quase nunca sai do fundo da caverna, envergonhada das espinhas que ostenta no rostinho lindo. E dos ataques de ciúmes que o acometem quando Clark, um morcegão de descendência americana, esvoaça em torno de Amélia; sim, esse é o nome da ninfa.
 
Aurora e seus achaques dariam fartos motivos às câmeras. Cheia de esquisitices, faria o gosto dos telespectadores quando, após uma lauta refeição de um ou dois ratinhos do campo, agasalhar-se no sobretudo de bolinhas vermelhas, calçar as pantufas verdes e postar-se à frente da TV para assistir, no canal Z33, ao time dos sonhos, sem saudosismos. O jogo seria Brasil e França, Copa do Mundo de 2006: Dida, soberbo, um deus de ébano entre as balizas. Cafu, um garoto, não deu chance aos franceses. Juan, como sempre, impecável. Lúcio, estranhamente calmo e comedido. Roberto Carlos, dedicação comovente, não deu chances ao Thierry Henry. Gilberto Silva, um leão, lúcido. Zé Roberto, impecável. Juninho, esforçado como sempre. Kaká, sempre o melhor do mundo. Robinho, humilde, maduro, útil. Ronaldinho Gaúcho, corajoso, destemido. Ronaldo, magro. O técnico, Sr. Carlos Alberto Parreira, tático, seguro, pulso firme, teve sempre o time na mão.
 
Sucesso faria um reality show de concentrações de futebol. Que tal um big brother da concentração do Corinthians? Ou do Flamengo? Que será que dizem ou fazem os jogadores em suas horas de folga? Talvez não fosse muito diferente daquele feito pela Globo. Alguns sob o edredon, outros languidamente esparramados à beira da piscina, haveria quem manipulasse notebooks jogando joguinhos de futebol, grupinhos batucando pagode, brincadeirinhas de mão… E os dirigentes? Certa ocasião, um árbitro de futebol fez algo parecido durante o próprio jogo, colocando um microfone na camisa, para que pudéssemos acompanhar, ao vivo, as reclamações e palavrões que acompanhavam cada jogada. Mas nada superaria a transmissão, por câmeras ocultas, das reuniões dos senhores donos da Fifa e do Comitê Olímpico Internacional.
 
De minha parte, modestamente, ficaria satisfeito de saber, do Túlio, como ele faz para marcar mais gols que todos os jovens atacantes brasileiros, alguns deles, vergonhosamente superados por um goleiro, aquele do São Paulo.
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Craque global

A volta de Ronaldo, definitiva, com direito a empate no último minuto num dos principais clássicos do futebol mundial foi, sem dúvida alguma, uma notícia que ocupou as manchetes da maior parte da mídia futebolística do planeta.

Para variar, mais um retorno inesperado de uma pessoa que, a cada nova prova que completa, mostra que dela você pode esperar qualquer coisa, mas nunca pode dizer que ela já está acabada para determinado tipo de função.

Ronaldo é notícia em todo o mundo. É, ao lado de David Beckham, um jogador mundial, daqueles que fazem mais sucesso que o papa, principalmente porque o futebol talvez seja uma das poucas unanimidades em toda a Terra.

Ronaldo é global. E é exatamente esse o maior problema para a imprensa brasileira.

Porque, aqui no Brasil, essa frase tem um significado muito diferente. Ronaldo é global. E, por isso mesmo, a imprensa toda sabe que o único furo de reportagem relacionado ao Fenômeno será, muito provavelmente, dado pela Globo.

A prova cabal disso foi ontem, logo após o término da partida contra o Palmeiras. Nivaldo de Cillo, repórter da Bandeirantes, foi o mais rápido e conseguiu chegar para a entrevista com o Fenômeno. Logo após chegou outro repórter de uma rádio. Só se ouvia Ronaldo dizer:

“Calma, sem confusão. Se ficar como foi da última vez, não vou falar nada. Depois reclamam que eu não falo”.

Ronaldo se referia ao término do jogo contra o Itumbiara, quando foi “golpeado” com um microfone no rosto pelos afoitos jornalistas. Mas dessa vez a coisa não estava tão feia assim, por incrível que pareça. E havia aparente tranquilidade dos próprios jornalistas. Mas Ronaldo continuou…

“Olha lá, não dá. Assim não dá para falar. Ou fica sem confusão ou não dá”.

Nivaldo de Cillo, o repórter, retrucou:

“Mas agora está calmo, você já pode falar”.

“Não está não”, foi a resposta de Ronaldo, quando nitidamente estava apenas cercado por um microfone da Band, outro de uma rádio e, já nessa altura, com outro do PFC, o canal de pay-per-view da Globo. Nem vestígio de confusão e daquele bolo de jornalistas afoitos.

A discussão só parou quando chegou a pergunta de um novo repórter que se juntou ao grupo. Curiosamente, percebia-se o símbolo da Globo. E, daí, vieram as primeiras respostas do Fenômeno. Quatro questões seguidas, e Ronaldo com o olho fixo apenas no repórter global, ignorando qualquer questionamento dos outros jornalistas.

Só depois dessa “exclusiva” é que o jogador começou a responder aos outros repórteres. Nenhum deles, infelizmente, colocou naquela hora, ao vivo, o dedo na ferida. 

Porque Ronaldo, há muitos anos, só fala com a Rede Globo. Foi no Jornal Nacional a primeira entrevista para dizer que chegava “mais um louco para o bando de loucos” do Corinthians. Foi na emissora que ele passou pelos mais diferentes programas, de Ana Maria Braga ao Esporte Espetacular, para falar qual era a sensação de jogar no Timão. Foi no Fantástico o desabafo do jogador quando esteve envolvido no caso dos travestis e quando disse que “era só voltar a jogar, começar a fazer gol e todo mundo se esqueceria disso”.

Assim como faz com Sandy, Ivete Sangalo e outros artistas badalados da mídia, a Globo parece ter com Ronaldo um contrato que lhe exige exclusividade. Ou, pelo menos, privilégio na hora de passar alguma informação bombástica à imprensa. 

O mais curioso é que a Globo não precisa disso para ter o furo de reportagem. Apenas o peso que o microfone da emissora tem já é suficiente para que ela largue com vantagem na hora de construir uma relação de proximidade com a fonte. O impacto que a Globo causa na vida das pessoas já constitui motivo mais do que suficiente para uma pessoa ter o desejo de falar primeiro a ela. E, depois, dar atenção aos outros veículos. 

Mas é impressionante como parece existir um medo terrível na Globo de ficar “para trás” na hora de uma informação exclusiva. E, com isso, ela parece usar toda a força que tem para manter os principais nomes da mídia com uma marca global no comportamento. 

E, o mais curioso, nem Ronaldo e nem Globo precisariam disso…

Para interagir com o autor: erich@universidadedofutebol.com.br

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Ganhar jogando à zona: conflitos da auto-organização coletiva

A todo tempo no nosso dia-a-dia, com maiores ou menores responsabilidades, com maior ou menor frequência, é inevitável e inerente à nossa condição humana: temos que tomar decisões.

Existe um tipo de decisão que nasce em uma dimensão que, tentando se aproximar das melhores respostas, acaba por se afastar da essência dos problemas.
 
Isso ocorre em ambientes diversos, da ciência à prática, da universidade ao “boteco” da esquina, dos escritórios mais ricos de Nova York até o gramado do futebol da periferia no final de semana.
 
Hoje tomarei no meu texto a decisão de assumir minha preferência pelo “jogar à zona”.
 
Em um passado bem recente, assisti um jogo em que uma das equipes se defendia marcando em zona – ou melhor, tentava – (e claro, marcar não representa o todo do jogar!). Ela foi derrotada e os especialistas de plantão logo apontaram com simplicidade, a culpada pela derrota: a marcação por zona.
 
Marcar individualmente, por zona, ou seja de que forma for pode ser mais eficiente em uma situação do que em outra, de maneira que apontar que uma forma de marcar é melhor do que outra incorre a grandes riscos de erro. Mas como mencionei anteriormente, hoje incorrerei ao grande risco.
 
Quando uma equipe faz uso da marcação individual, sua principal referência de ocupação do espaço é o adversário a ser marcado. Isso quer dizer que cada um dos dez jogadores de linha no jogo tem, cada um deles, uma referência distinta do seu companheiro para estruturar seu posicionamento no campo de jogo.
 
Então quando, estando marcando de forma individual, a equipe recupera a posse da bola, estará distribuída no campo em função do adversário e não das suas necessidades ofensivas. Isso quer dizer, em outras palavras, que ao invés de uma ocupação inteligente dos espaços, a equipe que marca individualmente acaba por configurar uma geometria anárquica no campo, e aí para ter êxito ofensivo precisará antes de mais nada redesenhar sua distribuição no terreno de jogo.
 
Certa vez um jornalista espanhol escreveu que é difícil distinguir em alguns jogos entre equipes brasileiras qual o esquema tático utilizado por elas.
 
Claro! Se as equipes brasileiras, em sua grande maioria, têm como referência principal de marcação o jogador adversário, cada ultrapassagem, entrada em diagonal ou troca de posição representa não uma dinâmica harmoniosa e inteligente de ocupação dos espaços, mas sim uma necessidade emergencial de auto-ajustes que proporcionem o mínimo de equilíbrio posicional a equipe.
 
E se isso é verdade para quando a equipe recupera a bola, também é para quando ela a perde.
 
Obviamente que marcar em zona pode ser tão ineficiente quanto marcar de forma individual (mesmo que jogadores e equipe entendam e cumpram bem suas funções) ou até pior se outras referências para a auto-organização coletiva ao invés de apresentarem caráter complementar umas as outras e caminharem na mesma direção, acabarem se chocando e não contribuindo para dinâmicas harmoniosas de jogo – mas que fique claro, o problema aí não é do “marcar em zona”…
 
Sob a perspectiva da auto-organização coletiva da equipe, o marcar em zona, o transicionar em zona, o atacar em zona; enfim, o “jogar à zona” permite uma referência mais contextualizada à dinâmica do jogo, podendo garantir sim superioridade no jogar, em circunstâncias diversas do jogo.
 
Sinto muitas vezes que as críticas que o “jogar à zona” sofre se dão mais pela incapacidade de entendimento do que isso significa (por parte de quem comenta ou critica), do que pela inconsistência dessa forma de jogar. Sinto também que muitas vezes, pelo que vejo, acredita-se com alardes, que essa ou aquela equipe joga (ou jogou) à zona; mas isso não deve ser tido como verdadeiro pelo simples fato de acreditarem que isso é verdadeiro – ou seja, acham que estão jogando à zona sem sequer cumprir com a essência dos construtos que o jogar à zona carrega.
 
Por isso, convido à todos a ler mais sobre o assunto e lhes garanto: as equipes de maior sucesso (financeiro e esportivo) no cenário europeu estão cada vez mais cumprindo melhor a essência do jogar à zona.
 
Sugestão de leitura inicial a respeito do tema: Amieiro; N. “Defesa à Zona no Futebol: um pretexto para reflectir sobre o JOGAR bem, ganhando!“. Portugal: Maiadouro, 2005.

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Seis mais cinco… a conta é justa?

Caros amigos da Universidade do Fubebol,

A Fifa deu nesta semana mais uma cartada em sua luta pela implementação da Regra do 6+5.

Para quem não se recorda, em vistas a uma internacionalização excessiva, principalmente em clubes das principais Ligas Européias de Futebol Profissional, a Fifa pretente implementar uma regra a entrar em vigor até 2010, segundo a qual um time deve entrar em campo com pelo menos seis jogadores elegíveis a atuar pela seleção nacional do país em que o clube é localizado.

Com isso, a Fifa pretende não só promover a formação de talentos locais, como também reduzir o gap (em termos de qualidade de jogo) existente entre as diversas seleções nacionais e aumentar o que se chama “competitive balance” entre elas.

Ocorre que a Comissão Européia vem dando sinais de que essa regra não teria o amparo da Legislação Comunitária, uma vez que promoveria a discriminação de trabalhadores com base na nacionalidade (tema exaustivamente discutido na decisão do caso Bosman).

Nesse sentido, a CE manifestou maior simpatia e preferência pela regra introduzida pela Uefa nos seus campeonatos interclubes chamada Home-Grown Players Rule (como a propósito já comentamos em colunas anteriores).

De toda forma, nesta semana a Fifa apresentou um relatório produzido de forma independente por 5 experts europeus com formações na Suiça, Alemanha, Espanha, Itália e Grécia (todos membros do Institute for European Affairs – Inea) que atesta a suposta legalidade da regra.

O estudo, de forma geral, defende a implementação da nova regra. Interessante notar algumas das suas conclusões.

Em primeiro lugar, o estudo traz um novo comentário ao atual debate sobre o tema, ponderando que as decisões passadas da European Court of Justice, i.e., Bosman e outras, não podem ser utilizados de forma axiomática com relação à Regra do 6+5. Isto porque as tendências agora são outras, e as preocupações são distintas. Em outras palavras, o estudo sugere, indiretamente, que o tema da discriminação por nacionalidade seja visto agora com outros olhos.

Além disso, princípios fundamentais ligados ao esporte, tais como a luta contra o tráfico de menores, desenvolvimento de comunidades locais, fair play, etc, seriam justificativas plausíveis e proporcionais para que a regra da Fifa fosse tida como lícita nos termos do Tratado da Europa e do Tratado de Lisboa (ainda pendente de ratificação).

Mais além, o estudo sugere que a intenção da Fifa com a regra do 6+5 respeita e promove diversos preceitos gerais do Tratado Europeu, tais como o princípio da boa-fé, o que também deveria ser levado em consideração em uma eventual decisão judicial.

 

Não haveria finalmente, segundo o estudo, ofensa às disposições anti-trust (concorrenciais). A Fifa não estaria tomando uma posição de domínio no mercado do futebol profissional em decorrência direta da aplicação da regra.

Esse é um tema que ainda deve gerar muito debate até o momento da sua aplicação. O estudo ora comentado é um passo importante para o lado da Fifa. 

Vamos ver qual será o “day after”.

Para interagir com o autor: megale@universidadedofutebol.com.br

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Títulos de uma dívida sem sentido

A essas alturas você já deve estar careca de saber sobre como começou a crise econômica mundial que quebrou tanta gente a ponto do Manchester United convidar até a Petrobras a patrocinar o clube. Não tá fácil arranjar patrocínio hoje em dia. A míngua é tamanha que até o Manchester United tenta mamar nas tetas do Estado brasileiro.

É feia a coisa.

Tudo por conta dos títulos podres do mercado imobiliário americano. Bastou um pessoal sem dinheiro hipotecar suas casas por umas cinco vezes, sem ter a menor condição de pagar por isso. Aí um malandrão rola o título da dívida pra uma outra negociação qualquer, o que vai criando uma bola de neve – que você já deve estar bastante cheio de ouvir falar.

O propósito desta coluna não é falar sobre a Petrobras, o Manchester ou sobre os estadunidenses. É para fazer um exercício de imaginação. Se você acha que as coisas estão ruins hoje, pare. Elas poderiam estar muito piores. Imagine como não estaria o mundo se, ao invés de títulos hipotecários dos estadunidenses, os malandrões tivessem negociado títulos de dívida pública dos clubes de futebol do Brasil?

Antes de mais nada, uma ressalva. Eu não entendo quase nada de títulos de dívida, pública ou privada.Talvez dizer ‘quase’ seja superestimar minha capacidade cognitiva. A verdade é que eu entendo lhufas. Mas imagino o que seja, de tanto ouvir o William Wack falar. Portanto, se você é um especialista na área por escolha da profissão ou por obrigação de pagamento, perdão se eu falar alguma bobeira.

De qualquer maneira, imagine que o Lehman Brothers negociasse títulos de dívida de clubes de futebol do Brasil. Ele acreditava que clubes eram instituições ricas, apesar das muitas dívidas, e que eventualmente pagariam a dívida com o governo. Se não pagassem, o governo daria um jeito que eles assim o fizessem, nem que fosse preciso inventar uma loteria para isso. É garantia certa de retorno. Por que não securitizar uma boa parte do patrimônio nisso?

Eis que o primeiro baque faz com que o governo invente a loteria. É um alerta, mas não é sinal de desespero. Afinal, a loteria promete acabar com todas as dívidas. O dinheiro vai entrar.

E eis que o dinheiro que se imaginava arrecadar com a loteria não aparece. O título de dívida do clube vira um título podre. O banco tinha boa parte do seu patrimônio em cima de valores que deixaram de existir. O Lehman Brothers quebra. E todo mundo que negociou crédito com o LB também quebra. Bancos quebram. Acaba o crédito. Empresas quebram. A crise mundial estoura. Países que baseiam a sua produção nas áreas financeiras e não de manufatura entram em recessão. Islândia, Suíça, Inglaterra, boa parte da Europa. Tudo por causa dos títulos de dívida dos clubes de futebol.

A solução?

Estatizar o futebol dos países quebrados.

Aí sim faria sentido a Petrobras patrocinar o Manchester.

Para interagir com o autor: oliver@universidadedofutebol.com.br

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Buy “Campeonato Estadual”

O pacote econômico lançado pelo presidente dos EUA, Barack Obama, há poucas semanas, e apoiado pelo Congresso Nacional, previa, inicialmente, a implementação da cláusula “Buy American”, cujo principal objetivo era estimular a economia nacional e, ao mesmo tempo, impedir qualquer compra de insumos e produtos estrangeiros, vinculados aos segmentos financiados pelo plano. 

Felizmente, para o livre comércio mundial, regulado pela OMC, esta medida não prosperou, haja vista que o estímulo estava revestido de protecionismo comercial.

Falemos de futebol.

Muito se discute sobre a viabilidade dos campeonatos estaduais. Críticas negativas, em sua maioria, especialmente quando os grandes clubes encontram-se envolvidos em outras competições nacionais e internacionais, sob um calendário anual bastante intenso – em que pese ser um período importante para entrosamento das equipes, surgimento de novos talentos e planejamento geral da temporada.

Entretanto, não se pode culpar a falta de êxito dos estaduais pelo excesso de importância dada pelos clubes às demais competições, como a Copa do Brasil e à Libertadores da América. A concorrência é intrínseca, nesse caso. Sem sequer mencionar as transmissões de TV das ligas européias que batem à porta dos fãs (Champions League, Uefa, Italiano, Espanhol, Inglês, Alemão…). 

Tome-se como exemplo o Campeonato Gaúcho. É uma competição bem organizada, já há alguns anos, com fórmula de disputa enxuta e conseqüente presença de clássicos regionais, além de oferecer visibilidade e valorização aos patrocinadores e apoiadores, com a necessária participação da TV (aberta e no sistema pay-per-view). A Federação Gaúcha, os clubes, os patrocinadores e os torcedores ajudaram a forjar esta realidade e lhe dar continuidade.

O mesmo ocorre, paradoxalmente, no Rio de Janeiro. Enquanto os clubes se alternam nas dificuldades para escapar de posições medianas e, até mesmo, do rebaixamento no Campeonato Brasileiro, o Campeonato Carioca tem sido exitoso, pelas mesmas razões apresentadas no “Gauchão”.

Por outro lado, no estado de São Paulo, os últimos campeonatos têm sofrido um desgaste, no que concerne à ausência de clássicos em jogos decisivos, com conseqüente desinteresse do público nos estádios e, até mesmo, na TV, bem como alguns clubes pouco competitivos técnica e financeiramente que tornam a tabela de jogos inchada. Ainda pior se considerarmos, por exemplo, São Paulo e Palmeiras disputando a Libertadores. Como bem disse uma vez meu amigo Oliver Seitz, “muito futebol mata o futebol”.

No Estado do Paraná, que, neste ano, com base em um novo acordo com a TV, sinalizava para uma retomada de crescimento, eis que surge algo absolutamente impensável numa atividade que atrai muito dinheiro e interesse geral: o regulamento da competição nasceu como uma aberração. Para resumir a bagunça, o clube melhor colocado da primeira fase tem o “supermando” dos jogos no octogonal final – jogará todas as partidas em sua casa – o que criou descontentamento geral entre os clubes e ameaças envolvendo STJD e Justiça Comum.

Infelizmente, nesse caso, o foco são os problemas, não a grandeza dos eventos – o que prejudica o relacionamento entre os clubes, federações, patrocinadores e TV, bem como o próprio público amante e consumidor do esporte. Instabilidade contratual e investimentos não combinam…

Recentemente, uma pesquisa encomendada pelo maior grupo de comunicação do Paraná visou traçar o panorama geral do contingente de torcedores dos distintos clubes no estado.

Resultado: a maior torcida, com certa folga, foi a do Corinthians, do estado vizinho, São Paulo. Muito bem cotados na capital e no norte, estão o São Paulo, Palmeiras, Santos, além de Grêmio e Internacional, em especial no sul e sudeste do estado.

Essa pesquisa foi apontada como o fator que impulsionou a transformação no J. Malucelli, clube de família tradicional por aqui, no Corinthians Paranaense, por um lado, e reações indignadas, por parte dos que “exigem” que os habitantes do estado sejam torcedores dos clubes locais – jornalistas, torcedores, cronistas, políticos.

Já no Rio Grande do Sul, outra pesquisa realizada pela consultoria Nielsen em 2008, e veiculada na revista Veja, sobre o hábito de consumo da população em diferentes segmentos, evidenciou o contrário: os gaúchos dão preferência aos produtos nativos, autóctones. Não à toa, empresas como Magazine Luiza, TIM, AmBev, Wal-Mart e Carrefour compraram empresas locais, para “ser” gaúcha, ou direcionaram as estratégias de marketing para “parecer” ao menos.

Conseqüências: simpatia das comunidades onde atuam e maiores vendas, inclusive de produtos fabricados no estado.

Em outras palavras, a valorização do futebol dos campeonatos estaduais pode despertar o interesse do seu mercado consumidor, desde que impulsionada por uma mudança de cultura administrativa surgida e estimulada entre todos os envolvidos em sua organização e execução. Vale dizer, em coordenação, não em subordinação de interesses.

Esta postura é que possibilitará um aumento da base de torcedores/sócios em âmbito regional, com aumento de receitas em direitos de TV, patrocínio, licenciamento e merchandising, com perspectiva nacional sustentável. 

Mudanças nesse patamar não são feitas de uma hora para outra, tampouco por decreto, ou por cláusulas impositivas do tipo “Buy Campeonato Estadual”.

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Buy "Campeonato Estadual"

O pacote econômico lançado pelo presidente dos EUA, Barack Obama, há poucas semanas, e apoiado pelo Congresso Nacional, previa, inicialmente, a implementação da cláusula “Buy American”, cujo principal objetivo era estimular a economia nacional e, ao mesmo tempo, impedir qualquer compra de insumos e produtos estrangeiros, vinculados aos segmentos financiados pelo plano. 

Felizmente, para o livre comércio mundial, regulado pela OMC, esta medida não prosperou, haja vista que o estímulo estava revestido de protecionismo comercial.

Falemos de futebol.

Muito se discute sobre a viabilidade dos campeonatos estaduais. Críticas negativas, em sua maioria, especialmente quando os grandes clubes encontram-se envolvidos em outras competições nacionais e internacionais, sob um calendário anual bastante intenso – em que pese ser um período importante para entrosamento das equipes, surgimento de novos talentos e planejamento geral da temporada.

Entretanto, não se pode culpar a falta de êxito dos estaduais pelo excesso de importância dada pelos clubes às demais competições, como a Copa do Brasil e à Libertadores da América. A concorrência é intrínseca, nesse caso. Sem sequer mencionar as transmissões de TV das ligas européias que batem à porta dos fãs (Champions League, Uefa, Italiano, Espanhol, Inglês, Alemão…). 

Tome-se como exemplo o Campeonato Gaúcho. É uma competição bem organizada, já há alguns anos, com fórmula de disputa enxuta e conseqüente presença de clássicos regionais, além de oferecer visibilidade e valorização aos patrocinadores e apoiadores, com a necessária participação da TV (aberta e no sistema pay-per-view). A Federação Gaúcha, os clubes, os patrocinadores e os torcedores ajudaram a forjar esta realidade e lhe dar continuidade.

O mesmo ocorre, paradoxalmente, no Rio de Janeiro. Enquanto os clubes se alternam nas dificuldades para escapar de posições medianas e, até mesmo, do rebaixamento no Campeonato Brasileiro, o Campeonato Carioca tem sido exitoso, pelas mesmas razões apresentadas no “Gauchão”.

Por outro lado, no estado de São Paulo, os últimos campeonatos têm sofrido um desgaste, no que concerne à ausência de clássicos em jogos decisivos, com conseqüente desinteresse do público nos estádios e, até mesmo, na TV, bem como alguns clubes pouco competitivos técnica e financeiramente que tornam a tabela de jogos inchada. Ainda pior se considerarmos, por exemplo, São Paulo e Palmeiras disputando a Libertadores. Como bem disse uma vez meu amigo Oliver Seitz, “muito futebol mata o futebol”.

No Estado do Paraná, que, neste ano, com base em um novo acordo com a TV, sinalizava para uma retomada de crescimento, eis que surge algo absolutamente impensável numa atividade que atrai muito dinheiro e interesse geral: o regulamento da competição nasceu como uma aberração. Para resumir a bagunça, o clube melhor colocado da primeira fase tem o “supermando” dos jogos no octogonal final – jogará todas as partidas em sua casa – o que criou descontentamento geral entre os clubes e ameaças envolvendo STJD e Justiça Comum.

Infelizmente, nesse caso, o foco são os problemas, não a grandeza dos eventos – o que prejudica o relacionamento entre os clubes, federações, patrocinadores e TV, bem como o próprio público amante e consumidor do esporte. Instabilidade contratual e investimentos não combinam…

Recentemente, uma pesquisa encomendada pelo maior grupo de comunicação do Paraná visou traçar o panorama geral do contingente de torcedores dos distintos clubes no estado.

Resultado: a maior torcida, com certa folga, foi a do Corinthians, do estado vizinho, São Paulo. Muito bem cotados na capital e no norte, estão o São Paulo, Palmeiras, Santos, além de Grêmio e Internacional, em especial no sul e sudeste do estado.

Essa pesquisa foi apontada como o fator que impulsionou a transformação no J. Malucelli, clube de família tradicional por aqui, no Corinthians Paranaense, por um lado, e reações indignadas, por parte dos que “exigem” que os habitantes do estado sejam torcedores dos clubes locais – jornalistas, torcedores, cronistas, políticos.

Já no Rio Grande do Sul, outra pesquisa realizada pela consultoria Nielsen em 2008, e veiculada na revista Veja, sobre o hábito de consumo da população em diferentes segmentos, evidenciou o contrário: os gaúchos dão preferência aos produtos nativos, autóctones. Não à toa, empresas como Magazine Luiza, TIM, AmBev, Wal-Mart e Carrefour compraram empresas locais, para “ser” gaúcha, ou direcionaram as estratégias de marketing para “parecer” ao menos.

Conseqüências: simpatia das comunidades onde atuam e maiores vendas, inclusive de produtos fabricados no estado.

Em outras palavras, a valorização do futebol dos campeonatos estaduais pode despertar o interesse do seu mercado consumidor, desde que impulsionada por uma mudança de cultura administrativa surgida e estimulada entre todos os envolvidos em sua organização e execução. Vale dizer, em coordenação, não em subordinação de interesses.

Esta postura é que possibilitará um aumento da base de torcedores/sócios em âmbito regional, com aumento de receitas em direitos de TV, patrocínio, licenciamento e merchandising, com perspectiva nacional sustentável. 

Mudanças nesse patamar não são feitas de uma hora para outra, tampouco por decreto, ou por cláusulas impositivas do tipo “Buy Campeonato Estadual”.

Para interagir com o autor: barp@universidadedofutebol.com.br