Duas equipes vivem grandes fases no cenário brasileiro atualmente: Palmeiras e Santos. E se olharmos para o jeito de jogar de ambas, não vemos nada muito sofisticado, nada muito elaborado. Tanto o verdão como o peixe possuem ideias bem simples de jogo com e/ou sem a bola.
E voltando o olhar para o banco de reservas e contextualizando o momento atual com o de algumas semanas atrás, notamos dois técnicos experientes substituindo dois jovens: Felipão, no lugar de Róger no Palmeiras, e Cuca, no lugar de Jair Ventura no Santos.
Meu objetivo aqui não é dissecar o trabalho desses profissionais, mas sim fazer uma reflexão do movimento da função de treinador no Brasil. Há uma sede feroz de todos, incluindo nós da imprensa, para que novos profissionais ganhem destaque no alto rendimento. Porém, invariavelmente voltam aqueles técnicos antigos, que já foram vencedores e que perderam de certa forma o seu auge, mas que ainda conseguem responder bem aos problemas que se apresentam no nosso futebol.
Tudo há um porque no futebol. Uma explicação. Os jovens treinadores não estão conseguindo de maneira geral ter sucesso por vários fatores. O primeiro é que eles não dominam por completo os novos conceitos táticos e metodológicos de treinamento que já são explorados há muitos anos nos maiores clubes do mundo. É claro que esses técnicos da nova geração vão ‘surfar na onda’ e aproveitar que se fala muito mais em princípios operacionais de jogo e métodos integrados e sistêmicos de treinamento do que se falava antigamente para passar uma imagem mais moderna. Porém, quando há pressão no trabalho e a qualidade tem que aparecer, esses profissionais não apresentam nada de diferente. É mais do mesmo. Apenas com uma nova linguagem.
E aí eles pecam em outra parte fundamental que é a gestão de pessoas e o capital simbólico que ainda não possuem, pela pouca rodagem. Um Cuca ainda terá mais presença de vestiário pelas conquistas que já teve e isso fará diferença no convencimento de um jogador. Um Felipão saberá fazer as forças do seu elenco e de todo o clube trabalhar a favor dele. E isso fará a diferença dentro de campo.
É necessário que um jovem treinador chegue com conceitos novos atropelando todos. Vencendo, convencendo e sendo melhor com uma abordagem diferente do comum. Algo similar ao que fizeram José Mourinho em Portugal e Pep Guardiola na Espanha. Por enquanto aqui no Brasil ainda não vi nada de diferente. Apenas um discurso mais rebuscado.
Ano: 2018
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Sobre a qualidade do jogo: uma introdução

Muito se fala, tanto em tempos remotos quanto recentes, sobre a qualidade do jogo praticado no Brasil. Aqui, adianto que não pretendo ser repetitivo, e que estas linhas serão apenas introdutórias. Ao mesmo tempo, não me parece que o tema esteja saturado e imagino que seja nossa responsabilidade, como profissionais do futebol, sustentar este debate com firmeza.
Nas últimas semanas, o tema foi novamente trazido pelo colega Adílson Batista. Adílson atribui parte significativa do suposto mau jogo praticado no Brasil ao calendário selvagem (adjetivo meu) aqui praticado. Em linhas gerais, ele me parece absolutamente correto, embora devamos avançar no tema. Apenas a título de ilustração, a equipe brasileira que mais jogos disputou no último ano foi o Flamengo: 83 partidas oficiais entre Campeonato Carioca, Copa do Brasil, Libertadores, Copa Sul-Americana, Copa da Primeira Liga (!) e Campeonato Brasileiro. Para efeitos de comparação, o Real Madrid, uma vez mais campeão da UEFA Champions League, fechou a última temporada com meros 58 jogos oficiais (números não-oficiais). A diferença é simplesmente obscena e, cá entre nós, sabemos a sua origem. Por ora, não nos debruçaremos aqui.
No ano passado, esta mesma Universidade do Futebol pontuou um importante debate sobre a qualidade do jogo no Brasil. O documento está aqui: diversos profissionais enviaram suas ideias sobre aquilo que consideram como qualidade de jogo. São inúmeras as definições e indico que leitores e leitoras saboreiem o conteúdo, com calma. Aqui, gostaria que nos atentássemos para uma das ideias, não apenas eficiente como bela, colocada pelo professor João Batista Freire. Faço um pequeno recorte:
“O termo “qualidade do jogo”, por si só, não define absolutamente nada.
Para dar sentido a esse termo, temos que agregá-lo a contextos. O jogo de futebol é um jogo coletivo. Por mais que integre uma equipe jogadores excepcionalmente habilidosos nos fundamentos do futebol, esses jogadores precisam colocar suas habilidades individuais à disposição do coletivo.
(…) Há algo que vai além das obrigações contratuais no jogo de futebol. Voltando à questão da qualidade do jogo, a imprevisibilidade, o risco, a graça do jogo é aquilo que poucos dominam. Quais técnicos de futebol chegam a discutir
essa questão? Pois deveriam, porque os que a dominarem, os que souberem entender melhor esse ponto, que é o fundamental em todo jogo, poderão saber como melhor orientar suas equipes. Esse é o ponto, em meu entender, que mais daria qualidade de bom jogo ao futebol”.
Não é preciso que nos debrucemos sobre Hobbes ou Rousseau para imaginar que, no jogo, também existe um contrato – contrato este que igualmente não se assina, mas está firmado. O problema é que cumpri-lo, na sua frieza, não basta. Um dos motivos por que a qualidade do jogo brasileiro tem sido severamente questionada me parece morar no objetivismo a que nos submetemos, como se o jogo fosse formado por uma série de checklists, de objetivos a serem cumpridos que, linearmente, levariam treinadores e treinadoras ao mais absoluto sucesso. Como se treinadores estivessem para o jogo como alguns chefs estão para a cozinha, bastando apenas elencar os ingredientes dentro de um menu previamente estabelecido e, em uma boa cuisine, montada por alguém, seguir cada um dos passos para, voilá, despertar o paladar daqueles que saboreiam (ou desejam saborear) o jogo.
O problema é que a qualidade do jogo, como o próprio termo revela, não é uma mensurável objetiva. Rubem Alves (que deveria ser lido pela crônica esportiva, diga-se) já havia nos alertado para a distância entre saberes e sabores e para a prevalência dos últimos, pois são eles que matam a fome da alma. No jogo se sucede o mesmo, e a qualidade em nada será maior se, ao invés de buscarmos os sabores, ficarmos apenas nos saberes, no contrato, pois não é disso que se trata o jogo. Ainda no campo da arte, os versos de Cartola são perfeitamente aplicáveis aqui, e o jogo, se entendido como mero cumprimento de um contrato implicitamente estabelecido, também será um moinho, capaz de triturar mesmo os mais diligentes e estudiosos, se estes não estiverem dispostos a saborear, a sentir o jogo. E isso, aliás, significa olhar para dentro.
A cozinha onde se faz o jogo a ser saboreado é, como já sabemos, o treino. É contraditório esperar qualidade de jogo se: a) não houver um treino de qualidade; b) não houver tempo para um treino de qualidade. É por isso que a discussão sobre o calendário em nada é uma desculpa ou um adorno. Assim como não nasce uma laranja em uma jabuticabeira, não nasce um bom jogar se não houver onde e como construi-lo. Aqui, me parece um equívoco grosseiro, mesmo para quem usa o futebol em função dos interesses do assim chamado mercado, o acúmulo de tamanhos jogos em tão curto espaço de tempo. O calendário selvagem é um dos pais da (dita) má qualidade de jogo, das bilheterias e audiências questionáveis, das lesões em profusão, de um sentimento razoavelmente blasé, uma indiferença parcial, que parece crescente no nosso futebol. Para o calendário, no mais alto nível, serve facilmente o adágio que diz que menos é mais.
Mas repare, até nisso conseguimos a proeza de dar mais aos que já têm muito e retirar dos que nada têm. Os clubes grandes se afogam no excesso de jogos enquanto os pequenos definham, apenas sobrevivem. O calendário, poeticamente, também ilustra a desigualdade que mora no coração deste país. A qualidade do jogo, neste olhar, seria vítima de força maior.
A saber. Continuamos em breve.
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O “Jogo Limpo” e o Marketing do Esporte

Há uns dias estava a consultar o twitter e havia percebido que um amigo compartilhara um interessante vídeo que reproduzia uma situação de fair-play da temporada passada do campeonato alemão. Era um jogo entre o Bayern de Munique e o Moenchengladbach, e envolvia Thiago Alcântara (Bayern), que em um lance tentou roubar a bola do adversário, Jonas Hofmann. Mesmo sem ser tocado, Hofmann vai ao chão e alega falta. O árbitro marca infração em favor do jogador caído. Thiago intervém e diz que não encostou no jogador, que confirma ao juiz: não tinha de fato sido tocado e, por isso, a arbitragem reverte a marcação. Logo em seguida, Thiago e mais um colega de equipe vão até Hoffman e o cumprimentam pela atitude.
Tudo bem, ele valorizou o lance, quis “levar vantagem”. Entretanto, corrigiu a situação e, de certa maneira, colaborou para o jogoe não o inverso, que é o “antijogo”. Conhecemos este termo por inúmeros exemplos como: atraso na reposição da bola, a proposital falta de objetividade, o fingimento e a dissimulação. Ou seja, simular uma falta ou lesão é contribuir para o não (anti) andamento do jogo. É o antijogo. É a inversão da função e o objetivo propostos por uma equipe ou atleta no gramado que é simplesmente: jogar.
Há quem diga que é um jogo psicológico de pressão sobre o adversário ou o árbitro. Ledo engano. Sugere que se está mais concentrado no antijogo do que propriamente no jogo. É possível – e os meus colegas através das colunas aqui na Universidade do Futebol mostram isso – usar o jogo para envolver o adversário em um cenário de pressão usando sistemas de jogo. Ao usá-los, favorecem e fortalecem a modalidade, ao deixar a partida mais atraente. Ganha quem sabe se valer disso e ganham os torcedores que apreciam um belo jogo.
Portanto, dentro de uma dinâmica de “Jogo Limpo”, que sugere a transparência, a integridade e o respeito, ganha quem o pratica, mas sobretudo ganha a arbitragem porque tem a certeza de que os futebolistas estão mais concentrados e preocupados com o andamento da partida (e não o contrário) e o torcedor, que também percebe este cenário e passa a disfrutá-lo. Quer queira, quer não, o objetivo final do torcedor é poder desfrutar do futebol. O produto fica mais atraente e mais pessoas vão querer consumi-lo. Ou seja, para o marketing do esporte, é um “prato cheio”!
Sem o fingimento, ganham todos.
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Entre o Clube e o Mercado
Bem-vindos ao nosso “Entre o Direito e o Esporte”. Nessa segunda sexta-feira de setembro nós vamos continuar a nossa conversa sobre o que a gente acha “Entre o Direito e o Mercado”. Ou seja, vamos dar uma olhada com mais calma no começo dos tais dos “direitos econômicos” na transferência de um jogador profissional de futebol. Um terceiro que não o seu clube e nem o jogador do seu time. Um terceiro que “compra” uma fatia dessa pizza que é a ida de um jogador do seu clube daqui para outro time – ainda mais de lá de fora.
E, para fazer que nem João e Maria, deixo aqui os pedaços de pão para a nossa coluna de hoje: vamos começar com a ideia de “estabilidade contratual vs. transferência”, ou seja, por que importa se um jogador sai do seu clube antes do fim do contrato? Depois vamos dar uma olhada na “realidade local: endividamento vs. necessidade de caixa”, em outras palavras, como estão os nossos clubes por aqui? Aí então vamos conversar sobre a ideia de “oportunidade de negócio: direitos econômicos como TPO”, ou para que isso importa(va) para o mercado?
Bora lá?
“O meu time vendeu aquele reserva por EUR 3m, boa!”. Bom, antes de começar… transferiu e não vendeu, por favor! Aqui a regra geral é tranquila: o contrato é feito para ser cumprido – a questão que fica é o “até quando?”. Imagina que o seutime trouxe para o profissional um craque que era da base, um craque da base que era “problema”, um “problema” que era uma joia bruta. Essa joia bruta tinha 3 anos de contrato, não vingava e o seutime transferiu o menino em troca de 3 milhões de euros. E aí?
O atleta profissional de futebol masculino no Brasil, em geral, só é liberado para outro time quando o contrato de trabalho (CEDT) dele com o seu time acaba ou se o seu clube e o jogador entrarem em um acordo. Com base nessa ideia de “mútuo acordo”, e aqui por exigência legislativa, pode ter o que a gente chama de “pré-fixação de valor de liberação prévio” que é o long para “cláusula indenizatória desportiva” (antiga “cláusula penal” que veio quando acabou o “passe”).
“Tá, mas e eu com isso?”. Lembra que o jogador saiu por EUR 3m do seu time? Então, isso foi um “mútuo acordo” e pode ter sido o pagamento dessa “cláusula indenizatória desportiva” (se for o pagamento da “multa contratual”) ou um “meio termo” que os dois clubes concordaram (o que é mais comum para quem não é “Diferente”, como diz o influencer jurídico-desportivo). Seja como for, o artigo 18 do Regulamento sobre o registro e a transferência de jogadores da FIFA diz que nesse contrato deve ter o nome do intermediário que está envolvido na negociação.
“Beleza… mas a gente já conversou um pouco sobre isso antes. Né, não?”. A resposta simples é: sim. Só que a gente ainda não parou para ver como isso aparece no mercado do nosso futebol! E, pois é, o direito entra aí como parte do nosso dia a dia que fica entre o “endividamento dos clubes” e a “necessidade de caixa”. Imagina que o seu clube tem uma dívida “monstro”. Imagina que o seu clube tem um monte de jogador “até que bom”. Imagina… o que o seu clube faz? Isso, “transfere os meninos todos” para fazer o caixa girar.
Essa nossa realidade tem dois fatores essenciais para que a gente pense no mercado do nosso futebol. E a nossa primeira parada é o histórico endividamento por parte dos clubes brasileiros, como a gente pode ver na série de Análise Econômico-Financeira dos Clubes Brasileiros de Futebol realizada pelo Itaú BBA. Segue o exemplo da publicada em 2017:
Essa dívida que continua “subindo menos rápido” vai parar no dia a dia do seu clube com “menos dinheiro em caixa” e maiores dificuldades para “conseguir” esse dinheiro na hora em que precisa. Pensa em um amigo seu. Esse seu amigo quer comprar um carro. Esse seu amigo precisa de um empréstimo para comprar esse carro. Esse seu amigo já tem uma dívida com parcela em atraso (esqueceu de pagar o último mês) no banco. O banco vai cobrar juros “mais baixo” ou “mais alto” que o normal? Isso, mais alto! E aí um empréstimo de R$ 40k que custaria R$ 60k para pagar em 2 anos vai custar R$ 75k. Isso pode virar uma bola de neve sem gestão financeira… o que, por diversos motivos, aparentemente aconteceu no futebol brasileiro.
E, assim, um dos “jeitinhos” de fazer caixa dos nossos clubes foi o que…? Isso mesmo! Transferir os jogadores do seu time antes do contrato de cada um deles terminar. Ou seja, chegar em um “mútuo acordo” (pré-fixado ou não) com outro clube para que aquele atleta vá para a… outra equipe. E, como a gente vê nessa série histórica aí de cima, é mais comum do que a gente pensa:
Essa nossa realidade de fazer caixa com transferência para cobrir o dia a dia do clube levou até a Receita Federal a “penhorar” (pegar antes do tempo com um processo judicial) os valores de transferências (futuras) de atletas de futebol – e isso já no início da década. Agora, se isso era uma prática tão comum do nosso futebol… será que não tinha um mercado para isso?
Pois é, tudo é uma “oportunidade de negócio” – só depende do ponto de vista. E o futebol brasileiro não “escapou” dessa regra geral quando a gente pensa na transferência de jogadores profissionais de futebol. Imagina que o seu clube tem essa “dívida monstro”. Imagina que o seu clube precisa “fazer caixa” agora para trazer uma estrela para o ano que vem – ou manter a estrelinha. Imagina que o seu clube vai precisar pagar juros de 331% ao ano (um empréstimo de BRL 1m vira mais de R$ 4 milhões em 12 meses!) para pegar esse dinheiro com um banco. E aí?
Essa realidade entre o “endividamento” e a “necessidade de caixa imediato” dos clubes brasileiros criou uma oportunidade de investimento (será?) para quem se interessasse em agir na “bolsa (informal) de valores do futebol brasileiro” que era o nosso mercado de transferência (onde surge “um Neymar por janela”). Aliás, é quase como a antiga “BM&F”… começou com uma “bolsa de mercadorias” (e dói dizer isso) e virou uma “bolsa de mercadorias e futuros”.
“Oi, pera, como?”. Isso mesmo! Que nem a gente faz com soja na B3, por exemplo. Resumindo e muito tudo isso: é onde o investidor busca uma commodity (como boi gordo, café e soja) antes dela “estar pronta” e revende depois – indo desde uma simples compra de “futuro de soja com liquidação financeira”, passando pelas “opções” do mercado, e chegando até em “operações estruturadas” complexas. Tudo isso tinha (ou tem?) no nosso futebol.
“Me dá um exemplo?”. Opa… imagina que estamos em setembro. Imagina que o seu time está lutando contra o rebaixamento. Imagina que o salário está 2 meses atrasado. Isso está afetando (é claro) o objetivo do seu clube (e a vida de um monte de gente). O seu clube não quer pagar tanto assim para um banco… aliás, o seu time não quer é pagar nada (não tem dinheiro mesmo, né?). O que faz? Sabe aquele agente (intermediário) amigo? Então! Negocia com ele 30% do que receber na transferência daquele jogador (que ele já agencia) em troca de “caixa para pagar salário do time” – se o intermediário vai repassar esses 30% para outra pessoa aí é “problema dele”, ao menos quando o seu clube pensa nessa hora.
Quer outro? Imagina que é novembro. Imagina que o jogador do seu time quer uma casa de praia para passar o ano novo. Imagina que ele é muito bom,mas ainda vai jogar a Copinha em janeiro. Detalhe: quando ele for jogar por outro time vai receber 20% do valor recebido pelo seu clube pela transferência. E aí… compra, pega emprestado, ou troca? Isso, troca com o próprio intermediário 15% por um apartamento no Guarujá (péssimo negócio hoje em dia).
“Entendi, e tudo isso pode?”. Lembra, hoje falei do que podiaquando a vida era mais simples e só tinha o artigo 18 do RSTP/FIFA – e não existia nem o 18bis que vamos ver semana que vem, e nem o 18tre da outra semana. Então lá atrás foi assim que começou toda a história do “jogador pizza” e das “fatias de terceiros” na transferência de um jogador daqui para lá– terceiros que não um clube ou o próprio jogador.
“Tá… volta um pouco. Você acabou de comparar um jogador com… soja?! É isso mesmo?”. Não amigo, não é isso. Imagina que você queria comprar uma casa. Imagina que você pegou um empréstimo no banco para comprar essa casa. Imagina que você tem uma dívida com esse banco para comprar essa casa. O banco é dono de você ou da sua dívida?
Agora imagina que os juros desse banco não eram lá tão “bons” quanto você gostaria. Você foi em outro banco. Esse outro banco te ofereceu juros “melhores”. E você optou pela tal da portabilidade e viu a sua dívida transferida de um banco para outro. Essa é uma modalidade de investimento (pasme) por parte dos bancos, ou seja, é uma escolha de investimento quando um banco “compra” (portabilidade) a sua dívida de outro banco. E, de novo, eu te pergunto… o banco é dono de você ou da sua dívida?
No futebol, a regra geral era a mesma. Assim como o banco não é dono de você, mas é da sua dívida. Aqui o “investidor” não é dono do jogador, mas é do valor da transferência. Já que “comprou” esse “recebível” (os tais dos “direitos econômicos”) de alguém como um “investimento” (de alto risco, com certeza). O atleta continua com o seu time, assim como a soja continua no chão da terra do agricultor enquanto isso.
E é assim que o direito desportivo aparece no que a gente acha entre o clube e o mercado. A “venda e compra” de direitos econômicos é diferente da transferência dos “direitos federativos” de um jogador. E, mais, é (era?) um jeito do seu clube fazer caixa e “manter o nível”. Pode ser até que não fosse a maneira ideal, mas era um jeito. E foi assim que começou a “era da pizza” no nosso futebol.
Por hoje é isso, um ótimo final de semana a todos! E convido vocês a ficar comigo no “Entre o Direito e o Esporte” nesse setembro. Semana que vem vamos continuar a nossa conversa sobre aquele tal do “jogador pizza”, focando no artigo 18bis do RSTP/FIFA – “influência de terceiros em um clube”. Combinado? Deixo meu convite para falarem comigo por aqui, pelo meu LinkedIn ou pelo meu Twitter. Obrigado e até semana que vem!
Eu não estou satisfeito com a qualidade do jogo do futebol brasileiro. Tenho plena certeza de que poderíamos fazer mais e melhor.
Os problemas e os seus diagnósticos são amplos, complexos e multifatoriais. Não há apenas uma razão que explique a baixa beleza dos nossos campeonatos. Para ficarmos na ‘página dois’: gramados, formação de jogadores, formação de técnicos, gestão esportiva, amadorismo dos dirigentes, impaciência e violência de alguns torcedores, más condições de acesso aos estádios, calendário, corrupção. São alguns pontos que acontecem aqui e acolá – claro, com boas exceções – mas que juntos fazem o nosso futebol estar na segunda, caindo para a terceira divisão mundial.
Eu como imprensa também tenho minha parcela de contribuição. Estamos formando uma massa crítica de torcedores? Ou alimentamos o ‘ganhou é bom, perdeu não serve’? Dentro da cadeia futebolística, valorizamos dirigentes austeros, que buscam a integridade e a assertividade em suas tomadas de decisões ou defendemos o ‘ganhar a todo custo’? Sei que ainda tenho muito o que evoluir e aprender, mas tenho estudado incansavelmente para decifrar o porque de derrotas e o porque de vitórias no futebol.
Faço essa contextualização porque me causou estranheza a entrevista coletiva do técnico Adílson Baptista, após o empate América- MG 0 x 0 Ceará, no último final de semana. Reproduzo abaixo alguns trechos:
– Não adianta nós ficarmos reclamando, nós treinadores e atletas, para apresentar um jogo de bom nível… dá para tirar as 20 datas de Estadual, que não vale nada, não leva a lugar nenhum, não joga contra ninguém. Aí fica esse futebol que vocês estão vendo: lento, preguiçoso. É político, é um reflexo do que estamos vendo aí, só tem ladrão neste país. É desgaste. Eu já defendo isso há anos. Campeonato estadual é um atraso no futebol brasileiro. Lugar nenhum do futebol mundial tem campeonato estadual. Só na várzea aqui do Brasil. Aí vão ver isso aí. Tenho que defender os atletas: fica lento, preguiçoso. Eu assisto Campeonato Inglês, você acha que eu assisto Série B? Eu não perco meu tempo. Assisto Campeonato Inglês, Campeonato Alemão, Espanhol. A gente vai assim mesmo, jogos ruins, jogos lentos. Eu fico triste como profissional.
Adílson tem muita razão quando ele cita o calendário. É um dos problemas da baixa qualidade do nosso espetáculo. Porém, ao colocar essas palavras ele se exime de toda e qualquer responsabilidade do processo. Quer dizer que ele como treinador não tem culpa de nada? Ele é apenas uma ‘vítima’ do que acontece? Mesmo com a pausa para Copa, o time dele está cansado por conta do campeonato estadual? O futebol então é só físico, é só o cansaço que conta? Ou o jogo é também físico, mas também técnico, tático, emocional, cognitivo, espiritual, etc?!….Não aceito as justificativas de Adílson.
A terceirização da responsabilidade dos nosso problemas é o pior cenário para encontrarmos soluções. Porque se somos frutos do que acontece conosco, para que tentar mudar então, não é mesmo?
Adílson Baptista, que já teve oportunidades em equipes grandes, como Cruzeiro, São Paulo, Corinthians, deveria buscar como melhorar a qualidade dos seus treinos para que sua equipe seja intensa por 180 minutos semanais. Como ele pode evoluir como treinador para que mesmo diante das circunstâncias o trabalho dele se sobressaia?. Culpar o calendário, a estrutura, ‘os ladrões’, o dinheiro (ou falta dele) é muito fácil. Não dói. A culpa é do outro. Desse jeito fica difícil mudar. E seguimos com mais do mesmo.
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Sobre os jogos dentro do próprio jogo

Leio no El País uma agradável entrevista com Javi Gracia, treinador do Watford, uma das surpresas deste início de temporada na Inglaterra. Após quatro jogos – um deles contra o Tottenham, diga-se – o Watford soma doze pontos, um começo brilhante. Evidente que os holofotes, nessas ocasiões, se voltam para o treinador. Neste caso, falamos de um profissional com passagens por Olympiacos, Málaga, Osasuña e Rubin Kazan, entre outros. O salto para a Premier League, em alguma medida, parece bastante razoável.
A frase que origina a manchete da entrevista é particularmente atraente: na Premier League, diz Gracia, há vários jogos dentro de um jogo. Segue ele (tradução livre):
“Há muitas influências de treinadores e jogadores distintos que têm uma repercussão no jogo. É uma liga muito rica não apenas no econômico, como também no tático. Em cada jogo há constantes modificações de sistema de jogo. Uma equipe joga com três centrais e, de repente, muda a defesa para [linha de] quatro. Há momentos em que joga mais direto, em que se buscam as segundas jogadas, quando em outros há mais pausa. Há muitos jogos dentro de um jogo.”
A reflexão de Gracia, como podemos observar, reside no campo da tática, mais especificamente das mudanças de plataformas que há durante um mesmo jogo. Em alguma medida, aliás, me parece que a chegada de Pep Guardiola à Inglaterra parece ter contribuído de maneira importante neste sentido, fazendo com que os adversários, para responderem aos problemas criados pelo Manchester City e pelo próprio jogo, também tenham adotado estruturas mais fluidas, por assim dizer (repare, aliás, como a própria seleção inglesa parece ter importado algumas das descobertas do City, como Kyle Walker como zagueiro e a participação ativa de John Stones no início da organização ofensiva, às vezes como um falso volante).
Mas aqui, prefiro ir por um outro caminho, um pouco mais amplo. Imagino, por exemplo, se os vários jogos dentro de um jogo são uma qualidade exclusiva da Premier League ou se, ao invés disso, são uma característica do jogo em si. Como defendemos anteriormente, o jogo parece ser uma rede de variáveis intrincadas, ondulatórias, que oscilam não exatamente de acordo com quem joga, mas de acordo com o próprio jogo. Não é o jogo que se adapta a quem joga, mas nós que nos adaptamos aos problemas por ele impostos. Neste sentido, atletas e treinadores são como atores e atrizes, mas com particularidades: representam não apenas um, mas vários papeis durante o jogo (pense nas estruturas fluidas de que falamos acima), em um palco vivo, cujo roteiro não é escrito a priori (é, no máximo, rascunhado), mas se faz em tempo real.
Repare, assim, no alcance da pluralidade exigida pelo jogo: é preciso que sejamos vários, pois o mesmo jogo que, em um certo instante, aceita um determinado papel, no instante seguinte o rejeita, e cabe a nós, atletas e treinadores, a mais rápida adaptação possível. Neste sentido, temos aqui um pé absolutamente fincado na formação, pois assim como é salutar a formação de atletas versáteis, o mesmo se aplica as outras funções dentro de uma equipe: quanto maiores forem os papeis potencialmente exercidos por cada um dos profissionais de dentro do clube, maiores serão as possibilidades, mais histórias podem ser escritas a partir de uma dada ideia.
É fundamental, neste sentido, perceber o jogo não como narrativa encadeada, linear, teleológica, mas como uma poesia de versos incertos, assimétricos, em nada lineares. Assim como um poeta não sobrevive apenas da leitura de poesias, treinadores e treinadoras não podem se alimentar apenas do futebol: é preciso sair do futebol para encontrá-lo, é preciso personificar a multiplicidade de que falamos acima, pois é assim que seremos práticos, sendo tão mutáveis quanto é o próprio jogo. Da mesma forma como não se banha duas vezes no mesmo rio, treinadores e treinadoras nunca são os mesmos, estamos em constante movimento. Aqui, aliás, pense bem: se um ser está em movimento constante, como é possível conhecê-lo, se a cada instante ele se torna algo diferente? Parece uma pergunta ingênua, mas não é – basta olhar atentamente para o jogo. Retomaremos este debate em breve.
Por fim, repare como essa percepção tem repercussões importantes no nosso treino, pois se julgamos que o jogo sempre acontece no plural, também precisamos julgar que os treinos, por sua vez, também o sejam. Como o treino será plural? Em linhas gerais, pelo método. Quanto mais próximo o treino estiver do jogo real, ou seja, quanto mais os treinos forem jogos e os jogos forem treinos, desde que haja uma intencionalidade definida, mais próximos estaremos do mosaico em que repousa o jogo. Assim como há pequenas peças dentro de uma grande peça que é o mosaico, há pequenos jogos, interligados, dentro de um grande jogo.
De fato, há vários jogos dentro de um.

A Copa do Brasil chega à fase semifinal com dois grandes duelos: Palmeiras contra o Cruzeiro e Flamengo contra o Corinthians. Grandes torcidas, grandes estádios, grandes elencos. As quatro equipes que não apenas querem a Copa, mas querem a Libertadores, que já venceram ao menos uma vez. Certeza de casa cheia em todos os jogos. Bastante audiência também pela televisão. A Copa do Brasil se revela sendo um excelente produto.
Em primeiro lugar, porque tem conseguido proporcionar eventos que acabam por promover o torneio, gerar debates e discussões na imprensa que caem na boca dos torcedores e aumentam as expectativas para bons jogos. Tratam-se dos sorteios dos confrontos, equipes mandantes e visitantes. A propósito, acaba por ter um efeito semelhante ao que é, por exemplo, o sorteio da Copa da Inglaterra entre os adeptos de futebol daquele país.
Outro indicador que sim, pode ser considerado fator do quanto a Copa do Brasil está valorizada, é a quantidade de anunciantes através das marcas no perímetro do campo, expostas nos jogos. São muitas, dos mais diversos setores da economia. A cada temporada saem algumas, entram outras, mas a exposição segue bem alta, acompanhada de inovações que agradam aos olhos de quem assiste pela TV ou no estádio, o que faz agregar valor ao produto “Copa do Brasil”. Como consequência, a valorização (financeira e afetiva) do evento, retenção e atração de novos anunciantes.
É um caso bem interessante dentro da indústria do marketing do esporte no Brasil, de propor e oferecer um produto a um mercado consumidor do futebol de todo um país, haja vista que as primeiras fases conseguem reunir equipes de todos os rincões deste “Brasilzão”. De um campeonato que consegue comunicar sua grandeza (porque dá acesso ao principal torneio de clubes do continente) com base na diversidade e riqueza da modalidade em nosso país. Poderia conseguir fazer isso mais, é verdade. Entretanto, em alguma medida isso é feito. É um bom caminho.
Com tudo isso, vamos desfrutar, a partir desta semana, de uma excelente fase final de uma Copa do Brasil bastante interessante e que é capaz de tornar-se muito mais nas próximas temporadas. Basta seguir pensando em fazê-lo e comunicá-lo para um mercado cada vez mais exigente e disputado.
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Quem pensa o jogo?
Partiu do técnico Adilson Batista, contratado neste ano pelo América-MG, o diagnóstico mais preciso sobre o atual momento do futebol brasileiro. No último domingo (09), após empate sem gols contra o Ceará pelo Campeonato Brasileiro, o comandante do time de Belo Horizonte chamou atenção por entrevista coletiva verborrágica, criticou o nível da partida em que havia acabado de trabalhar e responsabilizou dirigentes de clubes por aspectos como lentidão e morosidade nos gramados locais.
“Dá para tirar as 20 datas de Estadual, que não vale nada, não leva a lugar nenhum, não joga contra ninguém. Só por causa da federação, recebe R$ 100 mil e ficam esses campeonatos estaduais. Aí fica esse futebol que vocês estão vendo: lento, preguiçoso. Eu mostrei para eles. Vi Brasil e Estados Unidos [vitória dos pentacampeões mundiais por 2 a 0 em amistoso disputado no dia 07 de setembro]: você vê futebol de alto nível, jogadores tops, todos fazem andar rápido. É muita velocidade, muita intensidade. Ninguém fica penteando a bola. Aí você tem que viajar para Uberaba, Uberlândia, tem que ir lá para Ituiutaba, aí vai chegar aqui, meio de agosto e setembro, está cansado. Mas quem comanda o futebol não enxerga isso. Não adianta eu ficar falando, outros treinadores já falaram. Tem 44 finais de semana, tem 88 datas, quarta e domingo para fazer decentemente um Campeonato Brasileiro. Mas não querem. É político, é um reflexo do que estamos vendo aí, só tem ladrão neste país”, disse o treinador.
A sobreposição de jogos não é uma novidade no futebol brasileiro, mas a temporada 2018 tem uma série de peculiaridades. É ano de Copa do Mundo, e por isso o calendário foi interrompido na metade da temporada – o que motivou intervalo menor na virada do ano e fragmentou a preparação das principais equipes nacionais. O desfecho da Copa do Brasil também foi jogado para novembro – em 2017, a decisão havia acontecido em setembro. E a competição nacional disputada em mata-mata também recebeu aumento considerável de premiação, o que mudou consideravelmente a escala de prioridades dos clubes.
Ganhar a Copa do Brasil demanda menos jogos do que ser campeão brasileiro. Além disso, dá mais dinheiro e ainda oferece ao vencedor uma vaga na edição seguinte da Copa Libertadores, principal desejo de torcedores e dirigentes de times brasileiros. São muitos argumentos favoráveis ao certame disputado em formato mata-mata.
Existe, portanto, um calendário espichado, flagelado, que convida os times a deixarem de lado o Campeonato Brasileiro. A principal competição organizada pela CBF (Confederação Brasileira de Futebol) é maltratada por diversos motivos, subjugada em diferentes níveis.
A discussão proposta por Adilson, contudo, não se limita aos problemas causados pelo calendário. A estrutura organizacional precária do futebol brasileiro tem efeitos nefastos na comunicação, no interesse do público, na relação com patrocinadores e parceiros, mas principalmente na concepção do jogo. E aí entra uma das principais questões sobre o atual momento do esporte no país: enquanto aspectos como o calendário são discutidos e têm várias soluções práticas enfileiradas, quem pensa o jogo?
As próprias mudanças na Copa do Brasil são prova de que a CBF, ainda que não ataque a raiz dos problemas, está preocupada com o calendário e tenta criar lógicas diferentes para distribuição de conteúdo ao longo do ano. E quanto ao jogo, o que a mesma entidade fez nos últimos anos?
A CBF cogitou incluir no Campeonato Brasileiro o VAR (sigla em inglês para árbitro assistente de vídeo, em tradução livre), mas levou a discussão aos clubes com um preâmbulo conveniente: antes de debater formatos e custos possíveis em cada cenário, jogou na mesa um número grande e conduziu uma votação balizada apenas por “você aceita ou não aceita gastar tudo isso para dirimir algumas polêmicas?”. Nem a amplitude de uso do recurso foi discutida, e a Europa tem mostrado como é abrangente essa lista de possibilidades.
Que outra medida a CBF tomou para interferir no andamento dos jogos no Brasil? Neste ano, preocupada com o excesso de jogadores poupados em seu principal torneio, a entidade chegou a discutir uma limitação de elencos e um veto ao uso de reservas. Mais uma vez, encontrou uma solução inexequível para atacar um problema sem abordar suas principais razões.
Numa época marcada por abusos e excessos em campanhas políticas, chama atenção o fato de a CBF sequer tentar estabelecer uma linha de comunicação com seu público. Todas as ações da entidade são institucionais, protocolares e desprovidas de personalidade. Tudo parece ser feito apenas como resposta, sem compromisso com mudanças reais.
Já passou da hora de a CBF se preocupar com o que acontece em campo e discutir se é esse produto que seus consumidores querem. Sobretudo porque o Campeonato Brasileiro tem entrado em uma fase mais aguda de discussão sobre venda de direitos para o mercado internacional. Afinal, sabemos se o material oferecido está adequado aos anseios desse público?
Precisamos pensar em qual é o futebol que queremos. Precisamos pensar em medidas que possam interferir no ritmo, no perfil e no modelo do jogo enquanto produto. O triste, porém, é constatar essas demandas e ver também o quanto a CBF está alheia a esse processo.
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Entre o Direito e o Mercado

Bem-vindos ao nosso “Entre o Direito e o Esporte” desse setembro! Hoje vamos dar uma olhada no que vamos conversar nesse mês. É aquele começo, é aquele primeiro contato, é aquele primeiro olhar nesse tema que a gente adora:
Isso mesmo, esse mês nós vamos falar sobre pizza! Aquela pizza que a gente falava lá atrás quando o jogador tinha um monte de gente com um pedaço – que nem terreno em algumas cidades do nosso Brasil que tem mais dono que chão.
E para deixar tudo mais direto, esse é o nosso mapa de hoje e do nosso mês: vamos começar com o que a gente vê entre o clube e o mercado, ou seja, como tudo era com o “artigo 18” – do Regulamento sobre o registro e a transferência de jogadores da FIFA; na nossa terceira semana vamos conversar sobre o que está entre o jogador e o mercado, em outras palavras, a primeira mudança pela FIFA com seu artigo 18bis; e fechamos o mês com aquilo que a gente acha entre a FIFA e o mercado, com a criação do artigo 18tre.
Enfim, vamos ver como a pizzaria vai do delivery até o forno a lenha gourmet passando por aquela em pedaços naquele food truck elétrico.
Bora lá?
O bom e velho oeste do futebol. A regra geral da nossa segunda semana é a de que “se não diz que não pode, então pode”. É tipo colocar ketchup na pizza, sabe? Nada diz que não pode… então cada um escolhe se faz isso ou não – só, por favor, molho de tomate e não ketchup, vai!
Brincadeira de lado, a gente vai conversar sobre qual era a base do Regulamento sobre o registro e a transferência de jogadores da FIFA (RSTP) quando só tinha seu “artigo 18” e como isso afetava o mercado de transferências de atletas profissionais de futebol. Em outras palavras, vamos dar uma olhada em como tudo era quando surgiram as primeiras pizzas do nosso futebol.
Entre quatro linhas. A nossa terceira semana foca no “gol só vale sem impedimento”. É como quando a gente quer pedir uma pizza meio frango com catupiry meio calabresa… é, isso mesmo. Você pode fazer isso… mas sabe que vai pagar a mais cara porque essa é a regra – daí nem adianta chorar, estava escrito no cardápio!
Deixando para lá a fome, a gente vai conversar sobre a inclusão do artigo 18bis no RSTP. Ou seja, quais eram os limites para o “investidor” colocar dinheiro no futebol em troca daquele pedacinho da pizza na hora de transferir “um Neymar” para fora do Brasil, sabe?
Entre a falta de água e o deserto. Fechamos o mês de setembro conversando sobre o “não” da FIFA para os tais dos “direitos econômicos” – e como o “mundo da pizza” teve que se reinventar. Imagina aquela vontade de comer pizza… você chega lá doido para pedir uma portuguesa e descobre que só tem “margherita” ou “marinara”.
É, é quase isso que aconteceu com o nosso futebol com o artigo 18tre no RSTP. O “não” da FIFA para o repasse dos direitos derivados da transferência dos direitos federativos de um atleta profissional de futebol a terceiros varreu para “debaixo do tapete” um mercado que ainda existe – como era esperado.
Resumindo, nesse mês de setembro nós vamos ter uma conversa séria: como o “direito” aparece na “economia” do esporte. Ou seja, o que nós vemos “Entre o Direito e o Mercado” quando a gente pensa na transferência daquela estrela do seu clube lá para fora.
Fico por aqui hoje, desejo a todos um ótimo feriado! E convido vocês a continuar no “Entre o Direito e o Esporte” nesse setembro. Semana que vem vamos continuar a nossa conversa sobre aquele tal do “jogador pizza”. Fechado? Deixo meu convite para falarem comigo por aqui, pelo meu LinkedIn ou pelo meu Twitter. Obrigado e até semana que vem!
Se o futebol é complexo, sistêmico e multifatorial, quem o pratica também é. Não podemos fazer qualquer tipo de análise contando apenas um único fator.
Se para opinarmos sobre uma equipe, um campeonato e um jogo temos que considerar os aspectos técnicos, táticos, físicos, emocionais, comportamentais, psicológicos e até espirituais para falar de qualquer jogador, também devemos partir desses mesmos pressupostos, que são bem amplos, diga-se de passagem. Coloco tudo isso para pontuar que em uma avaliação sistêmica eu jamais contrataria o volante Felipe Melo para o meu time.
Reconheço as virtudes técnicas e táticas dele. Felipe tem uma inteligência para ocupar o espaço acima da média do futebol brasileiro. É verdade que sua condição física não o ajuda, já que ele está em um declínio corporal. Porém, sua rapidez cognitiva compensa isso.
O problema de Felipe é o comportamento. Sua intrínseca vontade de fazer valer algo muito próximo da intimidação ao adversário se volta invariavelmente contra ele mesmo. Felipe é imprevisível. Viril além do ponto. Provocador ao extremo. E isso prejudica sua equipe. Ele pode ser expulso no começo, no meio ou no fim do jogo. Até mesmo pode brigar após o apito final da arbitragem. Pode mandar áudios ofensivos contra o técnico da própria equipe. Pode tentar dar ‘lição de moral’ em algum companheiro mais novo durante os treinos.
Hoje todo bom departamento de análise de desempenho checa comportamento e histórico para indicar qualquer contratação. É claro que não existe jogador perfeito. Até porque o próprio perfeito é subjetivo – o que é perfeito para mim pode não ser para você. Mas dentro do meu critério de análise, os defeitos de Felipe Melo se sobrepõem as suas virtudes. O ‘pacote’ não compensa.