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A rua como espaço público de educação

Este é o primeiro artigo de uma série que abordará o significado da rua como espaço público de educação, mais especificamente, de formação para a vida em cidadania, a vida coletiva, a vida política e social. O objetivo desta série é esclarecer as pessoas que circulam no campo da Educação Física e do Esporte para a importância de um tipo de educação que é, quando considerada, quase sempre subestimada. Falamos de um processo educativo que ocorre nas pequenas sociedades infantis, onde não há educação a cargo de pessoas adultas autorizadas, mas educação entre pares (crianças com crianças).

O empenho permanente dos seres humanos é constituírem-se humanos. Mas não bastaria aguardar a ação da natureza, cada qual desenvolvendo-se de acordo com o roteiro biológico? Não, afinal, cada ser humano que nasce, nasce incompleto. Significa dizer que refutamos a teoria inatista do conhecimento. Por sua vez, ao afirmar que o ser humano nasce incompleto, e não “vazio”, estamos implicitamente nos posicionando a favor da teoria do conhecimento interacionista.  

A gestação na barriga da mãe, aquela que tão bem dá conta de produzir os outros animais, no ser humano é incompleta. Nascemos com muito mais faltas que com presenças. Boa parte do que necessitamos para viver neste mundo está inacabado. É como se, no caso do ser humano, tivéssemos que ter duas mães: a primeira, a mãe biológica, que se encarrega da primeira vida em sua barriga; a segunda, a mãe social, a sociedade toda (inclusive a mãe biológica), que constitui uma espécie de segunda barriga. A sociedade humana é uma barriga social. São Tomás de Aquino dizia que “o homem é, por natureza, político, isto é, social”. [1]

O homem é aquele que, como outros animais, um dia sai de casa, não para viver sob a orientação dos instintos, mas para viver sob a orientação das regras que tornem possível o convívio com outros homens. O homem sai de casa para viver na polis, ou seja, para exercer sua condição de animal político, de forma que em sua vida tudo será “[…]decidido mediante palavras e persuasão, e não força e violência.” P.31[2]. Ainda, segundo Hannah Arendt, “Para os gregos, forçar pessoas mediante violência, ordenar ao invés de persuadir, eram modos pré-políticos de lidar com as pessoas, típicos da vida fora da pólis, característicos do lar e da vida em família, em que o chefe da casa imperava com poderes incontestes e despóticos, ou da vida nos impérios bárbaros da Ásia, cujo despotismo era frequentemente comparado à organização doméstica.” P. 32[3].

Ainda hoje, especialmente quando se trata de crianças, as relações familiares são orientadas por imposição dos mais velhos. O modo como as relações são tratadas em família é completamente diferente do modo como são tratadas na rua. Na rua, pela primeira vez, as crianças estabelecerão relações entre pares, sem a intermediação de adultos e sem as imposições destes. Especialmente quando sua imaginação amadurece e, por volta dos seis, sete anos, com o desenvolvimento da moral (ainda heterônoma), surge o interesse pelas relações coletivas; a criança sente-se compelida a resolver os conflitos por discurso, por persuasão. A violência como instrumento de solução de conflitos perde força e as negociações e os acordos ganham terreno.

Talvez não devesse ser assim, mas também a escola, de maneira geral, é impositiva, realizando sua orientação pela força. Se nela antigamente prevaleciam os castigos, alguns corporais, a força e a imposição física dos adultos sobre as crianças, na escola atual, e não tão atual assim, predomina a violência simbólica em forma de ameaças e chantagens, de avaliações, notas, premiações, competição pautada em normas de referência social, reprovações etc. Aquele que deveria ser um espaço acolhedor, de liberdade, de criação, de amadurecimento, da constituição de vínculos e estabelecimento de diversas e distintas relações sociais, apresenta-se como um ambiente intimidador, cerceador… um espaço de privação de liberdade, no qual as crianças permanecem em “celas de aula” cumprindo “regime fechado” em  uma “grade horária” sob vigilância e coação.  

Portanto, resta às crianças o grupo infantil; sua pequena sociedade de pares que, embora carregando sinais da violência que cada qual traz da família e, muitas vezes, da escola, pressiona para um tipo de relações públicas e políticas, nas quais a ação e o discurso precisam caminhar em consonância, para que os conflitos sejam resolvidos. Afinal, na rua da criança, trata-se de brincar, e o jogo não pode ser interrompido por largo tempo. Que os conflitos sejam rapidamente resolvidos, as regras aceitas ou (re)elaboradas, e que o jogo siga.


[1] De acordo com Hannah Arendt, a citação é do Index Rerum da edição de Turim das obras de São Tomás de Aquino (1922). Arendt, Hannah. A condição humana. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2010.

[2] Arendt, Hannah. A condição humana. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2010.

[3] Idem

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O treino (não) precisa ser legal – uma reflexão

Crédito: Marcello Casal Jr/ABr

Bom, já conversamos algumas vezes sobre o quanto o processo de treino caminha junto do processo de ensino e do processo de aprendizagem. Ou seja, de fato há muitas semelhanças entre treinadores/treinadoras e professores/professoras. Isso me parece bastante positivo, uma vez que não apenas nos ajuda a pensar sobre as pontes que inevitavelmente existem entre diferentes profissões, como também nos faz perceber que, para ser treinador ou treinadora, é preciso um certo tipo de saber, do ponto de vista pedagógico – seja ele intuitivo ou não.

Mas, isto dito, sinto que nós ainda temos alguns palpites perigosos quando pensamos no tipo de sentimento que os nossos processos de treino devem despertar. Inclusive, porque hoje se reproduz velozmente este discurso próximo do que se entende por educação centrada no aluno ou, no caso do futebol, da educação centrada no atleta. Não raro, este mesmo discurso transita para uma outra coisa, próxima disso que se tem chamado de desenvolvimento positivo, algo razoavelmente difundido nos círculos acadêmicos – mas que não é exatamente o que me interessa aqui. O que me interessa é o seguinte: por que raios o treino, centrado no atleta, precisa ser legal? Quem disse que a educação ou o treino, para que sejam bons, precisam ser legais?

Este é um problema muito importante, porque não se separa de um debate fundamental, que é o das metodologias de treinamento. Pois, veja bem, talvez você concorde comigo que um processo de treino essencialmente técnico, baseado na técnica, principalmente na iniciação esportiva, parece ter outras preocupações que não o prazer. Na verdade, um processo essencialmente técnico tem, como uma das suas premissas, a noção de que a performance de um atleta depende especialmente do domínio de certas qualidades técnicas – geralmente chamadas de fundamentos. Embora também não seja o ponto deste texto, indico aos amigos um vídeo do amigo Lucas Leonardo, que discute muito bem os problemas de se pensar o treino de fundamentos – no futebol e em outras modalidades.

O que me interessa aqui é que existe, mesmo nos colegas que preferem metodologias mais próximas dos jogos (ou mais próximas da complexidade, daquilo que é tecido junto) uma ideia de que um dos motivos porque treinamos a partir de jogos, sejam eles pequenos ou grandes jogos, é porque é algo mais prazeroso, ou mais agradável, ou mais legal, ou qualquer outra coisa neste sentido – como se o processo de treino, ou como se própria educação, existisse apenas para ser prazerosa, agradável ou legal e, mais do que isso, como se o processo de treino e a educação existissem para gerar uma felicidade imediata, instantânea. Embora seja um pensamento corrente, talvez seja um pensamento muito problemático. A educação, veja bem, não deve ser um fardo, não existe para deixar a vida pior e mais triste, nós sabemos disso, mas isso também não significa que a educação (e o processo de treino) deva existir como ração de prazeres pequenos e imediatos, muito menos que deva existir somente para fazer aquilo que o aluno/atleta quer que seja feito: pelo contrário, a educação existe para fazer o que deve ser feito. E quem decide o que deve ser feito, pensando na formação do aluno ou do atleta no longo prazo, não é o aluno ou o atleta (que, se soubesse disso, não seria aluno): são justamente treinadores/treinadoras e professores/professoras. Repare como faz ainda mais sentido pensar nos treinadores como professores.

Jorge Larrosa, um filósofo que tenho lido bastante nos últimos tempos, tem um ótimo texto sobre isso, num livro intitulado El Profesor Artesano. Ali, ele defende a importância de uma educação livre, que não esteja presa a supostas obrigações de agradar o educando (especialmente quando a educação é paga – repare aqui nas escolinhas de futebol), mas sim de ensinar o que deve ser ensinado. Quando fazemos educação apenas de um ponto de vista utilitário, quando alunos/atletas são apenas clientes, a consequência imediata é que os alunos/atletas vão encarnar a noção de que a educação serve para agradá-los, que o mundo serve para agradá-los, e que portanto tudo aquilo que não os agrade na hora, de imediato, tudo aquilo que não seja prazeroso, agradável ou legal, deve ser imediatamente descartado. Basicamente, saem da sala de aula ou do treino entediados ou mesmo irritados, ainda que não verbalizem, porque não faz sentido quando o mundo não gira ao seu redor e não faz deles felizes no instante. Não é preciso ir muito longe para sabermos o quão absurdo isso pode ser.

Ao mesmo tempo, não perca de vista o que eu disse acima: o processo de treino não tem que ser monótono, chato, entediante. E, se me permite, não perca de vista que o processo de ensino e aprendizagem de um atleta não se resume ao treino. A nossa relação, enquanto treinadores e treinadoras (ou profissionais do futebol em geral) com os atletas precisa ser uma relação de desafio. A nossa função é causar um tremor, causar um incômodo, causar um certo tipo de fissura, algo parecido com o que sentimos quando lemos um livro muito bom, ou quando assistimos um filme ou uma série que nos tira o chão, ou quando conhecemos alguém muito interessante, que faz de nós outra pessoa além de nós mesmos. O atleta precisa se sentir estremecido, inquieto, desafiado. Por muitas vezes, isso vai sim significar repetição (contextualizada, mas repetição), disciplina, desconfortos físicos e emocionais, conflitos com os outros e consigo mesmo – e assim sucessivamente. A educação precisa ser desconfortável. Ao mesmo tempo, é justamente o desconforto do instante que permite um certo tipo de florescimento, que permite que se crie um outro mundo no médio prazo. Se quisermos nos sentir bons treinadores, pelo menos é como eu vejo as coisas hoje, não temos que nos preocupar em ficar fazendo coisas legais e agradáveis, como inclusive somos induzidos a fazer, mas temos que fazer o que tem de ser feito, dentro dos conteúdos que julgamos importantes (e não me refiro apenas aos conteúdos tático-técnicos), com as dúvidas que achamos pertinentes, com os desconfortos que achamos pertinentes, fazendo a roda rodar. E isso também significa, se me permitem, que podemos não ser tão queridos, pelo menos não de cara. Se queremos ser queridos por todos e por todas, aliás, talvez tenhamos aqui um problema razoável.

Vamos retomar este assunto num outro momento. Por ora, gostaria apenas de sugerir o quão prejudicial pode ser pensar no processo de treino como algo obrigatoriamente legal. Talvez isso não seja tão legal assim.

Seguimos em breve.

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Habilidades para reerguer o Corinthians

A situação do Corinthians é preocupante, dentro e fora de campo, e no médio prazo as esferas externas e internas às quatro linhas sempre acabam se confundindo e produzindo juntas um único resultado. Um clube com problemas financeiros e políticos, que se soma a um time sem confiança e sem uma herança tática deixada pelo treinador que saiu, se mostra um desafio gigantesco ao próximo treinador. Seja ele o interino Dyego Coelho ou outro que vier a ser contratado.Todo e qualquer modelo de jogo deve ser condicionado pelo que os jogadores podem oferecer. Em todos os aspectos: técnico, tático, físico, emocional e até em questões espirituais, sociais . Por exemplo, jogadores intimidados pelo momento dificilmente vão apresentar passes e/ou dribles ousados. Ou zagueiros lentos terão dificuldade em jogar adiantados porque terão dificuldades para acompanhar atacantes velozes. Veja: situações físicas e emocionais interferindo na maneira de jogar.

Mas além dessas questões que são mais relacionadas ao campo, o comandante corintiano terá que ter outras competências que são até mais complexas. A gestão do ambiente se mostra nesse momento a situação mais desafiadora a ser enfrentada. Capacidades de comunicação, liderança, habilidade de se relacionar, capacidade de adaptação rápida com uma ações, consequentemente, eficazes no ambiente, serão tão ou até mais importantes do que os conhecimentos técnicos. Todo grande clube tem suas peculiaridades e uma história calcada em identidade de jogo e maneira de se relacionar com o torcedor. O bom treinador é aquele flexível o suficiente para se adequar ao ambiente e não chegar com um modelo já pronto. Nesse atual instável Corinthians não há muita margem para testes e erros. Em uma temporada tão atípica, vacilos custarão muito caro. 

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Quem treina o treinador de futebol no Brasil? – Melhorando a tomada de decisão

Salve, salve amantes do futebol! Na coluna anterior falamos sobre a importância do autoconhecimento na carreira de um treinador e sugerimos algumas práticas para o desenvolvimento de competências intrapessoais.

Nesta, falaremos sobre a relevância em preparar o treinador para tomar decisões e traremos algumas sugestões para que o mesmo seja mais assertivo ao fazê-las.

Quantas decisões o treinador toma por temporada? Decisões de curto prazo, mais frequentes e fundamentais como o processo treino-jogo: titulares, reservas e listas de jogos; o que treinar; como treinar; que feedbacks passar para atletas; contratações de atletas e comissão técnica; substituições nos jogos; estratégia de jogo e comunicação; como lidar com pais, agentes, torcida, imprensa, entre tantos outros. Decisões de longo prazo como: negociar salário e contratos; escolher clubes; definir se vai para outro clube ou não; se pede demissão ou não; escolher categoria; mudar de cidade com família ou sem; se trabalha com agentes ou não; que profissionais convidar para trabalhar junto, entre tantas outras também.

Mas afinal, quem treina o treinador para melhorar essas tomadas de decisões? Falamos muito sobre evoluir a tomada de decisão do atleta, e as decisões do treinador? Alguns prontamente dirão que é na vida, no dia-a-dia, que ele aprende na prática, mas será que não há maneiras de ajudar o treinador a aperfeiçoar esse processo? Será todos precisarão cometer os mesmos erros? Certamente, a prática gera experiência, no entanto, mas aprender a tomar melhores decisões não se resume a isso.

No processo de ensino-aprendizagem do treinador algumas ações podem ser realizadas para promover uma melhora nas escolhas pontuais, de curto, médio e de longo prazo que o treinador toma ao longo de sua carreira, tanto pelos próprios treinadores, como por instituições de ensino, clubes e federações, responsáveis pela formação continuada desses profissionais.

a) Criar fóruns de debates sobre erros e acertos de treinadores mais experientes;
b) Realizar pesquisas qualitativas sobre o mindset e o comportamento de treinadores em diferentes níveis;
c) Treinar o processo LICA (ler, interpretar, compreender e agir)
d) Desenvolver um plano de ação: i) identificar a decisão, ii) reunir informações, iii) identificar alternativas, iv) ponderar as evidências, v) escolher entre as alternativas, vi) tomar decisão, vii) rever decisão;
e) Inserir esse conteúdo em ementas de cursos de formação e desenvolvimento de treinadores;
f) Escrever livros sobre resoluções de problemas embasadas em tomadas de decisões de treinadores em diferentes contextos e diferentes complexidades;
g) Bate papos informais transparentes com os pares;
h) Refletir sobre erros e acertos das suas próprias tomadas de decisões;
i) Sistematizar aprendizagens de séries de treinadores e clubes esportivos disponíveis em serviços de streaming;
j) Processos reflexivos em mentorias.

Fez sentido? E você, como faz para melhorar sua tomada de decisão? Traga mais sugestões! Continuaremos na semana que vem com mais uma coluna sobre treinar o treinador. Grande abraço e até lá!

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Mais dois passos do futebol feminino em busca do empate

Na quarta-feira da semana passada (02/09/2020) o futebol feminino brasileiro fez história: a Confederação Brasileira de Futebol (CBF) anunciou que pela primeira vez, duas mulheres serão as novas coordenadoras no comando dos principais assuntos relacionados ao futebol feminino no país.

Duda Luizelli, diretora de futebol feminino do Internacional, passará a ficar à frente da Coordenação da Seleção Brasileira Feminina, enquanto Aline Pellegrino, ex-capitã da seleção brasileira e responsável pela modalidade na FBF (Federação Paulista de Futebol), assumirá o cargo de coordenadora de competições da modalidade do futebol feminino que atualmente são quatro: o Brasileiro Feminino A-1, o Brasileiro Feminino A-2, o Feminino Sub-18 e o Feminino Sub-16. Com vastos currículos e por terem provado muita competência, o anúncio foi feito pelo presidente da CBF, Rogério Caboclo, que classificou a nomeação de ambas como “memorável”.

Em suas próprias palavras, Caboclo reiterou a importância desse passo para a modalidade no Brasil: “A partir de hoje, o futebol feminino do Brasil estará nas mãos de quem sempre trabalhou com a bola dentro e fora do campo. Pessoas que conquistaram seu espaço por terem feito tudo que podiam enquanto jogaram e trabalharam para estarem aqui como dirigentes. Hoje, as mulheres ganharam seu espaço pela competência que tem”.

Além das nomeações, a CBF também fez história ao anunciar que as atletas da seleção feminina brasileira de futebol passarão a receber os mesmos valores pagos aos homens em premiações. Segundo Rogério, a definição já havia sido determinada em março deste ano, resultado de um esforço conjunto na batalha pelo reconhecimento de igualdade salarial entre as seleções feminina e masculina. Tanto os valores a serem recebidos durante as convocações diárias, como também os provenientes de conquistas ou etapas alcançadas em Olimpíadas passarão a serem os mesmos.

A notícia teve grande destaque em jornais internacionais, exaltando a conquista que as nossas jogadoras conseguiram após tantos anos de luta e preconceito. Para efeitos comparativos, foi realizado um levantamento em 2017 que escancarou a desigualdade existente até então: enquanto os homens ganhavam R$ 500,00 por dia da CBF durante o período de treinos, as mulheres recebiam apenas metade desse valor. Para jogos fora do país, a diferença ultrapassava mil reais.

Apesar da importância dessa conquista, a batalha ainda não está ganha. Por exemplo, não obstante a determinação que as premiações a serem pagas pelo desempenho das seleções feminina e masculina nos Jogos Olímpicos de 2021 serão equivalentes, na Copa do Mundo de 2022 a proporção paga será a mesma, mas o total pago, não. Isso ocorre porque a Fifa ainda destina valores muito maiores aos times masculinos.

De qualquer maneira, o cenário diante das nossas atletas soa cada dia mais animador. Na mesma ocasião desses anúncios, a técnica da seleção brasileira Pia Sundhage fez a primeira convocação para a equipe principal feminina após o adiamento dos Jogos Olímpicos de Tóquio para julho de 2021, por causa da pandemia de covid-19. A convocação chamou atenção por conter apenas jogadoras que atuam no Brasil, para evitar viagens internacionais em meio à pandemia. A convocação é para participar apenas de um período de treinamentos na Granja Comary, em Teresópolis, de 14 a 22 de setembro, semana em que o Campeonato Brasileiro será pausado.

De fato, essas conquistas foram muito celebradas e bem-vindas na comunidade desportiva nacional. Esse avanço só foi possível após muita luta, força de vontade e coragem para enfrentar tantos desafios até hoje.

O caminho ainda é longo: os pagamentos ainda não são igualitários e a busca pela mesma visibilidade que a seleção masculina possui ainda é um objetivo a ser perseguido. Resta a conscientização e o resgate em massa do espírito de orgulho que sentimos por nossas atletas, que tanto tiveram destaque na última Copa do Mundo.

É essencial nos atentarmos para a força que o futebol feminino vem demonstrando – e que tem muito mais a demonstrar. É cristalino o potencial a ser explorado na prática, tanto em termos de descoberta de novos talentos e a valorização de atletas excepcionais, como de resultados financeiros práticos em patrocínios, marketing, comercialização de produtos oficiais etc.

E tudo isso é apenas o começo!

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Pedagogia e futebol: é preciso sentir para fazer sentido

‘Quem sabe só de futebol, ainda não sabe de futebol’ – Manuel Sergio

A vida, esse emaranhado de incertezas, possui duas certezas: a primeira é a morte física e a segunda, enquanto a primeira não vem, é a interdisciplinaridade.

O futebol, então, enquanto uma das representações de vida, é interdisciplinar. Podemos – devemos – debater sua condução, as condições com que são exploradas e o quanto, de fato, o discurso é levado a cabo, mas, assumindo o risco da afirmação generalizadora, suponho que mesmo aqueles ou aquelas que gostem de incutir rótulos aos profissionais esportivos – fulano é ‘ultrapassado’, ciclano é ‘retrógrado’ – terão certa dificuldade em escutar deles uma ode declarada ao obscurantismo.

Primeiro porque, no futebol, a interdisciplinaridade está posta. Demos, porém, um passo atrás: negar a fisiologia, a biomecânica, a nutrição, a psicologia, a análise de desempenho, bem como a influência de disciplinas outras no ensino, treinamento, vivência e aprendizagem do esporte-bretão parece um erro, um abraço fraterno ao insucesso profissional. É bem possível que soe óbvio, mesmo para os e as que projetam o mundo de forma cartesiana, difícil negar a importância das partes – até porque, para esses e essas, dá soma delas é que se constitui o todo.

A nem tão simples ‘mudança de chave’ – eufemismo para rompimento de paradigma – de um olhar para as relações mais linear e técnico, para outro, não-linear e complexo, pode contribuir à percepção de que diferentes áreas do conhecimento e disciplinas, como as citadas no parágrafo acima, por exemplo, interagem entre si e não é de hoje. Eis, aí, a interdisciplinaridade, importantíssima para entendermos as nuances das (infinitas) transformações das relações humanas, do próprio jogo e estruturarmos o passo adiante rumo à transdisciplinaridade, a que estudiosos como o Prof. João Paulo Medina tem se referido há um tempo – conversa que esmiuçaremos em próximas oportunidades. 

Segundo porque, mesmo em tempos de tosca resistência anti-iluminista, assumir-se como profissional esportivo de excelência carregado de tradicionalismos por aqui (sem levar em consideração a cultura sebastianista do torcedor ou torcedora passional, de culto cego ao futebol-raiz) sobretudo no pós-sete a um, já não pega tão bem assim – ao menos no discurso, não bastasse a contradição. O futebol mudou porque o mundo também mudou, e se modifica a todo momento. Quem não busca adaptação às dinâmicas emergentes corre grande risco de sucumbir profissionalmente, mesmo que não admita outros tipos de transformações sociais. Permitam-me o trocadilho: é o fenômeno do conservador ou conservadora nos costumes e liberal no futebol – pretendemos explorar bastante essas e outras contradições por aqui.

Ainda que tenha sublinhado a psicologia algumas linhas acima, a resistência às ciências humanas, para que seja concebida sob a interdisciplinaridade, perdura no futebol e, porque não dizer, na Educação Física, tida como prática demais para ser influenciada por teorias tidas como rebuscadas demais. As vivências do chão de quadra e à beira do campo compensariam as densas perfumarias filosóficas, afinal. Mostra de que os caminhos para o corte epistemológico, falado há décadas pelo Prof. Manuel Sérgio, que trata da transposição do futebol como atividade física para atividade humana, não está tão pavimentado assim.

E para melhor entendimento de uma atividade humana, dá-lhe ciências humanas, certo? Mas para que essa relação faça sentido é preciso oferecer, ora bolas, sentido. E é aí, que peço para que a Pedagogia tire o colete, faça rapidinho o aquecimento para entrar e mudar o jogo. Qualquer jogo. Não falo só do rachão no ambiente escolar ou o bobinho nas escolinhas especializadas, mas nos contextos competitivos e de altíssimo rendimento. Onde há gente, existe pedagogia.

Partimos, assim, do pressuposto de que a Pedagogia é uma ciência educativa, que se reflete por método(s) e didática(s) para que, a partir de uma ou várias intencionalidades, as pessoas sejam tocadas e pensem, sintam e ajam melhor. E, aplicada ao futebol, também joguem, treinem melhor e, não menos importante, aproximem formas de pensar o mundo e o jogo distintas. A pluralidade de ideias toleráveis é o que dá tempero às relações humanas, afinal.

Quando evocamos o filósofo Edgar Morin para falar da noção de complexidade, as obras do psicólogo Urie Brofenbrenner que aludem à teoria ecológica ou as do físico Thomas Kuhn, que aborda a filosofia da ciência e o paradigma científico emergente, a Pedagogia é imprescindível para que essas brilhantes ideias tenham significado à realidade do profissional do futebol, esteja ele ou ela na Série A do Brasileirão ou no projeto voluntário do bairro periférico. É preciso, evidentemente, empenho e disposição para o novo e o novo nem sempre é cômodo – e nem deveria ser – bem como empatia e compromisso com o real e o social da parte de quem administra o ambiente formativo sem fazer do processo educativo algo superficial ou encastelado demais.

Por esse entendimento, nos parece importante inferir a Pedagogia, sob a égide da cada vez mais relevante subárea da Pedagogia do Esporte, como indispensável ao futebol. Vou além: a Pedagogia é, senão, a própria interdisciplinaridade, na medida em que se compromete com o diálogo entre dissemelhantes, mobiliza saberes de diversas fontes, admite sincretismos e minimiza dualismos entre a teoria e a prática, o ‘boleiro’ e o acadêmico, o reativo e o propositivo, a competição e a participação, a técnica e a tática, sem desconsiderar suas especificidades.

Seria, da parte deste que vos escreve neste espaço pela primeira vez, presunçoso demais dizer que as ciências humanas (com a Pedagogia inclusa) por si só, dá sentido à vida – e ao futebol – mas que ajuda a cada um de nós encontrar o seu, isso ajuda. Agora são três certezas, desconfio

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Covid-19 e a influência no desempenho das equipes europeias

A pandemia provocada pelo vírus COVID-19 alterou drasticamente as condições do futebol competitivo em todo o mundo, com o cancelamento ou adiamento da maioria das competições em andamento. Entre fevereiro e março de 2020, como toda população, os jogadores profissionais de futebol tiveram suas vidas restringidas e aderiram ao isolamento social. Sem a previsão de retorno, as comissões técnicas dos clubes elaboraram protocolos de treinamento individuais com intuito de manter a aptidão física dos atletas1.

Por ser um jogo de equipe, manter a forma do atleta através do treinamento individual é um grande desafio, devido à dificuldade de adequar ao treino ações intensas específicas do futebol, como cabeceio, chutes, mudanças de direção, aceleração, desaceleração2. Além destes fatores, é muito difícil para o atleta ter a motivação necessária para manter diariamente uma intensidade satisfatória do treinamento prescrito a distância, sem a presença dos companheiros de equipe e comissão técnica.

Num segundo estágio, os jogadores começaram a treinar em pequenos grupos com estrita restrição de contato e o retorno aos campeonatos ocorreu após poucas semanas de preparação da equipe.

Fica evidente que os treinamentos aplicados durante a pandemia não foram suficientes para a preparação ideal do atleta, portanto, é esperada uma menor aptidão física, maior fadiga e elevado risco de lesões durante os jogos oficiais.

A mudança drástica que a pandemia trouxe em contextos “externos” como jogos, treinos e campeonatos, se fez também no “mundo interno” através dos pensamentos, sentimentos e comportamentos dos atletas e comissão técnica.

Um cenário completamente novo leva a mudanças transformadoras que modificam e influenciam a forma do indivíduo agir e reagir diante do que era habitual.

UEFA CHAMPIONS LEAGUE NA PANDEMIA

Paralisada em 11 de março, a Champions League retornou no dia 07 de agosto nas quartas de finais, com um novo formato, contendo sede única para as rodadas finais e partidas sem público. Classificados para esta fase estavam o Atalanta, Atlético de Madrid, Barcelona, Bayern de Munique, Lyon, Manchester City, Paris Saint-Germain e RBR Leipzig.

Os alemães Bayern de Munique e RBR Leipzig juntamente com os franceses Lyon e Paris Saint-Germain avançaram para as semifinais. Os alemães destacaram-se por sua organização tática e preparo físico enquanto os franceses pela qualidade técnica de seus jogadores. A final entre Paris Saint-Germain e Bayern de Munique foi realizada recentemente em 23/08, em que a equipe alemã sagrou-se campeã. 

O desempenho dos times alemães foi surpreendente, o novato RBR Leipzig chegou às quartas de finais eliminando um grande time espanhol, o Atlético de Madri e a campanha do Bayern de Munique foi irretocável, os números impressionaram, 11 jogos e 11 vitórias, primeiro clube a ganhar a campeonato com aproveitamento de 100%, 43 gols em 11 jogos, média de 3,91 gols por partida, a maior da história da Liga dos Campeões.

Vários fatores podem ter influenciado o sucesso dos alemães na competição, o principal é a volta às atividades coletivas relativa antecedência, se comparados aos adversários. Fatores como estratégias de treinamento adaptadas nas diferentes fases da pandemia e protocolos eficazes de segurança contra contaminação criaram um contexto para volta aos treinos e campeonatos, o que se acredita ter dado significativa vantagem às equipes alemãs.

Um fato interessante é que fora de campo, segundo dados da Organização Mundial da Saúde (OMS), a Alemanha apresentou melhor enfretamento à COVID-19 em relação aos países dos times adversários nas quartas de finais: Itália, Inglaterra, França e Espanha, com menor número de mortos por milhão de habitantes, conforme demonstrado no infográfico ao lado.

O número de mortos na Alemanha é cerca de 7 vezes menor que no Reino Unido, 6 vezes que na Espanha e Itália e 4 vezes que na França.

Não há até o momento comprovação científica que a relação de óbitos pelo COVID-19 menor da Alemanha tenha trazido vantagens para o futebol, mas é possível conjecturar que este fato pode ter dado condições melhores de treinamento bem como maior tranquilidade para os atletas e familiares durante o ápice da pandemia na Europa.

Nessa capacidade do sistema nervoso de promover adaptações e superar situações difíceis reside a ajuda para lidar com as incertezas neste mundo em contínua mudança, fato que pode ter sido determinante para os alemães nesse confronto. Todo esse contexto pode ter propiciado melhores condições de treinos. No mundo esportivo, a tendência é que quanto mais e melhor se treina, mais bem preparado o atleta e toda uma equipe estará para enfrentar os desafios competitivos. Neurociência e desempenho costumam andar de mãos dadas.

Referências

1. Mohr M. et al. Return to elite football after the COVID-19 lockdown. Managing Sport and Leisure, 2020.

2. Bangsbo J. et al. Training and testing the elite athlete. Review. Journal of Exercise Science and Fitness, 2006.

1.Psic.: Teor. e Pesq. vol.17 no.2 Brasília May/Aug. 2001 – Artigo Plasticidade Neural: Relações com o Comportamento e Abordagens Experimentais.

HANSON, R. “O cérebro de Buda: neurociência prática para a felicidade.” (Tradução Bianca Albert) 1.ed São Paulo: Alaúde Editorial, 2012.

2.SWART, T. A neurociência da criatividade. Disponível em: <https://ssir.org/books/excerpts/entry/the_neuroscience_of_creativity#/>. Acesso em: 25 ago. 2020.

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Entre as pessoas e as coisas no futebol: uma (re) apresentação

Quando comecei a escrever para a Universidade do Futebol, em junho de 2018, logo no primeiro texto citei diretamente um dos assuntos que achava mais importantes à época, e que acho fundamental até hoje: isso que podemos chamar de processo de humanização no futebol. É um dos temas que persigo há algum tempo, ainda que seja uma busca menos preocupada com a chegada do que com o percurso. O que é saudável, claro.

Não faz muito tempo, recebi um convite do professor João Paulo Medina para organizar uma espécie de grupo de estudos próximo disso que se entende por um olhar mais humanizado do futebol. Claro que fiquei lisonjeado, porque acredito num tipo de futebol que existe em razão do humano – e não apesar dele. Mais do que isso, acredito que é importante que nos formemos a partir da humanidade, com agá minúsculo mesmo, mas também dentro das humanidades da humanidade: se, por um lado, tornar-se profissional do futebol é algo que se faz no mundo (portanto, se faz do lado de fora de nós mesmos), tornar-se profissional do futebol também é algo que se faz a partir de si, da própria subjetividade, da própria história, dos nossos próprios limites e das nossas próprias contradições (portanto, se faz do lado de dentro de nós mesmos). Tratar dessas coisas é algo de fato muito agradável. Ao mesmo tempo, é algo que carece de cuidado e, especialmente, de refinamento.

Por isso, pelo menos por enquanto momento, quando penso no processo de humanização – e naquilo que o acompanha – acho importante fazer alguns recortes. Neste texto, vamos fazer pelo menos três deles, sobre os quais podemos falar aos pouquinhos. Mas vamos ilustrá-los brevemente aqui:

– em primeiro lugar, embora não seja uma novidade, é de fato significativo que tenhamos normalizado o fato tratarmos as pessoas enquanto objetos.

Ou seja, ao invés de nos tratarmos como pessoas, dotadas de uma subjetividade intransferível, basicamente nos tratamos a partir de premissas mais objetivas (portanto gerais, universais), o que significa que nossas relações são cada vez mais utilitárias, uma vez que nos vemos como coisas, não como pessoas. Se quiser ir além, perceba que não isso significa apenas que tratamos os outros como objetos (geralmente para atingir os nossos próprios fins) mas, mais importante do que isso, tornou-se comum que tratemos a nós mesmos como objetos, empresas de nós mesmos (e, na mesma linha, descartáveis por nós mesmos). É claro que isso não nasce do chão, é fruto de um conjunto de ideias e de visões de mundo e, a meu ver, são justamente essas ideias e essas visões de mundo que devemos retorcer se acreditamos num futebol mais humanizado e, obviamente, se acreditamos que uma vida mais humanizado é mais significativa do que uma vida coisificada.

– em segundo lugar, me chama a atenção o quanto se fala do processo de humanização, o quanto se fala da importância de formar pessoas, ao invés de apenas atletas, da atenção que supostamente damos a isso tudo, das performances com que às vezes se fala disso tudo, mas que costumeiramente escondem que entende que falar do humano no futebol é um algo muito legal, é muito bonito, às vezes muito agradável, mas na verdade é mais um enfeite, um adorno, até mesmo um pedágio: é um discurso socialmente aceito, às vezes necessário para projetar uma certa imagem de bom-mocismo, ainda que nem sempre esteja comprometido com a prática.

Por isso, na vida vivida, me parece que o humano continua sendo um enfeite, um adorno, até mesmo um pedágio e, como às vezes acontece com os pedágios, pode ser um pedágio caro, que nem todos estão dispostos a pagar. Talvez seja importante decidirmos se queremos nos manter no campo dos discursos, ou se estamos de fato interessados em avançar, todos os dias, na articulação de uma vida mais humanizada, que reconhece e admira a humanidade do humano na mesma medida em que percebe que tratar da humanidade do humano no futebol não é um gasto, é uma necessidade: um atleta pela metade geralmente não será melhor do que um atleta inteiro. E, hoje em dia, estar pela metade é a regra.

– em terceiro lugar, em arrastamento do ponto anterior, me chama a atenção como sempre fica subentendido que quando tratamos do humano, ou quando tratamos das pessoas enquanto pessoas, e não como coisas, somos geralmente reduzidos a uma certa dimensão teórica, de articulações teóricas, de devaneios teóricos e que, por muitas vezes, seriam apenas e tão somente teóricos – mas insustentáveis na prática.

Não por acaso, geralmente encontramos alguma dificuldade em exercer a nossa humanidade na prática, especialmente em um tempo de tantos conteúdos técnicos, de tantas formações, de tanto conhecimento, de tanta informação… mas de tão pouca humanidade. Ou seja, mesmo sabendo que as nossas práticas, ainda que sejam práticas, podem ser estéreis, ocas, vazias no sentido que mais importa, nós preferimos que elas continuem assim do que investir tempo e energia no sentido de algo mais potente.

A boa notícia é que humanizar o futebol e a vida vivida não começam (e não terminam) em blá blá blás teóricos, mas é algo essencialmente prático, é uma forma de estar no mundo, de relacionar-se com o outro, de organizar um processo de treino, de aplicar um determinado treinamento, de olhar para nós mesmos, nossos atletas e colegas de trabalho, de abrir-se ao movimento do mundo, de fazer, de pensar, de sentir. Este, aliás, é um ponto prático de atenção: se normalizamos apenas uma ou duas formas de estar no mundo, como as pessoas não-normativas (não raro geniais), que fogem à norma, podem ser quem são? Como esperar que pássaros voem em gaiolas pequenas? É preciso criar normas, mas também é preciso recriá-las.

Para isso, neste primeiro momento, convidei sete pessoas para ampliar meus próprios limites e os limites deste debate: Aline Castro, Annie Kopanakis, Gabriel Puopolo, Gabriela Montesano, Luis Felipe Nogueira, Lucas Leonardo, Thais Toledo. São elas que, por ora, dividem comigo o espaço deste grupo, no qual nos propomos a um falar e um fazer no futebol (é o que nos une, afinal), mas um falar e um fazer por um olhar humanizado, plural, contingente, imanente – dentro e através de todos esses entes, de todos esses ismos, de áreas diferentes, com histórias diferentes. É um pouco do que gostaria de propor a cada semana de agora em diante.

E claro que contamos com vocês nessa jornada.

Continuamos em breve.

***

PS: Daqui em diante, todos os textos meus na Universidade do Futebol são dedicados à memória da querida colega Leticia Fava, que partiu tão cedo, mas que deixa com a gente memórias de muita atenção e de muito carinho, que sempre guardamos em todos os momentos. 

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O que tem de errado no Palmeiras?

O torcedor do Palmeiras não está satisfeito. E isso por si só já mostra uma evolução na maneira de ver futebol. Não é possível falar que não há resultado no trabalho de Vanderlei Luxemburgo. Porém a torcida já não se contenta “só” com isso. É preciso mais. A cobrança é por desempenho. Por um melhor rendimento. Por isso me alegro em ver essas críticas vindas da arquibancada, hoje virtual. O ganhar por ganhar já não basta. Estamos crescendo!


O futebol tem muitos elementos e a generalização não combina com uma análise mais aprofundada. Isso porque dizer simplesmente que o trabalho de Luxemburgo é ruim fica raso, superficial e não condizente com a verdade. Prefiro apontar que o time tem hoje uma séria dificuldade na construção ofensiva. Mas reconheço que a defesa é muito sólida, que há um mérito em colocar jovens para jogar e que a gestão do ambiente é bem feita por toda a comissão técnica. Viu, como não dá pra chegar e falar que tudo é ruim?


O problema do ataque do Palmeiras existe, mas ele fica potencializado porque o clube investiu alto em nomes para esse setor. A afirmação frequente é: com esses jogadores era pra jogar melhor. Novamente, recorro a questão da complexidade. É claro que o Palmeiras tem bons jogadores. Mas eles estão no lugar certo e na hora certa? E aqui não me refiro a posição dentro de campo, e sim transcendo para falar do clube como um todo. Qual o grau de ‘fome’ de alguns jogadores do elenco? O ‘ciclo’ de alguns já teria que ter chegado ao fim para o bem deles mesmo e do próprio Palmeiras?

Analisando grandes vencedores no futebol mundial vemos sempre uma oxigenação em seus elencos de um ano para o outro. O Palmeiras foi ‘obrigado’ a reformular seu elenco, mas sem ser algo pensado para o sucesso. Foi forçado e natural ao mesmo tempo. Explico: forçado porque jogadores caros, que não eram titulares, foram negociados. E natural porque uma molecada excelente vinda da base teria que ganhar espaço por razões óbvias de qualidade acima da média está cada vez mais no campo.

Um time vencedor não é composto necessariamente pelos melhores jogadores. Analisar o momento de cada um, o que eles já ofereceram e ainda podem – ou não – oferecer, enxergar e diferenciar potencial de crescimento e tendência a zona de conforto, enfim, são vários fatores a serem analisados na formatação de um elenco. Há uma carência de ideias ofensivas no trabalho de Vanderlei Luxemburgo. Entretanto o problema pode estar não apenas no treinador.