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Trabalhos táticos ‘inteligentes’

Vejamos a seguinte passagem do livro “Liderança: as lições de Mourinho”, de Luís Lourenço e Fernando Ilharco (página 37):
 
“O trabalho tático que promovo não é um trabalho em que de um lado está o emissor e do outro o receptor. Eu chamo-lhe a “descoberta guiada”, ou seja, eles descobrem segundo as minhas pistas. Construo situações de treino para os levar por um determinado caminho. Eles começam a sentir isso, falamos, discutimos e chegamos a conclusões”.
 
Durante uma partida de futebol ocorrem inúmeras situações de confronto. O ataque buscando desequilibrar a defesa, a defesa tentando se manter em equilíbrio e desequilibrar o ataque. As possibilidades táticas e estratégicas dentro do jogo são inúmeras.
 
Preparar uma equipe de futebol no nível em que se joga futebol hoje é desenvolver e trabalhar a complexidade do jogo detalhadamente em sua totalidade. Isso significa que dentro de um esporte em que é infinito o número de situações possíveis no jogo, torna-se necessário que uma organização científica inteligente norteie o treinamento.
 
Vejamos um trecho de um texto que escrevi em 2002: “O jogo de futebol, antes de ser futebol é jogo. E por ser jogo é imprevisível. Ainda que se controlasse a maior parte das variáveis que estruturam a lógica do jogo, seria impossível apontar no início de uma partida o vencedor. Se a imprevisibilidade é “princípio” do jogo, há tempos tornou-se necessário estruturar o treinamento de equipes de futebol no contexto da imprevisibilidade. E como treinar algo que não se sabe o que vai ser? Criando estratégias que garantam um diversificado número de possibilidades imprevisíveis, através de situações-problema que estimulem o jogador a compreender o jogo no contexto do próprio jogo. Então, ao se aumentar as possibilidades de respostas às situações-problema, aumenta-se também a possibilidade de se ter uma solução adequada ou próxima dela a uma situação nova e desconhecida”.
 
O treinamento técnico-tático a partir da perspectiva da “complexidade do imprevisível” resolve-se na medida em que treinadores tornem-se capazes de estruturar práticas de treinamentos que contemplem desafios mais próximos possíveis do jogo.
 
Daí, chegamos às situações-problema.
 
As situações-problema são situações que ocorrem no jogo, que desafiam o equilíbrio técnico-tático de uma equipe e que requerem resposta individual-coletiva imediata, exata e precisa.
 
Como estão presentes nas partidas de futebol, podem ser trabalhadas técnica e taticamente nos treinos a partir de jogos com regras adaptadas e orientadas para gerar situações-problemas específicas.
 
No trecho do livro sobre a liderança de José Mourinho, o próprio aponta a “descoberta guiada” (termo utilizado pelo treinador) em que cria situações no treino que apontam caminhos para serem discutidos e apreendidos pelos jogadores da equipe.
 
Vamos à uma história sobre um outro esporte que pode nos ajudar na compreensão das situações-problema no futebol:
 
“Um grande “levantador” que jogou Vôlei por muitos anos pela seleção do seu país, certa vez teve todas as suas ações mapeadas por uma equipe adversária com a qual jogaria em uma final de torneio. Buscavam identificar um padrão de jogo para poderem marcá-lo. Depois de várias análises, constataram que o tal “padrão” que buscavam não existia. Era um grande número de ações que não seguiam uma ordem aparentemente definida, e que pior (para eles), tinha um maciço número de sucessos (acertos). As bolas eram levantadas de vários pontos da quadra para vários pontos da rede (ou fora dela), e ainda às vezes com “viradas” de segunda bola. Realmente, um repertório imenso que deixava o bloqueio e defesa adversária atordoados”.
 
O nosso “levantador” possuía uma habilidade imensa de solucionar “problemas de jogo”. Todas as vezes em que a bola chegava às suas mãos, uma análise rápida da situação (posicionamento e movimentação do adversário e da sua equipe) e pronto; solução pontual.
 
Se transferirmos a analogia do levantador do jogo de vôlei para o jogo de futebol, compreenderemos, por exemplo, que os treinos de futebol de finalização em que o jogador passa a bola para o treinador, recebe na entrada da área e depois de driblar um cone chuta a gol (faz isso pelo menos dez vezes) não estão em nada colaborando para a finalização como ela é no contexto do jogo (uma situação-problema a ser resolvida).
 
Trabalhar utilizando nos treinamentos “situações-problema” significa criar atividades que desafiem os atletas a compreender o jogo de futebol, em toda sua complexidade, de tal forma que a equipe seja capaz de desempenhar estratégias e táticas de jogo, resolvendo problemas táticos “propostos” pelos adversários, mantendo-se em grande nível de competitividade.
 
Como compreender isso não é trivial, muitos de nossos treinadores vão continuar acreditando que os jogadores de futebol precisam mecanizar as ações táticas da equipe, de forma automática, para que não precisem pensar naquilo que devem fazer!
 
Então, para terminar, continuemos a seguir em frente. Como cantaria Caetano Veloso: “caminhando contra o vento, sem lenço, sem documento, no sol de quase dezembro, eu vou…”
 
Para interagir com o autor: rodrigo@149.28.100.147  
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Trabalhos táticos 'inteligentes'

Vejamos a seguinte passagem do livro “Liderança: as lições de Mourinho”, de Luís Lourenço e Fernando Ilharco (página 37):
 
“O trabalho tático que promovo não é um trabalho em que de um lado está o emissor e do outro o receptor. Eu chamo-lhe a “descoberta guiada”, ou seja, eles descobrem segundo as minhas pistas. Construo situações de treino para os levar por um determinado caminho. Eles começam a sentir isso, falamos, discutimos e chegamos a conclusões”.
 
Durante uma partida de futebol ocorrem inúmeras situações de confronto. O ataque buscando desequilibrar a defesa, a defesa tentando se manter em equilíbrio e desequilibrar o ataque. As possibilidades táticas e estratégicas dentro do jogo são inúmeras.
 
Preparar uma equipe de futebol no nível em que se joga futebol hoje é desenvolver e trabalhar a complexidade do jogo detalhadamente em sua totalidade. Isso significa que dentro de um esporte em que é infinito o número de situações possíveis no jogo, torna-se necessário que uma organização científica inteligente norteie o treinamento.
 
Vejamos um trecho de um texto que escrevi em 2002: “O jogo de futebol, antes de ser futebol é jogo. E por ser jogo é imprevisível. Ainda que se controlasse a maior parte das variáveis que estruturam a lógica do jogo, seria impossível apontar no início de uma partida o vencedor. Se a imprevisibilidade é “princípio” do jogo, há tempos tornou-se necessário estruturar o treinamento de equipes de futebol no contexto da imprevisibilidade. E como treinar algo que não se sabe o que vai ser? Criando estratégias que garantam um diversificado número de possibilidades imprevisíveis, através de situações-problema que estimulem o jogador a compreender o jogo no contexto do próprio jogo. Então, ao se aumentar as possibilidades de respostas às situações-problema, aumenta-se também a possibilidade de se ter uma solução adequada ou próxima dela a uma situação nova e desconhecida”.
 
O treinamento técnico-tático a partir da perspectiva da “complexidade do imprevisível” resolve-se na medida em que treinadores tornem-se capazes de estruturar práticas de treinamentos que contemplem desafios mais próximos possíveis do jogo.
 
Daí, chegamos às situações-problema.
 
As situações-problema são situações que ocorrem no jogo, que desafiam o equilíbrio técnico-tático de uma equipe e que requerem resposta individual-coletiva imediata, exata e precisa.
 
Como estão presentes nas partidas de futebol, podem ser trabalhadas técnica e taticamente nos treinos a partir de jogos com regras adaptadas e orientadas para gerar situações-problemas específicas.
 
No trecho do livro sobre a liderança de José Mourinho, o próprio aponta a “descoberta guiada” (termo utilizado pelo treinador) em que cria situações no treino que apontam caminhos para serem discutidos e apreendidos pelos jogadores da equipe.
 
Vamos à uma história sobre um outro esporte que pode nos ajudar na compreensão das situações-problema no futebol:
 
“Um grande “levantador” que jogou Vôlei por muitos anos pela seleção do seu país, certa vez teve todas as suas ações mapeadas por uma equipe adversária com a qual jogaria em uma final de torneio. Buscavam identificar um padrão de jogo para poderem marcá-lo. Depois de várias análises, constataram que o tal “padrão” que buscavam não existia. Era um grande número de ações que não seguiam uma ordem aparentemente definida, e que pior (para eles), tinha um maciço número de sucessos (acertos). As bolas eram levantadas de vários pontos da quadra para vários pontos da rede (ou fora dela), e ainda às vezes com “viradas” de segunda bola. Realmente, um repertório imenso que deixava o bloqueio e defesa adversária atordoados”.
 
O nosso “levantador” possuía uma habilidade imensa de solucionar “problemas de jogo”. Todas as vezes em que a bola chegava às suas mãos, uma análise rápida da situação (posicionamento e movimentação do adversário e da sua equipe) e pronto; solução pontual.
 
Se transferirmos a analogia do levantador do jogo de vôlei para o jogo de futebol, compreenderemos, por exemplo, que os treinos de futebol de finalização em que o jogador passa a bola para o treinador, recebe na entrada da área e depois de driblar um cone chuta a gol (faz isso pelo menos dez vezes) não estão em nada colaborando para a finalização como ela é no contexto do jogo (uma situação-problema a ser resolvida).
 
Trabalhar utilizando nos treinamentos “situações-problema” significa criar atividades que desafiem os atletas a compreender o jogo de futebol, em toda sua complexidade, de tal forma que a equipe seja capaz de desempenhar estratégias e táticas de jogo, resolvendo problemas táticos “propostos” pelos adversários, mantendo-se em grande nível de competitividade.
 
Como compreender isso não é trivial, muitos de nossos treinadores vão continuar acreditando que os jogadores de futebol precisam mecanizar as ações táticas da equipe, de forma automática, para que não precisem pensar naquilo que devem fazer!
 
Então, para terminar, continuemos a seguir em frente. Como cantaria Caetano Veloso: “caminhando contra o vento, sem lenço, sem documento, no sol de quase dezembro, eu vou…”
 
Para interagir com o autor: rodrigo@universidadedofutebol.com.br