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Invencível armada

Para a Uefa, o craque da ótima Euro-08 foi o volante-meia (meia-volante?) espanhol Xavi; para a torcida da campeã da Europa, o cabeça-de-área Marcos Senna foi o destaque da Fúria; para este que vos tecla, depois de assistir a todos os jogos, fico com o meia-atacante (mais atacante que meia) David Villa (que não jogou a final e mais da metade da semifinal por estar machucado).

 

Casillas poderia ser listado entre os bambas da campeã (embora tenha sido o menos acionado dos goleiros da competição); por conta disso, Puyol e Marchena, que se superaram na zaga, também merecem menção; Sergio Ramos, na lateral direita, foi o melhor da posição. Capdevilla mostrou ser o melhor lateral-esquerdo espanhol com seguras atuações. Os wingers (ou interiores, esterni, carrilleros, como queiram) Iniesta e David Silva mandaram muitíssimo bem, saindo dos lados para articular pelo meio, e trocando constantemente de posição; Torres foi um perigo constante; e o craque dessa geração, o jovem Fábregas, de apenas 21 anos, era reserva!

Melhor reserva de qualidade de um time que teve todos os melhores números do torneio e merecidamente ficou com o título. Com um futebol de craques.

 

Mas sem um craque. Talvez a maior lição desta Euro que não deixou lições além dos 90 minutos.

 

Fábregas é quem mais se aproxima dos requisitos do ISSO 9000 para o certificado de craque de origem controlada. Mas ele foi reserva do ótimo meio-campo espanhol. Insisto: um time sem uma estrela. Mas com poucas pontas nebulosas.

 

Talvez o maior legado da Euro tenha sido esse. Um grande futebol sem graaaaaandes jogadores. Algo possível com qualidade (claro), mas, também, com intensidade, aplicação, e grande quantidade de passes bem executados pela melhor Espanha que vi desde 1974. Desde que vejo futebol. Na melhor Eurocopa que vi desde 1984.

 

Os desenhos mostram os esquemas básicos da Espanha na Euro. Algo difícil de definir. Na estréia, o mais próximo possível na goleada sobre a Rússia foi um 4-1-3-1-1. Estranhos nos números, mas muito prático em campo: Marcos Senna blindou a entrada da área, liberando o múltiplo Xavi para criar com Iniesta e Silva (que trocavam de lado todo o jogo). Villa chegava próximo a Torres, mas era mais um atacante que um meia.

 

A movimentação e a variação tática foram determinantes para o excelente jogo espanhol. Um time que superou barreiras psicológicas, como o trauma das quartas-de-final, e não saber ganhar uma disputa de pênaltis. A Itália que o sofra.

 

Da primeira à última vitória, a Espanha solidificou o 4-2-3-1 que pode ser apresentado como o esquema-base  sem a bola. Porque o segundo volante pela esquerda (Xavi), quando a Espanha a retomava (e ficava com a pelota mais que qualquer outra seleção), se juntava aos meias abertos pelos cantos, e fazia a transição com graça e eficiência.

 

Sem Villa, na final, o encarregado a pensar o jogo foi Fábregas. Com o meia do Arsenal em campo, o treinador Luis Aragonés adotou um 4-1-4-1; ele e Xavi formando o meio-campo, e Senna ainda mais preso à zaga. Mas sempre com a saída rápida e precisa de jogo.

Muito mais que os números do meio-campo e ataque, os nomes espanhóis ganharam a Euro pela qualidade técnica e pela precisão ao fazer o jogo que gostam de posse e passes. Futebol que apreciavam, mas não conseguiam jogar até o inesquecível verão de 2008.

Para interagir com o autor: maurobeting@universidadedofutebol.com.br

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Falta de estudo

Na última década, o futebol brasileiro assistiu à consolidação da presença da assessoria de imprensa no dia-a-dia de um clube. Até o final dos anos 90, o torcedor estava acostumado a ver qualquer jogador do time dando entrevista após um treino, falando como quisesse, para quem lhe conviesse.

Aí vieram os grandes investimentos, as contratações a peso de ouro e a europeização do relacionamento jornalista-atleta. Foi quase na virada do milênio que começamos a ver os primeiros “assessores” de imprensa nos clubes. Preocupados com a informação e, principalmente, com a maneira como a informação ia de jogadores e treinadores para os veículos de imprensa. 

Os primeiros anos desse relacionamento foram turbulentos. Brigas, jogadores e treinadores brigando com jornalistas mais “abusados”, assessores ganhando a fama de vilões. Agora, porém, o equilíbrio na relação parece que começa a ser atingido. E o problema é que, com isso, entramos na era do emburrecimento da cobertura do futebol.

Assessoria de imprensa começa a significar para o jornalista ter todo tipo de informação à mão, sem precisar de esforço, sem ter de se preocupar em correr atrás da notícia. É só reparar. Portugal, até hoje, é para mim o exemplo mais claro dessa pasteurização da informação. 

O país tem quatro grandes veículos dedicados exclusivamente ao esporte. E é praticamente raro você ler qualquer notícia diferente num dos quatro. O jornalismo sempre se baseia nas declarações pós-treino. Como sempre são os mesmos jogadores a falar para toda a imprensa, a situação não muda muito de figura de um jornal para outro.

No Brasil, ainda temos muito a cultura de buscar uma notícia exclusiva, de tentar encontrar algo diferente dentro da mesmice que é um treino. Mas geralmente isso só acontece quando se fala de todo o clube, e não especificamente de um único atleta. Por quê?

Porque a preocupação de estudar um jogador não está no dia-a-dia de um jornalista. Ele quer esmiuçar tudo do clube, mas não do atleta. E aí é que vemos o quanto a falta de estudo ajuda para a pasteurização da cobertura.

Nas próximas semanas veremos jogadores chegando e voltando da Europa, com a janela de transferências para o exterior em franca atividade. E, com isso, atletas que já foram ídolos em um determinado clube desembarcarão agora numa agremiação rival. 

Em vez de lembrar o passado desse jogador e procurar, dentro dessa história, alguma coisa diferente para destacar, o jornalista vai esperar a apresentação do atleta para então, baseado nas suas respostas, produzir o noticiário que irá ao público. 

“Fulano diz que não comemorará gol contra ex-clube”

“Cicrano diz que respeita ex-clube, mas celebrará o gol”

Sim, ainda veremos, nos próximos dias, algumas manchetes edificantes como os dois exemplos acima. Por incrível que pareça, aquela frase despretensiosa dita por Edmundo no ano 2000 virou hit para quando um novo atleta é apresentado após passagem num grande rival.

Romário e Edmundo foram bons protagonistas de histórias assim. Marcelinho Carioca, toda vez que joga contra o Corinthians, tem de passar por semelhante périplo. Da mesma forma que Tinga teve de se explicar bastante depois de ter sido campeão da Copa do Brasil pelo Grêmio e ganhar a América no Inter. 

Falta estudo sobre o jogador para não cair na mesmice de sempre. Falta vontade ao jornalista de não pensar no trabalho apenas no período em que está dentro da redação. E falta mais vontade ainda de “driblar” a assessoria, não se contentando com a informação que esta lhe manda. 

Do contrário, o jornalismo esportivo no Brasil caminha para a mesma pasteurização de Portugal.

Para interagir com o autor: erich@universidadedofutebol.com.br