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A regra da Fifa do 3/2

Caros amigos da Universidade do Futebol,
 
Gostaria de esclarecer, nesta coluna, a questão da regra do 3/2 contida no artigo 5, parágrafo 3, do Regulation on the Status and Transfer of Players editado pela Fifa.
 
Segundo essa regra, os jogadores profissionais de futebol somente podem ser registrados em três clubes durante uma mesma temporada, sendo que, desses três clubes, o jogador somente pode atuar em jogos oficiais por duas equipes.
 
Tendo em vista uma série de casos que foram trazidos à Fifa, em que jogadores não observaram esse limite por conta da diferença de calendário entre os respectivos países, a entidade máxima do futebol resolveu incluir uma disposição que, em princípio, autoriza que o jogador efetivamente atue nos três clubes caso as temporadas não sejam coincidentes (ou seja, caso nem todas as temporadas em que as agremiações envolvidas estejam sujeitas comecem e terminem no mesmo momento).
 
Importante ainda ressaltar que o Regulamento da Fifa acima mencionado somente deve ser aplicado para casos de transferências internacionais de jogadores, sendo que casos domésticos devem ser regulados pela legislação e regulamentação nacionais.
 
Assim, caso um atleta movimente-se por “n” clubes dentro de seu próprio país, a regra a ser obedecida para análise de eventual irregularidade é aquela editada em pela federação local e/ou autoridades locais. Caso, entretanto, a movimentação ocorra entre países distintos, então deve-se observar a regra editada pelo órgão máximo da modalidade.
 
Cabe ainda ressaltar que o próprio regulamento da Fifa estabelece que as federações nacionais devam trazer, obrigatoriamente, alguns de seus dispositivos para o âmbito nacional, sendo a regra do 3/2 um desses dispositivos.
 
Dessa forma, caberia a cada federação nacional “importar” a regra do 3/2 para seus regulamentos, a fim de que ela pudesse valer da mesma forma para casos de movimentação nacional e internacional de atletas.
 
Finalmente, em um caso ou em outro, deve-se sempre impor as penalidades previstas nos regulamentos nacionais ao clube ou atleta que desrespeitar, dependendo do caso, a regra prevista para transferência nacional ou internacional.

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Alto Custo

Humberto Gessinger é um gênio. Suas palavras comovem e motivam. Se fizessem uma coletânea da sua obra, Sun Tzu ficaria de joelhos.

Antes de Gessinger, ninguém era o que de fato poderia ser.
Antes de Gessinger, Andy Warhol não gostava do Papa.
Antes de Gessinger, ou se gostava dos Beatles, ou dos Rolling Stones.
Antes de Gessinger, crimes perfeitos deixavam suspeitos.
E exércitos tinham no mínimo duas pessoas.

Mas Gessinger sempre foi subvalorizado. Ele é o Millhouse do lirismo brasileiro. O Horace Grant da MPB. O Cleiton Xavier da cultura nacional.

Gessinger sempre esteve à frente do seu próprio tempo, como todos os gênios estão. Seu trabalho só será devidamente reconhecido em anos.

Mas uma frase sua faz todo o sentido para o atual final de campeonato brasileiro.
Afinal, o preço que se paga às vezes é alto de mais. E é mesmo.

Não é nem necessário dizer que a alta madrugada às vezes é tarde demais.
E nem pedir perdão. Basta parar pra pensar.

Qual é o preço daquilo que foi conquistado?
Qual é o preço daquilo que deixou de ser conquistado?
Qual é o preço daquilo que foi perdido?

Matéria da Folha de S. Paulo informa que o Flamengo antecipou receitas, adiou pagamentos e realizou empréstimos para conseguir bancar o time até o final do ano.
O time foi campeão.
Mas quanto custou isso? O que foi sacrificado?
Não há dúvidas que o Flamengo tem conseguido se desenvolver comercialmente ao longo dos últimos anos. Mas atrasos de salários, que é o sinal derradeiro da situação de um clube de futebol, ainda acontecem. E podem acontecer mais ainda no próximo ano, já que as futuras receitas foram parcialmente sacrificadas e pouca coisa indica que haverá um aumento substancial para reverter essa situação. O título, no fim das contas, pode ser penoso ao futuro do clube. Como já foi a tantos outros no Brasil e no mundo.

Mas, pelo menos, foi campeão. Em pior situação está o Palmeiras, que pode ser considerado o caso mais preocupante do ano. O clube apostou alto em uma conquista que não conseguiu alcançar. Lembra muito, o caso do Leeds United, que hoje se encontra na terceira divisão inglesa. A diferença é que, na Inglaterra, o impacto desse tipo de perda é imediato, já que o sistema funciona mais rápido. Por aqui, que ainda há certa lengalenga, o impacto é diluído em alguns anos, o que pode ser bom por um lado, já que evita uma queda brusca, mas ruim por outro, uma vez que o clube pode pagar por anos pela não conquista do ano. Outra diferença é que a Libertadores não paga tanto assim. Pelo menos não tanto, proporcionalmente, quanto a Champions League.

O Coritiba, por sua vez, perdeu. Perdeu o lugar na primeira divisão e perdeu qualquer boa imagem que o centenário pudesse ter deixado. Menos mal que a tendência é que o clube se torne o time a ser batido da segunda divisão e, em caso de sucesso, pode contornar os atuais problemas até o final do próximo ano. E, também, pode diminuir consideravelmente seus custos pra arrumar a casa.

O preço da queda para a série-B, nesse caso especificamente, parece ser menor do que o preço pela não classificação para a Libertadores. E só o futuro dirá se será menor que o preço de ser campeão Brasileiro.

Até lá, Gessinger já será um imortal.

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Viva o povo brasileiro!

Na China Antiga, por volta de 3000 a.C, os militares chineses praticavam um jogo, que na verdade era um treino militar. Após as batalhas, formavam equipes para chutar a cabeça dos soldados inimigos.

Com o tempo, as cabeças dos inimigos foram sendo substituídas por bolas de couro revestidas com cabelo. Formavam-se duas equipes com oito jogadores e o objetivo era passar a bola de pé em pé, sem deixar cair no chão, levando-a para dentro de duas estacas fincadas no campo.

Da Idade Média, há relatos de um esporte muito parecido com o futebol, embora se usasse muito a violência. O Soule ou Harpastum era praticado por militares que se dividiam em duas equipes: atacantes e defensores. Era permitido usar socos, pontapés, rasteiras e outros golpes violentos, inclusive ocorria a morte de alguns jogadores durante a partida. Cada equipe era formada por 27 jogadores, onde grupos tinham funções diferentes no time: corredores, dianteiros, sacadores e guarda-redes.

Na Itália daquela época, apareceu um jogo denominado gioco del calcio. Era praticado em praças e os 27 jogadores de cada equipe deveriam levar a bola até os dois postes que ficavam nos dois cantos extremos da praça. A violência era muito comum, pois os participantes levavam para campo seus problemas causados por questões sociais típicas do medievo.

O barulho, a desorganização e a violência eram tão grandes que o rei Eduardo II teve que decretar uma lei proibindo a prática do jogo, condenando à prisão os praticantes. Porém, o jogo não terminou, pois integrantes da nobreza criaram uma nova versão, com regras que não permitiam a violência. Nesta nova versão, cerca de 12 juízes deveriam fazer cumprir as regras do jogo.

Agora, voltamos para o futuro. Para 2009. Semelhanças com a violência medieva, acima descrita, não são meras coincidências.

Rio de Janeiro. Flamengo campeão brasileiro. Muita alegria. Muita selvageria na entrada do Maracanã, na saída, na comemoração no Leblon e em Ipanema.

Santos. Um jogo quase sem torcida. Selvageria na briga entre torcidas nos arredores da Vila Belmiro.

Porto Alegre. O jogador do Grêmio que fez o gol contra o Flamengo, na chegada à cidade, foi hostilizado, acossado pelos torcedores do clube, pois isso favoreceria o Internacional na briga pelo título.

São Paulo. Vagner Love, em uma agência bancária, foi intimado por três torcedores para que o negão começasse a fazer gols, senão…

Curitiba. Invasão do campo do Coritiba FC por centenas de vândalos que protagonizaram cenas absolutamente repugnantes de violência sem propósito. Dezessete feridos, sendo três em estado grave. Destruição do patrimônio do clube. Destruição de uma imagem de um povo supostamente pueril, civilizado aos olhos do Brasil e do mundo.

Cidade-modelo para o Brasil. Modelo e microcosmo de como um povo, ao se acostumar em maquiar e esconder a realidade, simplesmente arma uma bomba-relógio, condensando energia para que seja detonada quando menos se espera.

Décadas de passividade social, impunidade e condescendência, somadas ao déficit de cidadania – algo que apenas recentemente começamos a construir – são o meio de cultura da violência e revolta que o Brasil favorece, em geral e, em particular, o futebol, de vez em quando, torna visível através destas demonstrações de estupidez coletiva.

O país dos direitos para todos, da Constituição-cidadã. Obviamente, ninguém, muito menos as novas gerações, querem ter obrigações.

É muito melhor agir como crianças que escondem doces e brinquedos – quando adultos, escondem dinheiro – nos bolsos e nas meias, pois sabem que os pais fingem que não sabem e não haverá punição.

Lembrando palavras recentes do nosso colunista Oliver Seitz, a Copa de 2014, no Brasil, vai acontecer, inevitavelmente. Mas ela pode ser bem perigosa para os brasileiros e para os estrangeiros que virão.

Bom. Sabemos identificar os problemas. Necessitamos ter a capacidade para superá-los. Não pela Copa 2014, mas pelo nosso povo.

Senão, como se diz em espanhol, Cría cuervos, y te comerán los ojos…

Viva o país do futebol!

Viva o país da Copa 2014!

Viva o povo brasileiro!

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Miopia na gestão do futebol

Caros amigos,

nesta semana, escrevi para um site regional de futebol, uma análise sobre pontos que devem ser observados em times de menor expressão em relação aos chamados “grandes times das capitais”, com destaque no cenário nacional. Compartilho com vocês.

Que aspectos devem ser pensados no planejamento?

1. Formação da comissão técnica;

2. Formação do elenco;

3. Viabilização financeira da equipe;

4. Potencialização dos recursos.

Acredito que esses itens estão, sem sombra de dúvida, nas cabeças dos dirigentes. Mas, uma questão que não é exclusividade dos clubes de Pelotas, mas sim, de muitas agremiações brasileiras é o que podemos chamar de “miopia”. Não a patológica, tão comum a todos nós, mas a conceitualmente relacionada no brilhante texto intitulado “Miopia em marketing”, de Theodore Levitt, leitura obrigatória para qualquer gestor, inclusive esportivo.

Nesse contexto de miopia, na conclusão do texto, o autor expõe a seguinte ideia:

“Obviamente, a companhia precisa fazer o que exige a necessidade de sobrevivência. Precisa adaptar-se às exigências do mercado e o mais cedo que puder. Mas a mera sobrevivência é uma aspiração medíocre. Qualquer um pode sobreviver de uma forma ou de outra: até mesmo um vagabundo das sarjetas. A vantagem é sobreviver galantemente, é sentir a emoção intensa da maestria comercial; não sentir apenas o odor agradável do sucesso, mas experimentar a sensação profunda de grandeza empresarial”.

Esse trecho, transportado para realidade do esporte enfrentada pelas equipes, representa dois aspectos significativos:

1. A miopia que temos quando acreditamos que basta desenvolver ações para manter a sobrevivência dos clubes;

2. A miopia relativa à falta de adequação dos projetos à realidade dos clubes.

Esses tópicos serão aprofundados, com o convite a sua participação, caro leitor, por meio de criticas e opiniões, em semanas futuras. Por ora, apenas alguns indicativos para estimular nossas reflexões:

a. Que pretensões podem ser desenvolvidas para as equipes da região para que não sejam consideradas apenas sobrevivência? Que voos podem ser alçados?

b. Como viabilizar a montagem de uma equipe competitiva frente à concorrência das equipes maiores e mais estáveis financeiramente? Como trazer e manter atletas e profissionais frente à concorrência do mercado?

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Reinventando a fórmula

A edição de 2009 do Campeonato Brasileiro consagrou o formato de pontos corridos no país. Não tanto no gosto do torcedor, ou na cabeça dos dirigentes, mas finalmente parece que os veículos de imprensa compreenderam como deve ser a cobertura de uma competição nesse formato.

Em São Paulo, a Rádio Bandeirantes, por sugestão do narrador José Silvério, não transmitiu nenhum jogo da última rodada da competição. Pelo contrário. Fez todos! Silvério preferiu abrir mão de narrar um jogo no estádio (pela terceira vez em décadas de carreira) para ficar nos estúdios da rádio, na capital paulista, transmitindo simultaneamente os quatro principais duelos decisivos: Flamengo x Grêmio; Internacional x Santo André; Botafogo x Palmeiras; e São Paulo x Sport.

Um espetáculo de informação e transmissão pela rádio. A cada lance de ataque perigoso num dos quatro jogos e lá estava José Silvério trazendo a emoção do lance. Para completar, repórteres em cada um dos estádios e ainda os apoios de Sergio Patrick (giro de placares), José Maia (direto da Vila Belmiro com Santos x Cruzeiro), Claudio Zaidan e Mauro Beting (“comentando” os jogos e o vai-e-vem da tabela).

Da mesma forma, a TV Globo decidiu fazer com que Cléber Machado, Caio, Casagrande e José Roberto Wright ficassem dentro do estúdio em São Paulo numa transmissão mais focada no Botafogo x Palmeiras, mas que passou a ser multiestádios desde que o Grêmio abriu o placar no Maracanã.

Da mesma forma, diversas outras emissoras fizeram cobertura semelhante, numa plataforma única, mas multi informativa.

É o aprendizado da fórmula dos pontos corridos por parte da imprensa. Numa rodada em que quatro times jogavam pelo título, três pela Libertadores e outros quatro pelo rebaixamento, a imprensa entendeu um pouco mais da forma de disputa da competição.

Para segurar audiência e informar muito bem o cliente (que na realidade é a essência do trabalho da mídia), optou-se por essa “transmissão simultânea”.

Se, por um lado, isso representa uma reinvenção da fórmula de transmissão de um jogo de futebol, por outro volta para os primórdios dos trabalhos de rádio e TV no esporte. Muito mais do que um produto comercial, o esporte é produto jornalístico das emissoras. A função de uma transmissão é informar a pessoa.

E o Brasileirão por pontos corridos de 2009 ficará, entre outras coisas, marcado por isso.

Para interagir com o autor: erich@universidadedofutebol.com.br

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Transições de referências: alerta aos treinadores!

Faz alguns anos – mais precisamente em 2001 – publiquei um capítulo na obra “Fútbol: cuadernos tácticos”, chamado “Fútbol: un juego de transiciones”. Nele, abordei e discuti as diversas expressões das fases de transição do jogo de futebol.

Como diz um escritor norte-americano, que agora me escapa da memória, precisamos criar o hábito de sempre resgatar e ler as coisas que escrevemos. Pois bem, esse capítulo que escrevi (sobre as transições), ficou escondido na minha memória, até que recentemente foi resgatado, graças a um dos ouvintes (que havia lido meu texto), presente em uma palestra que ministrei sobre questões táticas do jogo de futebol.

Resolvi hoje, então, escrever um pouco sobre as transições, resgatando algumas ideias que foram apresentadas em 2001, compartilhando-as com os leitores deste texto.

Estamos acostumados com a ideia de que as transições acontecem entre as fases de ataque e defesa, ou defesa e ataque no jogo de futebol. Isto está certo, e não é novidade. Gostaria de chamar a atenção então, sobre outras expressões da transição, presentes ainda dentro da mesma fase de jogo (de ataque ou de defesa), antes da comumente turbulenta migração do estar a atacar para o estar a defender, ou vice-versa.

Em outras palavras, vou tratar das transições presentes dentro de uma mesma fase de jogo de uma equipe (e não das transições entre as fases do jogo). Tratarei daquelas transições, as quais chamei, em 2001, (e creio, ainda ser um nome adequado) transições de referências.

Basicamente, ao atacar ou defender, com base em Claude Bayer, uma equipe pode manifestar ao menos um dos seguintes princípios operacionais: a) estando a atacar – manutenção da posse da bola, progressão ao campo de ataque e ao alvo, finalização da jogada; e b) estando a defender – impedimento da progressão adversária, recuperação da posse da bola e proteção do alvo.

Esses princípios servem como referências coletivas para a ação da equipe. Essas referências podem mudar de acordo com as circunstâncias, e essas (as circunstâncias) podem estar associadas, por exemplo, a região do campo de jogo, comportamento do adversário, localização da bola ou ação de determinado jogador (dentre outros).

Da mesma forma que esses princípios servem como referências, existem também, outras tantas, que podem representar nortes estratégicos e/ou de ocupação do espaço de jogo para jogadores e equipes.

A ação coletiva e individual, de equipe e jogadores no jogo a cada circunstância, é definida pela condensação (e coordenação) de referências operacionais, de ocupação do espaço e estratégicas; e ainda que sejam, por questões puramente didáticas, separadas, na prática, se manifestam integralmente, de maneira associada.

A alteração circunstancial, de predomínio de uma referência, para outra, é um momento de transição, que, normalmente é negligenciado na construção de treinos.

Para elucidar o que quero dizer, vou usar um exemplo bem pontual.

Imaginemos uma equipe (equipe “A”), que tenha como grande referência do seu sistema defensivo, a recuperação da posse da bola, na linha “1” (ou seja, bem próximo a sua meta de ataque), com pressing zonal em profundidade. Se em um jogo, por algum motivo, seu adversário conseguir avançar até a linha 3 (linha do meio-campo) sem perder a posse da bola, é necessário que ela (a equipe “A”) altere elementos da sua grande referência, que pode por exemplo, continuar sendo de recuperação da posse da bola, mas, agora, na linha “3”, com pressing zonal, porém, em largura.

Notemos que o fato da posição da bola sair das proximidades da linha “1”, em direção a linha “3”, faz com que a equipe “A” defina alterar a maneira com que realiza o pressing (que antes era em profundidade, e passa ser agora, em largura).

A dinâmica que liga essa alteração de referência, em função do posicionamento da bola, consiste em uma transição interna a fase de defesa da equipe. Isso quer dizer que, não basta que ela seja treinada para as circunstâncias em função do posicionamento da bola na linha “1”, e depois em função do posicionamento na linha “3”, porque há um elo que liga, cria interdependência e inter-relação entre tais circunstâncias (a transição de referências), e isso não pode ser desprezado.

Da mesma forma, se uma equipe “B” tiver as mesmas referências da equipe “A” quando a bola estiver nas proximidades da linha “1”, mas nas proximidades da linha “3”, ao invés de agir para a recuperação da posse da bola, agir para impedir a progressão do adversário e da bola ao campo de ataque (mesmo mantendo o pressing zonal semelhante ao da equipe “A”), terá dinâmicas de transição bem diferentes, criando interdependências e inter-relações também distintas.

Essas transições de referências são tão, ou mais “esquecidas” nos treinamentos, quanto as transições ataque-defesa e defesa-ataque.

Existem muitas coisas que podemos explorar sobre essas transições. Em breve trarei “expedições” mais aprofundadas sobre o tema. Por enquanto, espero ter estimulado a reflexão e discussão sobre ele, para que à frente possamos debater questões peculiares as transições de referências, de acordo com seu nível de complexidade geral, operacional, estrutural e/ou estratégico.

Para interagir com o autor: rodrigo@universidadedofutebol.com.br

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A tecnologia na arbitragem do futebol

Caros amigos da Universidade do Futebol,

A Fifa realizou a última reunião de seu Comitê Executivo, na Cidade do Cabo, onde debateu alguns temas bastante interessantes e importantes no contexto do atual modelo do futebol.

Foram discutidas alterações nos jogos eliminatórios das Copas do Mundo e, também, a grande polêmica envolvendo as apostas no futebol (assunto esse objeto de várias de nossas colunas).

Um tema importante, que permeia uma série de assuntos abordados na reunião da Exco da Fifa, é a questão da introdução de tecnologia na arbitragem do futebol. Esse assunto tem impacto na questão do gol ilegal da França contra a Irlanda e, também, na possível introdução de outros dois juízes, atrás dos gols, nas partidas.

Em outros esportes, com sucesso, pudemos observar a adoção de tecnologias, tais como o já famoso ¨olho de falcão¨ introduzido pela ATP nas partidas de tênis. No hockey, há tempos há o uso da televisão para auxiliar a arbitragem das partidas.

A Fifa já se pronunciou a respeito, por meio de seu vice-presidente e ex-jogador Franz Beckenbauer, dizendo que a introdução da tecnologia “diluiria a emoção do jogo” (may dilute the emotion of the game).

Eu particularmente concordo com o Kaiser Beckenbauer. Podemos notar nas diversas transmissões dos jogos na televisão, que muitos dos comentarias, inclusive ex-árbitros, têm opiniões diferentes, mesmo após o exame do replay. Entendo que muitos dos lances polêmicos são subjetivos e poderiam causar uma enorme confusão e atraso nas partidas se fossem dirimidos pelo uso da tecnologia.

Creio também que haveria a possibilidade de analisarmos lances mais objetivos por meio de equipamentos tecnológicos, tais como os casos de dúvida se a bola entrou ou não no gol. No entanto, penso que o elemento da participação exclusiva de seres humanos no momento da decisão da jogada (árbitros e bandeirinhas), contribui bastante para a existência da emoção no futebol, que fez deste esporte o mais popular no mundo.

De qualquer forma, ao menos na legislação brasileira, teríamos a possibilidade de anular uma partida por erro de direito do árbitro (o que seria o caso se, por exemplo, o juiz tivesse visto a mão na bola do Henri, porém achasse que o jogador poderia colocar a mão na bola propositalmente, sendo que isso não configuraria nenhuma irregularidade. Isso seria um erro de direito).

Em suma, acredito até que a Fifa pode propor a inclusão de um maior número de árbitros (apesar de defender que isso implicaria em um acréscimo de custos, que a maioria dos jogos de futebol não poderia suportar). Mas, não entendo como necessário e nem conveniente a inclusão de tecnologia para interferir na arbitragem do futebol.

Para interagir com o autor: megale@universidadedofutebol.com.br

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Apontou, guardou

Ninguém tem falado muita coisa sobre a Copa do Mundo de 2014.
Quer dizer. Falar, falam. Mas nada de útil. Nem de novo.
E existem temas que precisam ser falados.
Discutidos.
Debatidos.
Mas que estão sendo ignorados.
Violência, hooliganismo, terrorismo. Essas coisas.
Só se fala de estádio e infraestrutura urbana, o que, convenhamos, é o básico.
Mas, é preciso falar sobre outros assuntos.
Um, em particular, causa calafrios as nossas pueris almas conservadoras.
E será, possivelmente, um dos maiores problemas sociais que a Copa do Mundo irá trazer.
O ônus do bônus.
O opa da Copa.
O turismo sexual.
Alguém tem que falar.
O Brasil é mundialmente reconhecido como um dos grandes pólos de turismo sexual do mundo, junto com o leste asiático.
Que é fomentado por homens, residentes em países mais desenvolvidos, solteiros e de meia idade, que podem ir a esses países e fingir que são ricos.
E, como são ricos, atraem determinado tipo de mulher, ou não, e com elas estabelecem relações comerciais. Esse é o perfil.
E, adivinha qual é o provável perfil da maioria dos torcedores que virão para a Copa do Mundo no Brasil?
Igual ao citado acima. Mas, que gostam de futebol.
Que vêm para beber. Para festejar. Para dizer, no final, que aquilo que acontece no Brasil só pode ficar no Brasil.
O Robin Williams não é solteiro, acho. Mas deu uma indicação clara do que representa o Brasil aos olhos estrangeiros. Festa. Drogas. Sexo. Diversão. Brigas. E, no caso da Copa, futebol. E mais brigas. E mais tudo. Inclusive sexo.
Copa do Mundo não é diversão pra família. Muito menos por aqui.
Seja pelo fato da imagem de violência e confusão do país, somada à Copa do Mundo, fazer com que pai, mãe, filho, filha e avó prefiram destinos mais seguros e organizados, ou seja, apenas pelo fato de que a maioria das famílias não vão querer trocar o raro verão do hemisfério norte pelo verão frio e chuvoso de algumas cidades do sul do país.
Sobra pra quem está disposto a passar por isso: homens, solteiros, de meia idade, com certa grana no bolso, que querem ver futebol, brigar, beber, festar e fazer sexo. Não necessariamente nessa ordem.
Isso, claro, tem impacto econômico.
Você pode, por exemplo, investir em ações da indústria contraceptiva.
Porque, solteiros, possivelmente, preferem continuar solteiros nove meses depois da Copa. E sem filho pra criar.
Mas, em caso de falhas, você pode montar um escritório que trabalhe com a justiça da família internacional.
Nichos de mercado.
Que, se as autoridades continuarem nessa lengalenga atual, serão os mais lucrativos.
Para interagir com o autor: oliver@universidadedofutebol.com.br

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Presente de Natal no maior do mundo

Sou apenas mais um a tentar descrever o que se passa na cabeça de alguém, cujo futebol está no sangue desde pequeno, quando se entra no Maracanã.

Nelson Rodrigues e um sem número de cronistas esportivos, ao longo dos quase 60 anos do mítico estádio, o fizeram muito melhor, com a perfeita combinação entre futebol, prosa e poesia.

Parte do sonho de criança, em se tornar jogador de futebol, passa pela imaginação de atuar nos mais importantes palcos desse esporte, em todo o mundo: Wembley, Camp Nou, Santiago Bernabéu, San Siro, La Bombonera, Monumental de Nuñez, Azteca, Morumbi, Mineirão e Maracanã.

Maracanã, o maior do mundo. Atualmente, não é o maior em número de espectadores. Mas continua sendo o maior no imaginário coletivo do futebol mundial, especialmente, pelo posto ocupado pelo Brasil como maior vencedor desse esporte em Copas, além dos grandes craques aqui revelados que fizeram o país ocupar o primeiro lugar no panteão.

Pude experimentar de perto, bem de perto, a energia que circula por todo o estádio, nos corredores, nos túneis, nos vestiários, no gramado, nas arquibancadas, no salão nobre, durante a última segunda-feira.

Foi na 3ª edição do Torneio Gol de Letra, realizado pela fundação de mesmo nome, presidida pelos ex-jogadores Raí e Leonardo.

Empresas inscrevem suas equipes de colaboradores para participarem, e o valor das inscrições é revertido para os trabalhos desenvolvidos pela entidade. Na primeira fase, os jogos foram disputados no Centro de Futebol Zico (CFZ).

As partidas finais, das equipes fair play e das vencedoras do fim de semana, são disputadas em pleno Maracanã. E, após esses jogos, a disputa do jogo dos ídolos, com os capitães Raí e Bebeto de cada lado.

Tudo impressiona no estádio. A chegada ao imponente palco, a calçada da fama, com os pés dos grandes craques do passado e do presente emoldurados no chão.

É um crescente em emoção, contagiante. Os pensamentos que nos tomam ao perambular por ali remetem às grandes histórias vividas por heróis, vilões e ilustres desconhecidos como eu ao longo da sua existência. Energia pura.

Participei como convidado, no time do capitão Bebeto. Joguei ao lado de Mauro Galvão, Ailton, Julio Cesar Uri Geller, Romário, Macula. E contra Sávio, Raí, Beto, Djalminha, Nélio, Maurício.

Ganhamos de 5 a 2. Tive a dura missão de tentar marcar o meio-campo acima. Mas o que ganhei foi muito maior e mais importante do que o resultado.

Ganhei, de presente, o sonho de menino, embalado no maior do mundo, com muitas surpresas dentro dele.

O “Maraca” foi meu por algumas horas intensas. Será até o fim da vida.

Entretanto, tenho certeza que, assim como tantos outros que ali pisaram no gramado para jogar dividiram com sua família e com os amigos este fantástico presente.

Faço o mesmo com os meus. Em especial, com meu pai, Oscar, que soube transmitir para mim a paixão pelo futebol e tudo aquilo que ela suscita, particularmente, o lado bom, que ficou impregnado em meu caráter.

Isso não tem preço, mesmo.

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Memória: conhecimento e experiência

Há muito escutamos e participamos do aparentemente interminável debate do que vale mais: se a experiência do saber fazer ou se o conhecimento de como fazer. A superficialidade de grande parte das pessoas do meio futebolístico faz com que as opiniões flutuem de acordo com a maré, ora como uma onda mais forte para um lado, ora como ondas no sentido oposto.

Discutimos sobre tecnologia, gestão, treinamento, práticas, formação, enfim, uma série de temas, os quais, quase sempre, retornam ao assunto da experiência de campo, seja como mocinha ou vilã.

“O cara foi jogador, por isso, conhece os atalhos e a linguagem do boleiro”, ou pela outra onda, “o cara foi apenas jogador, não estudou, e não tem profundidade naquilo que faz”, não há planejamento ou sobra malicia prática, eis o contexto.

Para refletirmos sobre a temática, permito abster-me de opinar, para refletir, junto com os amigos, sobre as palavras de Voltaire, num breve conto intitulado “A Aventura da Memória”.

Voltaire faz uma reflexão acerca de teorias que criticam ou defendem a ideia de que nossos conhecimentos decorrem da experiência, da memória. Com a palavra o filósofo:

“O gênero humano pensante […] acreditara por muito tempo […] que nós não tínhamos ideias senão por intermédio dos sentidos, e que a memória era o único instrumento com o qual podíamos reunir duas ideias e duas palavras. […]

Este dogma, no qual se fundam todos os nossos conhecimentos, foi universalmente aceito, e até mesmo a Nonsobre o adotou, embora se tratasse de uma verdade.

Algum tempo depois surgiu um argumentador[…], o qual se pôs a argumentar contra os cinco sentidos e contra a memória. E disse ao reduzido grupo do gênero humano pensante:

- Até agora estivestes enganados, porque os vossos sentidos são inúteis, porque as ideias são inatas em vós, antes de que qualquer dos vossos sentidos possa ter operado; porque já tínheis todas as noções necessárias quando viestes ao mundo; porque já sabíeis tudo sem nunca haver sentido nada; todas as vossas ideias, nascidas convosco, se achavam presentes em vossa inteligência, chamada alma, e sem auxílio da memória. Esta memória não serve para coisa alguma. 

A Nonsobre condenou tal proposição, não porque fosse ridícula, mas porque era nova. No entanto, quando, em seguida, um inglês começou a provar, e a provar longamente, que não havia ideias inatas, que nada era tão necessário como os cinco sentidos, que a memória muito servia para reter as coisas recebidas pelos cinco sentidos, a Nonsobre condenou suas próprias ideias, visto que eram, agora, as mesmas de um inglês. Ordenou por conseguinte ao gênero humano que acreditasse dali por diante nas ideias inatas, e perdesse toda e qualquer crença nos cinco sentidos e na memória.

O gênero humano, em vez de obedecer, pôs-se a rir da Nonsobre, a qual entrou em tamanha fúria, que quis mandar queimar um filósofo. Pois dissera esse filósofo que era impossível formar ideia completa de um queijo sem o ter visto e comido; e chegou o celerado a afirmar que os homens e mulheres jamais poderiam fazer trabalhos de tapeçaria se não tivessem agulhas e dedos para as enfiar.

Os liolistas juntaram-se à Nonsobre pela primeira vez na vida; e os sejanistas, inimigos mortais dos liolistas, reuniram-se por um momento a estes. Chamaram em seu auxílio os antigos dicastéricos; e todos eles, antes de morrer, baniram unanimemente a memória e os cinco sentidos, e mais o autor que dissera bem dessa meia dúzia de coisas.

Um cavalo que estava presente ao julgamento estatuído por aqueles senhores, embora não pertencesse a mesma espécie e houvesse muita coisa que os diferenciava, tal como a estatura, a voz, as crinas e as orelhas, esse cavalo, dizia eu, que tanto possuía senso como sentidos, contou a história a Pégaso, na minha estrebaria, e Pégaso, com a sua ordinária vivacidade, foi repeti-la às Musas.

As Musas […] amavam ternamente a Memória, ou Mnemósine. […]. Irritou-as a ingratidão dos homens. Não satirizaram os antigos dicastéricos, os liolistas, os sejanistas e a Nonsobre, porque as sátiras não corrigem ninguém, irritam os tolos e os tornam ainda piores. Elas imaginaram um meio de esclarecê-los, punindo-os. Os homens haviam blasfemado contra a memória; as Musas lhes tiraram esse dom dos deuses, a fim de que aprendessem de uma vez por todas, a que se fica reduzido sem o seu auxílio.

Aconteceu, pois que, durante uma bela noite, todos os cérebros se obscureceram, de modo que no dia seguinte, de manhã, todos se acordaram sem a mínima lembrança do passado.[…]

Alguns senhores, encontrando um chapéu, serviram-se dele para certas necessidades que nem a memória, nem o bom senso justificavam. E senhoras empregaram para o mesmo uso as bacias de rosto. Os criados, esquecidos do contrato que haviam feito com os patrões, entraram no quarto dos mesmos, sem saber onde se achavam; mas, como o homem nasceu curioso, abriram todas as gavetas; e, como o homem ama naturalmente o brilho da prata e do ouro, sem ter para isso necessidade de memória, apanharam tudo o que estava a seu alcance. Os patrões quiseram bradar contra ladrão; mas, tendo-lhes saído do cérebro a ideia de ladrão, não pôde a palavra lhes chegar à língua. […]

Ao cabo de alguns dias, as Musas tiveram piedade dessa pobre raça. […] “Perdôo-vos, imbecis; mas lembrai-vos de que sem sentido não há memória e sem memória não há senso”.

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