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Por onde também passa o futuro do futebol feminino no Brasil

Há algumas semanas esta coluna tratou do crescimento e desenvolvimento do futebol feminino no Brasil. Foram levantados alguns aspectos da modalidade, do seu envolvimento com a sociedade, algo sobre gênero e algumas hipóteses do porquê da falta de interesse por parte do público. Entretanto, o futuro deste esporte, praticado entre as mulheres, também passa pela maneira como é comunicado. 
Por como é comunicado se entende em como a mensagem do futebol é transmitida para determinado público-alvo. Pode ser ele com base na faixa etária, localização, equipe preferida e, claro, gênero. Nesse sentido, algumas emissoras de rádio e televisão contam com profissionais especializados em futebol para o público-alvo de interesse. É inegável que as mulheres formam hoje grande parte do mercado da modalidade – muito diferente de um tempo não tão distante – e, desta maneira, precisam de respostas que atendam às suas demandas (o tratamento da informação e a maneira como ela será transmitida, por exemplo).
Neste sentido, é crescente o número de narradoras e mulheres especialistas em futebol. E não apenas em futebol feminino. Que bom! Infelizmente, é comum perceber que elas precisam romper inúmeras barreiras ainda. No entanto, este cenário é uma realidade (não apenas com o futebol do Brasil, mas também com todas as questões relacionadas ao gênero na sociedade brasileira) sine qua non para que se alcance, de fato, uma igualdade plena de gêneros em nosso país. Muito se fala da projeção do futebol feminino dentro de campo, só que é preciso que o mesmo aconteça fora dele. Com o tempo, a contribuição das mulheres com o universo do futebol aumenta e a difusão do futebol praticado por elas, também: dependendo da qualidade da mensagem que é transmitida, vai haver mais meninas se interessando em praticar o jogo. 

Isabelly Morais, da Rádio Inconfidência, em jogo no Estádio Independência, em Belo Horizonte/MG. Foto: mg.superesportes.com.br

 
Portanto, é muito saudável perceber que mais mulheres estão envolvidas com o futebol, não apenas dentro de campo. Na gestão do esporte, elas vão ter um papel bastante semelhante. Quem dera fosse outra realidade a do Brasil – que isso surgisse natural e espontaneamente. Haver exemplos é fundamental para a continuidade de um propósito. No caso, o da igualdade de gêneros. Que surjam mais iniciativas como esta! 

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Entre o Intermediário, o atleta e os clubes

Bem-vindos ao nosso terceiro encontro nesse abril aqui no “Entre o Direito e o Esporte” – o “mês dos intermediários” aqui na nossa coluna! E hoje vamos conversar sobre o “modelão” na intermediação para seguir na linha do que combinamos no começo do mês. Hoje é o dia daquele contrato básico, aquele mínimo do mínimo que todo intermediário vê no seu escritório. É hoje que a gente vai ver o que o intermediário precisa no seu contrato.
É mais fácil seguir o jogo se as regras são claras, então já deixo aqui as quatro linhas bem desenhadas: as duas linhas de fundo são as bases do contrato de representação do intermediário. Já a lateral onde ficam os bancos é a forma de pagamento do intermediário. E a linha que sobrou são os detalhes importantes para fechar o campo de jogo.
Vamos lá?
No contrato-modelo de representação de um intermediário a gente vai ver o básico do básico e isso a gente já sabe. Agora, o que é esse básico? É fácil, juro. É que nem quando a gente quer fazer brigadeiro e meio que já sabe que tem que colocar na panela em fogo médio o leite condensado, o chocolate em pó e a manteiga.
No contrato de representação esses ingredientes são vários, como os nomes do representante (intermediário) e representado (clube ou atleta) com todas as informações possíveis. Além disso é importante colocar quanto tempo esse contrato vai durar, os tipos de serviço (e onde), e como esse contrato chega ao seu fim.
Daí é só misturar uma vez que a gente tem tudo isso, e esperar ferver para comer. Ou, no caso do intermediário, cobrar. Aliás, aí é outro ponto importante para se colocar no contrato: como que se dá o pagamento do intermediário – afinal, essa pessoa também precisa comer e viver.
Imagina agora que você vai começar um trabalho novo. Imagina que nesse trabalho novo você vai poder negociar o seu salário. Imagina que o seu trabalho é vender esses brigadeiros que o seu amigo fez para restaurantes na região central da cidade de São Paulo. Esse seu contrato tem que ter como que a pessoa que te contratou vai calcular o quanto que vai te pagar por isso, certo?
O contrato de representação do intermediário vai ter a mesma coisa. Alguns preferem trabalhar com um valor que fica lá pelos três por cento (3%) do que o jogador vai ganhar. Outros preferem trabalhar com um valor fixo fechado num pacote de vários serviços. Seja como for a preferência, esse valor é pago por alguém e esse alguém é quem contratou o intermediário – a não ser que o seuclube concorde em pagar o intermediário do atleta, daí vai ser uma exceção à essa regra geral.
Agora, ainda tem três detalhes importantes.
Imagina que você vende esses brigadeiros do seu amigo e esse amigo é menor de idade. E aí? O responsável por esse seu amigo (como os pais) tem que autorizar e o mesmo vale para o atleta profissional de futebol que for menor de idade.
Imagina que você vende esses brigadeiros do seu amigo e descobre que mais alguém vende esses brigadeiros no mesmo lugar que você. E aí? O seu amigo pode escolherse você é o único representante dele e o mesmo vale no “mundo do futebol” – seja esse seu amigo um atleta ou um clube.
Imagina que você vende esses brigadeiros do seu amigo e te perguntam até quando você pode representar o seu amigo. E aí? O contrato com o seu amigo vai ter um tempo fixo para  você vender esses brigadeiros e a mesma coisa vale para o nosso esporte – o intermediário vai ter um contrato com o seuclube ou um atleta de no máximo 24 meses que pode ser renovado por escrito desde que todo mundo concorde.
Fazer um contrato básico de representação é como fazer um brigadeiro. É simples na hora de colocar os ingredientes só que a gente sempre corre o risco de errar no ponto, ainda mais se o fogão ou a panela são novos. Agora, nem sempre tem espaço para o básico. Né?
É por isso que é importante pensar no que mais a gente quer que tenha no contrato antes de assinar, e pensar bem sobre isso. Desde o que pode dar errado depois e até o que pode dar certo. Quanto mais completo for o contrato, melhor. Essa qualidade a mais fica muito mais fácil de mostrar depois na hora de contar a história de quem você representa.
E quem prestou atenção em tudo até aqui já sabe que falta um último passo para terminar o brigadeiro, né? Colocar o granulado! Afinal, esse contrato tem que ser registrado na Confederação Brasileira de Futebol. E é bem isso que a gente vai ver semana que vem, fechou?
Espero que tenham gostado do nosso “Entre o Direito e o Esporte” aqui na Universidade do Futebol. A gente continua nossa conversa na próxima sexta-feira para fechar o nosso “mês dos intermediários”. Aproveito e deixo meu convite para falarem comigo por aqui, pelo meu LinkedIn ou pelo meu Twitter. Bom final de semana para vocês, e até logo!

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Quer entender o Atlético-PR de Fernando Diniz? 

Entender o jogo de Fernando Diniz não é fácil. Juro que já tentei. Falando diretamente com ele. Algumas vezes. A mais recente foi no final do ano passado. Ele desempregado. Rebaixado com o Audax.
Diniz nos brindou com sua presença no grupo de estudos que temos na Universidade do Futebol, capitaneado pelo brilhante professor João Paulo Medina. Me lembro como se fosse ontem: no final da reunião, após termos debatido e estudado o assunto do dia, puxei o meu celular e peguei um vídeo enviado por mais um amigo, o auxiliar de Diniz, Eduardo Barros: esse vídeo mostrava o Audax em organização ofensiva, encurralando o Palmeiras, em pleno Aliianz Parque. Eu na minha fome de estudar o jogo, sedento por entender tudo de tática, análise de desempenho e metodologia de treinamento, já fui indagando Diniz sobre os princípios e sub-princípios que estavam ali envolvidos.
E ele calmamente me respondeu que antes da tática vem as relações pessoais. Poxa, como assim as relações? Por exemplo: para jogar apoiado, em que o portador da bola tem duas opções de passe na formação de um triângulo pelo menos um jogador vai ficar sem receber a bola. Como se diz na gíria, vai ter ‘corrido a toa’. Para o goleiro fazer parte do modelo de jogo e da construção ofensiva o grupo todo tem que confiar nele. É contra-cultura aqui no Brasil o goleiro jogar com os pés. Afinal, se ele fosse bom estaria na linha, argumentam os mais conservadores. Para toda hora ter cobertura defensiva, há de se ter um espírito de equipe. E aí, está: se não houver grupo, companheirismo, senso coletivo e ajuda mútua esse tipo de jogo não vai rolar.
É por isso que Fernando Diniz considera muitas vezes mais importante fortalecer as relações do que treinar princípios e sub-princípios.
O atual técnico do Atlético-PR acredita piamente que com esse espirito e com esse tipo de jogo sua equipe estará mais próxima da vitória.
Ele diz sempre que todo garoto que vira jogador em algum momento da sua adolescência foi o melhor ou da rua ou da escola. Por que engessa-lo e podá-lo quando chega ao profissional? Resgatar o homem antes do jogador é o que mais fascina Diniz, que também é psicólogo. Entender o porque de esse jogador talvez não ser mais o melhor do pedaço faz com que Diniz dedique quatro, cinco horas conversando com esse homem e desvendando tudo o que passou. Eles se abraçam, choram, riem. Tudo junto.
Portanto, depois dessa conversa passei a entender melhor. Realmente antes da amplitude, da profundidade, da ultrapassagem e da compactação vem a forma com o que o grupo é construído. Diniz é assim na derrota e na vitória. Um time é o retrato fiel da personalidade de seu treinador. Não pense que o técnico do Furacão está empolgado com os últimos elogios. Assim como ele não mudou suas convicções quando foi rebaixado com o Audax e passou mais de seis meses desempregado. Você pode gostar ou não. Mas Fernando Diniz é um dos poucos, senão o único aqui no Brasil, que joga por uma filosofia, por uma missão, por um propósito.
 

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Contra ataque e transição não são sinônimos

Ao longo do tempo tudo na vida se ajusta e adapta, novas ideias aparecem e o que já existe é melhorado, atualizado.
No futebol esses ajustes também acontecem ao florescer de novas ideias, conceitos aparecem contagiando o meio para buscar novos caminhos para a melhora do esporte.
Dificilmente se cria algo novo no futebol, o que já existe é adaptado, analisado e estudado para que se ganhe em dinamismo e velocidade buscando um jogo envolvente e criativo.
Pelo contexto do esporte, que caminha em uma linha tênue entre o tradicional e o contemporâneo, muitas vezes nos deparamos com uma resistência ao novo, ou pior ainda, presenciamos pessoas que não tem a vontade em buscar a informação integral em estudar de verdade, mas criam opiniões com o mínimo que leram, escutaram ou ouviram falar.
O passo seguinte é sair propagando as ideias sem buscar a informação correta e precisa.

Uma mentira contada muitas vezes, se torna verdade em grande escala.

Dentre as grandes falsas informações propagadas nos meios de comunicação e por consequência de forma massificada, é que os contra ataques são transições.

Quantas vezes ouvimos que um time só joga em transição, que tal time defende para poder atuar em transição, que a transição está muito rápida, e assim em diante.

Antes de entrarmos no mérito de transição/contra ataque, vamos discutir as fases do jogo.

Fases do jogo
Já é bem difundido que o jogo é feito em quatro fases:

  1. Organização defensiva
  2. Transição ofensiva
  3. Organização ofensiva
  4. Transição defensiva.

Não temos o objetivo em entrar nos detalhes de cada uma das fases do jogo nesse texto.
Contudo, para fácil entendimento podemos ilustrar da seguinte forma:
A equipe sem bola precisa se organizar para poder recuperar essa bola (organização defensiva), ao recuperar a bola ela busca estratégias para poder se organizar ofensivamente (transição ofensiva), ao se organizar a equipe precisa criar mecanismos para poder chegar ao gol adversário (organização ofensiva) e no momento em que perder a bola os jogadores devem saber como abordar o adversário até se reorganizar defensivamente (transição defensiva).
Esse ciclo não acaba nunca, ele é constante ao longo de todas as disputas da partida.
A união dessas quatro fases de forma equilibrada tende a fazer uma equipe vencedora.
Ao privilegiar uma em detrimento da outra, é o inicio de problemas para a equipe técnica e para os jogadores.
Modelo de jogo
Ao falarmos em modelo de jogo, pensamos que ele representa a ideia do treinador e por muitas vezes da instituição, do histórico da equipe.
O modelo de jogo será o norte de cada momento, de cada fase do jogo. Nele que se definirá como a equipe deverá atuar em cada momento com e sem a bola.
Quando se define bem o modelo de jogo, se modula os treinos, sessão por sessão e introduz, posteriormente se fixa os conceitos da ideia de jogo do treinador na equipe.
Assim como todas as fases do jogo, a transição ofensiva deve ser treinada através da forma que o treinador definiu para seus jogadores. Ela precisa estar enquadrada dentro de todo o contexto da equipe e relacionada de forma sincrônica e equilibrada aos demais momentos do jogo.
Transição ofensiva 
Podemos entender transição ofensiva como o momento em que se recupera a posse de bola, e definimos como se deve atacar o adversário. Também pode ser entendida da seguinte forma:
Transição Ofensiva é (didaticamente) a transição como um momento, um instante, que se inicia antes mesmo da conquista da posse de bola.
Para a Transição Ofensiva devemos treinar a equipe para as seguintes situações:

  • Como a equipe prepara-se para a transição ofensiva?
  • O que a equipe tenta fazer (de forma intencional e coletiva) no exato momento em que recupera a posse da bola?
  • O que a equipe tenta fazer (de forma intencional e coletiva) na sequência se isso não for eficaz?

Imediatamente ao recuperar a posse de bola, em relação à atitude, a equipe tem três ações que devem ser analisadas:
1- manter a bola na zona de recuperação, -não se preocupa em retirar a bola da zona de pressão-, com passes curtos e/ou condução, inicia-se o ataque.
2- retirada imediata vertical da zona de recuperação, -ao recuperar a bola, a equipe executa passes verticais na direção do gol do adversário-, aproveitando possíveis desequilíbrios e iniciando o contra ataque/ataque rápido (contra ataque).
3- retirada imediata horizontal da zona de recuperação, -ao recuperar a posse de bola-, a equipe executa passes horizontais ou para trás para retirar da zona de recuperação. Muito utilizado em ataques posicionais em um jogo equilibrado.
Essas três caraterísticas da transição ofensiva estão relacionadas ao momento do jogo, quanto mais equilibrado entre as três a equipe estiver, mais preparada estará para conseguir êxito no início de suas ações ofensivas.
A equipe deve treinar as três situações, pois dentro do caos do jogo, todas são importantes em algum momento para buscarmos atacar o adversário de acordo com seu desequilíbrio e desorganização ofensiva.
Evidentemente uma será sempre a prioritária de acordo com o modelo de jogo da equipe, definida pelo treinador.
Como visto acima, o contra ataque está dentro do processo de transição ofensiva, mas ele não é nem pode ser entendido como sinônimo, pois essa fase é muito mais ampla e complexa do que se difunde por ai.
Reduzir a transição ofensiva a apenas contra ataque é sintetizar e abrir mão de muitas informações que agregam a essa fase do jogo.
Com esse calendário tão cheio, denso e disputado, definir e entender quais são as fases do jogo e como será colocada cada uma na equipe de acordo com o modelo de jogo do treinador, é essencial para aperfeiçoar o tempo de treino e com ele atingir os objetivos traçados para o time.

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Começou o Campeonato Brasileiro: o maior do mundo

Certamente muitos discordaram do título deste artigo e vão dizer sobre as ligas da Inglaterra, e da Alemanha, sobretudo. Sem dúvida que o futebol de clubes do Brasil está longe de ter a estrutura (dentro e fora de campo), o profissionalismo, a governança e a cultura de mercado que outros lugares possuem. Fatores que permitem grandes investimentos, em favorecimento do esporte. Como consequência, um dos produtos finais, o jogo, acaba por tornar-se um “espetáculo”.

Abre parênteses: em uma análise mais densa, é possível considerar até que ponto a política (o tráfico de influência, o nepotismo, a impunidade) do país chega a influenciar más práticas de gestão do esporte, especificamente o futebol. Fecha parênteses.

Volta-se ao título do artigo: a começar pela Série A, são todos clubes grandes. Alguns possuem projeção mais nacional, mas em geral todos são. Os jogos são na maior parte competitivos e capazes de atrair grande público, preencher a capacidade máxima dos estádios. O porquê ou não de ocupar essa capacidade máxima é outra história e tema para outro texto. Os jogos destes grandes clubes sugerem vários clássicos. Para ser campeão brasileiro, é preciso vencê-los, praticamente um seguido do outro. O resultado de um clássico é imprevisível, o que chama ainda mais a atenção do torcedor e da mídia.

Já são quinze anos de Campeonato Brasileiro disputado no formato de pontos corridos. Premia-se a regularidade e a constância de uma equipe na competição, fundamentais para um trabalho a longo prazo no esporte, com sustentabilidade. Sem contratações curtas, desesperadas e caras – que comprometem as finanças da instituição -, a fim de salvar do rebaixamento ou conseguir na última rodada a classificação para a fase de “mata-mata”.

Cruzeiro Esporte Clube, vencedor do Campeonato Brasileiro da Série A quando disputado por pontos corridos pela primeira vez, em 2003. | Foto: cruzeiro.com.br

 

Por muitos anos o mercado brasileiro foi fechado para o mundo. Há pouco mais de duas décadas isso começou a mudar. Aos poucos o esporte do Brasil está mais voltado para o mercado e a internacionalização é necessária. O Real não é tão forte quanto a Libra, o Euro e o Dólar. Ademais, a América do Sul é a região mais isolada do planeta.

Por outro lado, o Brasil possui: um grande e forte mercado consumidor e publicitário, respectivamente. Uma população com considerável poder de consumo. Torcedores, que gostam, consomem o futebol e querem isso muito mais. É possível ser bem maior do que já é. Entretanto, é uma conjuntura que vai proporcionar as condições necessárias para que isso aconteça.

Diante disso, esta conjuntura será construída a partir de um discurso unificado sobre o futuro do futebol de clubes do Brasil. Qual o ponto-de-situação e onde se quer chegar. Mudanças de ordem de governança, transparência e cultura de mercado, sempre com respeito ao torcedor e ao atleta. Com o tempo, adquire-se credibilidade da opinião pública (imprensa, torcida e setores não ligados ao futebol) e, consequentemente, haverá o retorno financeiro. No texto, aqui, parece muito fácil. Mas não é! No entanto, basta trabalho e vontade. Muita vontade em fazer e mudar.

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A sombra do Brasileirão de 2018

O Campeonato Brasileiro de futebol deste ano ainda está em meio à primeira rodada – faltam dois jogos, que serão disputados na noite desta segunda-feira (16). Entretanto, já é possível identificar uma sombra que vai acompanhar todas as partidas desta temporada na principal competição do esporte mais popular em âmbito nacional. Enquanto a Fifa e as maiores ligas do planeta discutem há anos a adoção de árbitro de vídeo, pensando em modelos e discutindo a eficiência desse advento, os dirigentes locais preferiram fazer da novidade uma verdadeira influência externa. No processo de comunicação, pelo menos.
Foi assim em Vitória x Flamengo, no último sábado (14). O árbitro Wagner Reway (Fifa-MT) viu toque de mão num chute que acertou o rosto de Éverton Ribeiro, que estava em cima da linha do gol e acabou expulso logo aos 10min do primeiro tempo. Depois, ele e os auxiliares validaram lance em que Willian Arão estava impedido e tornaram possível que os cariocas fossem às redes – Réver marcou aos 26min da etapa final do confronto que acabou num empate por 2 a 2. Influenciaram de forma determinante no resultado e no andamento da partida, e prova disso é que acabaram afastados pela CBF (Confederação Brasileira de Futebol) – a equipe que trabalhou no Barradão, em Salvador (BA), foi encaminhada a uma reciclagem.
O Flamengo havia sido um dos defensores da adoção do VAR (árbitro de vídeo) já no Campeonato Brasileiro de 2018. Em votação promovida pela CBF, foi acompanhado por Bahia, Botafogo, Chapecoense, Grêmio, Internacional e Palmeiras entre os defensores da ideia. Perderam para um contingente que julgou alto o custo – a confederação nacional trabalhava com uma estimativa de R$ 20 milhões para as 380 partidas deste ano.
O ponto central da reunião em que a CBF discutiu a possibilidade de adotar o VAR no Brasil, contudo, não foi o resultado da votação. A questão é que não houve qualquer debate sobre o modelo ou o porquê de a ferramenta ter esse custo. Não houve discussão sobre alternativas, parcerias ou outros caminhos que pudessem tornar viável a adoção do árbitro de vídeo. E mais importante: não houve por parte dos clubes uma pressão para que a conta fosse parar nas mãos da entidade que comanda o futebol nacional, tem nas mãos a responsabilidade sobre as competições locais enquanto produtos e tem sido superavitária há anos.
Também não houve na reunião em que o VAR foi rechaçado uma discussão sobre o modelo de arbitragem no Brasil. Não houve qualquer conversa sobre profissionalização de árbitros ou caminhos para que eles sejam mais bem preparados. Cobrá-los a cada erro é o caminho mais curto para desviar foco e construir narrativas em que o culpado é sempre o outro. O difícil, no caso da mediação de jogos de futebol no país, é trabalhar para que os erros não aconteçam.
A mesma questão vale para a pressão que o Palmeiras tem feito na FPF (Federação Paulista de Futebol) por suposta interferência externa em um lance da decisão estadual. No segundo tempo da partida em que o Corinthians vencia por 1 a 0, resultado que levava a disputa para os pênaltis, Ralf travou Dudu na área. O árbitro Marcelo Aparecido Ribeiro de Souza chegou a apontar a infração, mas mudou de ideia e no fim anotou apenas escanteio. Foram oito minutos de ínterim entre uma coisa e outra.
Se está convicto de que houve interferência externa, o Palmeiras tem total direito de perseguir seus direitos e fazer pressão para que a decisão seja colocada sob lupa. Mas cabe ao acusador o ônus da prova, algo tão fora de moda no país ultimamente, assim como um cuidado com a pessoa por trás da decisão. A narrativa de que o time foi prejudicado por “alguém de fora” é conveniente para reduzir a pressão sobre a equipe alviverde, mas joga aos leões os profissionais que estavam trabalhando naquele jogo – e que em última instância acertaram, importante dizer.
Em nota oficial emitida na semana passada, o Palmeiras cobrou uma série de medidas da FPF. Pediu, entre outras coisas, a imediata adoção do VAR nas partidas do Estadual. Mais uma vez, um pedido que ignorou o cerne da questão: Como? Com qual modelo? Com quantas pessoas? Operado por quem? Com qual custo? Com qual regulamento?
As semifinais da Superliga de vôlei têm usado árbitro de vídeo em ambos os naipes. E isso não encerrou totalmente as polêmicas – o modelo adotado por eles limita a revisão a alguns tipos de lances, e os árbitros erraram em situações não compreendidas no espectro.
Há uma série de modelos e caminhos possíveis para o VAR, portanto. Dependendo da escolha, é possível que o árbitro de vídeo seja usado para dirimir muitas polêmicas, mas não consiga resolver todas. No futebol brasileiro, porém, ainda não houve qualquer debate sobre todo esse universo de coisas entre o “usar” e o “não usar” o recurso.
Do jeito que está colocada, a questão do VAR é apenas uma sombra. A cada erro que acontecer no Campeonato Brasileiro de 2018, os prejudicados vão reclamar e lembrar que o futebol nacional está aquém das principais ligas do planeta nesse aspecto. Em todas as rodadas haverá gente falando que deixou de somar pontos por causa de falhas humanas, como se a mudança para a máquina fosse uma transposição simples.
Todavia, esse caminho não é nada simples. Se os árbitros que hoje são mal preparados forem os operadores do VAR e não tiverem treinamento adequado para a tecnologia, como garantir eficiência? Se a possibilidade de revisão estiver condicionada à existência de um replay que encerre totalmente a polêmica, o poder não será colocado inteiramente nos geradores de imagem?
Há muitas questões sobre o VAR, e nenhuma delas é se o sistema deve ou não ser adotado no Campeonato Brasileiro. Enquanto a conversa estacionar nessa dicotomia, a sombra que acompanhará toda a competição nacional em 2018 servirá apenas para o que tem sido usada: criar subterfúgios narrativos e evitar as verdadeiras responsabilidades.

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Aprender a executar + aprender a encontrar

Imagine-se num jogo de futebol. A cada instante nos vemos obrigados a agir da melhor forma possível e a aproveitar o máximo de cada momento. Mas estamos falando de um esporte onde o azar e a incerteza são características determinantes, ou seja, haverá sempre um “morrinho artilheiro”, um passe errado ou uma dúvida sobre o que fazer. O lado bom, é que podemos transportar muito disso para o adversário! Mas como podemos resolver o nosso lado?
Bom, os estudos sobre tomada de decisão no esporte nos trazem conceitos e aplicações práticas. Resumidamente, estes estudos vêm desde uma orientação psicofisiológica centrados na antecipação e no tempo de reação, passando por trabalhos com uma perspectiva cognitiva do processamento da informação onde o esportista tem um controle sobre sua resposta, e por hora, temos uma abordagem sobre a relação entre a percepção e a ação que trata da capacidade do atleta em dar uma resposta rápida e adaptada a partir de ajustes sobre o que se percebe em dada situação.
Evidentemente que um assunto desta importância não pode ser tratado de forma tão rasa e muito menos resumido em algumas linhas. Mas vale como pretexto de discussão e algum auxílio teórico, pois estamos falando do processo de formação do jogador de futebol.
Ora bem, pensando no desenvolvimento a longo prazo, os nossos jovens futebolistas estão aprendendo tanto os fundamentos técnicos (condução, passe, recepção, finta, chute, cabeceio, roubo de bola) como os movimentos fundamentais (correr, frear, girar, saltar, mudar de direção durante a corrida); isto é, estão aprendendo a executar tais ações de forma analítica e contextualizada. Neste caso, o ensino é conduzido de uma forma mais direta.
Por outro lado, o jovem precisa aprender a encontrar, de forma rápida e eficiente, as soluções para os problemas que surgem no decorrer do jogo. Para isso, ele deve treinar (melhorar a percepção, a tomada de decisão e a ação) sistematicamente as situações de jogo (1×1 até 11×11) de modo que fique mais “afinado” às ações dos adversários. Isto porque, por mais que as situações sejam pré-determinadas, elas não se reproduzem de forma exata e há sempre algo imprevisível pela frente. Neste sentido, o treino é conduzido de forma mais interrogativa e direcionado a resolver aquilo que é mais relevante.
Aqui chegamos num ponto chave! O papel do treinador é ajudar os jogadores em basicamente três aspectos: 1) torná-los mais conscientes e confiantes de suas responsabilidades quanto ao desempenho em uma situação de jogo; 2) deixar claro quando tomarem uma decisão inadequada, por quê é inadequada e quais as suas consequências e; 3) valorizar as soluções encontradas.
Esta interação jogador-treinador enriquece a análise do contexto da decisão e abre caminho para um diagnóstico mais rápido sobre o problema detectado e suas possíveis causas (perceptivo, decisional ou técnico), tornando o ajuste de comportamento em algo mais agradável e não apenas a execução de uma ordem. Além disso, quando sabemos a causa do problema, fica mais fácil resolvê-lo. Por exemplo, durante um exercício observa-se uma quantidade relevante de passes altos de média ou longa distância fora do alvo determinado. Neste caso, os jogadores perceberam um ponto vulnerável do adversário, decidiram corretamente pois encontraram uma maneira de alcançar o objetivo proposto, mas ainda não conseguem realizar o passe com precisão. Temos então, uma necessidade de melhorar este fundamento. Caso decidissem pelo passe longo, mesmo com o adversário todo defendendo o próprio alvo, tal decisão precisaria ser corrigida por algo que proporcionasse algum benefício para sua equipe.
Por fim, quando elaboramos uma sessão de treino, escolhemos os conteúdos de acordo com o objetivo proposto e conduzimos o ensino de acordo com o tipo de exercício selecionado, ou seja, a maneira como vamos conduzir o treino e transmitir as informações, é definida previamente.
 

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Entre o Direito e o Intermediário

Bem-vindos ao nosso “Entre o Direito e o Esporte”. Hoje vamos continuar a nossa conversa sobre aqueles que nós amamos sempre que trazem aquela estrela para o nosso time, aqueles que lembramos toda vez que esse jogador vai embora, aqueles que são conhecidos como intermediários. Hoje vamos ver mais sobre os regulamentos do “mundo do futebol” que batem na porta dessas figuras do nosso esporte.
E para deixar tudo mais tranquilo, a gente vai seguir esse esquema hoje: vamos começar com o que a FIFA fala sobre tudo isso – é pouco, prometo. Então a gente saí da Suíça para chegar ao Brasil e ver como a Confederação Brasileira de Futebol (CBF) repassa para os intermediários por aqui. E daí vamos conversar sobre um detalhe bem importante – o tal do “conflito de interesse”.
Fechou?
Quem lembra daquela história da pirâmide? Pois é, cá estamos de novo. A FIFA regulamenta e o resto do “mundo do futebol” segue – por isso que é importante saber o que ela fala do alto de seus bancos. A FIFA é quem cuida do futebol e cuidar do futebol significa proteger e melhorar o que existe. É tipo fazer uma boa pizza margherita, sabe? Não precisa inventar muito e é só seguir o que sempre deu certo. E no caso dos intermediários foi um pouco essa a lógica – regular o mercado da maneira mais próxima do que já existia, melhorando no que parecia possível.
Foi assim que a FIFA criou o regulamento para trabalhar com intermediários. Esse Regulamento é um guia geral para o “mundo do futebol”. Um guia que não fala diretamente com os intermediários, com os clubes, e com os jogadores. Um guia que mira nas Federações Nacionais. Essas Federações Nacionais têm que criar os seus próprios manuais levando em consideração esse guia e o seu dia a dia. É por isso que a CBF repassou por aqui o seu próprio regulamento que é o que a gente vai ver agora.
A Confederação Brasileira de Futebol fez a nossa pizza de catupiry dessa boa pizza margherita – que sempre pode ser melhor. Mudou um pouco aqui e ali para deixar um pouco mais com a cara do que a gente tem por aqui, sabe? Assim que saiu o Regulamento Nacional de Intermediários (RNI). Esse regulamento traz o que o intermediário precisa para se cadastrar e se registrar na CBF, traz o básico para o contrato de representação entre intermediário e clube ou jogador, e traz o básico sobre transparência no trabalho do intermediário. Esse regulamento bate na porta do intermediário para deixar o seu dia a dia mais claro – são os seus princípios gerais.
A gente já sabe que atleta e clube podem contratar intermediários, certo? E esses intermediários podem ajudar clube e atleta durante uma transferência ou numa negociação de contrato de trabalho. É aí que entra a ideia de due dilligence– que é a palavra chique para dizer um “faça a lição de casa antes de contratar alguém”. Esse deverdas partes passa pela ideia de conflito de interesses.
Afinal, o que é um conflito de interesse?
Imagina que você cansou da vida de pizza e resolveu dar uma mão e representar a sua tia com o negócio de molhos de tomate dela. Você conhece todo mundo do ramo mesmo, daí fica fácil. Imagina agora que uma pizzaria te contratou para comprar o melhor molho de tomate para fazer calzone. O que você faz?
A resposta é fácil se o molho da sua tia for o melhor. Você avisa a pizzaria, avisa que você representa a sua tia, e avisa que a sua tia te paga por essa intermediação. Até aí sem problemas – e isso vale para o futebol também se um jogador for o molho de tomate e seu intermediário representar o clube também. Não tem o menor problema desde que todos saibam disso antes e autorizem por escrito.
Agora, e se o molho da sua tia não for o melhor só que você não quer repassar outro por que quer dar preferência para o molho da sua tia porque ela te paga melhor. Como fica? É, aí é mais complicado. O intermediário tem que seguir alguns princípios básicos – transparência e honestidade valem para qualquer relação social das nossas vidas. E aí a grande questão é colocar os interesses do seu cliente antes do seu. Senão…
Senão é um risco que você corre – e pode perder o cliente. Pior. Pode perder até o direito de intermediar qualquernegociação desse tipo. É um risco grande. É por isso que é importante se perguntar se o que você está fazendo é algo que gostaria que fizessem com você. E se ficar na dúvida, bom… é legal pelo menos perguntar para alguém que você confie.
Lá fora todo cuidado é pouco. E do mesmo amor que a torcida tem por um intermediário, pode vir um ódio que pode fechar portas. A vida de intermediário é uma vida complicada e esses regulamentos estão aqui mais para ajudar do que para atrapalhar – mesmo quando parece que não é bem assim.
Hoje a gente fica por aqui. Espero que tenham gostado do nosso “Entre o Direito e o Esporte” aqui na Universidade do Futebol. E nos vemos na próxima sexta-feira para conversar sobre o contrato dos intermediários. Que tal? Deixo meu convite para falarem comigo por aqui, pelo meu LinkedIn ou pelo meu Twitter. Bom final de semana para vocês, e até logo!
 

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O cansaço é mesmo físico no futebol?

Ainda nem chegamos no meio da temporada. Não temos nem três meses de jogos oficiais aqui no Brasil. E o velho discurso de cansaço, desgaste físico e excesso de jogos permeia as entrevistas de muitos técnicos e jogadores.
Primeiro existe uma crença no inconsciente coletivo do futebol brasileiro de que jogar duas vezes por semana cansa. Quebrar crença é algo dificílimo em qualquer setor. Todo gatilho vai reforçar o que se pensa: se o time perde é porque está cansado; se um atacante desperdiça um gol feito é porque faltou perna; se um zagueiro chega atrasado no lance é por conta da sequência de jogos. Enfim, o viés físico toma conta das explicações. Se esquece que o jogo é complexo, sistêmico e integrado.
A vertente física é uma das esferas do jogo. Mas ela não se sobressai a técnica, a tática, ao psicológico, cognitivo, etc. É tudo junto. Ao mesmo tempo.
Tudo já começa pelo treino. Jogadores mais fortes e resistentes fisicamente vão jogar um futebol de mais qualidade? Tenho minhas dúvidas…Correr em volta do campo ou saltar na areia fará os jogadores implementar melhor as ideias de jogo da comissão técnica? Creio que não.
O jogo tem mais qualidade quando os jogadores respondem coletiva e ordenadamente melhor aos problemas que se apresentam nos quatro momentos (ataque, defesa, transição ofensiva e transição defensiva). E trazendo a parte física ele tem que ser um suporte a maneira de jogar. É diferente a preparação de uma equipe que joga com a manutenção da posse de bola, com passes curtos e apoios da preparação de um time que joga de maneira reativa, no contra-ataque e com bolas longas.
Fico incomodado quando se fala do jogo em apenas um aspecto. Não podemos esquecer que o futebol é multifatorial. Nunca há uma única explicação para uma vitória e para uma derrota. Só correr mais não vai te aproximar da vitória. Melhor do que correr bastante é correr certo, atingindo o objetivo do jogo, que é se sobressair ao adversário com o menor gasto de energia possível.
Falar que o time está cansado me parece pobre. Soa como uma desculpa de que o treino e as ideias de jogo não estão sendo bem trabalhadas.

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Mimimi paulista

A história que vai reverberar por mais tempo entre tudo que aconteceu no futebol brasileiro no último domingo (08) é a de Marcelo Aparecido Ribeiro de Souza, 45, árbitro que trabalhou em Palmeiras x Corinthians, decisão do Campeonato Paulista. O condutor do clássico viu um pênalti do alvinegro Ralf em Dudu aos 26min do segundo tempo, em lance na linha de fundo, quando os donos da casa perdiam por 1 a 0 no Allianz Parque – o resultado levaria às penalidades a disputa da taça, enquanto o empate daria o título aos mandantes. Depois, ouviu do quarto árbitro que o volante havia batido na bola e atingido o capitão alviverde apenas na sequência do lance. Esperou quase oito minutos, conversou com atletas e com mais gente que estava na área externa e por fim reviu a decisão.
O pênalti que não foi pênalti mudou a história do Campeonato Paulista e teve repercussão muito além das quatro linhas. Mauricio Galiotte, presidente do Palmeiras, deu uma entrevista verborrágica após a partida. Disse, entre outras coisas, que a competição estava manchada pelo lance. Além disso, vetou jogadores de sua equipe na entrega de medalhas, ainda no Allianz Parque, e também optou por um boicote à festa de premiação do certame estadual. Um grupo de conselheiros ainda espera que o time alviverde organize uma represália e boicote o torneio a partir do ano que vem.
A questão toda em torno do lance é se houve interferência externa na decisão de Ribeiro de Souza, o que é proibido pelas regras. Há imagens que mostram movimentos não usuais do quinto árbitro e de outras pessoas que estavam no entorno do gramado. Há conversas suspeitas, ações suspeitas e uma série de cenas questionáveis nos oito minutos entre a marcação do pênalti e a revisão. O Palmeiras tem razão para questionar a liturgia e a origem das informações que chegaram ao árbitro – na transmissão em rede aberta, profissionais da TV Globo foram imediatamente unânimes ao questionar a falta. O Palmeiras pode achar que o árbitro mudou um posicionamento com base em uma percepção que não era definitiva – o lance é questionável mesmo após replays. O Palmeiras pode questionar até o impacto que a paralisação teve em seu time, que precisava de um gol para evitar as penalidades. O Palmeiras pode até achar que o roteiro do clássico abalou emocionalmente seus atletas – Dudu e Lucas Lima erraram suas cobranças, e o Corinthians ficou com o título.
O que o Palmeiras não pode é transformar o episódio em ferramenta discursiva de conflito. Quando disse que o campeonato estava manchado e questionou a relevância do Paulista, Galiotte colocou em dúvida o próprio esforço que seu clube havia feito nos meses anteriores. Se tivesse sido campeão, o mandatário alviverde adotaria um tom de desdém tão escancarado?
Do jeito que foi colocado, o discurso do dirigente pareceu mais uma resposta a seus pares do que uma análise fria. Pareceu um choro de mau perdedor. Ainda que a interferência externa tenha acontecido, o fato é que o Palmeiras reclama de um lance em que a marcação de um pênalti teria sido um erro.
Se o Palmeiras tivesse sido campeão graças a um pênalti equivocadamente assinalado, Galiotte teria adotado um discurso semelhante? E se a interferência externa não oficial é um problema tão grande para o time alviverde, por que a diretoria nunca se pronunciou para criar mecanismos que impedissem essas ações?
Em 2017, depois de um jogo em que o Corinthians venceu o Vasco no Campeonato Brasileiro com um gol irregular anotado por Jô, Marco Polo Del Nero, então presidente da CBF (Confederação Brasileira de Futebol) disse que urgia a adoção do árbitro de vídeo e que essa medida era irreversível para a principal competição nacional. Depois, apresentou aos clubes uma conta de R$ 20 milhões por ano e entregou o custo a eles. O orçamento foi reprovado, importante dizer, sem que houvesse questionamentos sobre a natureza desse valor.
A única tentativa recente de minimizar polêmicas no futebol brasileiro, portanto, esvaiu-se numa simples discussão sobre custo. Não houve parecer técnico ou debate sobre a necessidade de evolução. Não houve preocupação com o todo, o que também resume o posicionamento de Galiotte após a decisão do Campeonato Paulista.
Se houve interferência externa na decisão do árbitro, trata-se de um erro inaceitável. Galiotte, contudo, não pode fazer acusações e julgamentos sem apresentar provas. Ainda que os indícios levem a uma conclusão assim, não pode levantar dúvidas sobre pessoas e instituições sem se responsabilizar por isso.
E aqui uma adição importante: também não deve, se achar que foi lesado, fingir que não aconteceu nada. Não pode aceitar qualquer explicação da FPF (Federação Paulista de Futebol) e não deve deixar o tema morrer, ainda que isso abale relações políticas.
O desfecho do Campeonato Paulista de 2018 tem muito do que o Brasil tem vivenciado no campo político: acusações sem provas, pessoas tomando partido e análises enviesadas. O Palmeiras tem chance de dar um passo além e efetivamente transformar o choro em investigação ou plano de ação. Caso contrário, para usar uma expressão que tem sido comum nas redes sociais, a reclamação do clube não vai passar de mimimi.