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Com o término dos Jogos Pan-Americanos, o esporte brasileiro começa, aos poucos, a voltar à ordem natural de suas coisas. Sem a overdose de cobertura da mídia a todas as modalidades, regressamos ao período em que o futebol domina as ações.
Mas o excesso de cobertura de futebol na TV nos revela, a cada outro evento esportivo, como o Pan e, principalmente, os Jogos Olímpicos, um problema crônico na narração esportiva brasileira.
É cada vez mais nítida a dificuldade que o país tem em produzir narradores técnicos, que conhecem uma modalidade a fundo além do futebol.
Em 15 dias de Pan, o que se viu, ou ouviu, nas telas e dials país afora foi muito mais uma “torcida” pelo Brasil em vez da narração de uma competição. Narradores afônicos com a maratona aquática, indignados com a decisão dos árbitros no judô, eufóricos com os saltos que valem o ouro no Pan, mas nem o bronze em Olimpíadas e Mundiais, de Maurren, Jadel e Fabiana Murer.
Tivemos de tudo um pouco no Rio. Mas o que faltou, de fato, foi o jornalismo.
Em busca da medalha dourada, nossos narradores se especializaram em falar coisas que não fazem sentido, em achar culpados e explicações para o inexplicável. Jade se esborrachou no chão durante a apresentação nas barras. Era nítido que o ouro havia escapado entre os dedos, literalmente. Mesmo assim, em todas as emissoras, a impressão que se tinha era de que ainda havia esperança.
O único momento em que tal “ufanismo” não aconteceu foi no futebol masculino, quando, aos 40 do segundo tempo, o time brasileiro sofreu o quarto gol do Equador e ficou claro que a equipe seria eliminada da competição.
Não seria isso a prova de que, no Brasil, o narrador só não é um torcedor quando o assunto é futebol?
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A lógica do jogo de futebol
Quando menino (avós vivos, tios animados, macarronada aos domingos), me intrigava uma figura, conhecida nas ruas do bairro como “Zé do Torto”, que sempre aparecia depois dos almoços em família na casa de meu avô apenas para dizer “boa tarde” e mostrar as moedas que mais uma vez ganhara desafiando pessoas na rua em uma variação do conhecido Jogo da Velha: “eu digo que nunca perco; então se o jogo empata ou eu venço, não tem jeito; as moedas são minhas”.
É claro que questionamentos que se arriscam a eliminar apenas oito quadrados ou menos (no caso de resposta negativa) podem alcançar o privilégio de eliminar 56 em caso de resposta afirmativa. Eis aí algo peculiar ao jogo: a imprevisibilidade. Mesmo dominando “combinações e possibilidades”, é possível transpor o esperado e passar à frente (o inesperado!).
Sem qualquer ponto ou vírgula a mais, a frase era sempre essa. E o que me deixava curioso era o fato do tal Zé do Torto nunca perder. Mais tarde, com um pouco mais de idade, desapareceram certas dúvidas, o jogo da velha (e sua variação) perdeu os seus mistérios e percebi que compreendendo certas combinações e possibilidades era muito fácil não perder jogando esse jogo. Percebi que outros jogos por vezes mais e por vezes menos complexos do que o jogo da velha também tinham “combinações e possibilidades” que estruturadas apontavam para uma lógica que orientava a melhor forma de jogar.
Os desafios cresceram e a curiosidade também. Ficou para trás o jogo da velha. Surgiram jogos com cartas, damas, xadrez e claro, futebol!
Façamos um exercício com um jogo conhecido (dentre outros nomes) como batalha naval. Nele o objetivo do jogador é descobrir qual dos “quadrados” (A1, A2, A3, A4, A5, A6, A7, A8, B1, etc.) fora escolhido pelo seu adversário dentre os 64 possíveis. O seu adversário buscará descobrir o mesmo. Vence o jogo aquele que mais rapidamente chegar ao “quadrado” do seu oponente.
Para chegar à resposta certa, cada jogador pode fazer ao seu adversário perguntas em que as respostas sejam somente “SIM” ou “NÃO”. Então um jogador pode perguntar, por exemplo, se o quadrado do seu oponente está na coluna 1; mas não poderá perguntar se “o quadrado escolhido está na coluna 1 ou na coluna 2″ (pois aí a resposta deixaria de ser simplesmente “SIM” ou “NÃO”). De quantas perguntas você necessitaria para chegar à resposta correta?
Compreendendo a lógica desse jogo é possível, com um número reduzido de perguntas, chegar ao quadrado escolhido pelo oponente. Para isso, basta que a cada pergunta seja eliminado o maior número de quadrados possível. Então, em vez de perguntar se o quadrado escolhido está na coluna 1 (ou 2, 3, 4, 5, 6, 7 ou 8) – o que em caso de resposta negativa eliminaria apenas 8 quadrados – dever-se-ia buscar interrogações do tipo “o quadrado escolhido está entre a coluna 1 e a 4?“. Nesse caso, independentemente da resposta ser negativa ou positiva, o número de quadrados eliminados seria 32. Se a mesma idéia for aplicada a cada pergunta, em seis tentativas seria possível chegar à reposta correta.
É claro que questionamentos que se arriscam a eliminar apenas oito quadrados ou menos (no caso de resposta negativa) podem alcançar o privilégio de eliminar 56 em caso de resposta afirmativa. Eis aí algo peculiar ao jogo: a imprevisibilidade. Mesmo dominando “combinações e possibilidades”, é possível transpor o esperado e passar à frente (o inesperado!).
Obviamente, em um jogo como o de batalha naval, se os dois oponentes conhecessem a lógica do jogo (para eliminar o maior número possível de quadrados), e não houvesse a possibilidade de se arriscar, ganharia sempre aquele que começasse primeiro com as perguntas.
E o futebol com isso?
O futebol é um jogo de grande complexidade de ações e como jogo pode ter a sua Lógica compreendida. A diferença é que em vez de buscarmos quadrados, devemos buscar o entendimento de detalhes que desencadeiam situações que possam efetivamente aumentar as chances de fazer gols. Em vez de buscarmos a simplicidade, devemos entender a sua complexidade.
Ainda que possa parecer abstrato, comecemos por entender que de certa forma alguns técnicos de futebol tornam-se vitoriosos com suas equipes e fazem história em agremiações diferentes, em torneios diferentes, com jogadores diferentes usando esquemas táticos diferentes. Seria isso coincidência?
Diversos estudos têm sido realizados no mundo tentando descobrir, sob a perspectiva técnico-tática, quais são as variáveis que determinam o sucesso de equipes e treinadores vitoriosos. É claro que não é apenas de variáveis técnico-táticas que uma equipe sobrevive. Não estou aqui desprezando aspectos psicológicos, sociais, fisiológicos ou qualquer outro. O que busco é apontar para a possibilidade de se entender a lógica dentro do jogo de futebol e a partir dela construir estruturas táticas e estratégicas nos treinamentos que aumentem as chances de vitórias.
Se os dados de pesquisas apontam para o fato de que seqüências ofensivas que resultam em gols têm em sua eficácia uma relação inversa ao seu tempo de duração (em outras palavras, as jogadas que têm maior chance de se reverter em gol são aquelas que têm poucos segundos de duração), por que não, por exemplo, criar estratégias para que a partir da recuperação da posse de bola em dada região do campo, uma equipe tenha condições de levá-la ao gol adversário rapidamente (e indo além, por que não investigar como tornar isso possível?)?
O que proponho, caros amigos, é a partir do entendimento da lógica do jogo, buscar o domínio do maior número possível de variáveis que a compõe, tornando uma equipe ao mesmo tempo mais imprevisível para o adversário e ele (o adversário) menos imprevisível para ela. O que sugiro é que busquemos responder sob a perspectiva técnico-tática os porquês de tantas vitórias desse ou daquele treinador, dessa ou daquela equipe, fugindo do acaso e dos achismos que sobrevivem no futebol.
Pra quê perguntar por quê? Será que vale a pena? Será?
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Sobre a saída de Dualib
Dualib se foi do Corinthians. Dizem que não volta mais. Depois de mais de uma década se sustentando no poder, não resistiu ao efeito MSI e largou mão do clube.
É fácil entender parte da razão da perpetuação de Dualib no cargo. Afinal, trata-se do segundo clube mais popular do país, o clube do coração do presidente da república e um dos clubes que mais atraem atenção da mídia e da população em geral. Os atrativos intangíveis são imensos, dificilmente oferecidos por qualquer outro tipo de atividade. Eu, no lugar dele, provavelmente também tentaria desfrutar dessa posição o maior tempo possível.
Acima de tudo, porém, a pseudo-deposição de Dualib do cargo ofereceu um grande argumento para aqueles que se posicionam contra a idéia do clube-empresa. Afinal, fosse o Corinthians uma empresa, e não um clube, poderia Alberto Dualib ter sido destituído do cargo? E se o clube fosse do próprio Dualib? Adiantaria alguma coisa os torcedores protestarem contra a sua permanência?
É essa, hoje, a grande briga que existe contra o formato empresarial dos clubes de futebol. Afinal, quando alguém compra alguma coisa, essa coisa é dela, e não dos outros. Supondo que Dualib fosse dono do clube, tudo que um torcedor poderia fazer caso discordasse desse fato, era deixar de torcer pelo clube. Foi o que aconteceu com o Manchester United, na verdade. Alguns torcedores ficaram tão desapontados com o fato de não ter nenhuma legitimidade de opinião contra o fato da família Glazer ter tomado comprado o clube que resolveram criar o próprio time, o FC United.
Bem ou mal, o regime associativo oferece canais mais diversos de acesso do torcedor ao clube, ainda que esses canais sejam bastante deturpados na realidade brasileira. Mas pelo menos eles existem. Um torcedor pode se associar a um clube, se tornar um conselheiro e eventualmente ter influência no poder decisório. É difícil, mas pelo menos existe a possibilidade de acontecer.
Um dos problemas, porém, é que o torcedor possui um comportamento naturalmente irracional, o que acaba deturpando a real legitimidade da sua opinião, principalmente no que se relaciona às questões administrativas. Acima de tudo, torcedores e conselheiros são motivados pela performance do seu clube e, portanto, suas opiniões e seus juízos serão diretamente influenciados pelo desempenho do time.
O que me leva a uma pergunta: Teria tudo isso acontecido caso o Corinthians estivesse no topo da tabela?
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A força que supera o planejamento
O planejamento é sempre uma palavra de ordem quando se pensa em trabalho organizado, científico e que busca vitórias de forma sustentada no esporte. Entretanto, há momentos que em outros fatores falam mais alto. Isto é o que demonstra a recente conquista pela seleção do Iraque da Copa da Ásia, uma competição correspondente à Copa América, ao vencer a Arábia Saudita na final por 1 a 0.
O Iraque, ao terminar a competição à frente de seleções como Arábia Saudita, Coréia do Sul, Japão, Irã, China, que sabidamente representam países que na atualidade possuem federações de futebol bem mais estruturadas, sinaliza que nem sempre apenas o planejamento garante o sucesso de uma equipe de futebol.
A preparação da seleção do Iraque caracterizou-se pelo improviso, carências e dificuldades de diversas ordens. Enquanto outros países se prepararam utilizando-se dos mais modernos e sofisticados recursos, o Iraque contou com condições bastante precárias de preparação.
O próprio treinador, o brasileiro Jorvan Vieira, com apenas dois meses de trabalho, mal conhecia os seus jogadores iraquianos. Mas então devemos concluir como afirmam alguns, que futebol não tem lógica? Ou será que existem outros aspectos que podem ser decisivos para uma conquista, como a conseguida pelo aparentemente fraco e despreparado Iraque?
Penso que esta última hipótese seja a mais correta. O que sobrou ao modesto Iraque e talvez tenha faltado às outras seleções consideradas mais qualificadas, foi aquela inabalável força interior capaz de unir solidamente um grupo em torno de uma meta ou finalidade comum. No caso do Iraque, país destroçado por problemas de ordem política, religiosa e econômica esta força quase mágica resgate do orgulho nacional, permitiu até que etnias historicamente divididas como xiitas, sunitas e curdos, se unissem em torno de uma causa comum.
Esta é a maravilhosa força da natureza humana. E esta é uma das características mais destacadas do futebol que o torna aparentemente imprevisível e encantador.
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A leitura tática do jogo
Certa vez, numa cidade do estado de São Paulo, em uma greve de ônibus, proprietários de “vans” (peruas) perceberam grandes oportunidades de trabalho: poderiam transportar os passageiros que ficaram sem ônibus, tentariam junto a prefeitura a legalização do seu meio de transporte e, claro, lucrariam com isso.
Com a permissão aos chamados “perueiros” os proprietários de ônibus protestaram e fizeram previsões catastróficas para a “saúde” das suas empresas. Um deles, contrário aos demais, viu na situação uma oportunidade de crescimento: acrescentaria na sua frota, “vans” bem equipadas (poltronas confortáveis, ar-condicionado e a promessa de que somente transportaria passageiros sentados) e passaria a concorrer em excepcionais condições com o meio “alternativo” de transporte.
No mundo, enquanto alguns enxergam o “ponto final” outros vêem o “início do próximo parágrafo”.
Muitos de nós brasileiros somos (por auto-intitulação) especialistas em futebol. Mas tantos especialistas sentados à mesa acabam por, na maioria das vezes, não chegar a um “ponto comum” sobre aspectos de uma partida.
Nos estádios, o técnico é “burro”, é gênio. Torcedores têm a solução imediata para qualquer problema que apareça no jogo. Incrível saber que mesmo essas soluções imediatas possivelmente serão tão distintas que é provável que se tenha mais de uma centena de idéias e não se tenha realmente a solução.
O fato é que mesmo os técnicos, “grandes” ou “pequenos”, desconhecidos ou famosos podem não chegar a um consenso quando o assunto é a leitura do jogo.
Como será que o técnico Vanderlei Luxemburgo viu a derrota da seleção brasileira para a seleção da França na Copa do Mundo de 2006? Como será que Luiz Felipe Scolari, José Mourinho, Parreira ou Domeneche viram o mesmo jogo. O mesmo jogo? – (certamente o “mesmo diferente jogo”) – O que teriam feito se fossem todos, naquele momento, técnicos da seleção brasileira? Como teriam tentado reverter o resultado da partida?
Certamente cada um desses treinadores mencionados e mais tantos outros mundo afora, vêem em cada jogo pedaços de si próprios. Por exemplo, Mourinho “lê” o jogo dentro de um contexto de possibilidades criadas de acordo com os conhecimentos e saberes que fora adquirindo ao longo de toda sua jornada (não somente jornada como técnico, mas jornada como pessoa – algo que ele tem consciência e que fica cada vez mais evidente em sua fala). O mesmo vale para Scolari, Parreira, Domeneche, Luxemburgo e para cada um de nós, quando ao assistirmos um jogo encontramos as respostas para as dificuldades desta ou daquela equipe.
O fato é que essa “leitura” de jogo particular remete para soluções também particulares e muito peculiares. Portanto, ainda que Parreira e Scolari enxerguem que algo está errado com as “roubadas” de bola pela esquerda da defesa de uma equipe, é possível que cada um deles faça apontamentos e tome atitudes diferentes para corrigi-las.
É nessa diferença interpretativa dos fatos que futebol, arte e ciência se confundem, ao ponto de se perder por diversas vezes a lucidez para buscar respostas que justifiquem vitórias e derrotas.
Certamente dois engenheiros podem discordar sobre a melhor forma de se construir bases sólidas para levantar um grande edifício, mas não precisarão construir dois edifícios iguais com bases diferentes para terem a certeza de qual é a melhor solução. Eles estudam, analisam, levam a Ciência para sua prática e finalmente podem tirar conclusões exatas sem que seja necessária para isso a queda de um edifício.
No futebol existem lógicas e princípios que ao serem entendidos podem elucidar a forma de se enxergar um jogo (o empirismo e os “achismos” que nele [no futebol] “imperam de maneira imperial” acabam contribuindo muito pouco para a sua evolução tática e estratégica).
E por que não vemos a busca do entendimento desses princípios e lógicas? Por que o “termômetro” de um jogo vem sendo a décadas dado pela experiência desvinculada do conhecimento?
Simples caros amigos; porque em terra de greve de ônibus, quem tem “van” é rei…
Poucas e “escondidas” são as “rodas” em que se discute dentro do futebol princípios como “apoio”, “profundidade” ou “penetração”; que experienciam cientificamente conceitos como “compactação”, “bloco”, “balanço defensivo”; que debatem por exemplo como manter a “amplitude” de uma equipe em um 4-4-2, ou o porquê é fácil tê-la no 4-3-3 ou no 3-5-2.
No futebol, mais se acha do que se compreende, mais se acredita do que se comprova.
Se pelo menos achassem o conhecimento (que pelo jeito que a coisa vai, deve estar escondido). Se pelo menos se acreditasse nos fatos ao invés dos mitos…
Não creio ser possível uma leitura uniforme dos eventos que desequilibram uma partida de futebol para esta ou aquela equipe, mas certamente é possível trazer a discussão sobre vitórias e derrotas a um nível mais apropriado, palpável, concreto, enfim científico.
Isso não significa engessar o jogo de futebol. Significa apenas uma aproximação cada vez maior da “arte do imponderável” (“pois até no caos ocorrem padrões”).
Semana que vêm começaremos a discutir quais são e o que são os princípios ofensivos, os princípios defensivos, os princípios operacionais e a lógica do jogo no futebol. Quem sabe, a gente não consegue levar a ciência para a tática e a estratégia de jogo e comece a entender a arte que se expressa no futebol.
PS – Quem sabe não começaremos a enxergar o princípio do parágrafo onde todo mundo vê o ponto final. Então, em vez de terminar com o próprio, finalizo hoje com reticências…
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A falta que uma liga faz
Dos males que assolam o futebol profissional brasileiro – e você bem sabe que são muitos – talvez nenhum possua tanta influência direta no composto total das coisas como a falta de uma liga propriamente estabelecida. Antes de eu começar a me prolongar por aqui, porém, é preciso que você, e tantos outros, entenda o que de fato é uma liga.
Lembra-se daquelas ligas regionais criadas há quase dez anos, que prometiam revolucionar o futebol brasileiro? Pois então. Esqueça delas. Apague da sua memória. Comecemos do zero.
Um clube sozinho, sem adversários, não faz nada. Joga paredão. Malha, talvez. Com um time só não existe futebol. É W.O. Para que uma partida de futebol possa existir é preciso um adversário. O futebol, portanto, não é um clube em si, mas sim o jogo resultante da disputa entre dois clubes.
Pois bem. Com dois times só, também, a coisa fica meio chata. Jogar contra o mesmo adversário repetidamente eventualmente acaba com o interesse na partida. Que diga o He-Man. Com um adversário apenas, o futebol até existe, mas fica bastante limitado.
Eis que um clube pode, portanto, procurar outros adversários para competir, despertando assim um interesse maior entre seus torcedores e seus próprios atletas. De forma desordenada, porém, as partidas acabam ficando sem propósito, cada uma acabando em si mesma. Dessa forma, cria-se um calendário para que determinadas equipes possam se enfrentar entre si de forma a conhecer qual é a melhor entre todas as concorrentes. Caracteriza-se, assim, uma liga, ou um campeonato.
No futebol moderno, a essência do interesse do torcedor e de todos os outros agregados no esporte se faz a partir da liga, e não do clube em si, tampouco em um seleto jogo. O Manchester United, em si, não representa nada. Ele possui o valor que tem por causa dos seus adversários. Se o Man Utd entrasse em campo no Old Trafford sem adversário, ninguém daria a menor bola. Bom, talvez alguns coreanos e chineses que eu conheço dessem, mas esses não batem muito bem.
O fato de o Manchester United poder jogar com times como Liverpool, Chelsea e Arsenal todo o ano oferece um valor agregado à marca que ela dificilmente encontraria em algum outro lugar. O mesmo acontece quando o clube se classifica para a Champions League e abre o leque de adversários para clubes como Barcelona, Real Madrid, Juventus, Milan, Bayern, Lyon, Benfica. Caso o Manchester passasse a jogar regularmente contra adversários do nível do Tranmere Rovers, por exemplo, é óbvio que o seu valor diminuiria consideravelmente. E que a família Glazer sentiria na pele a força daqueles que possuem cerveja em vez de sangue nas veias.
É possível afirmar, portanto, que todos os produtos do futebol são derivantes da própria liga em si. Quanto melhor a liga, melhor tende a ser a percepção dos produtos. Quanto pior, pior. Não à toa que as principais equipes dos principais esportes do mundo possuem por trás uma liga forte que a sustente. É o caso do futebol, mas principalmente dos esportes americanos, com a NFL, MLB, NBA, entre outras.
No futebol, as ligas não são novidades. A primeira de todas, a Football League inglesa, começou em 1888. Desde então, outras ligas foram surgindo ao redor do mundo com o intuito de organizar e comercializar a competição nacional.
Liga e Federação são coisas bastante diferentes. Uma federação nacional de futebol deve prezar pelo desenvolvimento do futebol em um determinado país, em seus mais diversos níveis, do amador ao profissional, da criança ao adulto, do homem e da mulher. Uma liga, porém, preocupa-se em organizar, promover e comercializar um determinado campeonato. São coisas diferentes, que precisam ser organizadas por instituições também diferentes. A idéia é outra, a filosofia é outra e os interesses são outros.
No Brasil nunca existiu uma liga propriamente dita. A CBF não é uma liga, é uma federação, e como tal preocupa-se com as coisas do parágrafo anterior. No começo, era ela a principal responsável pela organização do Campeonato Brasileiro, muito por causa da pressão do Estado na realização desse campeonato. De uns tempos pra cá, porém, a CBF tem passado a responsabilidade do campeonato para o Clube dos 13. O C13, porém, também não é um liga. O C13 ainda é uma organização fechada que reúne e preza pelo interesse de alguns determinados clubes, não do campeonato em si. Uma liga, na sua forma natural, é composta por membros temporários, que assumem ou deixam os postos de acordo com a performance esportiva. A liga preocupa-se com ela, e não com os clubes que a compõe.
Uma liga, no Brasil, poderia gerenciar melhor diversos elementos cujas responsabilidades hoje são atribuídas ou à federação ou ao governo. Uma liga poderia, por exemplo, exigir que determinados pré-requisitos fiscais fossem seguidos para que o clube fosse autorizado a participar do campeonato. Poderia, também, estipular regras claras sobre a presença e influência de empresários e grupos de investidores nos clubes. Poderia, enfim, dar pelo menos um passo inicial no controle e na solução das diversas mazelas que aos poucos vão acabando com o futebol nacional.
O Campeonato Brasileiro de futebol profissional não é da federação. Muito menos do Estado. O Campeonato Brasileiro de futebol profissional é daqueles que de fato fazem parte da tabela. Eles que se organizem para conseguir fazer o melhor possível para atrair interesse e dinheiro dos torcedores. O problema é da liga. O problema é dos clubes. Se não conseguirem se entender, que joguem paredão. Ou malha.
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Futebol e os números
Todos nós sabemos que o futebol é uma das mais significativas manifestações culturais dos nossos tempos. Como espetáculo fascina grande parte da população mundial que hoje já passa dos 6,5 bilhões de habitantes. Como prática esportiva, encontramos milhões e milhões de praticantes, entre homens e mulheres, espalhados pelo mundo todo.
Em pesquisa realizada em 2006, pela Federação Internacional de Futebol, a Fifa, instituição que organiza o futebol mundial, podemos observar números impressionantes.
Na China, por exemplo, mais de 26 milhões de pessoas praticam o futebol. A Índia, país sem tradição neste esporte, com apenas cerca de 400 jogadores profissionais, tem, contudo mais de 20 milhões de praticantes. Claro que temos que considerar que sua população já ultrapassa um bilhão de habitantes e, portanto, proporcionalmente estes 20 milhões pode não ser considerado um número tão grande assim. Mas para se ter uma idéia do que isso significa basta verificar que no Brasil, com uma população chegando próximo aos 200 milhões, temos cerca de 13 milhões de praticantes.
O Brasil, entretanto, é imbatível em número de jogadores profissionais entre os 207 países que são associados à Fifa. Possuíamos em 2006, 16,2 mil atletas profissionalizados. Bangladesh, país asiático, com população de 150 milhões de habitantes, possui mais de seis milhões de praticantes, porém nenhum jogador profissional.
Até os Estados Unidos, que parecem ser um país que não dá muita atenção a este esporte, possui a maior quantidade de mulheres futebolistas, com um número fantástico de mais de sete milhões de praticantes. Em segundo lugar vem a Alemanha com menos de dois milhões de mulheres que jogam futebol.
Os números são incríveis como podemos constatar. Não é à toa, portanto, que a Fifa, aproveitando-se da importância que este fenômeno sócio-cultural possui em escala global, vem procurando chamar a atenção para os aspectos da responsabilidade social potencialmente presentes no futebol enquanto instituição.
O significado do futebol é tão grande que a missão da Fifa, descrita em vários documentos por ela produzidos, de “desenvolver o jogo, comover o mundo e construir um futuro melhor” bem que poderia se transformar em realidade, na medida em que mais homens e mulheres de bem também participassem deste processo. O futebol seria um instrumento perfeito para isso.
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Histeria coletiva
A realização dos Jogos Pan-Americanos no Rio de Janeiro parece ter contagiado o clima da imprensa nacional. Talvez empolgados com o conhecimento de diversas “novas” modalidades, como tae kwon do, badminton e coisas do gênero, nossos jornalistas decidiram tentar praticar algumas delas.
O estresse que geralmente acompanha a cobertura de um grande evento como o Pan, somado ao fato de a competição ser no Rio, fazem do trabalho jornalístico no Rio uma espécie de bomba-relógio.
Logo no começinho do Pan, quando Diogo Silva ganhou o primeiro ouro do país no tae kwond do, a bomba estourou no meio do centro de imprensa, numa acalorada briga entre produtores de ESPN e Globo na batalha para levar o medalhista primeiro a seu estúdio.
Poucos dias depois, de novo confusão envolvendo a Globo. Essa chegou até a ser notícia, com o repórter Ivan Moré passando maus bocados por uma ríspida discussão com um cinegrafista da ISB, a parceira oficial de transmissão do Co-Rio.
A pergunta que se faz é simples: do que vale tanto estresse?
Quem assiste à Globo não necessariamente vê a ESPN. Às vezes, dependendo do canal por assinatura que a pessoa tem, nem mesmo dá para ver, por exemplo, ESPN e Sportv. Da mesma forma, a fidelidade de um telespectador é, na maioria das vezes, canina. A pessoa não costuma zapear o canal com tanta freqüência, ainda mais quando um grande evento acontece…
Sendo assim, de que adianta tanto corre-corre? E, principalmente, qual o efeito prático de uma discussão acalorada com um colega de profissão em busca de apenas cinco minutos de entrevista?
Muito mais importante, sem dúvida, é a credibilidade da informação transmitida às pessoas. É isso que confere ao veículo confiança para o público e, sem dúvida, garante fidelidade do telespectador, esteja um atleta no canal ou não.
Jornalistas ou ex-atletas?
Outro ponto que o Pan recoloca em pauta é a velha discussão de as emissoras usarem ex-atletas para atuarem como comentaristas nas transmissões esportivas. Particularmente eu defendo a prática de existir um equilíbrio na equipe de transmissão de um evento esportivo.
O jornalista, muitas vezes, busca informações que são complementares a uma transmissão. Dados curiosos e históricos sobre atletas e eventos, além de coisas que agregam detalhes interessantes a um evento esportivo.
O ex-atleta, por sua vez, tem uma visão diferente da do jornalista, principalmente pela experiência que ele teve no esporte. Só que muitas vezes o atleta se perde exatamente por não ter o comportamento de um jornalista durante um evento.
E é isso o que a gente vê no Pan. Oscar, do basquete, vai com a camisa da Globo a todos os eventos, mas se comporta como um autêntico torcedor de arquibancada de futebol, com direito até a puxão de orelha de Diego Hypólito pelo mau comportamento na ginástica.
No judô, Aurélio Miguel protagonizou um espetáculo vexatório ao discutir com membros da delegação cubana após um outro ouro polêmico de Cuba. Quase foi às vias de fato, com uniforme da Record e tudo.
Na Band, as “meninas do Rio”, como foram apelidadas as atletas-comentaristas, acabam se empolgando tanto durante a transmissão que viram muito mais uma torcedora com microfone.
O equilíbrio de uma dupla de comentaristas com jornalista e ex-atleta acaba dando o tom e deixando o telespectador mais bem informado. E, obviamente, esse deve ser o objetivo da transmissão.
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Nas teorias do treinamento desportivo, um dos princípios mais discutidos e pontuados é o da SOBRECARGA. Ele rege que para o organismo (integral) do atleta continuar se desenvolvendo e fazendo evoluir sua performance, é necessário que haja um "agente estressor" que possa gerar esse desenvolvimento.
Esse "agente estressor" no caso do atleta é o treinamento desportivo. Para conseguir o "estresse" que vai provocar uma REAÇÃO do organismo (para o seu desenvolvimento) é necessária uma carga de magnitude superior àquela que ele está "acostumado"; uma SOBRECARGA.
Pois bem. Uma questão que tem intrigado e rondado a cabeça de cientistas do desporto, treinadores e amantes do futebol é a que diz respeito à importância do "Coletivo" nos treinamentos de uma equipe de futebol.
Quando pensamos em "Coletivo" imaginamos um jogo (reservas e titulares, titulares e equipe B, etc. e tal) próximo ao jogo competitivo formal, com o objetivo de preparar ou observar uma equipe para uma partida oficial de campeonato. O fato, é que temos hoje treinadores em evidência na mídia defendendo o menor número possível de coletivos; priorizando jogos reduzidos e treinamentos técnico-táticos.
Na "contramão" temos José Mourinho (vitorioso técnico do Chelsea) e um grupo crescente de Estudiosos e Cientistas do Desporto que defendem a idéia de que se deve treinar o jogo, jogando (só se consegue andar de bicicleta melhor, andando de bicicleta; só se aprende a dançar melhor, dançando; só se consegue jogar melhor, jogando).
Nessa perspectiva, não a nada mais real para criar situações que se assemelhem ao jogo do que o tal "Coletivo".
Mas e o treino técnico-tático ou os jogos reduzidos?
Temos aí um problema a se resolver. Um corredor treina corridas para melhorar sua performance. Não corre, porém sempre na mesma velocidade, na mesma distância. Corre em velocidades próximas aquelas de sua competição, às vezes menores, às vezes maiores; o que é verdadeiro (ou deveria ser) também para as distâncias percorridas. Em outras palavras ele tem no seu treinamento uma alteração de cargas que exigem do seu organismo (integral) respostas que permitem seu desenvolvimento (SOBRECARGA).
Talvez seja fácil pensar em sobrecarga imaginando adaptações físicas. Mas como imaginarmos uma sobrecarga técnico-tática, ou melhor, uma sobrecarga "técnico-tática-fisico-mental"? Como abstrairmos a idéia de um "agente estressor" que provoque respostas integrais e integradas no jogador de futebol, que o permita se desenvolver, aumentando sua performance de jogo?
Certamente nos jogos em campo reduzido o volume de passes, finalizações, desarmes, coberturas, marcações duplas (e as mais diversas e inusitadas situações-problema de jogo) ocorrem em maior escala. Em outras palavras, no campo reduzido a sobrecarga parece maior. Ao se manipular as regras do jogo nesses treinamentos, é possível ainda priorizar esse ou aquele princípio do jogo, amplificando ainda mais a sobrecarga para determinada variável.
Ocorre, porém, que ao mesmo tempo em que se exige mais de determinadas variáveis, corre-se o risco de "desprestigiar" outras. Por isso, a condução de um treinamento com prevalência de um objetivo tático precisa ter regras bem ajustadas, para que ao se buscar de forma específica a sobrecarga do jogo não ocorra um indesejável distanciamento do próprio jogo.
Por outro lado, os coletivos são "exercícios" que se aproximam do jogo e que podem trazer situações-problema altamente especializadas. Talvez a carga do coletivo não seja a SOBRECARGA desejada para o desenvolvimento integral do atleta em sua preparação para o jogo, mas é inegável que ele exige o que mais próximo de um jogo um exercício pode exigir.
No entanto, mesmo o coletivo por si só pode não representar as exigências que proporcionem o desenvolvimento da equipe. Se uma equipe joga no 4-4-2 em linha e no coletivo enfrenta invariavelmente um 4-4-2 em losango, estará ela exercitando situações-problema restritas às possibilidades desse confronto. Então, mesmo no coletivo, deve-se buscar um maior número de situações que permitam a equipe uma melhor compreensão sobre o jogo.
Certamente, se fossem os coletivos a solução para a preparação de uma equipe, talvez melhor fosse buscar algo mais específico ainda: ao invés de treinar para o jogo através do coletivo, dever-se-ia treinar para o jogo jogando sempre formalmente de forma competitiva (por exemplo participando de competições paralelas de menor expressão ou fazendo amistosos contra equipes de nível).
Então, a melhor solução é quebrarmos paradigmas (como tem feito o português José Mourinho). Os jogos em campo reduzido, os jogos adaptados, os treinamentos de ataque contra defesa ou os "Coletivos" devem ser etapas de um processo que se completa jogando o jogo. O coletivo não deve ser entendido como um jogo sem pretensões de melhora tática. É óbvio, mas ainda se alardeia que treino tático é uma coisa, treino técnico é outra e coletivo… (Então um coletivo onde há uma regra que diz que a equipe de posse da bola, ao ultrapassar a linha do meio-campo, tenha 4 segundos para ter todos os jogadores (exceto o goleiro) posicionados dessa linha para frente, deixa de ser coletivo porque tem uma regra que taticamente "exige" rápida compactação?).
Da mesma forma, um jogo usando metade do campo, trabalhando ataque contra defesa deixa de ser jogo "coletivo" porque é chamado de treino tático?
Certa vez um técnico do Corinthians viu seu time sofrer um gol do Santos logo após ter um de seus jogadores expulsos. Após o jogo disse que sua equipe sofrera o gol porque não houve tempo hábil para orientá-la para aquela situação (de um jogador a menos em dada posição). Qual a relação disso com o texto acima? Certamente os jogadores, condicionados à tutela do comando técnico, não foram capazes de, naquela situação-problema, resolver, a partir de rá
;pida leitura do jogo, àquela nova exigência tática.
Então vos pergunto, caros amigos: o que faltou para o rápido re-arranjo tático da equipe? Mais "coletivos" ou mais "treinamentos táticos"?
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O exemplo de Congonhas e o futebol
O Brasil, sabe-se, é um país extremamente frágil em diversos sentidos. O terrível acidente no aeroporto de Congonhas é mais um reflexo desse fato, tantas vezes manifestado por essas bandas.
Dessa vez, calhou de ser com um avião, objeto de destaque e que desperta imenso interesse na população. Daí, talvez, a repercussão. O fenômeno, porém, é corriqueiro. A fragilidade do país se expressa diariamente, tantas e tantas vezes, nos mais diversos setores. Na aviação, alguns acidentes. Nas rodovias, muitos outros. Na política, a omissão dos líderes e os interesses escusos. Nos hospitais, a inoperância do sistema. E assim vai, seja por onde for.
Isso é muito conseqüência do crescimento desordenado do país, influenciado por anos de políticas populistas e desatreladas de um plano racional e ponderado. Deu no que deu. O país cresceu, a economia evoluiu, as pessoas começaram a ter o direito e o poder de fazer o que der na telha, e a estrutura sucumbiu. A tragédia de Congonhas, assim como outras tragédias cotidianas, era anunciada. Estava claro que, em algum momento, alguma coisa ruim iria acontecer. Por fim, aconteceu. Mais uma vez.
Esse sistema de funcionamento e de tratamento irresponsável e inseguro está presente na própria alma do país. Assim, dessa forma, o futebol não fica fora.
É óbvio que vai acontecer alguma coisa muito ruim no futebol brasileiro. A irresponsabilidade é visível e o descaso é evidente. Até que alguma coisa aconteça.
Pode ser nas brigas entre torcidas organizadas, que possuem elementos básicos de conflitos que fazem do futebol apenas uma simples desculpa para a expressão da irracionalidade bélica presente em determinados setores da sociedade. Em vez de torcida de futebol, poderia ser partido político ou milícias separatistas. Tanto faz. O que importa, em si, é o conflito e a vitória, independentemente do custo. Prato cheio para uma tragédia que acontece regularmente com pequena força, mas que pode eventualmente tomar maiores proporções. Todo mundo sabe disso, mas o descaso impera.
Assim como também impera no tratamento dos estádios do país, palcos prontos para desastres.
Quando a tragédia de Hillsborough assolou a Inglaterra, produzindo 96 mortos em 1989, o governo resolveu dar um ponto final no histórico de acidentes produzidos pelo futebol no Reino Unido desde o começo do século XX. Para isso, encomendou um minucioso estudo a respeito das causas para tantas mortes dentro dos estádios. Chegou-se à conclusão que a principal causa era o esmagamento das pessoas dentro das arquibancadas, apertadas pelos movimentos da massa contra a grade. Por isso, proibiram cercas e alambrados ao redor do gramado e obrigaram todos a se sentar em um banco identificado. Com torcedores sentados e individualizados, os movimentos de massa responsáveis pela pressão do esmagamento deixariam de acontecer. Sem alambrados, cercas e fossos, a pressão oposta ao movimento da massa também não mais existiria, acabando com a lógica física do esmagamento. Passaram à lei e, desde então, ninguém mais morreu por isso.
No Brasil, os estádios são velhos, sem escoamento, com fossos e pessimamente estruturados. É um cenário perfeito para desastres. Alguns pequenos já aconteceram, mas nunca produziram um número considerável de mortes para chocar a sociedade. A queda no Maracanã, o desabamento em Taubaté e o acidente em São Januário foram fortes, mas não publicamente impactantes, o que é um absurdo. Por isso, ninguém fez nada, e ninguém vai fazer nada. Portanto, até agora nada justifica uma ação mais efetiva contra a probabilidade de esmagamento ou de outros acidentes dentro dos estádios. Porém, é óbvio que a tragédia está anunciada. E uma hora ela pode acontecer.
Muito se reclama do vazio dos estádios brasileiros. É preciso, porém, agradecer ao fato de que a média de público pouco passa de 10 mil e que a taxa de ocupação está próxima de um terço. Quanto menos gente dentro, menor a probabilidade de alguma tragédia acontecer, principalmente por esmagamento. Do jeito que as coisas estão, é preciso temer pelo dia que a taxa de ocupação dos estádios brasileiros passe dos 70%. Aumentam ainda mais as possibilidades dos desastres. E se os detentores do poder decisório não se preocupam em tomar pedidas preventivas, faça você então a sua parte.
Pela segurança da vida dos torcedores de futebol, não vá ao estádio.
Para interagir com o autor: oliver@universidadedofutebol.com.br