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O jogador de futebol mercadorizado

Crédito imagem: Reprodução/Palmeiras

Finalizamos nosso último texto, sobre o futebol como negócio, levantando a bola para compreendermos o papel atribuído aos jogadores, e por vezes assumido por eles, de mercadorias, produtos, coisas. No momento atual do futebol brasileiro de abertura da “janela de transferências”, essa questão se torna mais evidente. Apesar de evidente, não está explícita e é pouco problematizada no contexto do futebol profissional. Por outro lado, recentemente, um atleta do Palmeiras, ao ser questionado se poderia jogar no rival, fez a seguinte declaração: “Sou uma mercadoria. Não sei o dia de amanhã.”

Há muitos anos, autores da Educação Física e das Ciências Humanas se dedicam à discussão do processo de coisificação do sujeito e, consequentemente, do atleta de futebol, o que o transforma numa máquina, numa coisa, num produto e mercadoria. Arlei Damo e José Florenzano são referências conhecidas por nós. Mas a psicóloga social Ana Quiroga e, principalmente, o precursor do termo, Perdigão Malheiro, já problematizavam, há décadas, sobre essa questão. Não se trata, evidentemente, de um fenômeno exclusivo do esporte. O tipo de sociedade que vivemos busca transformar todos nós em consumidores, clientes e em mercadorias. Vende-se, de ar a sonhos, nada escapa à ganância do lucro desenfreado. Porém, trata-se, neste ensaio, de colocar o fenômeno da mercadorização apenas no futebol.

No entanto, ainda que este termo tenha sido cunhado há anos e questionado e discutido desde então, ainda é muito comum a mídia esportiva, dirigentes, torcedores e até mesmo os próprios jogadores atribuírem aos atletas do futebol profissional a qualificação de mercadoria. Quantas vezes não se ouviu dizer, “fulano foi comprado”, “ciclano foi vendido”, “precisamos só trocar umas peças”, “tal jogador pertence e tal clube”, “quando não render mais, a gente vende ou descarta” etc. Tais falas explicitam o processo de transformar pessoas, seres humanos, em coisas. Afinal, como nos diz Florenzano, o futebol moderno está impregnado pelo discurso que associa o jogador a uma máquina, como uma peça de engrenagem, e que pode ser tranquilamente reposta/substituída quando vendida ou inutilizada.

Nenhuma outra expressão soa tão agressiva e impactante quanto “plantel”, expressão designada atualmente para nomear um grupo de profissionais, os jogadores principalmente, de um clube esportivo. Tal expressão remete aos tempos feudais para denominar um “conjunto de escravos de um senhor, uma província, uma região, um país” (GEIGER, 2016). Obviamente, não estamos querendo comparar jogadores de futebol aos escravos, mas ressalvadas suas particularidades, levantar similaridades quanto à negação de seus direitos, sentimentos e subjetividade.

O Brasil é farto na produção de talentos para o futebol. Afinal, foi nosso povo mais vitimado, mais marginalizado, que reinventou o futebol, transformando o jogo que nos chegou dos ingleses em uma espécie de brincadeira de bola, onde a beleza e a sutiliza do gesto, a diversão, a alegria, a criatividade, despontavam soberanas. Não se passa um ano sem que surja um menino ou menina de quem digam que será craque, embora ainda jovem, quase criança. Quando isso ocorre, acompanhamos com ansiedade seu desenvolvimento, mas não sem apreensão. Por vezes nos perguntamos quanto tempo se passará até que os mercadores do futebol o destruam.

O caso mais recente é o do menino Endrick, jovem talento das categorias de base do Palmeiras, quinze anos de idade, pouco mais que uma criança. Notamos a cautela no trato com esse menino por parte do técnico da equipe palmeirense que disputa a Copa São Paulo, versão 2022, deixando-o no banco para participar somente da segunda etapa (até quando ele conseguirá manter essa cautela?). O menino é um artista da bola e o demonstra isso fartamente quando entra em campo. Porém, confrontando a cautela do técnico de Endrick, vemos os vídeos de suas melhores jogadas exibidos à exaustão na mídia, lemos os comentários feitos por alguns profissionais da imprensa, que fortalecem a ganância dos mercadores; notamos a ansiedade de dirigentes pelo que representa Endrick como mercadoria, valores absurdos em dólares e euros são colados à imagem do menino. Clubes e imprensa da Europa falam do jogador palmeirense, monitorando-o para uma possível negociação. Quanto tempo dura a estrutura psíquica de um menino submetido a tal pressão? Que medidas cautelares contra essa mercadorização, além de seu técnico, o protegerão? Família? Amigos? Dirigentes? Endrick é só um menino. Ele poderá viver sua vida de menino? Endrick é criativo. Ele poderá seguir sendo criativo? Para Endrick, o futebol ainda é uma brincadeira de bola. Ele poderá seguir brincando de bola? Por quanto tempo? Endrick tem vestígios de artista. Ele poderá se tornar um artista da bola?

Todos os anos surgem “Endricks”, “Neymares”, “Zicos”, “Maradonas”, em todo o mundo. Quantos, depois de tornados mercadorias, sobrevivem à arrasadora sanha dos mercadores do futebol? Inevitavelmente caem nas garras desses mercadores, que olham para pessoas e só veem cifras, lucros, negócios. Todos somos cifras, lucros, negócios para os mercadores, mas jogadores de futebol são tudo isso potencializados. Nesse mundo balizado pelo modo de produção capitalista, poucas mercadorias produzem lucros tão astronômicos quanto jogadores de futebol

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Times campeões não precisam ter os melhores jogadores

Crédito imagem: Gilvan de Souza/Divulgação

Período sem jogos não quer dizer período sem futebol. Sobretudo com a euforia causada por simples especulações: saídas e principalmente chegadas de jogadores são comemoradas muitas vezes como um título! Mas qual a real eficácia de um reforço bombástico? A empolgação do torcedor deve ser parâmetro para o dirigente fechar ou não um negócio? Admitindo que toda contratação é um risco, como minimizá-lo através de uma análise prévia bem estruturada? Perguntas complexas para algo ainda mais complexo e subjetivo que é o futebol…

Primeiramente quero deixar bem claro que para mim o mais importante no futebol é o binômio: jogador-torcedor. É a qualidade do jogador que faz do futebol um espetáculo. É a paixão do torcedor que alimenta a indústria e faz a roda girar. Porém isso não quer dizer que uma equipe de sucesso, que conquiste títulos, seja calcada apenas na qualidade individual dos seus jogadores e no sentimento desmedido de quem está na arquibancada.

Não são poucos os casos de equipes recheadas de craques que nada ganharam. Ou então aquele time que no começo da temporada realizou duas ou até três contratações de impacto, criou uma expectativa gigantesca no torcedor, mas quando a bola rolou não houve o chamado encaixe. Apesar de sabermos que o futebol é coletivo-onze em campo e muitos outros profissionais nos mais diferentes departamentos- temos a tendência de individualizar o jogo. Pela nossa cultura. Pela nossa história. Pelos nossos inúmeros craques do passado e do presente. Fecho todo esse raciocínio com dois exemplos do futebol paulista: na última grande conquista do Corinthians, o Brasileirão de 2017, o time foi taxado como a quarta força ao ser confrontado “no papel (!)” com seus maiores rivais. A mais recente glória do Palmeiras, a Libertadores 2021, foi obtida mesmo com o clube tendo menos jogadores “decisivos (!)” do que os concorrentes Atlético-MG e Flamengo. Citações práticas de que no caos e na complexidade do futebol o todo, de fato, é maior do que a soma das partes.

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A temporada já começou!

Crédito Imagem: Reprodução/EC Bahia

Pré-temporada mesmo curta, não deixa de ser pré-temporada. E como tudo evolui, já não vemos, pelo menos nos grandes clubes brasileiros, aquelas longas sessões físicas, que só desgastam o jogador, sobretudo no aspecto emocional, e que pouca relação tem com o jogo em si. 

E junto com esses já iniciais trabalhos com bola, talvez no terceiro, quem sabe até no segundo dia de treinos, vêm as ideias do treinador. Todo profissional tem suas preferências conceituais. Simplificando o conceito de Modelo de Jogo, movimentos preferenciais de como se comportar na defesa, no ataque e nas transições. Exemplo: ao perder a bola, qual comportamento será padrão dos jogadores: buscar retomá-la rapidamente ou retroceder de maneira compacta para proteger o próprio alvo?

Mas se todo bom técnico tem suas ideias, os excelentes tem flexibilidade para adaptá-las ao contexto e principalmente aos jogadores que estão a disposição. Recorro ao mesmo exemplo da transição defensiva: um treinador pode gostar de executar uma ‘contra-pressão’ (gegenpressing), mas se no elenco que ele tem não há jogadores rápidos, com boa leitura de ocupação de espaços, capazes de assim que a posse for perdida pressionar rapidamente o adversário portador da bola e fechar as linhas de passe mais próximas, pode ser mais vantajoso contemporizar e voltar para marcar atrás da linha de bola.

Essa flexibilidade e esse entendimento são fundamentais para o treinador que está chegando e também para aquele que continua no mesmo clube. Por exemplo, não é só o português Paulo Sousa que precisará esmiuçar o seu elenco no Flamengo, entendendo as características individuais de cada jogador e ver como as conexões entre eles cria coisas novas e antes inimagináveis, como o próprio Abel Ferreira, mesmo permanecendo no Palmeiras, terá jogadores diferentes e sobretudo um contexto diferente, já que agora ele é o bicampeão da Libertadores e isso afeta tanto o ambiente interno como o externo.

A graça do futebol ainda está na imprevisibilidade. Amo números e defendo com unhas e dentes a integração deles a tudo o que acontece dentro das quatro linhas. Entretanto, a habilidade humana de potencializar o todo utilizando da melhor maneira cada uma das partes sempre será insuperável.

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SAF e a cultura organizacional dos clubes de futebol brasileiros

Crédito imagem: Reprodução/Sérgio Santos Rodrigues/Instagram

Pouco tempo após a sua criação e aprovação constitucional, o torcedor brasileiro já começa a incorporar em seu vocabulário a sigla SAF – Sociedade Anônima de Futebol. Muitos clubes brasileiros já iniciaram os trâmites legais e organizacionais para deixarem o formato associativo e adotar o novo formato empresarial. Na modalidade SAF, clubes de futebol podem ser “vendidos” total ou parcialmente para um ou mais investidores e, com os recursos financeiros acertados no negócio, esperam ter suas dívidas quitadas e aportar maiores investimentos em infraestrutura e contratação de atletas qualificados. Nesse mundo ideal, muitos torcedores e dirigentes já esperam ansiosos para comemorar os próximos títulos dos principais campeonatos e copas nacionais e internacionais.

Porém, é necessário lembrar que o Campeonato Brasileiro da série A, por exemplo, vai continuar apenas com uma vaga para campeão e outras quatro vagas para o descenso à série B. Sendo assim, teremos muitos clubes em que a adoção da SAF não trará nenhuma possibilidade de títulos relevantes, mas ao menos os possibilitará competir em certo pé de igualdade e, quem sabe, manter-se na divisão principal. Em um paralelo com a empregabilidade, às vezes precisamos fazer um curso de idioma e uma pós-graduação, não para conseguir um melhor salário, mas apenas para mantermos nossos trabalhos.

Os clubes bem estruturados e com torcidas gigantes talvez não adotem o modelo SAF, pois já conseguem realizar relevantes aportes de investimento pelo modelo associativo. Mas, tudo leva a crer que os clubes médios e pequenos que não adotarem o novo modelo ficarão para trás, pois terão muitas dificuldades em captar recursos financeiros de patrocinadores, os quais tenderão a buscar modelos de negócio mais confiáveis.

É importante enfatizar que os clubes que já adotaram ou adotarão o modelo SAF estão em diferentes patamares organizacionais e patrimoniais. Para um investidor essa informação é relevante, pois clubes estruturados oferecem menor risco no negócio, o que possibilita investir maiores valores e prever lucros com maior precisão. Já os clubes menos estruturados e endividados tendem a aceitar negociações desvantajosas, pois nenhum investidor experiente irá apostar suas fichas em um negócio de alto risco. Portanto, clubes que se prepararam melhor para esse novo modelo terão mais chance de prosperar e, quem sabe, romper a bolha dos seletos clubes campeões das grandes competições.

Porém, existe um componente fundamental para análise e que somente por meio dela, um clube se organiza e se estrutura de maneira eficaz: a cultura organizacional. Assim, também chegamos ao ponto de reflexão principal deste texto: uma empresa bem-sucedida não suportaria certos tipos de cultura institucional presentes em muitos clubes de futebol brasileiros.

As empresas são e continuarão a ser locais de convivência entre pessoas das mais variadas características culturais e comportamentais, mas, todas elas devem estar em sintonia para que os objetivos corporativos sejam alcançados. Em nosso país, é relativamente comum presenciarmos clubes com elencos de atletas altamente qualificados realizarem campanhas medíocres, muitas vezes culminando com o rebaixamento à série B e aos consequentes prejuízos financeiros milionários. Mesmo sendo um esporte, a certo grau de previsibilidade é algo fundamental em qualquer negócio.

Toda empresa de sucesso possui procedimentos operacionais muito claros, além de protocolos diversos que orientam seus colaboradores a agirem em diferentes situações. Com isso, a empresa vai construindo um “memorial de ações”, representado pelos manuais técnicos e de conduta, que servem como balizadores do trabalho diário. Quando situações inusitadas ocorrem, rapidamente essas passam a constar nestes manuais. Tudo isso contribui para o engajamento dos colaboradores e para o desenvolvimento de uma cultura institucional viva e eficiente.

Agindo dessa forma, independente da saída ou entrada de novos colaboradores, a empresa mantém um funcionamento coeso com a sua história e com os seus valores, o que gera credibilidade perante seus consumidores, fornecedores, parceiros e à sociedade como um todo. Lamentavelmente, muitos clubes de futebol possuem um funcionamento caótico nesse sentido. Apesar de avanços ocorridos nas últimas décadas, com a profissionalização de diversos setores dos clubes, ainda existe muita interferência política e amadorismo na captação e contratação de colaboradores para certas funções.

Outros clubes já estão bastante profissionalizados em todas as suas áreas, mas devido à pressão por resultados rápidos, promovem mudanças constantes no quadro de atletas e de profissionais das comissões técnicas, o que contribui para o desenvolvimento de uma cultura organizacional fraca e volátil, incapaz de estabelecer uma relação harmoniosa com a missão, objetivos e valores contidos no planejamento estratégico do clube.

Assim como certos elementos da cultura existentes em nossa sociedade são passados através das gerações e formam o que podemos chamar de uma “identidade nacional”, a cultura de uma empresa é mantida e fortalecida pelas ações dos colaboradores mais antigos, as quais são ensinadas e transmitidas aos recém-contratados. Um clube com mudanças frequentes no quadro de colaboradores terá dificuldade para desenvolver uma cultura organizacional reconhecível e confiável. Como resultado desse cenário, existe a possibilidade de cada indivíduo assumir um comportamento que mais lhe beneficia. Em outras palavras, os egos se sobressaem perante o sentido coletivo e o caos acaba reinando na instituição.

O fato é que os clubes que irão adotar o modelo SAF precisam estar atentos às necessidades técnicas, culturais e econômicas contemporâneas, reavaliando suas estruturas de trabalho com vistas ao desenvolvimento de uma cultura organizacional que forneça o suporte necessário a todo trabalho nele desenvolvido. Somente na direção de um pensamento sistêmico é possível criar um elemento integrador entre todas as áreas e colaboradores do clube: do marketing à comissão técnica, do presidente ao massagista. Dessa forma, o clube passa a ser reconhecido como uma instituição comprometida com o esporte e com a sociedade, gerando a confiança dos sócios, torcedores, imprensa e deles: os investidores.

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Perspectivas de 2022 para o futebol brasileiro

Crédito imagem: Vitor Silva/Botafogo

Fazer projeções em algo tão subjetivo, aleatório e caótico como o futebol pode ser uma das missões mais ingratas e com maiores probabilidades de erro do mundo! Porém, ao mesmo tempo, é condição obrigatória para quem se propõe a analisar o esporte mais praticado no planeta buscar justamente os elementos mais concretos que aumentem as tais probabilidades de êxito. 

No futebol brasileiro é muito claro que, mais do que nunca, terão sucesso os clubes mais estáveis política e financeiramente. Tanto que em um primeiro momento o que chama a atenção quando um clube “vira” empresa é o montante de dinheiro injetado. Contudo o mais fundamental, e que norteará um caminho longevo de conquistas, é a estabilidade e o profissionalismo que esse dinheiro com o nome e sobrenome do dono-investidor exige. Uma breve recapitulada em quem vem conquistando algo relevante no Brasil já aponta como rota o profissionalismo na gestão da política interna com a boa administração financeira, em buscar mais receitas e gastar não mais do que é possível.

Dentro das quatro linhas, com a figura destacada dos treinadores, pontuo qualidades como flexibilidade, resiliência e comunicação para uma comissão técnica ter mais chances de triunfar. Flexibilidade para se adaptar ao contexto, ao cenário e, sobretudo, às características dos jogadores a disposição para a partir deles dar vida a ideias e conceitos de jogo. Resiliência para não se abalar em momentos de instabilidade (e eles com certeza existirão) já que o futebol brasileiro, e todos os seus agentes, é pródigo em moer, triturar e dispensar profissionais na primeira intempérie que acontece. E, por fim, a comunicação que é fundamental para amenizar essas críticas, que são externas, mas também internas: treinadores que são hábeis em gerir bem o que transparece dos seus trabalhos conseguem um prazo maior para mostrar o que realmente importa que é a própria competência do trabalho. Sem uma comunicação assertiva nem o profissional mais qualificado consegue ser bem-sucedido no instável futebol brasileiro.

Não há receita em algo tão subjetivo como o futebol e a verdade de hoje se torna falsa amanhã. Posso fazer a projeção do ano que for, mas no longo prazo estou certo de que o que fará a diferença, como é em toda área da vida, é a preocupação individual com a melhoria contínua, a excelência no dia a dia, e uma mente blindada para continuar perseverando mesmo quando o mundo toda duvida de você. Um feliz ano a todos nós!

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Reportagens

A etnografia de uma crise em um clube esportivo

Crédito imagem: James Thorp/Twitter

Imagine ser um pesquisador na década de 1910 que decide fazer um estudo sobre a cultura de uma civilização isolada numa longínqua ilha no meio do Oceano Pacífico. A ideia inicial era passar algumas semanas por lá, mas acaba estourando a Primeira Guerra Mundial. Como não é nada seguro tentar retornar, você acaba ficando por três anos convivendo entre pessoas com um idioma, hábitos e crenças totalmente desconhecidos. Essa história daria um bom roteiro de filme, não é mesmo? Mas, esse relato é verídico e foi protagonizado pelo antropólogo polonês Bronislaw Malinowski, que, nessa circunstância, acabou desenvolvendo um método de pesquisa inovador e importantíssimo até os dias atuais: a etnografia. Podemos defini-la como uma intensiva coleta de dados em uma pesquisa por meio do contato intersubjetivo entre o pesquisador e seu objeto de pesquisa, que é um determinado grupo social. Nessa perspectiva, uma aldeia indígena, um grupo de punks, economistas portando trajes caros na Faria Lima ou um clube de futebol são exemplos de grupos sociais.

Os clubes de esportes coletivos como o futebol, vôlei e basquete são instituições bastante interessantes para analisarmos cientificamente sob o olhar etnográfico, principalmente em certos momentos que, mais cedo ou mais tarde, irão ocorrer: as crises.

Devido à extrema competividade intrínseca ao esporte, esses grupos tendem a ser bastante conflituosos, pois tanto os atletas quanto os profissionais das comissões técnicas e demais setores costumam ser muito pressionados por resultados. Além disso, a grande diversidade de idades, graus de instrução, interesses pessoais e costumes oriundos das diferentes regiões do Brasil e, até mesmo do exterior, podem tornar a comunicação e a compreensão mútua bastante prejudicada.

Portanto, um clube de esporte coletivo costuma ser um grande caldeirão com muitos ingredientes, no qual é possível que o produto seja um prato incrivelmente delicioso ou algo bastante desastroso ao paladar. Tudo vai depender da qualidade dos ingredientes, da moderação do fogo, da experiência e do “feeling” do cozinheiro. Mas, saindo da metáfora, quem é o profissional equivalente ao cozinheiro no esporte coletivo? Essa é uma pergunta de difícil resposta, porém, imagina-se que seja o técnico. Acontece que o técnico é um profissional sobrecarregado, pois seu foco está no desenvolvimento técnico e tático do seu time e, quase sempre é impossível monitorar as interações humanas que ali se sucedem e que costumam ser invisíveis aos olhos. Outros profissionais das comissões técnicas também possuem focos específicos e, como diz o ditado: “cachorro com mais de um dono morre de fome”.

Mesmo para os psicólogos dos clubes, essa área costuma ser de difícil acesso, pois como afirma o Doutor em Alto Rendimento Esportivo Miguel Ángel Fernández Macias “Equipe é algo diferente de seus jogadores, que deixam de ser partes isoladas para se assumirem numa totalidade com os demais e adquirem uma nova expressão.” Assim sendo, defendemos que a Antropologia se torne um ramo científico presente nos clubes esportivos, pois esses podem oferecer os melhores projetos, condições de trabalho, salários e estrutura física, porém, nada disso será o suficiente se o conflito permear os relacionamentos.

A qualidade das interações humanas costuma explicar a ascensão e a queda de casamentos, amizades, empresas e, até mesmo, civilizações inteiras: portanto, clubes esportivos não fogem a essa regra. Nesse cenário, investimentos financeiros vultuosos em estrutura de trabalho e contratação de atletas e outros profissionais podem ser desperdiçados pelo simples fato de a gestão humana não ser devidamente tratada. Nesse aspecto, a análise etnográfica pode ser um grande diferencial, pois ela não parte de fórmulas prontas e sim de estudos precisos e customizados à realidade do clube. Podemos afirmar até mesmo que a partir da etnografia é possível prever e se adiantar às crises, com o intuito de evitá-las. Como isso é possível? Pergunte a um antropólogo esportivo!

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Entrevistas

Conoce la Escuela de Fútbol del F.C. Villanueva del Pardillo – Madrid: entrevista con el Director Técnico Miguel G. Zárate

Crédito Imágenes: Archivo João Paulo Medina

En el último trimestre de 2021 la “Universidade do Futebol” tuvo la oportunidad de visitar en España el F.C. Villanueva del Pardillo, en el municipio perteneciente a la Comunidad Autónoma de Madrid. En ésta ocasión, João Paulo S. Medina, fundador de la Universidade do Futebol, ha visitado el Club, conociendo sus instalaciones y el funcionamiento de su Escuela de Fútbol. Fue recibido por su Director Técnico, Miguel Garcia Zárate que presentó algunos aspectos relevantes de su proyecto pedagógico, sintetizados en la entrevista que sigue a continuación.

Prof. Miguel G. Zárate durante entrenamiento en la
Escuela de Fútbol do FC Villanueva del Pardillo

Observação: Existe uma versão desta matéria em português para os leitores brasileiros ou que falem o idioma (clique aqui para acessar).

Entrevista

1. Cuéntanos un poco sobre la história de F.C. Villanueva del Pardillo y su importancia para el desarrollo del fútbol para los jóvenes en este ayuntamiento.

Esta temporada el club celebra su 30 cumpleaños, sin lugar a dudas es el club referente del pueblo y así se demuestra año con una increíble demanda de chicos y chicas que cada vez más, quieren venir a jugar a nuestro club, sobre su historia tengo que destacar el nombre de Juan Manuel Angelina, un aficionado que falleció durante la cuarentena y que dejó un vacío enorme, en su honor este año han cambiado el nombre del estadio.

Clase de fútbol para niños entre 08 y 10 años
2. ¿Cuántos alumnos tiene la escuela de fútbol y cuántas categorías hay?

Actualmente contamos con un más de 300 jugadores inscritos, teniendo la posibilidad de tener más de un equipo en cada categoría. Tenemos desde la generación de 2015-2014 (Prebenjamines) hasta 2005-2003 (Juveniles) haciendo un total de 16 equipos de escuela y 4 equipos aficionados, entre ellos 1 equipo femenino, el primero de la historia del club.

3. ¿Cuál es la estructura de la escuela de fútbol? ¿Cuántos empleados hay?

Ahora mismo nos encontramos dentro de un proceso de crecimiento en el que intentamos profesionalizar los departamentos ya existentes.  Por un lado se encuentra la Junta Directiva con Yolanda González que actúa como Presidenta del club y por otro lado dentro de la Dirección deportiva dividimos el trabajo por un lado los equipos Senior o Aficionados y por otro lado los equipos de la escuela que ya he citado anteriormente.

El equipo deportivo esta formado por un director deportivo, Antonio Carcaño y un director de escuela, Miguel Garcia Zárate con un ayudante en la coordinación, Pablo del Pino. Nuestro principal objetivo es dotar a los entrenadores de los mejores medios para poder hacer su trabajo formativo con los jugadores lo mejor posible. Además podemos contar con un departamento de Fisioterapia y Readaptación, con un departamento de captación y con un departamento de porteros.

4. ¿Y profesores? ¿Cuántos hay? ¿Qué clase de capacitación necesitan para trabajar con niños o niñas?

En nuestros equipos de escuela hay un total de 25 entrenadores contando con entrenadores auxiliares, que ayudan a los jugadores a mejorar y a disfrutar día a día. En España la titulación mínima que piden para poder entrenar a cualquier equipo es el Nivel 1 de Técnico superior Deportivo (Títulos Académicos) siendo el Nivel 3 el máximo o indistintamente el UEFA C (Titulo Federativos) que equivale al Nivel 1 siendo el UEFA PRO el nivel máximo.

5. ¿Qué tipo de metodología utilizan para desarrollo de las clases o entrenamientos? ¿Hay un cuaderno de principios?

La metodología de trabajo por el contexto que nos encontramos en el club, es muy difícil seguir una misma línea de trabajo en todos los equipos ya que nuestra realidad es que tenemos equipos compitiendo en máximas categorías que por tanto demandan un nivel de complejidad alto en sus entrenamientos diarios y equipos que se encuentran compitiendo en categorías más bajas y que esa complejidad tiene que ir en progresión y adaptada al nivel del equipo. Por ello el seguir una metodología de trabajo común es muy complicada, por ello los entrenadores son los encargados de transmitir a sus equipos un modelo de juego adaptado. Paralelamente damos mucha importancia a que los entrenadores no centren su trabajo en los resultados, todo lo contrario, entendemos que cuanto mayor es la formación individual y colectiva, además de una buena enseñanza en valores, obtener los resultados es algo que vendrá acompañado en un futuro. Tenemos un cuaderno de principios y unas fichas de entrenamiento que sobre todo las utilizamos en las categorías más bajas, donde los más pequeños tienen que aprender a jugar al fútbol desde 0 y para ello nos apoyamos en un cuaderno de trabajo con los principios de juego más básicos para que la progresión sea la mejor posible, siempre apoyándonos en los juegos y en el disfrute de todos los jugadores.

6. ¿Cómo se gestiona en general el gran interés competitivo (de los niños y de los padres) con la necesidad de que los chavales simplemente disfruten del placer de jugar? ¿Es esto tratado de manera distinta con el pasar de los años? ¿O sea, cuál es la filosofía en este tema?

Te diría que es de los temas mas difícil de gestionar, tenemos que aprender a convivir con la derrota, en el fútbol se pierde muchas más veces de las que se gana y por ello es muy importante enseñar a los jóvenes jugadores a canalizar el interés competitivo, despertando en ellos el gusto por el juego por aprender y conocer más sobre el deporte que practican. Esto solo se puede conseguir con buenos formadores, que no entrenadores. El entrenador de fútbol base tiene que ser antes un buen formador y despertar en los chicos ese disfrute por el juego y ganas de aprender antes que de ganar. Por lo tanto cuanto mas pequeños son, más intentamos desviar el trabajo competitivo y centrarnos en el formativo, haciéndoles ver a los jugadores que si el equipo tiene una buena base de conceptos y que están bien trabajados, además de que es un equipo unido y que disfrutar día a día, los éxitos llegarán antes y serán mas duraderos que si centramos nuestro trabajo en ganar a corto plazo. La formación se tiene que entender como un proceso a largo plazo donde los únicos ganadores son los chicos y chicas que practican el deporte que más les gusta.

7. ¿Cómo se mantiene económicamente la escuela de fútbol?

Después de atravesar una pandemia, y una serie de dificultades económicas la principal fuente de ingresos es la escuela, para nosotros sería muy importante la llegada de patrocinadores que puedan dar un pequeño impulso y de esa manera poder dotar de más medios a todos nuestros jugadores.

8. ¿En tu opinión, ¿qué caracteriza una buena escuela de fútbol?

Para mí lo más importante y que puede llegar a caracterizar o ser un factor diferencial respecto a otras escuelas es el nivel de formadores/entrenadores que hay. En este sentido los equipos son reflejo de los entrenadores que tiene y por ello un buen trabajo en la base con entrenadores donde su foco de trabajo este en la formación puede ser un factor que haga que una escuela de fútbol tenga una identidad propia y los equipos se diferencien de los demás.

9. ¿Cuál es el aspecto más difícil de se gestionar con los alumnos y con los padres a la vez?

El aspecto más difícil sin lugar a dudas es a la hora de confeccionar las plantillas, por desgracia no pueden jugar 30 niños en un equipo de fútbol y para los entrenadores, comunicar a otros chicos que tienen que jugar en otro equipo es sin dudas lo más duro del fútbol base. Siempre se tomarán esas decisiones en función de lo que creemos que es mejor para cada chico, pero no todos los padres y chicos respetan este tipo de decisiones.

10. Hoy en día, se espera que un jugador de fútbol de alto nivel sea inteligente, sea capaz de tomar decisiones individuales y también colectivas, sea creativo, valiente, que no tenga miedo de correr riesgos y que por encima de todo se divierta o disfrute. ¿Qué hacer para garantizar este tipo de ambiente que estimule estas complejas competencias en el entrenamiento y, sobretodo, en los juegos?

Creo que no podías resumir mejor lo que se pide en un futbolista de alto nivel, sin entrar en los aspectos técnicos, que muchos tienen un nivel altísimo, lo que de verdad diferencia un jugador de otro es esa creatividad y toma de decisión, jugadores valientes y con personalidad dentro y fuera del campo, es otro de los aspectos que a veces es muy difícil de trabajar por el tiempo de entrenamiento y los medios que tenemos en el club, pero a veces con charlas individuales o colectivas donde el entrenador trabaje eso aspectos mentales y motivacionales puede ser un factor de rendimiento importante que ayude a los jugadores. Por ello, el buen entrenador no es el que les enseña a meter goles por la escuadra sino también el que trabaje aspectos mentales, tácticos, técnicos, físicos… hoy en día hay que ser muy completo para que el jugador tenga un buen proceso de formación y que le ayude en su mejora de rendimiento.

Equipo técnico del la Escuela de Fútbol con Presidente de la “Universidade do Futebol”, João Paulo S. Medina y niños-alumnos.

Respuestas por vídeo:

Pregunta 1 -¿Qué es liderar a los jóvenes que en estos días tienen muchos otros intereses, además del fútbol? ¿Cómo garantizar su motivación para jugar al fútbol?
Pregunta 2 – Me gustaría hablar contigo sobre el tema de la creatividad. Se observa que los jugadores españoles son muy buenos en el fundamento del pase y seguro que se puede ser creativo también con los pases, pero, ¿cómo crear un ambiente en el que se pueda desarrollar la creatividad, incluyendo el regate como uno de sus importantes fundamentos?
Pregunta 3 – En tu opinión, ¿cuáles son las principales virtudes del futbolista español en comparación con otras nacionalidades europeas y mundiales?

Junta Directiva del F.C. Villanueva del Pardillo

Como curiosidad y para finalizar, presentamos la composición directiva del F.C. Villanueva del Pardillo, que tiene como Presidente a una mujer, señora Yolanda González.

Mire la composición estatutaria del Club.

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Entrevistas

Conheça a Escola de Futebol do FC Villanueva del Pardillo – Madri: entrevista com o diretor técnico Miguel G. Zárate

Crédito imagens: Arquivo João Paulo Medina

No último trimestre de 2021, a Universidade do Futebol teve a oportunidade de visitar na Espanha o F.C. Villanueva del Pardillo, município pertencente a comunidade autônoma de Madri. Nesta ocasião, João Paulo S. Medina, fundador da Universidade do Futebol, visitou o clube e pode conhecer suas instalações e funcionamento de sua Escola de Futebol. Foi recebido por seu Diretor Técnico, Miguel Garcia Zárate que apresentou alguns aspectos relevantes de seu projeto pedagógico, sintetizados na entrevista que se segue.

Miguel G. Zárate durante treinamento para jovens na Escola de Futebol do FC Villanueva del Pardillo

Observações: I. O conteúdo da entrevista conta com uma tradução livre do espanhol para o português. II. Existe uma versão desta matéria para os leitores e leitoras de língua espanhola. (Clique aqui para acessar).

Entrevista

1.  Conte-nos um pouco sobre a história do FC Villanueva del Pardillo e sua importância para o desenvolvimento do futebol para as crianças e jovens desta região da comunidade de Madri.

Nesta temporada (2021) o clube F.C. Villanueva del Pardillo celebra 30 anos de existência. Sem sombra de dúvida, trata-se de um clube de referência na prática do futebol para a população desta cidade, atendendo a uma grande demanda de meninos e meninas que cada vez mais querem jogar em nosso clube. Sobre a sua história tenho que destacar o nome de Juan Manuel Angelina, um aficionado que faleceu recentemente e que deixou um vazio enorme. Em sua homenagem mudamos o nome do estádio este ano.

Aula de futebol para crianças entre 08 e 10 anos
2. Quantos alunos tem a Escola de Futebol e quantas categorias existem hoje?

Atualmente contamos com mais de 300 alunos/jogadores inscritos, tendo a possibilidade de possuir mais de uma equipe em cada categoria. Temos desde a geração de 2015-2014 (pré-infantil) até 2005-2003 (juvenis) somando um total de 16 equipes da Escola propriamente dita e mais 4 equipes de aficionados, entre elas uma equipe feminina, a primeira da história do clube.

3. Qual é a estrutura da Escola de Futebol? Quantos funcionários tem?

No momento nos encontramos dentro de um processo de crescimento no qual estamos tentando profissionalizar mais os departamentos já existentes. Na Diretoria do clube temos como Presidenta a senhora Yolanda González e na Direção Esportiva dividimos o trabalho entre as equipes Seniors ou Aficionados e as equipes da Escola, como citado anteriormente.

A Diretoria Esportiva está formada por um diretor esportivo, Antonio Carcaño e um diretor da Escola, Miguel Garcia Zárate, com Pablo del Pino, como auxiliar da coordenação. Nosso principal objetivo é oferecer aos treinadores as melhores condições possíveis para poder fazer seu trabalho formativo com os alunos/jogadores. Além disso, contamos com um Departamento de Fisioterapia e Reabilitação, um Departamento de Captação e um Departamento de Goleiros.

4. E os professores? Quantos são? Que tipo de capacitação necessitam para trabalhar com os meninos e as meninas?  

Em nossas equipes da Escola temos um total de 25 treinadores, contando com os treinadores auxiliares, que ajudam os jogadores a melhorarem seu desempenho e a disfrutarem o dia a dia dos treinamentos e jogos.

Na Espanha a titulação mínima exigida para poder treinar a qualquer equipe é o Nível 1 de Técnico Superior Esportivo (Título Acadêmico), sendo o Nível 3 o máximo ou indistintamente a UEFA C (Título Federativo) que equivale ao Nível 1, sendo a UEFA PRO o nível máximo.

5. Que tipo de metodologia vocês utilizam para o desenvolvimento das aulas ou treinamentos? Existe um caderno de princípios?

Pelo contexto que se encontra o clube hoje em dia, é muito difícil seguir-se uma metodologia de trabalho unificada, ou seja, uma mesma linha de trabalho para todos os níveis, uma vez que em nossa realidade temos equipes que exigem um grau maior de complexidade em seus treinamentos diários e equipes competindo em um nível de maior competitividade que envolve uma complexidade mais alta e equipes de iniciantes em que essa complexidade tem que evoluir em progressão e adaptado ao grau de maturidade dos jovens jogadores. Por isso, seguir uma metodologia de trabalho comum é muito complicado. Assim sendo, preferimos que nossos treinadores sejam encarregados de transmitirem um modelo de jogo adaptado às suas necessidades. Mas ao mesmo tempo damos muita importância a que os treinadores não centrem seu trabalho nos resultados. Muito pelo contrário, entendemos que quanto maior é a formação individual e coletiva, além de um bom processo de ensino-aprendizagem calcado no ensino de valores, o resultado é algo que virá acompanhado no futuro.

Por outro lado, temos um Caderno de Princípios e fichas de Treinamento que utilizamos, sobretudo, nas categorias de iniciação, onde os jovens têm que aprender o futebol desde zero e, por isso, nos apoiamos em um caderno de trabalho com princípios de jogo mais básicos para que a progressão seja a melhor possível, sempre apoiando-nos nos jogos e no prazer de todos os alunos/jogadores.

Treinamento da equipe juvenil, ministrado pelo Prof. Miguel Zárate
6. Como vocês administram, de forma geral, o grande interesse competitivo, tanto dos alunos/jogadores, quanto dos seus pais, com a necessidade de que a criançada simplesmente desfrute o prazer de jogar? Este aspecto é tratado de maneira distinta com o passar dos anos? Qual é a filosofia da escola sobre este assunto?

Eu diria que, seguramente, este é um dos temas mais difíceis para se administrar. Temos que aprender a conviver com a derrota; no futebol se perde muito mais vezes do que se ganha e por isso é muito importante ensinar os jovens jogadores a canalizar o interesse competitivo, despertando neles o gosto pelo ato de jogar, por aprender e conhecer mais sobre o esporte que praticam. E isso só se pode conseguir com bons formadores, ou seja, educadores além de treinadores. O treinador de futebol de base tem que ser antes que tudo, um bom formador e despertar nos jovens o prazer de desfrutar o jogo e vontade de aprender antes de ganhar. Assim que quanto mais jovens sejam, mais tentamos desviar o trabalho competitivo e centralizarmos no formativo, fazendo-os perceber que se a equipe tem uma boa base de conceitos e que estão bem trabalhados, sendo uma equipe unida e que desfrutem o dia a dia de convivência, os êxitos chegarão mais cedo e serão mais duradouros que se focarmos nosso trabalho em ganhar a curto prazo. Há que se entender a formação como um processo de longo prazo, onde os únicos vencedores serão os garotos e garotas que praticam o esporte que mais gostam.

Aula de futebol para crianças de 6 a 7 anos de idade.
7. Como o clube se mantém econômica e financeiramente?  

Depois de atravessarmos uma pandemia, bem como uma série de dificuldades econômicas, a principal fonte de receitas do clube é a Escola de Futebol. Por outro lado, seria muito importante a chegada de patrocinadores que pudessem dar um pequeno impulso e desta maneira podermos melhorar as condições gerais para nossos jogadores e alunos.

8.  Em sua opinião o que caracteriza uma boa Escola de Futebol?

Para mim – como diretor esportivo – o mais importante e que pode se caracterizar como um fator diferencial em relação a outras escolas, é o alto nível de seus formadores/treinadores. Neste sentido, as equipes são o reflexo de seus treinadores. Se eles têm o foco de trabalho na boa formação isto pode se constituir em um fator que irá fazer com que a Escola de Futebol tenha uma identidade própria e, consequentemente, suas equipes se diferenciam das demais.  

9. Considerando os aspectos pedagógicos, qual é a questão mais difícil de se administrar com os alunos e os pais ao mesmo tempo?

O aspecto mais difícil de lidar, sem sombra de dúvidas, é a hora de relacionar a lista dos jogadores escalados. Infelizmente, não se pode escalar 30 crianças para jogar em uma mesma equipe de futebol.  O fato de o treinador ter que comunicar aos demais jogadores que eles estão fora da lista é a coisa mais difícil para se fazer no futebol de base. Sempre tomamos essas decisões em função do que acreditamos que é o melhor para cada um, mas nem todos os pais e garotos e garotas aceitam este tipo de decisão. 

10.  Hoje em dia, o que se espera de um jogador de futebol de alto nível é que seja inteligente, seja capaz de tomar decisões individuais e coletivas, seja criativo, valente, que não tenha medo de correr riscos e que acima de tudo se divirta ou desfrute com suas práticas. O que fazer para garantir um tipo de ambiente que estimule estas complexas competências no treinamento e, sobretudo, nos jogos?

Creio que você não podia resumir melhor aquilo que se espera de um futebolista de alto nível. Sem entrar nos aspectos mais técnicos o que, de verdade, diferencia um jogador de outro é essa criatividade, sua capacidade para tomar decisões, sua valentia e personalidade dentro e fora do campo. Alguns desses aspectos são, as vezes, difíceis de se trabalhar devido ao tempo disponível de treinamento e os recursos que temos no clube, mas com conversas individuais ou coletivas, onde o treinador pode trabalhar alguns aspectos mentais e motivacionais, podem ser um fator importante de potencialização do rendimento e que sem dúvida ajuda os jovens. Por isso, acredito que o bom treinador não é aquele que só os ensina a marcar gols pela equipe, mas também trabalha os aspectos mentais, táticos, técnicos, físicos… Hoje em dia há que ser muito completo para que o jogador tenha um bom processo de formação e que ajude em sua melhora de rendimento.

Respostas em vídeo:

Pergunta 1 – Como é liderar jovens que hoje em dia têm muitos outros interesses além do futebol? Como garantir sua motivação para jogar futebol?
Pergunta 2 – Gostaria de falar sobre o tema da Criatividade. Observa-se que os jogadores espanhóis são muito bons no fundamento do passe e é claro que se pode ser criativo também com os passes, mas como criar um ambiente que se possa desenvolver a criatividade incluindo-se o drible como fundamento importante?
Pergunta 3 – Em sua opinião, quais são as principais virtudes do futebolista espanhol se comparados a outras nacionalidades europeias e mundiais?

Direção do F.C. Villanueva del Pardillo

Como curiosidade, e para encerrar esta matéria, apresentamos a atual composição diretiva do F.C. Villanueva del Pardillo, que tem como Presidente uma mulher, Yolanda González.

Veja a composição estatutária do clube.

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Como (não) escolher um treinador

Crédito imagem: AFP

O espaço gigantesco que o treinador ocupa hoje no contexto do futebol mundial não é por acaso. Em um cenário globalizado, em que a informação e o conhecimento são acessíveis a todos, mais do que a quantidade do que se sabe, vale a sabedoria em escolher os elementos certos que aproximem um grupo da vitória. Além disso, a flexibilidade para se adaptar a diferentes ambientes, dentro de uma inteligência circunstancial, também é uma competência de extremo valor para um técnico ter sucesso.

Por isso, contratar um profissional não pode ser algo aleatório. Com base em ‘achismo’ ou ‘vi e ouvi falar bem’ desse sujeito… aqui, mais do que ideia de jogo, conceitos, modelo, falo de comportamento, perfil emocional e relacional. Quais clubes, sobretudo brasileiros, sabem de fato o ‘pacote’ que estão comprando?

Tomo como exemplo a busca atual do Flamengo para o substituto de Renato Gaúcho. Se justifica racionalmente a busca prioritária por um profissional português? Entendo a passagem brilhante de Jorge Jesus pelo clube e até mesmo a referência de Abel Ferreira no Palmeiras. Porém a capacidade deles em nada tem a ver e vai muito além do fato de serem portugueses. Um mínimo elemento é o idioma. Só! Até porque muita gente no clube carioca não entendia algumas coisas que Jorge Jesus falava…

Português, espanhol, brasileiro….a nacionalidade não pode ser critério para a escolha do líder do processo de um time de futebol. Um treinador vai muito além do passaporte. Repito: o que vai definir o sucesso do trabalho é capacidade relacional, gestão do ambiente, boas relações interpessoais, inteligência emocional, metodologia de treino, ideias adaptáveis e eficazes de jogo e etc. O sucesso é previsível. É construído e arquitetado. Apego emocional e pouco critério sólido não combinam com títulos… tentativa e erro não cabem em um mundo profissional…

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A vitória começa agora, na execução do planejamento

Crédito imagem: Vitor Silva/Botafogo

O mês de dezembro é crucial e determinante para conhecermos os campeões da temporada seguinte. Execução do planejamento – que já deveria ter sido feito anteriormente e agora, de fato, sendo só executado – montagem de elenco, acordos para chegadas e saídas de jogadores, definição de staff, aparelhamento de departamentos, enfim, é neste período sem jogos que as vitórias começam a ser construídas. E se ainda vivemos períodos insanos de trocas constante de treinadores, já dá para ver um entendimento maior dos clubes brasileiros de que competência e inteligência fora de campo aumentam as probabilidades de sucesso dentro de campo.

Listas de dispensas e caminhão de reforços não funcionam! Termos cunhados por dirigentes para mostrar ‘serviço’ a torcida, mas que na prática não aumentam as tais probabilidades de vitória, que já citei. Manutenção de uma base, de uma espinha dorsal, é fundamental. Independentemente de a temporada anterior ter sido boa ou ruim. Isso porque futebol é um jogo coletivo, em que quanto mais conhecimento um jogador tem do seu companheiro mais eles conseguem se entender, se entrosar e criar juntos coisas novas e melhores. 

Não defendo aqui que elencos sejam imutáveis. O que sou contra é a simplória observação de que porque perdeu tudo neste ano deve-se fazer uma ‘limpa’ no elenco e começar do zero para a próxima temporada e, por outro lado, se houve títulos achar que saídas e até mesmo contratações não são necessárias. E não se pode tirar da análise que o mercado brasileiro é exportador. Os melhores jogadores, sobretudo os mais jovens, são cobiçados e observados cada vez mais cedo. Mas até para vender dá para ter o ‘timing’ correto de ter o máximo de desempenho possível sem perder valiosos milhões de euros com uma negociação tardia.

A figura do executivo de futebol mais uma vez é crucial para o sucesso de toda essa engrenagem. Claro que o treinador deve ser ouvido. Entretanto não podemos esquecer que a média de um técnico no Brasil é de dois meses no cargo. Como deixar o treinador liderar a formatação de um elenco se na sequência por algum motivo ele pode ser demitido ou pedir para sair?! O clube é que deve ser o responsável por, por exemplo, ter relatórios físicos e médicos de todo atleta para ter claro se é momento de negociá-lo ou mantê-lo para o próximo ano. É o clube que deve mapear o mercado e buscar reforços que se encaixem financeira e esportivamente no projeto. Ficar refém de treinador, ou até mesmo de empresários, só fragiliza o clube. Terceirizar o planejamento ou simplesmente deixá-lo ao acaso não combina com troféu.