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Por abordagens metodológicas que valorizem a qualidade, estilo e essência do futebol brasileiro

Por Eduardo Barros* & Rafael Castellani**

Tem sido frequente, nos clubes, imprensa e no âmbito acadêmico, muitos apontamentos que destacam a importância de resgatarmos a nossa identidade de jogo que, no decorrer do tempo, por questões multifatoriais, vem se perdendo. O problema é grave e as críticas, culpados e responsáveis, surgem de todos os lados. Para alguns, a culpa é dos treinadores profissionais que, pressionados por resultados ou influenciados por outras culturas de jogo, tem aplicado Modelos de Jogo que se distanciam das principais características do nosso futebol. Para outros, os responsáveis são os profissionais das categorias de base que não aplicam treinos de fundamentos, o que sempre foi um diferencial dos nossos principais atletas. Outros, ainda destacam que os empresários são os culpados, uma vez que influenciam os nossos jovens a perderem o prazer e a paixão pelo jogo. Vale, também, a crítica à distância entre o que é produzido pelos pesquisadores/cientistas e a realidade concreta nos clubes e escolas de esporte. Neste cenário, temos também a imprensa, que atua criticamente e não só escancara, mas potencializa, nossos problemas, pois alimenta um ciclo vicioso e reconhecido do futebol brasileiro: a falta de projetos de longo prazo, a busca a qualquer custo do resultado imediato e a excessiva demissão e rotatividade de treinadores em todos os níveis, mas, especialmente, no futebol profissional. Existe mais uma série de argumentos que expõem o distanciamento do melhor futebol brasileiro e precisamos ter clareza que uma questão de natureza complexa como essa não tem origem ou causa em somente um elemento.    

Diante de todo esse contexto, é notável em nosso jogo, menor ofensividade, movimento, beleza, arte, alegria, ginga e criatividade. Afinal, para que estes elementos estejam presentes, um ambiente favorável precisa ser criado. E será que existe alguma maneira de (re)criarmos, mesmo com tantos desafios e pressões, tal ambiente? 

O estímulo à qualidade, estilo e essência do futebol brasileiro passa, necessariamente, pela adoção de abordagens de ensino-aprendizagem-treinamento, em todos os níveis da modalidade (da Iniciação ao futebol Profissional), que tenham no Jogo, em sua essência, a principal ferramenta para o desenvolvimento dos jogadores. Além disso, é indispensável que o foco da abordagem seja dado a cada indivíduo em sua totalidade, num processo humanizado que explora as potencialidades e virtudes, permitindo que o talento de cada indivíduo tenha espaço para se manifestar.

Destacados especialistas da Pedagogia do Esporte no Brasil, como João Batista Freire, Alcides Scaglia e Wilton Santana, dentre outros, apontam que o Jogo é o melhor meio para a educação integral, logo esportiva, das nossas crianças e jovens que sonham em se tornar atletas profissionais de futebol. Logo, o jogo configura-se como elemento central do treino para que se promova a adaptação dos jogadores às diversas situações, de modo que percebam autonomamente as situações e “problemas do jogo”, adquiram propriedades para tomada de decisões e respondam às ações de companheiros e adversários (e suas interações).

Mais do que isso, como vemos destacando, é preciso, também, que a metodologia de treino adotada por treinadores dê conta de lidar com a imprevisibilidade, aleatoriedade e o ambiente caótico inerentes ao futebol, por conta da sua grande complexidade. É a prática cotidiana sob essas condições (de treino) que garantirá aos jogadores maiores possibilidades de desenvolverem e expressarem sua criatividade, a beleza dos seus gestos e dribles/fintas, sua ginga e um estilo ofensivo de jogo, algo que, por décadas, caracterizou o estilo/essência do futebol brasileiro.       

Com o avanço dos estudos no campo da pedagogia do esporte, muitas abordagens metodológicas foram propostas. Além dos professores supracitados (João Batista Freire, Alcides Scaglia e Wilton Santana), há tantos outros (Roberto Paes, Larissa Galatti, Julio Garganta, Claude Bayer e Pablo Greco, por exemplo) que, mesmo considerando as especificidades de suas proposições e teorias, corroboram a necessidade de ruptura com abordagens pedagógicas que fragmentam o jogo e que desconsideram a interferência de fatores complexos  no desenvolvimento da capacidade dos praticantes em compreender os fenômenos do jogo e intervir de modo inteligente nas situações que ele impõe aos praticantes.

Nesse sentido, gostaríamos de destacar uma destas abordagens que, no nosso entendimento, pode trazer grandes contribuições para que o futebol brasileiro resgate e manifeste, em maior proporção, elementos do nosso jogo que sempre nos identificaram futebolisticamente: a pedagogia da rua.

Desenvolvida por João Batista Freire e “alimentada” por tantos outros professores e treinadores, a pedagogia da rua é apresentada por Freire (2022) no seu mais novo livro “O jogo de bola na escola: introdução à pedagogia da rua”, como a teorização de uma prática realizada no ambiente da rua, entendendo-o como um espaço que extrapola os limites das calçadas. Rua, neste caso, é, também, os campinhos de várzea, as praias, as praças etc. Ou seja, não se trata de realizar uma transposição mecânica do futebol jogado na rua para as escolas de futebol e clubes, mas, ao pedagogizar essa prática, dotá-la de um método que qualifique e dê novo significado ao que se aprende e como se aprende a jogar futebol. Nesse sentido, “a pedagogia da rua não é a educação da rua” (FREIRE, 2022. p.40). Da mesma forma, não podemos tratar o futebol de rua ou o jogo de bola na rua como um sinônimo da pedagogia da rua. Mas a rua, como uma pequena sociedade lúdica, na qual inúmeros jogadores de futebol se formaram, sendo o principal espaço de aprendizagem de tantos craques brasileiros, produz conhecimentos e nos apresenta um processo de aprendizagem que podem ser levados às categorias de base dos clubes de futebol.           

O essencial é que essa pedagogia se baseie no jogo e na brincadeira, ou seja, no lúdico. A partir da expressão do lúdico e pelo resgate do prazer na prática do futebol (nada parecido com as filas intermináveis e repetitivas para realizar uma finalização, um passe ou driblar um cone), podemos formar atletas conscientes da sua prática e das suas ações durante o jogo, capazes de resolverem os problemas (do jogo) de modo inteligente, autônomo e criativo.

Se o ambiente da rua deve estar presente nos clubes de futebol brasileiros e, mais especificamente, em suas categorias de base, o que esperar das sessões de treinamento para as nossas crianças e jovens? O que nos vem à mente quando pensamos, quer tenhamos praticado ou não, o futebol de rua? Como levar a pedagogia da rua, na prática, para o clube?

Os treinamentos que buscam recriar o ambiente da rua precisam oferecer aos jogadores diversas características; e a liberdade, seguramente, é a principal delas. Mas como estimular a liberdade nas categorias de base? Estimulá-la, em hipótese alguma deve ser resumida à permissão para os jogadores de ataque poderem driblar quando invadirem ou estiverem no último terço do campo. Em contrapartida, não limitar ou, ao menos, ampliar a área de atuação de cada um dos jogadores é um importante passo, bem como permitir que o drible e outras jogadas de maior risco estejam presentes em todos os setores do campo. Um zagueiro deve, em seu processo de formação, passar por várias posições da modalidade. Nas sessões de treino, precisa ser estimulado a cumprir funções de lateral, de volante, de meio-campista e, inclusive, de atacante. Durante as atividades propostas pelo seu treinador, mesmo que inicie um determinado exercício como zagueiro, deve ter liberdade para tocar e passar, para jogar do lado direito e esquerdo, para atuar fora de sua posição e realmente jogar (e viver e sentir) o jogo em todas as suas possibilidades. Se estiver no campo de defesa e o drible for uma boa solução, precisa arriscá-lo. Se está sob pressão, mas tem um companheiro que abriu linha de passe na tentativa de sair jogando, deve tentar a ação, mesmo que erre. Imagine um zagueiro que receba o estímulo de poder driblar ou passar sob pressão, todos os dias, por 10 anos de categorias de base, do sub-11 ao sub-20. Compare com um zagueiro habituado apenas a buscar soluções simples e de baixo risco. A diferença de recursos entre um jogador e outro será significativa.

A liberdade é a chave para a autonomia, inteligência e criatividade! Quem se sente livre para jogar, desenvolve a tomada de decisão. A exposição à prática autônoma é o caminho para jogar bem e melhor, logo, de forma inteligente. E, parafraseando o criador da Pedagogia da Rua, João Batista Freire, como o jogo é o paraíso da imprevisibilidade (2024), pode ser também o paraíso da criatividade, ou das novidades que podem emergir como soluções para os problemas que o jogo impõe ao praticante que, por sua vez, tem liberdade para decidir e agir.

É importante deixar claro que o exemplo dado sobre os zagueiros se aplica a todas as posições, até mesmo ao goleiro. Já pensou se os goleiros, ao longo do processo de formação, treinassem sistematicamente (não todos os dias, claro) em diferentes posições na linha? Um goleiro que recebe ou precisa executar um passe ao longo do jogo e tem diferentes soluções como resposta aumenta o nível de jogo da sua equipe em comparação àquele que só tem o chutão como recurso? Treinar como jogador de linha auxiliaria o goleiro a desenvolver competências e habilidades que podem ser transferidas para a sua posição formal? Vale uma boa reflexão sobre esta questão…

Diferentemente do ambiente da rua, cujas relações, combinados e decisões são tomadas de modo diferente e pelas próprias crianças e jovens, os clubes de futebol contam com a atuação não só do treinador, mas de toda a comissão técnica, com mais ou menos integrantes, de acordo com a estrutura, tamanho e recursos de cada um. Pedagogizar o conhecimento produzido na, e pela, rua, e levar essa pedagogia às escolas de esporte e categorias de base dos clubes, além de servir à propósitos diferentes, significa atribuir ao adulto (o professor, treinador, dentre outros) papel protagônico na construção de um ambiente de treino que permita a liberdade (e não só) como forma de expressão da criatividade e de tomadas de decisão autônomas. Este adulto, no âmbito dos clubes de futebol, em especial nas categorias de base, pode ser qualquer profissional que faça parte da comissão técnica, mas centralizaremos, neste texto, na figura do treinador, por entendê-lo como principal líder de uma equipe esportiva.   

Nesse sentido, é fundamental que o treinador oportunize aos atletas a maior quantidade e mais diversas experiências possíveis, preferencialmente com bola, que se aproximem ao máximo das condições de jogo com as quais o jogador tem que lidar. Além de planejar tais situações de aprendizagens, como temos destacado, cabe também ao treinador incentivar e encorajar o drible, o improviso, a antecipação de uma jogada, ou seja, dotar seus atletas de liberdade para serem eles mesmos e expressarem sua criatividade a partir do estabelecimento de uma cultura de aceitação e compreensão do erro. Afinal, o erro é elemento indissociável do processo de aprendizagem.

Diante de todas estas responsabilidades do treinador, entendemos que este profissional precisa estar muito bem preparado para liderar um grupo de crianças ou jovens, praticantes de futebol. Será possível desenvolver jogadores e equipes criativas, ofensivas, móveis, versáteis, corajosas se o treinador não reunir e aprimorar estas características? Destacamos a necessidade de os treinadores terem a capacidade de (re)criar o ambiente da rua, com aquilo de bom que ela tem a nos oferecer pedagogicamente, em suas sessões de treinamento, no entanto, será que, via de regra, ofertamos um ambiente institucional favorável para o desenvolvimento dos treinadores alinhados ao estilo e essência do futebol brasileiro?

Como a prática do futebol está sendo realizada de forma supervisionada e orientada desde a infância, não será possível alimentarmos a qualidade, estilo e essência do futebol brasileiro se não houver um investimento significativo em nossos formadores. Eles são os guias, ou mediadores, para o surgimento, em maior escala, de melhores jogadores e melhor nível de jogo nas categorias de base.

O planejamento de atividades, as conversas iniciais e finais de cada treino, a disputa de competições, a construção da equipe, a gestão do grupo, as abordagens individuais, a condução dos exercícios, a gestão da comissão técnica, o cuidado, a atenção e o olhar para a formação integral dependem de uma liderança que tenha ampliado conhecimento sobre tudo que envolve o desenvolvimento humano e, também, das equipes de futebol.    

 Idealmente, um bom treinador não só tem ampliado conhecimento como busca aperfeiçoá-lo continuamente, atento às melhores práticas (pedagógicas, técnicas, de gestão, de comunicação, de liderança, de treino) aplicadas ao seu grupo de jogadores. Um bom treinador e sua equipe de trabalho irão colher informações-chave sobre cada jovem, como sua história de vida, sua educação formal, sua condição social e vão se valer dessas informações para balizar suas ações.

É neste contexto complexo e holístico, como a vida, que as novas bases para a (re)criação de um novo futebol brasileiro precisa estar fundada. É urgente a implantação de Modelos de Jogo que tenham como princípios a liberdade estrutural, a multifuncionalidade, o refino técnico, o jogo ofensivo, a ginga, a coragem e não só a permissão, mas o estímulo sistematizado da criatividade, individual e coletiva. Uma vez que o jogo é coletivo e é consensual a existência de equipes cada vez mais organizadas, compactas e sólidas defensivamente, não podemos resumir a criatividade às jogadas de efeito, de característica individual, como um drible ou uma finalização inesperados, que tem a possibilidade de definir uma partida truncada, mas também o direcionamento (se recorda que classificamos o treinador como um guia?) das ocupações do espaço pela equipe de modo que através dos passes, o meio técnico-tático mais utilizado no jogo de futebol, emerjam jogadas coletivas com potencial para desestruturarem as melhores defesas.  

E como cada equipe é constituída de seres únicos, treinadores e jogadores, seguramente estaríamos diante de Modelos de Jogo também singulares, autorais, dotados da beleza de não serem uma cópia ou adaptação de qualquer outro. Parece utópico? Sim! Mas é possível…

Vale destacar que há grandes equipes e treinadores que podem servir de referência para a implantação dos Modelos de Jogo em toda a realidade das categorias de base. Inclusive, quando abordamos a retomada da qualidade, estilo e essência do futebol brasileiro, reconhecemos que existem exemplos históricos que nos direcionam para um caminho que tem a cara do nosso povo, da nossa cultura e da nossa identidade. Que estes grandes exemplos, do passado ou atuais, sejam inspirações para os nossos formadores, da iniciação esportiva à porta de entrada para o alto rendimento.  

Sobre os autores:

*Eduardo Barros – Atual auxiliar técnico do Fluminense, já atuou na equipe principal da Seleção Brasileira e tem experiência tanto em categorias de base como no profissional em outros clubes: Athletico Paranaense, Coritiba, Juventude, Grêmio Novorizontino, Audax-SP e Oeste. Possui a Licença PRO de treinador da CBF Academy, sendo bacharel em Educação Física (Unicamp) e pós-graduado em Administração de Empresas pela FGV. Ele também é consultor pedagógico na Universidade do Futebol.

**Rafael Castellani – Atualmente é professor da CBF Academy, líder do grupo técnico pedagógico da Universidade do Futebol e Pesquisador Colaborador do Instituto Nacional de Ciências e Tecnologia de Estudos do Futebol Brasileiro. Possui licenciatura em Educação Física (Unesp), mestrado em Educação Física & Psicologia do Esporte (Unicamp) e doutorado em Psicologia Social & Psicologia do Esporte (Usp).

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Mais uma vez explicando sobre a especialização precoce no futebol

É muito cansativa a tarefa de explicar as razões pelas quais as crianças não podem ser submetidas a treinamentos e competições esportivas precocemente, principalmente se realizadas nas perspectivas que vemos com frequência, isto é, adaptando-as ao esporte profissional e não adaptando o esporte à criança. Do ponto de vista científico, nada existe que fundamente essa precocidade; e tudo existe que a reprove. Por mais que artigos e livros a respeito do tema sejam publicados, prevalece a opinião daqueles que partem somente do seu conhecimento empírico ou seu “achismo”, e insistem na ideia de que, quanto mais cedo as crianças começarem a realizar treinamentos esportivos especializados, maiores as chances de êxito esportivo na adolescência e idade adulta.

Como argumento, citam as exceções de sempre, isto é, um ou outro atleta que foi iniciado precocemente e chegou ao topo do rendimento esportivo. Quanto à vida pessoal desses atletas nada se fala. Quanto aos diversos tipos de assédio, inclusive sexual, sofridos por meninas e meninos que buscam concretizar o sonho de serem jogadores profissionais de futebol, a memória se apaga. Quanto às contusões, dores e doenças decorrentes do excesso de esforço para organismos jovens, não há menções. Quanto aos problemas psicológicos causados pela pressão absurda a que são submetidos e pelo estresse de treinamentos e competições, os “entendidos” se calam.

               Apesar de cansativa, vamos, mais uma vez, à tarefa de desmascarar os arautos do treinamento precoce e as decorrentes competições.

               No futebol, as idades das categorias são cada vez menores: sub9, sub 7, sub 5 e, logo mais, sub-feto, envolvendo famílias ansiosas por exibir seus futuros campeões. Para os clubes e agentes, trata-se apenas de negócios, e as crianças, mercadorias. Se, entre milhares e milhares de criancinhas sacrificadas no altar do lucro, aparecer meia dúzia de talentos precoces, o rendimento financeiro estará garantido. Sem contar os atravessadores tirando dinheiro de pais e mães desesperados por evidenciar seus filhos (pagando para competir, pagando para treinar, pagando para passar por peneiras etc.).

               Poderíamos citar a ginástica, o atletismo, o voleibol e muitas outras modalidades esportivas. Mas o espaço para escrever isso exigiria um livro inteiro. A ideia generalizada no esporte brasileiro e mundial, com raras exceções, é a de que, quanto mais cedo se dá a iniciação esportiva em uma determinada modalidade, melhor.

               Trata-se de um absurdo científico e até de bom senso. Porém, o que prevalece é o mau senso. Vamos aos nossos argumentos que justificam essa afirmação.

               Comecemos pela questão moral. Como é possível comparar a moral de uma criança de 5, 6 anos com a moral de um adolescente ou de um adulto? Aos 5 ou 6 anos de idade uma criança está começando a formar aquilo que chamamos de julgamento moral. Uma pessoa só pode julgar moralmente (não necessariamente com acertos) os outros quando ela é capaz de se colocar no ponto de vista do outro. As brincadeiras das crianças, nessa idade, não devem ser orientadas com base em julgamentos morais, em regras rígidas. As regras para grupos dessa idade devem ser muito simples, pois as crianças sentem muita dificuldade em se colocar no ponto de vista dos colegas.

Os julgamentos morais no esporte são feitos com base na ideia de justiça. Quando um(a) jogador(a) se sente injustiçado(a), ele(a) reclama. A partir dos 6, 7 anos mais ou menos, já podemos perceber algum esforço das crianças para dividir, trocar e compartilhar, abrindo mão de parte de seus interesses. Nessa idade, com base nas insatisfações, uma professora bem formada reúne a turma e conversa a respeito. Se ela souber conduzir a conversa, as crianças chegarão a acordos, ou para aceitar a regra estabelecida (algumas das regras convencionais do esporte), ou para criar uma regra especialmente para o jogo que está sendo realizado. Quando chegam ao acordo, estabelece-se que, a partir daí, valerá tal ou tal regra. Os insatisfeitos, sentindo que a regra faz justiça, aceitam e o jogo continua.

O que significa essa regra? Significa que vários jogadores(as) abriram mão de interesses pessoais em busca do interesse comum. Ou seja, uma regra é uma norma de regulação das relações no grupo, feita de renúncias de interesses pessoais em favor do interesse geral do grupo. Isso, em crianças de 5 ou 6 anos de idade é muito incipiente, afinal, elas são ainda muito autocentradas, buscam, de maneira um tanto mágica, fazer prevalecer os próprios desejos. É por isso que, por exemplo, numa brincadeira de bola entre pequenos de 4, 5 anos ou até mais, a gente observa o grupo todo correndo atrás da bola. Isso porque o interesse é ter a bola, o objeto de desejo. Nada mais interessa além disso. E é assim que as brincadeiras devem ser realizadas, em função dessa dificuldade em julgar moralmente as situações.

               Até os 6 anos de idade (e essa idade pode ser maior ou menor a depender da criança), se escolhermos bem as brincadeiras, as crianças jogarão ao seu modo e se divertirão. Não temos que enquadrá-las nas regras do esporte adulto, pois isso acarretará sérios prejuízos para elas e para o esporte. Para elas, pelas consequências futuras de tal pressão e, para o esporte, porque a maioria perderá o interesse pela prática esportiva e desistirá rapidamente.

               A partir do momento em que podemos conversar com elas e estabelecer regras, isso significa que não transgredirão? Não. Sempre uma ou outra transgredirá. Quando isso acontecer, retoma-se a conversa. Ou não. No esporte convencional, para aqueles que preconizam a especialização precoce, as regras são impostas e, quando transgredidas, as crianças são punidas. No esporte educacional, constrói-se regras junto com as crianças para que elas desenvolvam uma moral de autonomia, ideia democrática de convívio em grupo, a ideia de acordos, de enxergar o interesse comum.   

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10 coisas que o presidente da CBF deveria saber: Propostas para o resgate do “jogo bonito” brasileiro

Por João Paulo S. Medina – Fundador da Universidade do Futebol

Vamos começar pela raiz que justifica o mandato do Presidente da Confederação Brasileira de Futebol:

1.“Por força de sua filiação à FIFA e CONMEBOL, a CBF é a única entidade brasileira autorizada, de forma exclusiva, a dirigir e controlar o futebol no território brasileiro” (Art. 5; § 1° de seu estatuto), tendo assim o dever de dirigir e organizar todos os assuntos e questões relacionados à prática formal do futebol profissional e não profissional, administrando, difundindo, fiscalizando e, sobretudo, fomentando e aperfeiçoando constantemente a modalidade em todo o país.

Tamanho conjunto de responsabilidades, obriga que o mais alto mandatário desta instituição esteja devidamente preparado para cumprir estas exigências estatutárias, sabendo que:

2. O futebol não é uma simples modalidade esportiva, mas um fenômeno global de massa que serve a muitos interesses, alguns legítimos e necessários ao próprio desenvolvimento sociocultural, econômico e esportivo da sociedade, e outros nem tanto, que precisam ser combatidos ou neutralizados com muita determinação e energia.

3. Neste sentido, mesmo sabendo que toda ação social é um ato político, é bom também lembrar que o Estatuto da CBF define em seu Artigo 12, que é papel da instituição “dirigir, organizar e ordenar, no território brasileiro, todos os assuntos e questões relacionados com o futebol, de forma independente, prevenindo quaisquer ingerências políticas ou de terceiros”; entendendo aqui que estas ingerências políticas ou de terceiros devam significar o ato de combater ou neutralizar quaisquer interesses ilegítimos ou espúrios, muitas vezes facilitados pela própria importância que damos ao futebol.

4. Neste contexto amplo, é preciso que o presidente da CBF saiba que o desempenho esportivo e os resultados alcançados por suas Seleções são o resultado ou reflexo de tudo que é feito em sua base (nos clubes, nas escolas de futebol, nas escolas formais), precisando, portanto de toda a atenção, cuidados, parcerias e investimentos da instituição em recursos materiais, tecnológicos e, sobretudo, humanos para que o futebol se desenvolva adequadamente e se possa, assim, resgatar “o jogo bonito” que é, verdadeiramente, a identidade do futebol brasileiro, reconhecida em todo o mundo, mas que está se descaracterizando rapidamente por força não só da globalização, mas principalmente devido à falta desta compreensão e de investimentos consistentes em capacitação profissional competente.

E falando em “jogo bonito” e em identidade do futebol brasileiro, é fundamental que o mais alto mandatário da instituição que tem poderes legais para administrar o nosso futebol, saiba também que:

5. Assim como nossa identidade futebolística, com todas as suas nuances e características regionais, foi uma construção que se deu ao longo dos tempos, baseada sobretudo em uma “pedagogia da rua”, que garantia a nossa essência, sustentada pelo lúdico, pela alegria, imaginação, criatividade, ginga, malandragem etc., ela também se desconstrói histórica e culturalmente. Portanto, podemos inferir que resgatar o “jogo bonito” ou desenvolver um novo estilo contemporâneo brasileiro de jogar futebol não ocorre por geração espontânea ou apenas com boas intenções, mas com políticas que exigem muito conhecimento, planejamento e ações de longo prazo (5, 10, 20 anos), impossíveis de serem implementadas sem a liderança proativa da CBF.

6. Ainda pensando no movimento de globalização (que a tudo pasteuriza) e os interesses econômicos (que costumam secundarizar outros relevantes aspectos socioculturais e esportivos), é preciso que o dirigente da CBF entenda que a abertura indiscriminada de vagas para importação de jogadores estrangeiros, ao mesmo tempo em que os melhores jogadores(as) brasileiros(as) sofrem um processo inverso (de exportação), fragiliza o nosso futebol em sua essência, além de diminuir drasticamente as possibilidades de jovens brasileiros que se destacam nas categorias de base de seus clubes, ocuparem uma posição ou vaga em suas equipes principais. Atualmente é permitida a participação de 9 jogadores estrangeiros por equipe.

7. Convém destacar também que dada a complexidade do mundo atual, nenhum setor da atividade humana consegue mais ser administrado e evoluir quando seus líderes atuam de forma isolada ou centralizadora. Com o futebol, não é diferente. Todo gestor competente deve saber que as ideias inovadoras e as melhores soluções ocorrem por participação e esforços coletivos, contando com o engajamento e comprometimento de pessoas igualmente competentes e bem lideradas. Facilitar o surgimento de uma Liga Nacional de Clubes atuante, responsável e, tanto quanto possível, coesa, pode ser um grande exemplo para reunir proativamente dirigentes, executivos e gestores com o propósito de se buscar soluções coletivas que sejam benéficas para todo o ecossistema do futebol brasileiro, entre elas a adoção de medidas efetivas que garantam a implantação e regulamentação do “fair play financeiro”, tanto para as SAF´s quanto para os clubes associativos.

Muitas outras providências e projetos poderiam ser pensados, implantados e implementados, com divulgação transparente sobre os recursos materiais, financeiros, tecnológicos, ambientais e humanos utilizados e devidamente auditados. Vamos citar mais 3 providências essenciais que o Presidente da CBF, enquanto principal responsável pelo fomento do futebol brasileiro, precisaria ter clareza:

8. Para que o futebol brasileiro possa se desenvolver de forma consistente, é necessária a criação gradual de Centros de Excelência de Futebol (estaduais ou regionais) que possam servir de referência não só para as práticas educacionais (escolas de futebol) e competitivas (Seleções), mas também como centro de estudos e pesquisas que desenvolvam e fortaleçam uma prática saudável, com atividades pedagógicas que reforcem o “jogo bonito” enquanto essência do futebol brasileiro. Estes Centros de Excelência poderiam também servir de base para diferentes categorias de Seleções masculinas e femininas, melhorando sua estrutura e aumentando suas possibilidades competitivas de forma planejada.

9. Somente a criação de um Comitê Disciplinar e de Arbitragem democrático, competente, legítimo, com suficiente credibilidade e amplos poderes, poderia ser capaz de reverter o triste, feio e lamentável estágio atual (“modus operandi”) do futebol brasileiro. A. Simulações ridículas de faltas; B. Reclamações desproporcionais de atletas, treinadores e dirigentes; C. Erros grosseiros da arbitragem, com uso indevido dos recursos tecnológicos como o VAR (tão necessários para trazer mais acuidade e justiça às decisões do árbitro); D. Comportamento inadequado das torcidas, que exigem não só medidas punitivas severas, como principalmente medidas preventivas e educativas que incluam, inclusive, ações que não estimulem o comportamento viciante em apostas (fenômeno que está se tornando uma verdadeira epidemia, com gravíssimas consequências sociais); E. Constantes atitudes suspeitas em relação à manipulação de resultados, são alguns dos principais fatores que estão matando a nossa essência, nos distanciando cada vez mais do nosso “jeito de jogar futebol” e, infelizmente, fazendo com que sejamos cada vez menos admirados mundo afora.

10. E por fim, é urgente e inadiável a criação de um novo Calendário do Futebol Brasileiro, suficientemente abrangente para considerar estrategicamente todo o universo competitivo, desde nossas Seleções, equipes das Séries A, B, C, D, campeonatos regionais, até as competições de todas as divisões das categorias de base masculinas e femininas. Este novo calendário precisaria encarar de frente algumas questões de difícil solução, tais como: A. Conciliar interesses dos patrocinadores e meios de comunicação; B. Favorecer competições com níveis equiparados, tanto para o futebol masculino, quanto feminino; C. Propiciar um número de jogos anuais mais equilibrado para clubes das primeiras divisões (com demasiados jogos) e clubes que atuam quase que exclusivamente de forma regional ou estadual (com pouquíssimo jogos); D. Exigir a compatibilidade entre a frequência escolar e os jogos oficiais, para que haja um convívio salutar entre as atividades escolares e competitivas formando melhor nossos jovens atletas; E. Viabilizar deslocamentos razoavelmente racionais das equipes em um país com dimensão continental como o Brasil, para que os atletas tenham tempo suficiente para descansar e treinar, auxiliando a diminuir os riscos de lesões, e também aumentando o nível técnico das equipes, principalmente das que possuem elencos mais reduzidos; entre vários outros aspectos que poderiam ser pensados para aumentar o interesse do público e a qualidade do futebol brasileiro.

Enfim, são essas as principais atitudes e providências que, se entendidas e seguidas, certamente ajudarão a resgatar, nos próximos anos, o nosso orgulho e a admiração pelo jeito brasileiro de jogar futebol, trazendo de volta o nosso “jogo bonito”.

João Paulo S. Medina

Fundador da Universidade do Futebol

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Comportamento Organizacional Aplicado à Gestão de Clubes de Futebol: Uma Perspectiva Estratégica

A gestão eficaz de qualquer entidade é uma tarefa extremamente complexa e traz vários elementos e estratégias essenciais ao sucesso. Podemos chegar a um consenso de que, independentemente do objeto da instituição, saber gerenciar os recursos aplicados em mão de obra para o negócio, estabelecer um ambiente propício à ótima atuação dos profissionais, motivando-os a dar o seu melhor e, principalmente, saber organizar as relações humanas ali estabelecidas, são tarefas e desafios fundamentais a todo gestor que deseja ter sucesso em sua atuação profissional.

Nos clubes de futebol, não é diferente. É observável a presença marcante de características ecléticas entre os profissionais envolvidos neste ambiente. Podemos elencar por alto profissionais de diferentes áreas, com distintas formações (profissionais da saúde, educadores físicos, advogados, gestores, ex-atletas, atletas etc.), com origens culturais diversas, muitas vezes com características educacionais geográficas distintas, além de possuírem relações diversas com o clube (Estatutários, Terceirizados, P.J., CLT, Contratos Especiais de trabalho desportivo etc.). Esta vasta diversidade gera uma riqueza potencial intelectual grandiosa para a instituição, mas também vários desafios advindos das relações humanas e profissionais ali estabelecidas. Não é difícil encontrar clubes, ou até empresas em geral, que tratam tal gestão citada de maneira muito superficial e pouco reflexiva, sendo materializada através da construção de um organograma e a criação de um setor responsável por processos seletivos, controle de folha de ponto e demissão, mesmo sendo sua importância estratégica conhecida por todos envolvidos na instituição.

Que fique claro, entendemos a importância da apresentação visual da estrutura através do organograma e não estamos aqui para julgar práticas gerenciais encontradas no mercado, mas temos como obrigação refletir se tais ferramentas e mecanismos são suficientes para gerar um ambiente otimizado de ganhos para a instituição.

Diante disso, clubes de futebol, independentemente de sua personalidade jurídica ou tamanho da instituição, devem ter uma compreensão aprofundada das interações humanas, estrutura organizacional e dinâmicas de grupo, elementos centrais do campo do Comportamento Organizacional. Com a introdução da terminologia citada, apesar de não ser este o objetivo central do texto, vale uma diferenciação, com intuito de evitar confusão em nomenclatura, sobre a diferença entre Comportamento Organizacional, Cultura Organizacional e Gestão Organizacional. Podemos definir, segundo Robbins (2020), Comportamento Organizacional como a área de estudo do comportamento humano dentro de uma organização, isso inclui a maneira como os indivíduos se comportam, interagem e se relacionam no ambiente de trabalho. Já a Cultura Organizacional refere-se ao conjunto de valores, crenças, normas, símbolos e práticas compartilhadas pelos membros de uma organização. A cultura organizacional molda a maneira como as pessoas dentro da organização pensam, agem e percebem o ambiente de trabalho. E por fim, Gestão Organizacional refere-se aos processos e práticas utilizados para coordenar e direcionar os recursos humanos, financeiros, tecnológicos e materiais de uma organização para alcançar seus objetivos. Isso envolve planejamento, organização, liderança e controle das atividades organizacionais.

É claro para todos os leitores e consenso entre os gestores que estratégias de liderança efetiva e gestão de ambiente são elementos cruciais para o sucesso da gestão organizacional de uma instituição. Contudo, isso daria conteúdo suficiente para outro texto. Por hora vamos nos atentar em como criar uma estrutura organizacional eficaz dentro de uma instituição desportiva.

Uma Estrutura organizacional define como são formalmente divididas, agrupadas e coordenadas as tarefas, atribuições e cargos da instituição. Existem seis elementos fundamentais que os administradores deveriam considerar quando projetam a estrutura de suas organizações, sendo cada um deles um ponto central para responder uma questão estrutural importante: 01 – ESPECIALIZAÇÃO DO TRABALHO (Em que medida as tarefas são subdivididas em cargos distintos?); 02 – DEPARTAMENTALIZAÇÃO (Em que base os trabalhos serão agrupados?); 03 – CADEIA DE COMANDO (A quem se reportam os indivíduos e os grupos?); 04 – MARGEM DE CONTROLE (Quantos indivíduos e como funcionará o comando dos gerentes com eficiência e eficácia?); 05 – CENTRALIZAÇÃO E DESCENTRALIZAÇÃO (Em que reside a autoridade para tomada de decisões?); 06 – FORMALIZAÇÃO (Em que medida haverá regras e regulamentos para comandar os funcionários e gerentes?). Vamos tentar aprofundar em cada um deles.

01 – ESPECIALIZAÇÃO DO TRABALHO.

No início do século XX, Henry Ford ficou rico e famoso ao instituir o modelo de linha de montagem móvel em suas fábricas automotivas, inspirado no desenvolvimento de Honoré Blanc que resultou, em 1778, no uso de partes intercambiáveis no processo de produção de armas. A cada trabalhador era designada uma tarefa muito específica e repetitiva. Por exemplo, um profissional ficaria responsável por montar as rodas dianteiras, outro por instalar as rodas e outro por apertar os parafusos. Dividindo os trabalhos em pequenas tarefas padronizadas, sendo repetidamente executadas, a Ford revolucionou os meios de produção e foi capaz de desenvolver seus produtos, os carros, em um ritmo relativamente veloz, ainda que usando profissionais com qualificações limitadas.

Este exemplo foi pioneiro na construção de um entendimento administrativo que, mesmo tendo mão de obra relativamente limitada em suas qualificações e consequentemente mais baratas, o trabalho poderia ser executado de maneira mais eficaz se permitisse que o profissional responsável se especializasse nesta atividade específica. Este conceito hoje é denominado de Especialização do trabalho, ou divisão do trabalho, em suma tem por princípio descrever o grau em que as tarefas na organização são subdivididas em cargos distintos.

A essência da especialização do trabalho é que uma ação profissional completa não é executada por apenas um indivíduo, sendo dividida em etapas, onde cada uma é executada por uma pessoa diferente, trazendo os ganhos do meio de produção. Então ficou fácil, mecanizando a atividade profissional da minha estrutura organizacional eu consigo ter eficiência e economicidade nos meios de produção. Não é tão simples. Durante a metade do século XX, empresas consideraram a especialização do trabalho como uma fonte inesgotável de aumento de produtividade. E provavelmente isso era verdade. Mas por volta do início dos anos 1960, tornava-se cada vez mais evidente que tal especialização trazia consequências aos empregados que poderiam não somente impactar na vida pessoal destes atores (que os administradores mais preocupados com indicadores de produção e sociocomportamentais de seus colaboradores podem querer levar em consideração), mas também impactavam diretamente nos ganhos de produtividade e até gerar custos econômicos à empresa maiores do que os ganhos de produtividade (que os administradores mais preocupados com indicadores econômicos podem querer levar em consideração). A verdade é que tal especialização do trabalho aplicado de maneira intensa gera uma “deseconomia humana” advinda da especialização, como monotonia, fadiga, tensão, baixa produtividade, baixa qualidade, maior absenteísmo e maior rotatividade. Fato é que tal tema deve ser dosado de maneira efetiva para trazer ganhos e evitar problemas dentro da estrutura.

Trazendo ao cenário futebolístico, pode ser observado na estruturação de diversos departamentos com eixos temáticos específicos, e até profissionais dentro dos departamentos com funções especializadas. Nesse cenário, diferentes profissionais se especializam em áreas específicas para otimizar o desempenho da equipe. Por exemplo, dentro da comissão técnica, temos diversos cargos com atribuições e pré-requisitos de áreas específicas do conhecimento, executando funções distintas na estrutura. A especialização do trabalho neste contexto permite uma divisão eficiente de responsabilidades e competências, resultando em um funcionamento mais eficaz e uma melhor performance esportiva.

Entretanto, é importante considerar que embora a especialização possa aumentar a eficiência em tarefas específicas, ela também pode levar à monotonia e à falta de motivação para os trabalhadores. Além disso, uma excessiva divisão do trabalho pode resultar em falta de compreensão do quadro geral, na perda da capacidade de adaptação a novas situações e, principalmente, na perda da rica possibilidade de construção conjunta de demandas complexas advindas do setor. Portanto, é essencial equilibrar a especialização com oportunidades para o desenvolvimento de habilidades multifuncionais e a promoção de um ambiente de trabalho que incentive a criatividade, o aprendizado contínuo e o bem-estar dos colaboradores.

02 – DEPARTAMENTALIZAÇÃO.

Uma vez determinados os cargos, suas atribuições e seus pré-requisitos, pela especialização do trabalho, é preciso agrupá-los de forma que as tarefas comuns possam ser coordenadas. O conceito por trás desta base na qual os cargos são agrupados é chamado de Departamentalização. Apesar de historicamente, termos de modo mais difundido o agrupamento das atividades pela função desempenhada, temos vários conceitos a serem levados em consideração para esta atuação. Vamos passar por eles:

  • Departamentalização Funcional: Este método envolve agrupar atividades e funções semelhantes em departamentos distintos. Por exemplo, um clube de futebol pode ter departamentos funcionais dedicados à gestão de recursos humanos, finanças, marketing e operações. Cada departamento é liderado por um gestor funcional com conhecimentos especializados na área;
  • Departamentalização por Produto: Nesse método, as atividades são agrupadas com base nos produtos ou serviços oferecidos pela organização. Por exemplo, um clube de futebol que possui equipes de futebol masculino e feminino pode ter departamentos separados para cada equipe, cada um focado nas necessidades específicas de seu produto (ou seja, a equipe de futebol masculino e a equipe de futebol feminino). Podemos expandir para a diversidade de modalidades e até para manifestações que o clube porventura explore em cada uma delas;
  • Departamentalização Geográfica: Aqui, as atividades são agrupadas com base na localização geográfica e território. Por exemplo, um clube de futebol que possui filiais, sucursais ou até interesse em implementar vários centros de iniciação ou captação, por exemplo, em diferentes cidades ou países pode optar por departamentalizar suas operações de acordo com essas localizações geográficas. Cada localização pode ter seu próprio departamento responsável por gerenciar as atividades específicas relacionadas àquela região. Confesso que desconheço a estrutura organizacional aplicada ao grupo City, Red Bull ou outros exemplos de clubes com equipes em diversos países, mas acredito ser uma boa representação deste tópico;
  • Departamentalização por Processo: neste método, as atividades são agrupadas com base nos processos ou fluxos de trabalho envolvidos na produção de bens ou serviços. Por exemplo, um clube de futebol pode ter departamentos dedicados a diferentes processos, como recrutamento de jogadores, desenvolvimento de talentos, preparação física, treinamento tático e análise de desempenho;
  • Departamentalização por Cliente: Aqui, as atividades são agrupadas com base nos diferentes tipos de clientes atendidos pela organização. Por exemplo, um clube de futebol pode ter departamentos separados para lidar com diferentes categorias de clientes, como torcedores, patrocinadores corporativos, parceiros comerciais e membros do clube.

Grandes organizações, que possuem sucesso em sua atividade, costumam combinar diversas destas formas de departamentalização e criar estratégias de relações intersetoriais na prática profissional, mas isso é tema para apresentarmos mais à frente.

03 – CADEIA DE COMANDO.

A cadeia de comando é uma linha contínua de autoridade, que se estende do topo da organização até níveis mais operacionais, indicando quem reporta a quem e quem tem autoridade sobre quem.

É impossível discutir cadeia de comando sem refletirmos sobre dois conceitos complementares: Autoridade e unidade de comando. Autoridade diz respeito aos direitos inerentes a uma posição de dirigir e ordenar ações a seus comandados. Já o princípio da Unidade de comando ajuda a preservar o conceito de uma linha contínua de autoridades.

Outro conceito fundamental para adotarmos dentro desta reflexão seria de liderança efetiva e como organizar o fluxo de cadeia de comando sobre as atribuições e expectativas referentes ao perfil da execução do cargo proposto, considerando fatores situacionais (Tamanho do grupo, pressão de tempo, Maturidade dos comandados), Características dos liderados (Dependentes / Autônomos), Qualidades do líder (Empatia / Comunicação), Estilo de liderança (Autocrático / Democrático), Fontes de poder (Coerção, conexão, recompensa, legitimidade, referência, informação, competência), entre outros fatores importantes para determinar estratégias efetivas de liderança e na cadeia de comando. Mas como já dito, pretendo dedicar um texto exclusivamente a este tema.

Trazendo este conceito ao cenário temático do texto, temos muitos elementos importantes e específicos que, quem já atuou dentro de um clube sabe muito bem que são desafios reais. Como dito, uma estrutura grande, com grande diversidade e muito suscetível a vaidade pessoal dos atores envolvidos, traz desafios complexos de como estabelecer uma cadeia de comando efetiva, delimitando autoridade, estabelecendo unidade de comando e desenhando estratégias de liderança efetiva.

Para isso, é importante ter clareza sobre elementos políticos, culturais, históricos, econômicos e individuais da instituição, analisando stakeholders internos e externos, para tentar entender como o relacionamento entre estes profissionais funciona historicamente na instituição e como podemos criar fluxos a fim de otimizar os processos.

Pode parecer superficial, mas esta decisão é muito estratégica ao clube e pode ser decisiva para processos de prevenção de problemas graves e como mecanismos de Gestão de Riscos. Um exemplo claro é entendermos como os diretores executivos e estatutários se relacionam dentro da instituição, qual a legitimidade de poder atribuído e suas devidas responsabilidades de prestação de conta e a quem devem relatar os indicadores de desempenho de seu setor. Outro exemplo ilustrativo que já vivenciei muitos problemas em instituições que adotavam estratégias distintas ao setor, é entender como o departamento/setor responsável pela comunicação externa está localizado dentro da cadeia de comando. Reporta a uma diretoria de marketing? a diretoria de futebol? possui uma diretoria própria? eles quem determinam os stakeholders internos a dar entrevistas pós jogo? Como decidem isso? Eles que estabelecem estratégias de Midia Training? Este exemplo mostra o quão complexo é esta decisão e, como isso pode impactar diretamente no dia a dia do clube.

04 – MARGEM DE CONTROLE.

A margem de controle refere-se ao número de subordinados que um gestor pode ou consegue supervisionar efetivamente. Isso impacta na construção dos níveis hierárquicos e na quantidade de gerentes necessários para conduzir as atividades, tendo uma relação direta com a quantidade de profissionais e os impactos orçamentários, os quais estão intimamente ligados à eficiência produtiva da instituição. Este conceito é particularmente relevante para estruturas que lidam com a produção de bens ou serviços. No contexto da gestão de um clube de futebol, a aplicação desse conceito pode ser observada na estruturação da equipe técnica e administrativa do clube.

Por exemplo, considere um clube de futebol que conta com um treinador principal, um diretor de futebol e diferentes departamentos, como o departamento técnico, o departamento de marketing e o departamento financeiro, entre outros. Cada um desses líderes possui uma margem de controle que determina quantos subordinados eles podem supervisionar eficazmente.

Portanto, é crucial para a gestão do clube de futebol encontrar um equilíbrio adequado entre o número de líderes e subordinados em cada nível da organização, levando em consideração a capacidade de supervisão efetiva de cada gerente. Isso garantirá uma comunicação clara, uma coordenação eficiente, um monitoramento eficaz e um desempenho máximo em todas as áreas do clube.

05 – CENTRALIZAÇÃO E DESCENTRALIZAÇÃO.

Em algumas empresas, a alta administração toma todas as decisões, enquanto os gerentes de nível operacional meramente executam as diretrizes. No entanto, o oposto também é visível em organizações onde a tomada de decisões é transferida para gerentes mais próximos da ação ou deliberada entre vários profissionais.

Este fenômeno descrito ilustra o conceito agora abordado neste texto. Podemos conceituar o termo “centralização” como o grau em que a tomada de decisões está concentrada em um único ponto da organização, e “descentralização” quando o processo de tomada de decisão é formalmente atribuído a diferentes níveis da instituição, ou até mesmo quando são criados órgãos colegiados deliberativos para tal fim.

No contexto da gestão de um clube de futebol, esses conceitos podem ser aplicados de várias maneiras, dependendo das necessidades, objetivos, tamanho e estratégia do clube.

Vamos considerar exemplos práticos de centralização e descentralização comumente observados na gestão de um clube de futebol:

Tomada de Decisão Financeira: Em um clube de futebol centralizado, todas as decisões financeiras importantes, como orçamento anual, investimentos em jogadores e contratos de patrocínio, são tomadas pela diretoria executiva ou pelo presidente do clube. Pouca ou nenhuma autonomia é concedida a outros membros da equipe de gestão ou departamentos.

Modelo de jogo O treinador principal pode adotar uma abordagem centralizada na definição dos Princípio Táticos Específicos utilizados no modelo de jogo, bem como suas alterações estratégicas dedicadas a confrontos com adversários específicos. Ele pode tomar todas as decisões relacionadas à formação da equipe, Sistema de jogo, Estratégia de Jogo, Modelo de Jogo e substituições durante as partidas, sem delegar muita autoridade para sua equipe técnica. Esta decisão pode ser imposta de maneira centralizada pelo clube, tendo o diretor executivo estabelecendo um Modelo de Jogo padrão ao clube, devendo ser adotado por todos os treinadores das categorias de base, por exemplo.

Tomada de Decisão nos Departamentos: Em um clube de futebol descentralizado, a autoridade de tomada de decisão pode ser distribuída entre os diferentes departamentos. Por exemplo, o diretor de futebol pode ter autonomia para tomar decisões relacionadas ao recrutamento de jogadores e contratação de membros da equipe técnica, enquanto o diretor de marketing pode ter autonomia para decidir sobre estratégias de marketing e parcerias comerciais.

Identificação de Talentos: A descentralização também pode ser aplicada no processo de captação e identificação de talentos dentro das categorias de base do clube. Os profissionais das categorias de base podem formar um comitê para avaliar os atletas e decidir em conjunto quais jogadores continuarão e quais serão dispensados. Essa abordagem também pode ser aplicada à dispensa de jogadores do elenco principal.

Em resumo, a centralização e descentralização na gestão de um clube de futebol afetam a distribuição de autoridade e responsabilidade dentro da organização. Essa estrutura organizacional estratégica impacta diretamente o poder atribuído a determinados cargos e a eficiência/velocidade na resolução dos problemas do dia a dia, sendo essencial na construção da estrutura organizacional da instituição. A escolha entre os dois depende das preferências, cultura organizacional e objetivos estratégicos do clube, bem como das necessidades específicas de cada departamento e área de atuação.

06 – FORMALIZAÇÃO.

O conceito de formalização diz respeito ao grau em que as atividades, procedimentos e responsabilidades são claramente definidos e documentados em uma organização. No contexto da gestão de um clube de futebol, a formalização pode ser aplicada em várias áreas para garantir a consistência, a eficiência e a transparência das operações.

Dentro da estrutura organizacional de um clube, é essencial atribuir responsabilidades a cargos específicos e estabelecer processos e fluxogramas bem definidos com o intuito de formalizar as atividades práticas do clube. Isso envolve elaborar e implementar políticas e procedimentos em diversas áreas:

  1. Contratos de Jogadores: O clube pode instituir procedimentos formais para a contratação e renovação de contratos de jogadores. Isso inclui definir claramente os termos e condições dos contratos, os procedimentos para negociação salarial, bônus por desempenho, cláusulas de rescisão, entre outros aspectos. A formalização desses processos ajuda a garantir que todas as partes envolvidas estejam cientes de suas responsabilidades e que os contratos sejam executados de maneira justa e transparente.
  2. Políticas de Recrutamento de Talentos: O clube pode estabelecer políticas formais para o recrutamento de talentos, especificando critérios de seleção de jogadores, métodos de avaliação, procedimentos de monitoramento e canais de comunicação com agentes e clubes parceiros. Isso assegura que o processo de recrutamento seja consistente e baseado em critérios objetivos, minimizando o risco de favoritismo ou arbitrariedade na seleção de jogadores.
  3. Procedimentos de Treinamento e Desenvolvimento: O clube pode desenvolver procedimentos formalizados para o treinamento e desenvolvimento dos jogadores, incluindo cronogramas de sessões de ensino-aprendizagem-treinamento, planos individuais de desenvolvimento, métodos de avaliação de desempenho e protocolos médicos. A formalização desses procedimentos ajuda a garantir que todos os jogadores recebam o suporte necessário para alcançar seu potencial máximo e minimiza o risco de lesões ou sobrecarga.
  4. Políticas Financeiras e Orçamentárias: O clube pode estabelecer políticas formais relacionadas à gestão financeira, como orçamentos anuais, controles de despesas, políticas de investimento e relatórios financeiros. Isso contribui para garantir a transparência e a responsabilidade na gestão dos recursos financeiros do clube, protegendo contra o mau uso ou desperdício de fundos.

Em suma, a formalização na gestão de um clube de futebol envolve a criação e implementação de políticas, procedimentos e documentação claramente definidos em diversas áreas da operação do clube. Isso promove a consistência, eficiência e transparência nas atividades do clube, contribuindo para o seu sucesso a longo prazo.

CONCLUSÃO

Para finalizarmos, vamos apresentar brevemente outro assunto que, apesar de complementar os temas já descritos, vale um texto próprio e este é o objetivo deste autor. Na construção da estrutura organizacional, considerando os 06 elementos fundamentais citados, podemos apresentar 07 tipos de estruturas organizacionais, segundo Robbins (2003), sendo eles:

  1. Estrutura Simples: É caracterizada por uma autoridade centralizada em uma única pessoa, geralmente o fundador ou líder da organização. As linhas de comunicação são simples e diretas, com poucas camadas hierárquicas. Decisões são tomadas de forma rápida e flexível, mas pode haver falta de formalidade e de processos claros.
  2. A Burocracia: Baseia-se em regras e regulamentos formais, com uma hierarquia clara de autoridade. As tarefas são divididas de forma especializada e as decisões são tomadas de acordo com procedimentos estabelecidos. A burocracia é conhecida por sua eficiência e previsibilidade, mas pode ser lenta para se adaptar a mudanças e propensa à rigidez.
  3. A Estrutura Matricial: Combina características de departamentalização funcional e por projetos. Os funcionários reportam a dois supervisores: um funcional, para assuntos relacionados à especialização técnica, e outro por projeto, para questões específicas do projeto em que estão envolvidos. Isso permite uma melhor coordenação entre diferentes áreas da organização, mas pode gerar conflitos de autoridade.
  4. Estrutura Baseada em equipes: Organização na qual as equipes multifuncionais têm papel central. As equipes são responsáveis por completar tarefas e alcançar metas específicas, com membros com habilidades complementares. A estrutura é flexível e promove a colaboração, mas pode haver dificuldades na coordenação e comunicação entre as equipes.
  5. Unidades internas autônomas: Caracteriza-se pela divisão da organização em unidades autônomas, cada uma responsável por suas próprias funções e decisões. Cada unidade opera como uma entidade separada, com sua própria estrutura e recursos. Isso pode aumentar a agilidade e a inovação, mas pode levar a problemas de coordenação e coesão organizacional.
  6. A Organização Virtual: É uma estrutura flexível e descentralizada, na qual os funcionários trabalham remotamente, muitas vezes usando tecnologias de comunicação online. A organização virtual permite uma maior flexibilidade e redução de custos, mas pode desafiar a coesão da equipe e a comunicação eficaz.
  7. A organização sem Fronteira: Refere-se a uma estrutura organizacional que transcende fronteiras geográficas, culturais e funcionais. Ela enfatiza a colaboração global, a integração de diferentes unidades e a flexibilidade para se adaptar a um ambiente globalizado. Essa estrutura promove a inovação e a diversidade, mas pode enfrentar desafios na coordenação e comunicação entre unidades dispersas.

A gestão eficaz de clubes de futebol requer uma compreensão profunda do comportamento organizacional e uma perspectiva estratégica. O texto destaca a importância de gerenciar recursos humanos, criar um ambiente propício ao desempenho dos profissionais e organizar as relações humanas de forma eficaz. Em um ambiente tão diversificado como o dos clubes de futebol, com profissionais de diferentes origens e áreas de atuação, esses desafios são ainda mais pronunciados.

O texto delineia conceitos-chave, como especialização do trabalho, departamentalização, cadeia de comando, margem de controle, centralização e descentralização, e formalização, todos fundamentais na construção de uma estrutura organizacional eficaz. Cada um desses elementos desempenha um papel crucial na definição das responsabilidades, autoridades e fluxos de comunicação dentro da organização. Além disso, são apresentados sete tipos de estruturas organizacionais, desde a estrutura simples até a organização sem fronteiras, cada uma com suas próprias características e desafios. A compreensão desses modelos pode orientar os gestores na escolha da estrutura mais adequada para o contexto específico do clube de futebol, levando em consideração suas necessidades, objetivos e cultura organizacional.

Por fim, se meu amigo leitor sair deste texto entendendo a importância de uma abordagem estratégica e reflexiva na gestão de clubes de futebol, reconhecendo a complexidade do ambiente e a necessidade de considerar uma variedade de fatores ao tomar decisões organizacionais, teremos alcançado nosso objetivo ao escreve-lo. Ao adotar uma perspectiva fundamentada no comportamento organizacional e na estratégia, os gestores estarão mais bem preparados para enfrentar os desafios e aproveitar as oportunidades que surgem no cenário do futebol profissional.

Até a próxima e bom jogo a todos!!!

Fontes:
“Comportamento Organizacional” – Stephen P. Robbins (2020)
“A verdade sobre gerenciar pessoas: … e nada mais que a verdade” – Stephen P. Robbins (2003)

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Audiência pública debate fortalecimento do futebol de base

Estudo do Movimento Progresso Futebol de Base norteou evento, requerido pelo deputado Bandeira de Mello, com temas urgentes para fortalecimento do setor

A Comissão do Esporte da Câmara dos Deputados realizou audiência pública, na última terça-feira (14), em Brasília, para debater a criação de políticas e programas que não só incentivem o desenvolvimento do futebol brasileiro como também apoiem os clubes formadores. A audiência foi proposta pelo deputado federal Bandeira de Mello (RJ) e teve a participação de representantes da Universidade do Futebol, da Confederação Brasileira de Futebol (CBF), da Federação Paulista de Futebol (FPF), do Ministério do Esporte, do Pacto pelo Esporte, da Associação Brasileira de Executivos de Futebol (ABEX) e da SIGA (Sport Integrity Global Alliance).

Audiência Pública realizada no dia 14/05, pela Frente Parlamentar de Modernização do Futebol. Na foto (da esq. para dir.): Edgar Montemor (ABEX); Daniela Castro (Pacto pelo Esporte); Heloisa Rios (Universidade do Futebol); Eduardo Bandeira de Mello (Dep. Federal); Athirson Mazolli (Ministério do Esporte); Mauro Silva (Federação Paulista de Futebol); Ênio Gualberto (CBF).

Para subsidiar a audiência, foram apresentados resultados da primeira etapa do Movimento Progresso Futebol de Base, iniciativa da Universidade do Futebol, com apoio  da Alvarez & Marsal, que reuniu mais de 100 pessoas em sete grupos de trabalho para pensar temas sensíveis e urgentes do futebol de base como a formação integral dos atletas, a garantia de seus direitos e deveres, o futebol feminino, uso de dados do futebol e gestão do futebol de base, a qualidade e essência do futebol brasileiro, a educação em jogo, para citar alguns.

2 eventos do Progresso Futebol de Base, o de cima sediado no CT do Sfera FC, em Jarinú, e o de baixo sediado no CT do São Paulo FC, em Cotia.

Os grupos são compostos por entidades, federações, representantes de clubes e profissionais de diversas áreas do conhecimento. “Queremos transformar o cenário do futebol brasileiro a partir da sua base. Desde ano passado, nosso movimento investiu em estudos, conteúdos inovadores, trocas de boas práticas e fizemos levantamentos das demandas que precisam da intervenção do estado, porque ultrapassam as ações que as entidades privadas podem proporcionar. Vamos apresentar demandas que precisam urgentemente da atenção e ação do poder público”, afirma Heloisa Rios, CEO da Universidade do Futebol.

Rios reflete que o pilar da transformação do futebol passa pela base. Os players do futebol precisam se debruçar para entender os desafios, o que ainda não está funcionando, para transformar essa realidade. “Por isso a importância de unir todo o ecossistema do futebol para formar uma base mais forte e sólida em que tenhamos o desenvolvimento humano como prioridade. Sabemos que menos de 2% de quem está no futebol de base chega ao time principal, mas e os outros 98% que não se chegam lá? Estamos interessados no 100%”, completa.

Heloisa Rios, na audiência pública do dia 14/05, que resultou na abertura de Grupo de Trabalho Interdisciplinar para o desenvolvimento e proteção dos jovens e categorias de base do futebol brasileiro.

O Progresso Futebol de Base tem participado ativamente dos trabalhos da Frente Parlamentar pela Modernização do Futebol, liderada pelo deputado Bandeira de Mello. “Nosso movimento é responsável por alimentar e estar à frente de ações e investigação de tudo que é relacionado ao futebol de base. Levaremos à audiência a necessidade de mais pesquisas e da transformação que vários players precisam e desejam para o futebol de base e não conseguem realizar porque é necessária a ajuda do estado”, concluiu o deputado antes de a audiência ocorrer.

Deputado Eduardo Bandeira de Mello, líder da Frente Parlamentar pela Modernização do Futebol
Progresso Futebol de Base

O programa, que nasceu da necessidade de transformar o cenário do futebol brasileiro desde a sua base, tem uma visão de longo prazo, prevista para os próximos sete anos, para desenvolver uma estratégia para a transformação do futebol brasileiro a partir de suas bases, colocando a formação integral dos jovens atletas no centro de tudo.

São premissas do programa, criar valor para o futebol de base no curto, médio e longo prazos; fortalecer a rede de relacionamento e cooperação dos profissionais pelo compartilhamento e conhecimento na gestão da base e práticas na formação integral dos atletas, além de potencializar a representatividade e o impacto dos clubes formadores.

O Progresso Futebol de Base prevê, ainda, ações como missões nacionais e internacionais, intensificação das trocas de experiência, criação de conteúdos relevantes, estabelecimento de grupos permanentes de estudos e compartilhamento contínuo de boas práticas.

AGENDA:

Audiência Pública Comissão do Esporte Câmara dos Deputados

Dia: 14/05, das 9h às 11h

Local: Anexo II, Ala C, Sala 2, Térreo, Palácio do Congresso Nacional

Para mais informações e entrevistas:

Rede Comunicação

Eliana Fonseca

(31) 99581-8452

ASSISTA AO VÍDEO DA AUDIÊNCIA PÚBLICA

CLIQUE AQUI PARA ASSISTIR

CLIQUE AQUI PARA TER ACESSO À AUDIÊNCIA PÚBLICA POR TEMAS DISCUTIDOS

REPERCUSSÃO DA AUDIÊNCIA EM ALGUNS VEÍCULOS DE MÍDIA

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Rasgando a declaração dos direitos da criança

João Batista Freire & Rafael Castellani

Assistimos recentemente a um vídeo em que alguns pais vaiavam um garotinho de uns seis anos, aproximadamente, porque ele, brincando de ser goleiro durante um jogo entre crianças, tomou um gol. Cenas como essa, lamentavelmente, são mais frequentes do que imaginamos.   

No decorrer de nossa trajetória profissional, de décadas, como professores de Educação Física, lidando com a formação, acadêmica e cidadã, de jovens na Universidade, de crianças em escolas da educação básica e escolas de esporte, de jovens esportistas e com treinamento de alto rendimento em diversas modalidades, principalmente no futebol, cansamos de assistir cenas semelhantes às do vídeo em que o garotinho é vaiado. São cenas de humilhação e de abuso.

Crianças são frequentemente abusadas no esporte, ou porque são humilhadas, ou porque são submetidas a treinamentos exaustivos e de especialização precocemente, ou porque passam a ser responsáveis, desde muito cedo, pelo sustento da família, ou porque são agredidas verbalmente por pais, professores, técnicos, torcida.

São inúmeras as situações presenciadas por nós que denotam o quão abusiva e humilhante é, ou pode ser, a prática esportiva realizada por crianças e jovens: O que pensar quando um pai pula o alambrado e invade o campo para bater em uma criança que tinha feito uma falta no filho dele?  Por sorte esse pai foi contido a tempo por algumas pessoas com juízo, mas a violência já estava manifestada. Ou então, outro fato muito frequente, vaias e xingamentos de alguns pais contra o professor das crianças ou até contra as próprias crianças da equipe adversária.

Em 24 de setembro de 1990 o Brasil ratificou a Convenção Sobre os Direitos da Criança, que foi adotada pela Assembleia Geral da ONU em 20 de novembro de 1989. No artigo 31 dessa convenção, lê-se que “Os Estados Partes reconhecem o direito da criança ao descanso e ao lazer, ao divertimento e às atividades recreativas próprias da idade, bem como à livre participação na vida cultural e artística.” (O Brasil é um Estado Parte). No Artigo 32, a Convenção declara que “Os Estados Partes reconhecem o direito da criança de ser protegida contra a exploração econômica e contra a realização de qualquer trabalho que possa ser perigoso ou interferir em sua educação, ou que seja prejudicial para sua saúde ou para seu desenvolvimento físico, mental, espiritual, moral ou social.”

Em nosso país, ratificamos solenemente a convenção, mas, na prática, pouco se fez. Em 1990 criamos no Brasil o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) e, apesar da sua importância e do avanço que significou para a proteção de crianças e adolescentes, ainda são diariamente desrespeitados, passam fome, morrem de doenças que não deveriam mais existir, recebem educação de péssima qualidade, meninos e meninas (principalmente) são violentadas dentro das próprias famílias. Tivemos avanços, sem dúvidas, mas o prejuízo ainda é gigantesco. Já não se permite mais o trabalho antes dos 16 anos (embora ele exista em alguns lugares), mas, no esporte, é diferente. No futebol, por exemplo, uma criança de 14 anos, ou menos, pode ser submetida a treinamentos quase idênticos aos que realizam atletas profissionais adultos. Para dar conta das inúmeras sessões de treinamentos e competições, perdem dias, semanas e até meses de aulas. Crianças de 14 anos deixam suas residências, seus familiares e amigos para morar em alojamentos dos clubes com a missão de representar aqueles poucos (cerca de 3%) que conseguem a profissionalização no futebol. Antes mesmo dos 14 anos, algumas crianças arcam com a responsabilidade de garantir o sustento da família e alimentam a esperança de ascensão social. Crianças que possuem o sonho de tornar-se jogador ou jogadora profissional de futebol, podem sofrer abusos (inclusive, sexuais) no ambiente nem sempre confiável e seguro do futebol. Geralmente silenciam sua dor e escondem seu sofrimento com medo de terem que interromper esse sonho ou frustrarem seus familiares. 

Um futebol que foi forjado em brincadeiras de rua, nos clubes proíbe a brincadeira, em nítido desrespeito à convenção da ONU ratificada pelo Brasil. Cada vez mais cedo ocorre a especialização esportiva. Já existe a categoria de crianças de 6 anos de idade (sub 7). Daqui a pouco sub-6, 5, 4… aonde chegaremos? Há projetos em análise que diminuem para 12 anos a idade mínima para uma criança poder alojar-se em clubes. Contratos são feitos clandestinamente com as famílias para garantir aos agentes a exclusividade dos negócios, caso a criança se torne jogadora habilidosa e tenha seu potencial reconhecido no mundo do futebol.

No futebol brasileiro, criança não pode ser criança. Aquilo que foi escrito na Convenção Sobre os Direitos da Criança da ONU foi rasgado e jogado no lixo. Deveria ser um caso para o Ministério Público (MP), Conselho Tutelar, Unicef, não só no futebol, mas em qualquer modalidade esportiva. Com raras exceções, sobretudo a partir de denúncias grandes/graves e de viés jornalístico, MP, Conselho Tutelar e demais instâncias responsáveis por garantir a segurança e direitos das crianças e adolescentes pouco têm conseguido fazer.               

Sem contar a estupidez dos métodos. Professores e treinadores, alimentados pelo ego e orgulho de “revelar” grandes talentos, impulsionados por alguns agentes inescrupulosos, adestram pequenas crianças para que alimentem os lucros dos gananciosos que, sem qualquer pudor, arrancam o couro dos pequenos e pequenas, sugam-lhes as entranhas em busca do ouro que elas podem representar alguns anos adiante. É preciso que tratemos as crianças como crianças. Que devolvamos o jogo a elas. Que possam voltar a brincar e se divertir com o futebol e, acima de tudo, que sejam respeitadas e tenham os seus direitos garantidos.

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A “pedagogia da fila” em escolas de futebol

Rafael Castellani & João Batista Freire

Cansamo-nos de ler reportagens, artigos e comentários sobre o fim do futebol brasileiro, aquele futebol que conquistou o mundo por cinco vezes e em tantas outras o encantou, e que se parecia com os jogos de bola nas ruas e campinhos brasileiros. As pessoas falam sobre isso como se não houvesse uma razão para o fim do futebol que tanto fascinou o mundo todo. E quando essas pessoas se tornam responsáveis por ensinar futebol às crianças e adolescentes, quer seja nas chamadas Escolas de Futebol, projetos sociais ou nas equipes de base dos clubes profissionais, não sabem ou não querem que seus alunos aprendam a jogar futebol do mesmo modo como aprenderam nossos maiores craques.

Uma rápida caminhada pelas ruas é suficiente para ver que em muitos dos espaços onde, anos atrás, as crianças brincavam de futebol, quais sejam, os campinhos de várzea, as praças e as próprias ruas, atualmente vê-se escolas de esporte, as famosas “escolinhas” de futebol, com seus campos de grama sintética e mensalidades, muitas vezes, exorbitantes. Onde havia crianças se divertindo, driblando umas às outras, fazendo tabelinhas e gols, hoje há crianças em fila, esperando sua vez de driblar cones.   

Já falamos em textos anteriores sobre a “A diferença entre driblar e fintar um cone e uma pessoa”. Nosso objetivo, neste texto, é abordar as frequentes filas nas quais crianças e jovens aguardam sua vez para tocar e brincar com a bola. É impensável para nós, que apreciamos um futebol lúdico, livre e criativo, que professores/treinadores ainda tenham a fila como, praticamente, a base de sua pedagogia.

A fila, recurso pedagógico muito utilizado, inclusive, em escolas de educação formal, nos ciclos iniciais (Infantil e fundamental 1), é predominante em escolas de futebol e projetos sociais. Ao colocar seus alunos (e atletas) em filas, professores e treinadores buscam manter o controle sobre eles, garantindo uma determinada organização. Pretendem manter, a todo custo, a disciplina de seus alunos/atletas. Enquanto isso, crianças que vão às escolas de futebol para “brincar de bola”, aguardam ansiosamente o momento para tê-la aos seus pés, mesmo que por poucos segundos.   Há, certamente, ocasiões em que filas são necessárias. Reconhecemos que não é fácil manter uma disciplina mínima entre os alunos quando se trata de uma quantidade grande deles em uma turma. Porém, se for absolutamente necessário manter filas, que elas sejam formadas de modo a não tirar das crianças e jovens o tempo tão aguardado de contato com a bola. O que temos presenciado, principalmente, em escolas de futebol, é crianças, depois de aguardarem muitos minutos em uma fila, realizarem uma corrida controlando a bola e dando um chute ao gol para, em seguida, retornarem à fila. Isso é altamente frustrante e, sem dúvida, nada tem a ver com aprendizagem do futebol.

Imaginemos duas situações. Na primeira, uma professora tem uma turma de 30 alunos em uma escola de futebol e pretende, em uma determinada aula, ensinar condução de bola para as crianças, que possuem uma média de idade de dez anos, meninos e meninas. Ela decide organizá-los em uma fila única, atrás de uma sequência de oito cones. Ao sinal da professora, o primeiro aluno da fila sai correndo, contorna os cones e, ao final, recebe uma bola da professora, que ele deve chutar em direção a um gol vazio. Como se trata de trinta alunos, esse processo demorará, até que o último realize sua ação, cerca de oito minutos. A aula tem uma hora de duração. Se os alunos fizerem apenas esse exercício, cada um deles realizará a ação aproximadamente sete vezes.

Na segunda situação, a professora organiza os alunos em seis filas com cinco deles em cada uma. Três filas de frente para três gols defendidos por três goleiros e três filas à frente dos gols. As três filas de frente para os gols serão de alunos atacantes; as três à frente dos gols serão de defensores. Ao sinal da professora, os três primeiros atacantes das três filas sairão conduzindo uma bola. Os três primeiros defensores se colocarão à frente dos atacantes e, sem tirar-lhes a bola, atrapalharão a condução dos atacantes. Os atacantes conduzem a bola por cerca de dez metros, ao final dos quais levam a bola para a direita ou para a esquerda e finalizam ao gol. Nessa situação, os alunos cumprirão uma roda completa de exercícios em apenas um minuto, aproximadamente. Em seguida os papéis são trocados e os defensores viram atacantes. Em uma aula de 60 minutos repetiriam os movimentos cerca de 30 vezes. Portanto, não precisariam fazer somente esse exercício, bastaria que gastassem, nele, apenas vinte minutos, por exemplo.

A primeira situação é um exemplo de mau uso da fila. Os alunos nada aprendem de futebol, primeiro, pelo pequeno número de repetições, o que faz com que o contato do praticante com a bola seja muito reduzido. Em segundo lugar, é consenso na literatura do campo da pedagogia do esporte a necessidade de ruptura com práticas pedagógicas como a que serviu de exemplo, tipicamente de natureza analítica/tecnicista, que fragmentam o jogo, a partir do entendimento de que o ensino do futebol se dá a partir da soma das partes que compõem o jogo, ou seus fundamentos. E isso em nada ajuda o atleta a resolver os problemas que o jogo impõe. Por fim, aprenderão aquilo que fazem, isto é, a esperar em uma “interminável” fila e a contornar cones, objetos que, num jogo de bola, não existem. Fintar cones não tem relação alguma com fintar pessoas. Não se trata, portanto, de uma escola para ensinar futebol.

Na segunda situação, a professora continua usando a fila, mas apresenta um exemplo de bom uso dela. As crianças não deixam de brincar de jogar bola, fazem uma brincadeira que adoram fazer, que é driblar. Driblam pessoas e não cones. A condução da bola com um adversário atrapalhando faz sentido para o jogo de bola, e tudo isso é feito para atingir o objetivo de chutar ao gol. O número grande de repetições dessa ação favorece a aprendizagem, neste caso, de meios técnico-táticos (condução de bola, drible/finta, defesa e finalização) que atuam em conjunto, e os ajudam a lidar com situações típicas de um jogo de futebol. Em uma aula, repetir a ação 30 vezes é bem diferente de repeti-la 7 vezes. Além disso, quando não estão conduzindo bolas e atacando, os alunos estão defendendo. Sem contar a atuação dos goleiros. Realizar conduções de bola, defesas, fintas e finalizações na segunda situação faz muito mais sentido que realizar ações apenas para obedecer aos comandos da professora.

As filas podem ser usadas, embora possamos lançar mão de outras alternativas mais lúdicas. Porém, como buscamos discorrer neste texto, é possível recorrer às filas, desde que elas não prejudiquem a aprendizagem e tampouco diminuam o prazer e interesse da criança pelo jogo de bola.

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PONTO CEGO – PARTE 3

Entenda o ponto cego que bloqueia progressões consistentes

Intrigado pelas instabilidades recorrentes que prevalecem em constante renovação nos clubes de futebol do território brasileiro devido às frequentes decisões superficiais voltadas a tão somente desqualificar treinadores profissionais, este estudo se orientou em revelar os efeitos colaterais desencadeados por transições de comando técnico durante o período competitivo. Curiosamente, muito embora a expectativa original por trás das decisões de mudança de liderança técnica condicione o pensamento convencional a acreditar que exista um suposto atalho ao sucesso, as experiências práticas testemunhadas por 30 profissionais ligados a uma múltipla variedade de comissões técnicas ao longo de suas carreiras no futebol brasileiro e internacional manifestaram uma direção oposta à expectativa dos dirigentes e da opinião pública. Isto é, contrário aos argumentos superficiais defendidos por quem frequentemente descarta treinadores sem embasamento objetivo no país, o desempenho e o rendimento esportivo de uma equipe profissional de futebol tendem a se reprimir, e não a progredir, mediante a volatilidade do seu comando técnico.

Ao encarar uma série de restrições e limitações desafiadoras durante as trocas de treinadores, os profissionais que operam nos bastidores da estrutura esportiva cultivam alternativas inovadoras para assimilarem, lidarem e se ajustarem tanto às rupturas de suas rotinas quanto aos distúrbios causados no processo de evolução coletiva. A escala e a direção desses distúrbios são impulsionadas por distintas combinações de expectativas, práticas de trabalho e comportamentos conflitantes nos domínios individual e coletivo da organização. Fundamentalmente, (uma ou mais) alterações de comando técnico ao longo da mesma temporada moldam uma cultura de restrições contraprodutiva para o clube, cujos efeitos colaterais afetam a mútua colaboração necessária para um melhor desenvolvimento esportivo com o capital humano que sustenta a cadeia de valor da instituição.

Líderes organizacionais que confiam no processo emergente de excelência coletiva tendem a empoderar o potencial humano e promover uma comunicação autêntica, a fim de apoiar uma mudança organizacional positiva. Nesse sentido, uma “mudança positiva” para um clube de futebol profissional representaria uma oportunidade de superar limitações pré-existentes, como os obstáculos já mapeados, antecipados e até bem conhecidos dentro de uma temporada competitiva. Para efeitos práticos, o treinador – aquele que foi inicialmente selecionado e empregado para liderar a equipe principal – receberia a confiança e o respaldo necessários para otimizar as interações com a cadeia de profissionais pertencente à estrutura esportiva da organização. Desse modo, uma “mudança” não deveria ser entendida como uma reposição de nomes em diferentes cargos, seja no posto do treinador ou qualquer outra função dos bastidores, pois tal decisão apenas se manifesta com a finalidade de transferir uma suposta culpa a uma única pessoa (ou grupo de pessoas, no caso de uma demissão de toda a comissão técnica) frente a cenários desafiadores durante a temporada. Pelo contrário, a “mudança” deveria se relacionar ao realinhamento de atitudes e/ou comportamentos entre os colaboradores do clube. Tal situação pode ser percebida como uma tensão positiva que fomenta padrões de aprendizado e inteligência coletiva. Ou seja, quando tratado devidamente como um organismo coletivo, um clube de futebol representa um sistema de tensões que alavanca possibilidades de progressão, em vez de uma entidade estática bloqueada pela reincidência de restrições.

Com base nesse raciocínio, os entrevistados reconheceram que os treinadores dependem prioritariamente de relações prósperas, tanto dentro como fora de campo. Para influenciar os padrões comportamentais de suas equipes, assim como o seu estilo de jogo competitivo mais desejado no contexto do futebol profissional, espera-se que os treinadores tenham condições de se envolver com treinamentos e métodos fluídos, sequenciais e reflexivos como parte do processo esportivo. Dessa forma seria possível oferecer um potencial de construção consistente dentro do clube. Entretanto, tão logo alterações de liderança técnica são impulsionadas com frequência durante a competição, o rendimento esportivo evidentemente demonstra uma contradição entre os distúrbios desencadeados por comandos voláteis e o cenário ideal defendido pelos especialistas das áreas de saúde e desempenho humano.

Dado o senso de urgência, impaciência e vulnerabilidade em que os treinadores profissionais de futebol operam, tensões fundamentais são originadas a partir de diferentes prioridades na relação de um novo treinador com os bastidores da estrutura esportiva. Embora o novo treinador carregue a expectativa de produzir sinais de melhoria imediata (a todo momento enquanto permanecer empregado), os profissionais do clube reconheceram que tensões podem vir à tona devido ao fato do seu foco estar voltado ao desenvolvimento dos jogadores em prazos superiores ao do novo treinador. Além disso, os profissionais também identificaram que, ao invés de transformar tensões em possibilidades de progressão, as trocas de treinadores involuntariamente criam uma cultura de restrições que permeia todos os participantes do processo esportivo. Nesse tipo de cultura contraprodutiva, comportamentos (auto)defensivos que visam reter o poder e o controle prevalecem nítidos entre os líderes da organização, como no caso dos dirigentes de clubes de futebol. Frequentemente, tais comportamentos contribuem para a formação de um sistema subdesenvolvido, cujo rendimento insatisfatório espelha os receios da liderança organizacional em atender novas normas e superar pressões internas. Ou seja, em vez de aceitar os desafios e possibilitar progressões com consistência, a cultura de restrições representa um contexto que reduz o potencial de colaboração humana.

Não se trata tão somente de cessar as oscilações de comando técnico ou de manter o(s) mesmo(s) treinador(es) empregado(s) ao longo da(s) temporada(s). Tal alegação se posicionaria tão superficial e irrealista quanto as decisões de descartes recorrentes e já proliferadas no território brasileiro. Na prática, a continuidade de um processo esportivo se baseia menos na estabilidade e mais na adaptabilidade de interações entre os agentes e suas estruturas. Sem testemunhar esforços mútuos entre a liderança e a rede de conexões internas da organização esportiva, torna-se menos provável que as restrições organizacionais sejam reformatadas rumo a possibilidades de transformação por meio da inteligência coletiva. Por exemplo, um novo treinador pode querer repetir a mesma escalação na sua equipe, utilizando os mesmos jogadores em partidas consecutivas, mas os profissionais da estrutura esportiva devem contabilizar e ponderar as demandas competitivas anteriores, assim como qualquer excesso de viagem ou ausência de descanso que possam conjuntamente afetar a recuperação dos jogadores entre as partidas em questão. Do mesmo modo, um novo treinador pode tentar persuadir um jogador que esteja se recuperando de uma lesão a pular etapas no seu período de transição e logo participar de sessões de treinamento mais intensas no campo, porém os profissionais da estrutura esportiva devem seguir rigorosamente os protocolos e critérios definidos pelas áreas de saúde responsáveis, a fim de assegurar que o jogador retorne ao campo somente quando apresentar as condições mais adequadas e realistas aos seus parâmetros individuais.

Apesar dos entrevistados terem reforçado a importância em saber inspecionar e orientar uma equipe de jogadores como uma complexa rede de interações humanas e movimentos comportamentais no campo (tanto em treinos como em competição), eles também enfatizaram como um novo treinador tende a se guiar por uma mentalidade defensiva na confecção do seu estilo de jogo, utilizando um pensamento convencional que o faz acreditar ser preferencial (e mais provável) evitar derrotas a fim de proteger o seu emprego. Contraditoriamente, entretanto, jogar com o foco na defesa costuma gerar menos controle da bola e condicionar espaços mais apertados para minimizar as ações do adversário, afetando as possibilidades de movimentos criativos com a bola para aumentar a precisão das oportunidades ofensivas durante os jogos.

Seguindo a argumentação dos entrevistados, conforme os novos treinadores priorizam os seus próprios métodos e preferências com o objetivo de reafirmar a sua posição hierárquica na instituição, os profissionais alertaram que repentinas modificações metodológicas representam um fator de risco desnecessário para o desenvolvimento dos jogadores. Particularmente durante a temporada competitiva, há relatos na literatura acadêmica sobre redirecionar a periodização de treinos de força com alternativas mais eficientes na aplicação de cargas segundo as condições individualizadas de cada jogador. Contudo, tanto o tempo disponível para treinamentos quanto o monitoramento de cargas nas sessões de treino são substancialmente afetados no contexto do futebol brasileiro, o que potencialmente leva os especialistas das áreas de saúde e desempenho humano a testemunharem maiores riscos de lesão, danos musculares e estresse fisiológico. Na prática, o processo voltado a monitorar as cargas de treinamento se destaca como um aspecto primordial nos bastidores de uma equipe de alto rendimento, sobretudo a fim de apoiar efetivamente a recuperação fisiológica e psicológica dos jogadores. Portanto, quando as prioridades do clube são subestimadas devido ao favorecimento orientado por trocas de treinadores, a impaciência míope que força resultados inevitavelmente compromete as estratégias de prevenção de lesões e controle de cargas durante a competição.

Canalizando os efeitos colaterais ao domínio individual dos entrevistados, tornou-se revelador como as alterações de comando técnico refletem um fenômeno problemático aos colaboradores do clube, tanto por uma perspectiva profissional quanto pessoal. De um modo geral, os membros dos bastidores da estrutura esportiva absorvem múltiplas ramificações que restringem o seu tempo, a sua confiança e os seus incentivos. Tais restrições travam a condução de tarefas de alta relevância para a organização. Por exemplo, monitorar e instruir apropriadamente os jogadores, resguardar os protocolos internos entre as áreas de apoio à comissão técnica, assim como estimular decisões com base em evidências contextualizadas aos jogadores e à equipe. Na realidade, a pressão absorvida pelos profissionais tende ainda a sofrer sobrecargas devido à incerteza da continuidade de seus empregos, à subjetividade dos estilos de liderança, além de contradições metodológicas originadas pela sucessão de comandos técnicos vulneráveis.

Ameaças iminentes são expostas ao entendimento dos entrevistados tão logo eles compartilham necessidades de apoio junto a novos treinadores que extrapolam a sua resistência frente às práticas já implementadas no clube, prejudicando a qualidade da comunicação interna no processo esportivo. Contraídos por um comportamento que limita o potencial humano ao invés de alavancar oportunidades rumo ao melhor rendimento, torna-se plausível reconhecer como lideranças que favorecem a imposição de metas e opiniões precipitadas acabam por gerar um senso de dúvida, impactando as relações interpessoais entre os profissionais que tentam preservar algum nível de consistência durante a temporada. Lamentavelmente, até mesmo os efeitos prejudiciais às condições de saúde dos colaboradores do clube aparentam passar despercebidos (tanto a eles próprios quanto aos líderes da instituição) conforme as trocas de treinadores se materializam, transportando desafios que ameaçam iniciativas de cuidado pessoal em longo prazo. Nesse cenário de descuido com o ser humano que ocupa distintas funções na estrutura esportiva, destacaram-se o enfraquecimento da (auto)confiança e da motivação, além de potenciais sintomas de esgotamento (burnout).

As noções de colaboração e aprendizagem mútua são reiniciadas a cada substituição de comando técnico. Sobretudo em cenários mais agravantes, caso o novo treinador centralize as decisões e articule ideias conflitantes, os profissionais da estrutura esportiva testemunham restrições em suas tentativas de estabelecer rotinas de trabalho, temporariamente repriorizando suas responsabilidades de modo a se adequarem ao novo regime de liderança. Além disso, o receio imposto por relações menos familiares e o desequilíbrio de poder na hierarquia do clube também atrapalham os esforços dos colaboradores em suas tentativas de harmonizar o ambiente e minimizar discordâncias com a maior cautela possível.

Essencialmente, o inevitável desentrosamento de práticas e comportamentos no trabalho conjunto entre o treinador, a comissão técnica e os demais especialistas das áreas de saúde e desempenho humano empregados pelo clube acaba por exigir e depender do “tempo” como um componente chave à sinergia. A partir do “tempo” como recurso prioritário, o processo que fomenta a excelência coletiva na rede de conexões que circunda o comando técnico poderia, enfim, progredir rumo a um desenvolvimento mais integrado e consistente. No entanto, a realidade que impulsiona as frequentes trocas de treinadores no território brasileiro oferece o “tempo” como um recurso renovável apenas nas oportunidades em que as especulações de curto prazo sejam atendidas com resultados numéricos favoráveis. Caso contrário, os profissionais que transitam nos bastidores demonstraram estar cientes que uma próxima mudança de comando torna-se previsível e que, novamente, acarretará distúrbios nas suas tentativas de construção de hábitos dentro do clube. Visto como os colaboradores são capazes de antecipar a repetição desse mecanismo, eles próprios aparentemente revisam a sua compreensão de práticas institucionais e passam a desempenhar comportamentos adaptáveis às transições de liderança. Isto é, enquanto os efeitos colaterais são negligenciados pelos dirigentes do clube, a ilusão de um atalho ao sucesso é renovada conforme os treinadores entram e saem do comando.

CONCLUSÃO

Este estudo buscou explorar uma área de notável relevância ao desempenho esportivo de uma equipe de futebol no contexto do alto rendimento brasileiro, direcionando o foco da investigação a um ângulo tipicamente ignorado pelas discussões sobre trocas de treinadores profissionais. Em suma, ao analisar os efeitos colaterais que são involuntariamente desencadeados aos domínios coletivo e individual da organização (nesse caso, um clube de futebol), o estudo fez-se valer de depoimentos substanciais para explicar as ramificações escondidas pelas mudanças de comando técnico, cuja reincidência inevitavelmente afeta o desempenho dos jogadores e dos profissionais que transitam nos bastidores da estrutura esportiva do clube. Fundamentalmente, uma cultura de restrições imposta por práticas de trabalho e comportamentos conflitantes revelou como os jogadores tendem a interagir, treinar e atuar durante a temporada competitiva mediante oscilações no regime de liderança. Ademais, os colaboradores que integram a comissão técnica e as áreas de saúde e desempenho humano demonstraram como novos treinadores frequentemente desafiam os seus compromissos, dificultando a construção de rotinas e práticas comportamentais que possam solidificar uma consistência interna ao desenvolvimento de longo prazo.

Embora o estudo justifique a continuidade, a harmonia e o entrosamento das lideranças técnicas junto às instituições que decidiram empregá-las para a condução de (pelo menos) uma mesma temporada, o conteúdo apresentado não pretende acomodar qualquer ingenuidade que possa desconsiderar trocas de profissionais em cenários onde líderes e colaboradores interagem por objetivos coletivos. Visando equipar uma plataforma de argumentação baseada em experiências confiáveis, este estudo revela o impacto colateral gerado por mudanças de treinadores durante a temporada competitiva. Portanto, os líderes organizacionais (nesse caso, os dirigentes dos clubes de futebol do Brasil) deveriam defender, preferencialmente, uma avaliação substancial nos bastidores da estrutura esportiva antes de uma eventual tomada de decisão sobre o treinador do momento. Isto é, ao questionar as potenciais ramificações e consequências internas que podem comprometer o presente e o futuro esportivo da instituição, torna-se mais realista evitar uma turbulência desnecessária aos domínios que valorizam efetivamente as prioridades do clube.

Dentro e fora de campo. Com e sem a bola. O futebol reflete, enfim, um jogo de comportamentos cujo progresso depende do entrosamento entre os seres humanos que colaboram pela mesma cadeia de valor.

“A prosperidade é a melhor protetora de princípios.”

Mark Twain

Para acessar o estudo completo, clique aqui.

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PONTO CEGO – PARTE 2

Observe os efeitos colaterais das mudanças de treinadores

Sob uma perspectiva teórica, esta investigação qualitativa explora as recorrentes instabilidades ocasionadas por mudanças de comando técnico durante a temporada competitiva. Para engatar o raciocínio, este estudo compreende que uma organização esportiva deve representar não somente uma hierarquia estável, mas sobretudo uma rede de conexões sociais em constante mutação. Tais conexões envolvem colaboradores que compartilham distintas influências em cadeia, potencialmente moldando um sistema próspero a se destacar com consequências positivas. Aproximando-se a uma abordagem paradoxal, tensões e oposições organizacionais tendem a surgir como partes de um processo emergente que desafia suposições convencionais por meio da colaboração criativa e do aprendizado coletivo. Consequentemente, a ênfase interna se desloca a partir das restrições organizacionais rumo às possibilidades de aprimoramento contínuo. Isto é, a realidade das limitações numa organização esportiva deve ser tratada como uma possibilidade para alavancar a sua transformação por meio do capital humano presente na cultura organizacional. Portanto, ao enxergar um clube de futebol como um organismo coletivo, torna-se possível examinar e compreender os efeitos colaterais provenientes das transições de treinadores no âmbito profissional.

Apesar dos entrevistados identificarem um viés positivo entre as múltiplas interações e experiências acumuladas enquanto os mesmos trabalharam com um elevado número de treinadores ao longo de suas carreiras, os resultados deste estudo revelam os efeitos colaterais, indiretos e não-intencionais originados pelas decisões que optam por mudanças de comando técnico no meio da(s) temporada(s) do futebol brasileiro. A fim de replicar os depoimentos dos entrevistados com maior assertividade e sem comprometer o anonimato dos seus testemunhos, o texto apresenta uma série de palavras e frases entre “aspas”, que destacam as informações devidamente associadas ao processo de análise do conteúdo qualitativo neste estudo acadêmico. Ademais, citações individuais com maior aprofundamento também foram utilizadas para enaltecer em detalhes algumas das experiências dos profissionais.

Interrogando os efeitos colaterais sobre o desempenho da equipe:

  • No domínio coletivo, como as mudanças de treinadores afetam o desenvolvimento dos jogadores?

ESTILO DE JOGO PRAGMÁTICO

Inicialmente, os entrevistados reconheceram como as reposições contínuas de treinadores levam os próprios líderes técnicos a cultivarem um senso de pragmatismo dentro de campo durante os seus compromissos com tempo limitado no cargo. Empregados, porém cientes do perigo constante de demissão, “os treinadores implementam um jogo mais pragmático, procurando se defender para correr menos risco possível”. Ao endossar “um comportamento que é menos ousado, menos criativo e menos arriscado”, eles optam por atuar com alternativas mais simples e seguras, originando “um jogo feio e defensivo”. Supostamente, os treinadores minimizam a criatividade de seus jogadores e a evolução de suas equipes para implementarem um jogo reativo, cuja prática afeta o fluxo de informações proativas dentro de campo. Três entrevistados exemplificaram o raciocínio que permeia a prática:

“Existe uma relação muito próxima com a qualidade do futebol no país. O medo de treinar e do resultado que o jogo gera nos treinadores se reflete num jogo mais reativo. Nisso, pensando em longo prazo (o que para mim está muito claro), o futebol brasileiro está caminhando para a decadência muito em função dessa busca incessante pelo resultado. Quando você pensa só no resultado, você não desenvolve, você não promove criatividade. Você não valoriza o trabalho pelo que o jogo apresenta, você valoriza o trabalho só pelo resultado. E aí todo mundo quando entende o mecanismo, por mais corajoso que seja, começa a viver o sistema, começa a jogar em função do que o sistema apresenta. Eu já vi treinadores criativos mudando o jeito de jogar em função do que essa cultura impõe.”

“Eu vejo que os treinadores e as comissões técnicas no Brasil têm uma ideia sobre como trabalhar com alguns conceitos e comportamentos para melhorar o futebol do clube. Ao mesmo tempo, assim que os primeiros resultados negativos aparecem (e você já sabe que está num ambiente instável), a comissão não concentra toda a sua energia no desenvolvimento da equipe, mas sim em vencer a próxima partida para manter o emprego. Eu acho que isso afeta totalmente a qualidade do nosso jogo, porque sem ideias, sem treinamentos e sem tempo para maturar as ideias, nós não vamos melhorar o nosso futebol. E como a gente necessita desse resultado a curto prazo, muitas vezes você abdica das suas ideias para entregar o resultado. Você abdica, por exemplo, de tentar melhorar os jogadores individualmente, ou coletivamente, para focar no resultado do fim de semana. Isso vai virando uma bola de neve, porque o seu time não vai apresentando uma evolução, um futebol melhor com o passar do tempo, e você fica mais concentrado no resultado do que no processo de desenvolvimento da equipe.”

“A autoestima do treinador brasileiro é muito arranhada em decorrência dessas trocas. O jogo brasileiro ficou um jogo feio, um jogo difícil? Claro! O cara tem contas a pagar, tem família a sustentar. Aí ele vai jogar domingo fora de casa e vai colocar o time lá na frente sabendo que, se ele perder, na segunda-feira ele estará demitido? Como você espera que o cara vá propor o jogo? Quem propõe o jogo são as pessoas que têm multas altíssimas nos seus contratos. É isso o que ocorre, não agora, há muito tempo você vê jogos chatos no Brasileirão. É esse o esquema. Aí esse treinador é defensivo, vai se rotular que esse treinador não sabe colocar a equipe para jogar na frente. Ele sabe sim, mas ele sabe muito mais que, se ele perder, na segunda-feira ele vai estar desempregado e muito preocupado em pagar as suas contas.”

DIVERGÊNCIA METODOLÓGICA

Substituições repentinas de treinadores durante a mesma temporada também tendem a desequilibrar metodologias de treinamentos, prejudicando a evolução dos jogadores devido a divergências em torno das características e preferências entre distintas lideranças. Conforme assinalado pelos profissionais, “existem claramente perdas entre treinadores com perfis opostos”, pois os jogadores devem responder a “diferentes metodologias que afetam o seu desempenho”. Mesmo quando há semelhanças no perfil do líder técnico, “trata-se de um processo lento e perigoso durante a competição” devido à probabilidade de mudanças radicais em métodos e rotinas. Dois entrevistados aprofundaram a explicação:

“A gente sabe que precisa de continuidade para implantar um trabalho de ordem técnica ou física para desenvolver um atleta, mas hoje em dia não tem como desenvolver um trabalho, qualquer que seja a ordem. O atleta está em constante mudança de metodologias durante o ano inteiro. Não tem como. São formas e métodos diferentes, isso dificulta muito. A gente já tem a dificuldade normal do calendário com constantes viagens e jogos, sendo poucas semanas inteiras de trabalho para recuperar o atleta, dar uma base de maior sustentação ou melhorar um pouco a força, por exemplo. A gente já tem um trabalho de quebra-cabeça tão grande e a troca do treinador dificulta ainda mais para saber qual é a prioridade. Se é a manutenção no cargo, se é o desenvolvimento do atleta, a prevenção de lesão, a recuperação, ou botar ele para jogar de qualquer forma para ganhar o próximo jogo. Com certeza o desempenho fica em segundo plano.”

“Quando se troca toda a comissão, por mais que eu chegue ao clube, olhe o relatório e dê sequência, sempre existe algo diferente no que se faz, no dia-dia, nas influências em como fazer as coisas. Por exemplo, se um novo treinador executa um trabalho para a sua equipe ficar mais rápida dentro de um curto espaço de tempo, essa abordagem talvez não se sustente com um embasamento adequado de preparação. Mais tarde, se outro profissional vier a substituí-lo com um pensamento ou proposta diferente, haverá um prejuízo estrutural. Você vai fazer mudanças e com isso começam as lesões musculares, porque a solicitação neuromuscular foi orientada e praticada pelo atleta num momento em que ele ainda não estava preparado para isso. Quando há continuidade, a tendência é não ter tantos problemas, mas quando se troca tudo, vai depender das circunstâncias, dos relatórios, de quem analisa. Portanto, é um pouco mais complexo. Não é assim: ‘mudou, não tem problema.’ Tem problema sim!”

Os profissionais alertaram que as transições de treinadores tendem a elevar os riscos de negligência sobre as estratégias de controle de carga e prevenção de lesões já implementadas nos bastidores do clube. Isto porque a variação metodológica que acompanha uma mudança de comando técnico no meio da temporada pode aumentar as incidências de fadiga, reclamações de ordem física, bem como lesões em curto prazo. Ao encarar distintos métodos de treinamento, “o corpo do atleta é o componente que mais sofre, pois uma alteração de conduta se reflete nos estados físico e cognitivo dos jogadores”. Portanto, “se a carga de trabalho é aumentada devido a um sistema de jogo diferente, as consequências serão sentidas pelo organismo dos atletas, já que eles ainda não se encontram prontos para a nova demanda”. Dois entrevistados complementaram a manifestação de uma divergência metodológica ocasionada pela troca de treinadores:

“Eu vejo um impacto muito grande, principalmente nas primeiras semanas de trabalho de um novo treinador, porque a rotina dos atletas muda completamente. Por exemplo, o antigo treinador só treinava pela manhã, mas agora eles treinam no período da tarde. Ou então, o preparador físico que só trabalhava com os jogadores na academia agora passa a sessões funcionais no campo. Tudo isso obviamente impacta os atletas e respinga na gente. Vai sobrar para nós aqui na fisioterapia, sabe? Esse impacto com uma nova comissão técnica é nítido para mim porque os sintomas dos jogadores aumentam muito na minha demanda da fisioterapia. Eu catalogo todas as informações de entrada e saída dos atletas no nosso departamento, a frequência de cada um atendendo o trabalho preventivo, então eu consigo perceber a diferença.”

“Você pode ter duas metodologias excepcionais, só que elas são diferentes. Se você quebrar a primeira e colocar a segunda, por melhor que elas sejam, vai demorar para fluir. Além disso, o clube geralmente muda a comissão toda, agravando ao mesmo tempo as exigências técnicas e físicas. Para você alterar isso, são meses de trabalho, não é de um dia ao outro. Mudar a carga de trabalho por um novo sistema de jogo tem uma repercussão grande no organismo do atleta. Ele está pronto para aquilo? O que eu acho que falta é justamente o clube pensar a médio e longo prazo. Não é apenas o treinador que faz a diferença, mas sim todo esse processo e estrutura metodológica do clube pela manutenção de uma filosofia que possa obter rendimento.”

ATRASOS NO ENTROSAMENTO DA EQUIPE

Ainda sob o viés do desempenho coletivo, as mudanças de liderança técnica são percebidas como uma medida disfuncional e contraprodutiva para construir sinergia entre os jogadores, considerando que, em geral, os treinadores trabalham predominantemente com uma mentalidade de curto prazo e baseada em relações superficiais. Segundo os entrevistados, o clube deveria defender uma consistência de “treinos, jogos e revisões sequenciais”, caso contrário “os jogadores ficam sobrecarregados com diferentes estímulos até conseguirem se acostumar a um novo posicionamento, estilo ou proposta de jogo”. Afinal, “as grandes construções de equipes levam temporadas de trabalho conjunto, mas no Brasil o treinador está muito suscetível à demissão, por isso não existe coesão de grupo significativa”. Expressando suas preocupações sobre como a interatividade dos jogadores pode ser afetada, três profissionais fizeram questão de explicar o desfecho que se repete com frequência em clubes do Brasil:

“A mudança do treinador retorna os jogadores à estaca zero, onde uma minoria se privilegia, mas essa oscilação é muito mais maléfica do que benéfica. Ela freia a evolução de alguns atletas. Um jogador serve, outro não. Um recebe mais ou menos afeto, levando a uma queda técnica, física e tática. Isso é muito evidente. A perda de confiança e de qualidade nos assusta ao ponto que nós (da comissão) nos questionamos se estamos trabalhando com os mesmos jogadores que já havíamos visto antes. É muito prejudicial essa troca de treinadores porque ela não favorece a evolução do futebol como um todo.”

“O grande problema que eu vejo é na proposta de jogo e na função que os atletas têm que desempenhar, porque muitas vezes um atleta que está acostumado e adaptado a uma função acaba tendo que executar uma outra função e ter um outro estímulo com a mudança de treinadores durante a competição. Isso acaba sobrecarregando o atleta. O que a gente vê empiricamente é que alguns atletas sofrem para se adaptar a uma nova proposta de jogo.”

“Como funcionários do clube, a gente vai convivendo com os jogadores do grupo e entendendo o comprometimento de cada um no dia-dia. Aí, por exemplo, chega um novo treinador que quer resgatar alguns jogadores que já passaram por outros treinadores sem dar resposta alguma, sem mostrar compromisso nem mesmo com o grupo. Esse novo treinador acha que ele vai resolver, insistindo em alguns jogadores que nós que já estamos ali há mais tempo temos certeza que não vão funcionar. Você explica, dá exemplos, cita várias situações que já aconteceram, mas às vezes o novo treinador não acredita. Nessa você vai perdendo três ou quatro jogos com um e com outro, porque todos acham que vão conseguir, seja com a maneira de trabalhar ou com o discurso. Só que você não tem mais tempo, porque você joga todo dia, entendeu? Então você acaba atrasando o processo. De repente se deixassem um mesmo treinador que efetivou o elenco e pode entregar um melhor desempenho, eu acho que é um caminho mais fácil.”

PONTO CEGO: A CULTURA DE RESTRIÇÕES ORIGINADA PELAS TROCAS DE TREINADORES

Interrogando os efeitos colaterais sobre o desempenho individual:

  • No domínio individual, como as mudanças de treinadores afetam os profissionais ligados à comissão técnica?

RUPTURA INTERNA

Ao reposicionar o foco da argumentação ao trabalho dos próprios profissionais que navegam pelos bastidores da estrutura esportiva (ou seja, comissão técnica e especialistas das áreas de saúde e desempenho humano), tornou-se possível identificar como as suas práticas laborais são expressamente interrompidas quando os dirigentes do clube permitem que um novo treinador assuma o controle absoluto das operações internas. Após uma troca de liderança técnica, os entrevistados argumentaram que eles devem “convencer o novo treinador a respeito do que já está estabelecido, reafirmando ideias e protocolos”, cuja reincidência contribui para gerar “um estresse interno”. Apesar dos seus esforços em implementar práticas institucionais, caso o novo treinador discorde dos métodos apresentados, “tudo vai por água abaixo, mas os dirigentes do clube pouco se importam com isso”. Agindo com tons de poder e superioridade logo a partir da sua chegada ao posto, “o novo treinador pode alegar que a metodologia e até mesmo o organograma do clube estão errados, por isso mudanças devem acontecer”. No entanto, torna-se primordial defender o fluxo de trabalho interno e reforçar como os profissionais da estrutura esportiva gerenciam “os antecedentes médicos, as operações, as lesões e as limitações que os jogadores apresentam”. Para ilustrar essa realidade, três entrevistados compartilharam a eventual turbulência que acompanha as trocas de treinadores:

“Quando não se acerta o perfil do novo treinador, há mudanças muito bruscas em relação às rotinas e processos. Seja porque ele não acredita na função, no equipamento, na tecnologia, ou nas ideias em geral. O clube passa a correr um risco muito grande de perder processos desenvolvidos ao longo do tempo e que são fundamentais para se chegar ao alto nível daqui a alguns anos. O novo treinador pode atrapalhar o ambiente ao criar desconfiança, com pouca interação entre a comissão técnica e as funções fixas do clube, sem vínculos de lealdade e cumplicidade, que são muito necessários para uma comissão. A todo momento nós precisamos tratar de treinos, reuniões, atletas, viagens, jogos, e na maioria das vezes o ambiente é de muita pressão. Se as relações não partirem ou forem construídas pelo líder, fica muito mais difícil de se conectar. Quando há uma quebra de confiança devido a ideias diferentes e com pouca relação pessoal, a chance de dar errado é muito grande.”

“Nós temos uma linha de trabalho no clube, na qual a gente acredita e tenta colocar em prática, introduzindo algumas situações que nós queremos que sejam institucionais. Por exemplo, nesse momento em que nós estamos no comando da preparação física do clube, está legal porque a gente está aplicando a nossa forma de enxergar e trabalhar, mas daqui a pouco, se trouxerem um outro treinador que tenha outro pensamento, os dirigentes só vão querer cobrar e ver o resultado, entendeu? O impacto é gigantesco quando você se depara com diferentes formas de pensamento e de trabalho. Por quê? Quando o clube está pressionado, os dirigentes abrem a casa toda para o novo treinador. Então assim, geralmente as comissões técnicas chegam ao clube com um poder inimaginável, autorizadas a mudar até a posição da cama dentro do quarto do hotel do clube. Com isso você fica de mãos atadas, porque às vezes você quer implantar um tipo de trabalho ou pelo menos ter um direcionamento do clube, mas se uma nova comissão técnica desacredita completamente naquilo, você sente um impacto grande devido ao poder que eles carregam ao chegar no clube.”

“Via de regra, a substituição do treinador acontece em momentos de crise. Então o sujeito que chega quer recuperar o terreno perdido e eventualmente mudar o que estiver errado. Ele começa a impor até a sua metodologia, porque ele precisa mostrar serviço comparado ao outro que talvez não mostrou. Ele vai querer fazer tudo aquilo que não foi feito. Muitas vezes o novo treinador sobrepõe atitudes, ele é imperativo, ele não é tolerante, porque algo tem que mudar. O treinador quer marcar a sua presença. Ele começa a fazer as suas interferências, até administrativas, para marcar território. Muda hábitos e costumes só para dizer que ele está presente, porque se ele chegou para mudar alguma coisa e não muda nada, já imaginou o que acontece?”

ADAPTAÇÕES REPETITIVAS

Tão logo os compromissos dos treinadores são interrompidos e novos nomes são empregados para ocupar a função, os profissionais que transitam nos bastidores da estrutura esportiva são forçados a se readaptarem continuamente em janelas de curto prazo. Conforme destacado pelos entrevistados, eles se encontram num “reinício constante, sempre recomeçando” e “ajustando a rotina no meio da competição”. De forma compreensível, “se três treinadores trabalham para o clube durante um ano, isso significa três maneiras diferentes para se readaptar”. Na realidade, os profissionais devem aprender rapidamente a como lidar com um novo treinador, “porque alguns querem que você discuta tudo pessoalmente com eles, enquanto outros não querem nem conversar com você”. Encarando as recorrentes trocas de treinadores no meio de uma temporada competitiva, “todos os membros da comissão técnica sofrem para se adaptar a mudanças drásticas de métodos e tratamento humano”. Metaforicamente, um dos entrevistados resumiu a situação argumentando que eles devem “trocar o pneu com o carro em movimento”. Enquanto buscam se sintonizar com diferentes perfis de liderança, preferências de relacionamento e metodologias, os entrevistados percebem as frequentes mudanças de comando como “prejudiciais”, “desagradáveis” e “estressantes”.

“Interfere na questão de você entender o que um novo treinador espera. Tem treinador que quer o jogador (lesionado) no campo o mais rápido possível, independente de qualquer situação. É tipo assim: ‘Ele pode voltar e tratar depois, mas eu quero esse cara no campo.’ Por outro lado, existe treinador que só pede por jogadores que estejam completamente recuperados. Esses dizem: ‘Espera e me entrega o jogador pronto.’ Você precisa entender como funciona a cabeça do treinador e o nível de influência das pessoas que o cercam na nova comissão. Então você tem que, de certa forma, sempre ganhar a simpatia de todos que chegam ao clube, mas isso é cansativo. É desgastante você ter que mudar uma estratégia de trabalho apenas para suprir as expectativas de um novo treinador. É como a sensação de se equilibrar numa corda bamba.”

“Eu me preparo para aquilo que o treinador quer. A minha primeira pergunta ao treinador é: o que você vai fazer? E aí, eu tenho que me adaptar. Desde quando eu comecei a minha carreira, para você ter uma ideia, eu já tentei uma gama de treinamentos para me adaptar ao treinador que estiver na comissão. Então, enquanto eu estou me ajustando ao sistema e também adaptando os atletas ao que o treinador quer ou deseja, geralmente há uma perda com a demissão. Isso nos causa consequências, até porque você aprende a respeitar o profissional, o ser humano. Você passa a ter uma proximidade maior, começa a se envolver mais. Infelizmente isso é interrompido de uma forma até drástica, bem desagradável.”

“Eu tenho que me adaptar ao comando. Não é o comando que tem que se adaptar ao meu modo de trabalho. A partir do momento em que eu consigo me adaptar ao comando, eu tento fortalecê-lo, porque eu sou fiel ao treinador. Por exemplo, se o novo treinador tem um jogo que utiliza muito os pés do goleiro, eu tenho que adaptar os meus goleiros ao que o novo comandante quer. Independente de eu ter um ponto de vista que não seja o mesmo nesse caso, ou talvez eu tenha opiniões diferentes do treinador, mas eu vou sempre fortalecer o comando. É isso o que eu sempre frisei nas reuniões com novos treinadores, independente de como são as mudanças.”

INSEGURANÇA PROFISSIONAL

Atraindo a atenção ao seu lado ocupacional, os entrevistados demonstraram uma tendência a se sentirem inseguros sobre a continuidade dos seus próprios empregos quando eles testemunham transições de treinadores. Segundo os relatos dos profissionais, eles aparentam trabalhar sob uma vigilância implacável, pois “um treinador recém-contratado pode repentinamente demitir qualquer pessoa como se ele fosse o dono do clube”. Para exemplificar, “você não sabe quem o novo treinador irá trazer com ele, nem mesmo como ele irá te avaliar”. Consequentemente, o risco de uma demissão repentina influencia como os profissionais são condicionados a “repensar atitudes para superar uma pressão desconfortável” e “permanecer, de certo modo, seguro no emprego”. Devido a essa instabilidade, eles até questionaram se deveriam priorizar o desenvolvimento de suas carreiras fora do futebol. Especialmente para aqueles que não foram jogadores profissionais, “ninguém possui estabilidade financeira para cuidar da família e pagar as contas, então isso afeta muito a todos nós”. Em retrospectiva, três depoimentos detalham como o cenário de vulnerabilidade dos treinadores efetivamente perturba os bastidores da estrutura esportiva:

“As trocas de treinador trazem uma sensação iminente de volatilidade ao nosso cargo. Sempre que tem uma troca, a gente imagina que está passando por um momento de instabilidade profissional. Por exemplo, eu não sei se o novo treinador vai chegar e pedir para trocar também a equipe de fisioterapia, ou se ele vai trazer um fisioterapeuta com ele. Então toda vez que chega perto de uma troca, todo mundo fica muito inseguro e isso nos atrapalha com grande frequência a desenvolver aquilo que a gente pensa. Esse problema é real! Sem dúvida que essa insegurança, essa iminência de que a qualquer hora você pode perder o emprego, ou que pode haver mudanças que vão nos afetar, isso seguramente influencia o nosso rendimento. Um ponto importante que pode te ajudar no entendimento é que essa situação de muita volatilidade no futebol tem causado uma mudança no perfil dos fisioterapeutas que trabalham com a modalidade. Antes nós tínhamos fisioterapeutas que trabalhavam exclusivamente no clube. Hoje em dia, como é muito volátil, ninguém anima de trabalhar só no clube e entregar ou abrir mão do que se tem por fora para viver apenas de futebol, porque isso não é sustentável. Eu percebo que o perfil do fisioterapeuta que trabalha hoje com futebol é de uma pessoa que acumula funções. Em geral, é a fisioterapia do clube misturada com dar aulas na faculdade, ter um consultório ou a própria clínica. Hoje em dia, cada vez mais o fisioterapeuta tem que segmentar o dia dele, somando outras tarefas e funções para que ele consiga manter a saúde financeira dele e não sofrer um impacto tão grande com toda essa volatilidade de cargos.”

“A partir do momento em que se fala sobre uma troca de comando durante a temporada, isso causa uma intranquilidade entre os empregados do clube. Não apenas para a comissão técnica, mas também para os funcionários e atletas. Essa inquietude se reflete no campo, porque em vez de proteger o treinador, tudo é feito ao contrário. A mudança não vai dar sequência ao trabalho do momento. Então você começa a se questionar: Será que o meu trabalho ou os métodos que eu estou aplicando não são ideais ou corretos? A nossa equipe era a líder do campeonato e, de repente, após dois ou três jogos se tornou a pior equipe? Todo aquele trabalho que foi feito, será que nada daquilo era verdade? Ninguém presta? Não existe parâmetro, porque você é movido pelo resultado. Você fica sempre preocupado porque a expectativa é a de que possa haver mudanças em todos os setores. É difícil trabalhar com essa perturbação, muito difícil.”

“Você não sabe quem chega com o treinador, como eles vêm, com que propósito, se vão dar alguma abertura, se você vai conseguir trabalhar ou continuar. O que acontece é assim: o dirigente chega e dá a chave do clube para o treinador. Isso acontece em muitos clubes. E o novo treinador se mete em tudo também. Se o clube tem nutricionista e ele é contra, ele tira. Se tem psicólogo e ele é contra, ele tira. Se ele não gosta de um funcionário, ele pede para a pessoa não aparecer mais. Por isso que eu falo, não se tem uma coerência dentro do clube. Parece que o treinador é o dono do clube. Se há uma diretriz no clube, você fica menos preocupado.”

DESCONFORTO MENTAL E EMOCIONAL

Alterações sequenciais de comando técnico também desencadeiam momentos de inquietação na vida pessoal dos entrevistados. Considerando a turbulência inerente aos eventos de sucessão de liderança, um dos profissionais argumentou que “o futebol realmente é desumano no Brasil”, visto que ele provoca consequências instáveis na vida privada, social e familiar. Na prática, “os padrões de ansiedade respingam porque, antes de abordar o treinador, os dirigentes descontam a pressão deles em cima de nós.” “Impacta o nosso lado emocional e afetivo, a nossa autoestima cai”, inclusive “com colegas mostrando baixa imunidade e adoecendo.” Coletivamente, os entrevistados compartilharam experiências pouco saudáveis, ponderando como as tensões originadas a partir das mudanças de treinadores tendem a afetar, sobretudo, os seus níveis de dúvida, privação de sono, pressão arterial e estresse ocupacional, cuja combinação interfere até mesmo em relações familiares. Três depoimentos se mostraram reveladores ao âmbito pessoal de cada ser humano:

“Na função de auxiliar, eu não sou o responsável pela tomada de decisões. Eu coloco a minha opinião ao treinador, que formula o que é melhor para a equipe. Agora quando eu assumi como treinador interino, a minha vida mudou totalmente de cabeça para baixo. É até engraçado eu te contar isso porque as pessoas não têm noção do que acontece. Eu passei a não dormir, a não comer. Eu já tinha tido a experiência de comandar um jogo, mas nunca havia passado um tempo como o responsável por todas as decisões. Era tanta coisa acontecendo, tantas decisões a serem tomadas, que a minha vida mudou totalmente. Ali eu pude ver como isso tudo afeta o treinador, como essa pressão é enorme. Um ambiente que parecia estar tranquilo acabou ficando conturbado enquanto eu tentava lidar com todas as situações e problemas. Na verdade, é muita coisa envolvida para o treinador e os dirigentes se escondem ao invés de nos ajudar.”

“Eu posso dizer por mim, pois eu já estou há oito meses sem ver grande parte da minha família, mas convivendo, felizmente, com a minha esposa e a minha filha. Se paga um preço muito alto. Em determinados momentos e para várias pessoas isso não é tão válido. Por exemplo, quando eu assumi como interino há alguns anos, a minha esposa relatou que a minha ausência (em casa) me deixou alienado em relação a ela. Na época eu não conseguia ver isso. Se eu não tivesse as minhas cunhadas ao meu lado para me falar, eu sinceramente não iria perceber isso. Eu estava muito mergulhado com o comando interino no contexto da Série A. Entre idas e vindas aqui, a pressão é muito maior. Isso com certeza acarreta muito à minha saúde e ao meu sono.”

“Posso te falar de mim. Essas trocas sem critério já me afetaram e ainda seguem afetando. Eu também acredito que afeta com certeza a todos. Àquele que diz: ‘Ah, segue a vida!’ Não é assim tão simples. Você tem um planejamento familiar, um modelo de vida. O novo treinador que chega não vai pensar logo nisso, até porque o clube também não pensa muito na pessoa que está chegando. O futebol brasileiro é uma coisa tão maluca que se demite profissionais até quando a pessoa tem um rendimento muito bom. Você pode não fazer um trabalho bom e te demitirem. Aí tudo bem, você vai para casa, fica chateado, vai afetar tudo isso, a pessoa vai ficar triste, mas no final você vai parar e reconhecer que não foi um trabalho legal. Agora, quando você olha um histórico de trabalhos incontestáveis por resultados, títulos, revelação de jogadores e simplesmente chega outra pessoa para te tirar do trabalho, isso nos afeta, lógico que afeta.”

Por fim, a PARTE 3 concluirá o estudo, refletindo acerca da importância em privilegiar o desenvolvimento progressivo e consistente na cadeia de valor que sustenta uma equipe competitiva no futebol profissional.

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PONTO CEGO. ENTENDA OS EFEITOS COLATERAIS DAS MUDANÇAS DE TREINADORES NO BRASIL

PARTE 1 – Sinapses do desempenho humano e coletivo

No âmbito dos esportes coletivos, os treinadores atuam como líderes técnicos enquanto colaboram com especialistas das áreas de saúde e desempenho humano em uma estrutura multidisciplinar focada no desenvolvimento esportivo das suas equipes. Nesse sentido, os treinadores de futebol profissional buscam avaliar regularmente o fluxo de informações relacionadas aos comportamentos e posicionamentos dos seus jogadores, a fim de tornar possível o desenho de sessões de treinos que apoiem os seus estilos de jogo preferenciais durante um processo gradual de aprimoramento coletivo. Sobretudo a respeito da prática, um processo efetivo de treinamento no futebol desafia os treinadores a encontrarem intervenções apropriadas ao desenvolvimento de sinergias coletivas, as quais se sustentam por dinâmicas não-lineares e sistemas adaptáveis. Fora de campo, os mesmos treinadores também procuram usufruir do conhecimento e do fluxo interno de processos que integram a estrutura esportiva de seus respectivos clubes, beneficiando-se, por exemplo, pela intersecção de estratégias de controle de cargas e prevenção de lesões. Ao monitorar o equilíbrio entre desgaste e recuperação, os treinadores conduzem o retorno de jogadores lesionados mediante à reaproximação de suas condições ideais. Caso contrário, tanto os indivíduos quanto a equipe podem apresentar menor desempenho físico e técnico numa competição de alto rendimento.

Em consonância com esse raciocínio, existe uma interação contínua entre o treinador e os bastidores da estrutura esportiva em um clube de futebol, uma vez que o seu trabalho compartilhado impacta as decisões em torno do aprimoramento dos jogadores que compõem a equipe. Para exemplificar, muito embora os analistas de desempenho possam fornecer evidências contextualizadas para apoiar o trabalho dos auxiliares técnicos, tais informações ainda estão suscetíveis à interpretação final do treinador que lidera o processo esportivo. Ademais, os protocolos internos devem ser observados e respeitados de modo a proteger o fluxo de trabalho coletivo entre fisiologistas, fisioterapeutas e preparadores físicos, especialmente em situações que sinalizem indícios de alto risco de lesão em jogadores específicos. Ao reforçar tais procedimentos, melhores níveis de comunicação interna tendem a ser decisivos para aprimorar a disponibilidade de jogadores tanto em sessões de treinos como em competições. Portanto, entendendo como o treinador compartilha os
seus domínios profissionais com a comissão técnica e os especialistas das áreas de saúde e desempenho humano, optar por mudanças de comando técnico significa assumir riscos de perturbação, alteração e interrupção de rotinas de treinamento já estabelecidas e influentes nos bastidores da estrutura esportiva.

Apesar de pertencerem a um processo de treinamento complexo, dinâmico e interativo, onde o rendimento esportivo depende prioritariamente da cooperação existente entre os profissionais das áreas de saúde e desempenho humano, aliado às suas respectivas condições contextuais, os treinadores ainda permanecem submetidos a julgamentos superficiais que se baseiam estritamente no placar e no resultado numérico dos jogos de suas equipes. Considerando as típicas limitações de conhecimento técnico e esportivo por parte do corpo diretivo de um clube profissional no Brasil, tornou-se comum testemunhar a arbitrariedade de dirigentes que despacham frequentes demissões e alterações de comando técnico em todo o território. Sobretudo durante a temporada competitiva, tal decisão tende a ser defendida como uma marca registrada para supostamente solucionar situações momentâneas e renovar a esperança de placares favoráveis. Um selo de (in)eficiência para atender os anseios da opinião pública, cultivando a repetição de descartes sem a necessidade de apresentar análises substanciais sobre as consequências que uma eventual troca de treinadores ocasiona para os seres humanos diretamente envolvidos no processo de desenvolvimento coletivo de uma equipe de futebol profissional. Na realidade, entretanto, a alteração de um comando técnico inevitavelmente desencadeia uma série de efeitos colaterais devido à rede de conexões estabelecida em torno do treinador e a partir dele com relação aos demais colaboradores.

Ao analisar períodos sequenciais às trocas de treinadores, a literatura acadêmica tem identificado diferenças significativas em métricas de condicionamento físico, reportando declínios no Brasil e na Espanha, enquanto na Alemanha e na Polônia constatou-se apenas uma evolução muito limitada. Já na Inglaterra, oscilações frequentes de comando técnico costumam acarretar reações emocionais e comportamentais entre os profissionais ligados às áreas de medicina e ciências do esporte, além de mudanças no estado psicológico dos próprios treinadores envolvidos nas ocasiões. Coletivamente, os depoimentos ingleses apontaram para um caminho que reduz a confiança, o comprometimento e a motivação em seus ambientes de trabalho. Ainda assim, a maior parcela das investigações acadêmicas segue examinando o cenário pós-troca por meio de estatísticas que se concentram em resultados de jogos (via pontos, gols, sequência ou ausência de vitórias) e de tabelas competitivas (via posição momentânea ou final na competição, percentual de aproveitamento, classificação ou queda em torneio eliminatório).

Em suma, os sinais de aprimoramento qualitativo originados pelo trabalho dos treinadores e suas comissões técnicas têm sido desconsiderados, o que potencialmente desvaloriza as especificidades do desempenho esportivo em uma equipe de futebol profissional. Desconsidera-se, por exempo, o conteúdo das sessões de treinos, as movimentações e dinâmicas orientadas dentro e fora do campo de jogo, o desenvolvimento e a recuperação individual, a influência sobre comportamentos setoriais, além da progressão gradual de um estilo de jogo com base nas circunstâncias contextuais de cada clube. Consequentemente, torna-se prioritário enfatizar que, muito embora jogadores e equipes possam ser analisados com métricas que representem possíveis indicadores de sucesso, os reais efeitos provenientes do desempenho esportivo estão relacionados ao que acontece predominantemente em torno da equipe e dos seus adversários.

No contexto profissional, a modalidade exige práticas de treinamento voltadas a aprimorar comportamentos coletivos para otimizar variações técnico-táticas, assim como estratégias de condicionamento e recuperação que possam ser devidamente implementadas e controladas durante a temporada competitiva. Contudo, devido à prevalência de uma mentalidade especulativa que privilegia decisões superficiais no domínio organizacional, as mudanças de comando técnico durante o Brasileirão superam quaisquer parâmetros já calculados nas principais ligas de futebol da Europa, América do Sul e do Norte, ilustrando como os treinadores enfrentam desafios muito particulares no cenário brasileiro.

Nota: Entre 2011 e 2020, os treinadores profissionais permaneceram empregados por um período de 78 dias, em média, durante o Brasileirão, o que representa 37% da duração da competição nacional. Esse período inclui um total de 183 treinadores e 34 clubes.

Partindo para uma abordagem teórica, este estudo indaga a dimensão da instabilidade ocasionada pela sucessão de treinadores numa organização esportiva, utilizando os principais clubes de futebol do Brasil como uma referência para a investigação. Na medida em que os períodos voláteis de permanência na função de treinador difundem instabilidades recorrentes dentro de um clube de futebol, o objetivo desta pesquisa se volta a desmistificar a depreciação em cadeia acumulada entre as transições de treinadores. Para tal, ao entrevistar especialistas que participam diretamente do processo esportivo, o estudo se distancia de estimativas estatísticas e se concentra na realidade do alto rendimento em um esporte coletivo.

Ao todo, 30 profissionais com vasta experiência prática junto a comissões técnicas foram entrevistados no período entre 14/Janeiro a 25/Março de 2021. Todos os participantes trabalharam pelo menos um ano na Série A do Brasileirão durante a última década (2011 a 2020). A fim de atender o propósito central do estudo, uma atenção particular foi dedicada a atrair especialistas que já haviam testemunhado múltiplas trocas de treinadores no território brasileiro. Apesar da maioria dos entrevistados ter desenvolvido suas carreiras profissionais no Brasil, as suas experiências práticas também incluem passagens por ligas do exterior (Inglaterra, Espanha, Japão, China, Arábia Saudita) e participações em grandes competições internacionais (CONMEBOL Libertadores, UEFA Champions League, Jogos Olímpicos, Copa do Mundo da FIFA). Respeitando os princípios éticos da metodologia científica, todos os entrevistados e os seus respectivos depoimentos permanecem confidenciais e anônimos frente ao julgamento público.

Fundamentalmente, quando um clube de futebol toma a decisão de substituir o seu treinador profissional durante a competição, torna-se possível reconhecer como o domínio organizacional visualiza um efeito direto e intencional (por exemplo, vencer jogos). Entretanto, mudanças de comando técnico também desencadeiam efeitos indiretos e não intencionais, que por sua vez se espalham aos domínios coletivo (por exemplo, o ritmo de treinamento) e individual (por exemplo, a confiança de um colaborador). Tal interação entre diferentes domínios representa o conceito dos efeitos colaterais, também reconhecido popularmente como efeito cascata ou efeito dominó. Essencialmente, tão logo as ações se manifestem em um domínio superior, inevitáveis consequências tendem a ser disseminadas aos níveis inferiores da organização.

A fim de capturar os efeitos colaterais absorvidos indiretamente pelos especialistas que atuam ligados às comissões técnicas, bem como o impacto sentido pelos jogadores da equipe conforme os treinadores entram e saem do cargo durante a temporada competitiva, esta investigação revela, esclarece e acentua como as rotinas de trabalho tendem a ser desestabilizadas nos bastidores de uma mudança de comando técnico. Indagados a respeito das possíveis ramificações que uma alteração de liderança técnica gera em torno do desempenho da equipe, os entrevistados foram apresentados às seguintes questões sobre o domínio coletivo: Como as trocas frequentes de treinadores impactam o desenvolvimento da equipe na prática? O que acontece com os jogadores entre as transições de treinadores? Como a volatilidade do treinador realmente afeta o desempenho esportivo da equipe? Em seguida, partindo ao domínio individual, os entrevistados foram estimulados a compartilhar as percepções acerca das suas próprias experiências mediante o convívio com substituições de liderança técnica. As questões levantadas foram: Quais são os efeitos colaterais que uma troca de treinador ocasiona para o seu trabalho como profissional no clube? O que acontece com os especialistas ligados à comissão técnica entre as transições de treinadores? Como um novo treinador geralmente afeta a sua função?

Contemplando o contexto brasileiro, este estudo qualitativo responde exatamente às duas perguntas abaixo:

Interrogando os efeitos colaterais sobre o desempenho da equipe:

  • No domínio coletivo, como as mudanças de treinadores afetam o desenvolvimento dos jogadores?

Interrogando os efeitos colaterais sobre o desempenho individual:

  • No domínio individual, como as mudanças de treinadores afetam os profissionais ligados à comissão técnica?

A PARTE 2 revelará o cenário que acompanha as transições de treinadores nos domínios coletivo e individual, apresentando os principais efeitos colaterais que recaem sobre o desempenho da equipe e dos profissionais ligados às comissões técnicas.

Por fim, a PARTE 3 concluirá o estudo, refletindo acerca da importância em privilegiar o desenvolvimento progressivo e consistente na cadeia de valor que sustenta uma equipe competitiva no futebol profissional.

Para acessar o PDF do estudo completo, clique aqui.