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Diário de viagem – Final

O último, mas não menos importante, capítulo de nossa viagem à acolhedora e fascinante Irlanda foi desfrutado na sede da Federação Irlandesa de Futebol (FAI).

A FAI dispõe de uma vasta área nos arredores de Dublin, onde se encontram campos para treinamento e a sede administrativa.

Vizinha a ela, pudemos ver as instalações do Comitê Olímpico Irlandês.

O executivo-chefe da FAI, John Delaney, é reputado como o grande protagonista da transformação do futebol irlandês nos últimos anos. Além disso, ocupa uma das Vice-Presidências do Comitê Olímpico Irlandês.

E não se trata de acumular mais um salário – a integração entre as duas entidades funciona muito bem.

Passamos o dia todo envolvidos num ciclo de palestras.

Na primeira dela, o chefe de segurança da FAI apresentou, no Plano de Ação para o Dia de Jogo, todos os detalhes da organização conjunta entre a federação, a polícia, a prefeitura e os estádios onde se realizam os jogos amistosos e oficiais das seleções nacionais.

O documento é um enorme dossiê, fruto do envolvimento coordenado dos líderes de todas aquelas entidades preocupadas em garantir a segurança e bem-estar dos torcedores. Não se percebe jogo de empurra-empurra quanto às responsabilidades de cada órgão.

E o número de maus torcedores fichados pelo controle da FAI e da polícia impressiona: sete (antes do jogo contra o Brasil eram apenas seis).

A seguir, tivemos contato com toda a gama de projetos desenvolvidos pela FAI.

Em todos eles, ficou claro uma coisa: o futebol é um meio absolutamente importante de inclusão social, que extrapola a detecção e formação de talentos.

Em outras palavras, isso é um pano de fundo importante na política de gestão – não a gestão política.

O Programa de Desenvolvimento do Futsal conta com a participação de um treinador brasileiro, como auxiliar. Trata-se de algo estrategicamente relevante para o país, por dois motivos: o futsal, além de poder ser praticado nas escolas, num país com invernos rigorosos, é considerado como importante na formação complementar de futuros jogadores do futebol de campo.

Já no programa Football for all (“Futebol para todos”), o objetivo principal é dar oportunidade às pessoas que não teriam, em princípio, a chance de praticar o futebol. Aqui, são desenvolvidas atividades e competições para surdos, cegos, pessoas com paralisia cerebral, sem-tetos, amputados e cadeirantes. Ademais, jovens em situação de risco também são levados a praticar, aprender e ensinar o futebol dentro das penitenciárias – para ver de perto o que significa abrir mão da liberdade…

Nos Summer Soccer Schools, os acampamentos são utilizados, no verão, para despertar nas crianças o interesse pela prática do futebol. Utiliza-se como etapa de iniciação esportiva.

O Football Intercultural Programme é um dos mais interessantes. A Irlanda, após ter ingressado na União Européia, passou a ser destino de muito imigrantes de todas as partes do mundo. E isso, naturalmente, provocou atritos socioculturais. Assim sendo, a FAI estimula a interação entre pais e filhos de irlandeses e imigrantes, por meio do futebol. O próprio ensino do inglês é feito durante os exercícios do futebol.

O Departamento Técnico cuida da formação e aperfeiçoamento dos profissionais que irão atuar diretamente em todo o sistema de futebol do país. São vários cursos ofertados.

Por fim, cabe mencionar o School Football, por meio do qual o futebol é inserido no ambiente das escolas, como parte indissociável da formação dos jovens.

A fascinante e acolhedora Irlanda nos presenteou com uma lição.

Que futebol é educação. É integração social. É formação do caráter. É solidariedade. É amizade. É transformação de um país em algo mais.

Por lá, o futebol não se encerra em si mesmo. Não é fim. É meio.

Que possa servir como inspiração para o Brasil 2014.

Para interagir com o autor: barp@universidadedofutebol.com.br

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O exemplo do modelo americano de Ligas

Caros amigos da Universidade do Futebol,

Na última quinta-feira, em uma das aulas que ministro em gestão do futebol, surgiu um assunto bastante interessante. Bem verdade que mais acadêmico que prático, mas de toda forma muito pertinente.

Discutíamos a construção histórica dos esportes nos Estados Unidos, e o caráter exclusivo com que as relações esportivas profissionais foram desenvolvidas naquele país. Como o esporte norte-americano teve, desde seu início, uma orientação voltada para o profissionalismo e o lucro.

Fazendo o paralelo para o modelo de ligas europeu, pode-se perceber que o sistema norte-americano permite uma maior intervenção dos órgãos reguladores sobre os clubes (ou franquias), viabilizando um maior controle do chamado equilíbrio competitivo (competitive balance).

No modelo europeu, temos uma maior liberdade para o fortalecimento dos clubes maiores, em detrimento da grande massa dos pequenos clubes, cada vez mais enfraquecidos.

Recentemente, a Uefa na Europa sinalizou com a preocupação da proteção de clubes menores, e, com apoio da Liga Francesa e do Michel Platini, tentam implementar um sistema de licenciamento financeiro dos clubes, para começar a promover um maior controle sobre os clubes. Em outras palavras, se os clubes maiores forem compelidos a pagar suas dívidas (ou ao menos gerenciarem seus passivos), poderíamos ter um maior equilíbrio.

Também deveria haver um controle maior sobre a distribuição solidária de receitas entre os clubes menores, de forma a sempre permitir que clubes menores estejam fortes nas suas competições (para permitir que semifinais como a que vemos hoje em São Paulo aconteçam com maior frequência).

O modelo americano de ligas fechadas é impossível de ser implementado no nosso modelo europeu de divisões abertas, com promoções e rebaixamentos. Porém, é preciso olharmos para alguns princípios lá vigentes, que poderiam ser úteis para nós e, principalmente, fortalecer clubes formadores, pequenos e tradicionais, que são, no frigir dos ovos, o combustível principal que movimenta a nossa indústria do futebol profissional.

Para interagir com o autor: megale@universidadedofutebol.com.br  

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Porque o Brasil não dá Liga

Prega a epistemologia que, para dizer o que uma coisa é, primeiro é preciso definir o que ela não é. E a impressão que eu tenho é que muita gente no Brasil não sabe muito bem o que é uma liga. Então, vamos primeiro definir o que não é uma liga.

O Clube dos Treze não é uma liga.

Não é, nunca foi e nunca será.

Quando ele nasceu em 1987 e criou a Copa União, quase virou uma liga. Mas ficou por aí, no quase.

Uma liga é, de maneira bem simples, um campeonato. Nada mais do que isso.

Ela é constituída pelos clubes que disputam esse campeonato e serve como uma instituição coletiva que se preocupa com a organização, a comercialização e a sustentabilidade do torneio.

Daí, portanto, a razão de o C13 não ser uma liga. Apesar de ele, de fato, ser responsável por uma parte significativa da comercialização da Série A do Campeonato Brasileiro, o órgão não é formado pelos clubes que participam da competição, e sim por um grupo de clubes que não necessariamente toma parte do torneio. É, enfim, uma aberração esportiva.

Suponhamos que o Brasil tivesse uma liga, tipo a Bundesliga – provavelmente o melhor exemplo de liga no futebol tirando a MLS, e que ela se chamasse ‘Liga Brasil’, pra facilitar as coisas. Fosse verdade, o nome certamente não seria esse, já que iriam inventar algo do tipo ‘Grande Liga Brasileira’ ou homenagear algum personagem histórico da administração do futebol nacional, tipo ‘Liga Onaireves Moura’.

De qualquer maneira, a Liga Brasil teria que ser uma entidade independente e soberana, onde fariam parte do seu conselho os representantes de todos os clubes que disputam o campeonato ou campeonatos, caso a LB também cuidasse da Série B. Nesse conselho, os clubes teriam voto único e teriam que obedecer a um estatuto muito bem redigido que deixaria o poder da LB superior à vontade desses clubes sob qualquer hipótese.

Para uma liga dar certo, ela precisa ser muito mais importante que os clubes que fazem parte dela, independentemente do tamanho ou importância histórica do clube.

Aí já aparecem dois problemas que inviabilizam a formação de uma liga no Brasil. Primeiro, porque a igualdade entre clubes nunca vai acontecer. Essa igualdade não se dá apenas na representação política, ou seja, na ideia do “um voto para cada participante da liga”. A igualdade, na verdade, se faz muito mais presente na distribuição de receitas, já que todos os clubes participam do mesmo campeonato e cinco clubes sozinhos não conseguiriam disputar uma competição que durasse um ano inteiro.

Como as receitas provenientes de outras fonte é escassa – como as receitas de dia de jogo -, os clubes grandes só conseguem obter vantagem competitiva através do formato atual do contrato de televisão. Portanto, eles não estariam dispostos a abrir mão da atual divisão de receitas em prol do fortalecimento da liga sob o risco de perder dinheiro e, consequentemente, vantagem competitiva.

O segundo impeditivo é quem seria o representante do clube na LB, ou LON, no conselho da liga. No C13, quem representa os clubes são os presidentes. Em uma eventual liga, os representantes precisariam ser executivos remunerados e com dedicação exclusiva aos clubes, uma vez que o fato de um presidente eleito de clube só permanecer no cargo por um período que pode ser a partir de dois anos faz com que a rotatividade do conselho da liga seja muito alta, o que certamente atrapalharia seu funcionamento.

Pior: presidentes que se movem por ações políticas e ações políticas de clubes dificilmente se conciliam com o interesse da coletividade. Para o presidente de um clube (e principalmente para seus eleitores), é muito mais importante superar o grande rival e ter vantagem em tudo que for possível do que pensar num acordo coletivo. Isso invariavelmente afeta o comportamento de uma liga e impede que ela consiga ser mantida por muito tempo. Um executivo provavelmente teria não apenas mais segurança de continuidade como pautaria suas decisões em concordância com variáveis mais racionais.

Adicionando a esses dois fatores, a própria ideia fundamental de uma liga impede a sua criação de maneira apropriada no Brasil. Uma liga tem que buscar a sustentabilidade financeira do seu campeonato. Portanto, mais importante do que gerar receitas, uma liga bem sucedida precisa implementar fórmulas de contenção de custos. De nada adianta aumentar receitas se os custos com salários e transferências aumentam ainda mais. Só que para controlar esse tipo de coisa, a liga precisaria, novamente, afetar os clubes, principalmente os grandes.

Métodos de controle de gastos teriam que ser implementados, o que impediria clubes de cometerem loucuras financeiras em prol do resultado em campo. E dificilmente o presidente de um grande clube conseguiria se submeter a esse controle caso o time estivesse seriamente ameaçado de rebaixamento.

No fim das contas, a verdade é que uma liga precisa favorecer a pluralidade em detrimento da individualidade. E no Brasil, clubes, presidentes, conselhos e sócios estão mais preocupados com o seu próprio umbigo. Enquanto isso permanecer – e nada indica que haverá qualquer mudança -, qualquer tentativa de liga não conseguirá funcionar direito por muito tempo. Independentemente de quem for o seu presidente. Nem se for o Onaireves Moura.

Para interagir com o autor: oliver@universidadedofutebol.com.br

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Tecnologia no futebol – "Mini fórum" com os leitores: os portões encostados

Olá, amigos!

Damos sequência nesta coluna ao nosso “mini fórum” sobre o uso da tecnologia no futebol, abrindo espaço para o grupo de leitores que defendem a entrada parcial da tecnologia no universo da modalidade.

Agradeço aos amigos que têm participado do debate e contribuído com a parte principal destes textos, cabendo a mim apenas reorganizar e expor as ideias. Lembro que não estou à parte do debate, mas conforme o combinado, deixarei meu ponto de vista para as considerações finais, nas quais haverá espaço também aos nossos colaboradores.

Quando idealizei essa série de produções imaginava duas correntes argumentativas polarizando a discussão. Uma com aqueles que defendem os portões fechados para a tecnologia no futebol; e outra com os incentivadores do uso da mesma pelo esporte bretão.

Para nossa surpresa e enriquecimento do debate, um terceiro grupo apresenta-se com opiniões que se situam no meio termo. Para os mais apressados, poderiam ser os “em cima do muro”, mas é necessário compreender seus pontos de vista, daqueles que chamo de defensores dos “portões encostados” (ou “semi-abertos”) para a tecnologia.

Assim como quem entende que os “portões” devam estar “fechados” para a tecnologia, esse grupo apresenta a ideia de que os custos e necessidades de investimentos para a implantação dos recursos na arbitragem são elementos de “des-democratização”. Por isso, defendem uma linha de inserção da tecnologia com ressalvas, focando seu uso muito mais no processo de planejamento do futebol, entendendo este como decisões tomadas do ponto de vista estratégico e gerencial com o auxilio da tecnologia, e não decisões de campo.

Alguns pontos podem até parecer contraditórios, mas lembro que são opiniões de diferentes colaboradores, que pela essência de seus comentários se encaixam nesse perfil de “portões encostados” para a tecnologia.

Portões Abertos:

Tecnologia para controle e precisão do tempo de jogo, acréscimos, tempo de bola parada, etc. (Lincon Fonseca)

Melhoria dos sistemas de comunicação (já em uso) dos árbitros e assistentes (Lucas Iano)

Tecnologia como sistema de avaliação, feedback para a performance de árbitros, e atualização dos profissionais (Lincon Fonseca, Ricardo Rodrigues)

Portões Fechados:

Soluções que não são imediatas e interferem na decisão prévia do árbitro, como o replay de lances polêmicos (Lincon Fonseca, Lucas Iano)

Utilização de recursos que tira a responsabilidade do árbitro, como chips na linha de gol ou identificação eletrônica de impedimento (Ricardo Rodrigues)

Sistemas que requerem custos elevados de investimentos, dificultando uma uniformidade da arbitragem em nível mundial (Ricardo Rodrigues)

Na próxima semana, apresentarei os tópicos da turma dos “portões abertos”, que defende o acesso à tecnologia no futebol.

Participe, mande seus comentários, via e-mail ou twitter (@edufanta).

Para interagir com o autor: fantato@universidadedofutebol.com.br  

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Treinos: intenso e com qualidade, ou longo e com média intensidade?

Já faz algum tempo que grandes clubes do futebol europeu vêm em seus treinamentos enfatizando atividades de grande intensidade, com pouca duração, distribuídas em períodos únicos diários ao longo da semana de trabalho.

Faz mais tempo ainda que o cientista do desporto Yuri Verkhoshansky, em suas obras traduzidas do russo para o espanhol, português e italiano (e outros tantos idiomas), defendeu e vem defendendo que, no esporte de alto rendimento, o que define o êxito é o “agir em alta velocidade”.

Agir em “alta velocidade” no futebol, diferente do que o tradicional enfoque, do treinamento desportivo e da biologia do esporte propõem, significa construir um jogo em que o ritmo das ações efetivas, dos jogadores e equipe, seja elevado em função do tempo e do espaço, simultaneamente.

Isso quer dizer que, mais do que qualquer movimento realizado com grande velocidade, o que vale para um intenso e aumentado ritmo de jogo é a “alta velocidade” das ações carregadas de significados (técnicos, táticos, físicos e psicológicos).

Como já debatido outrora, a velocidade, como capacidade biomotora pura e simples, manifestada, por exemplo, em corridas cíclicas, não é a velocidade a ser treinada e maximizada no treinamento de futebolistas (e isso não significa deixá-la de lado) – pelos motivos já bem descritos pelas Ciências do Desporto.

O treinamento intenso, respeitando o volume de ações do jogo de futebol, conforme acontece em grandes equipes europeias, prioriza a qualidade das ações treinadas. E a intensidade com qualidade gera respostas adaptativas por parte dos jogadores e equipes, que condicionam um comportamento de alta velocidade de ações – ações efetivas, carregadas de significados.

Claro, qualidade nesse caso significa gerar estímulos que possam desenvolver o jogo que se deseja jogar, respeitando processo e zona de desenvolvimento proximal de jogadores e equipe.

As ideias iniciais de Verkhoshansky, ainda que não tenham sido construídas, partindo do futebol ou do esporte coletivo, como centro, levantaram um interessante debate sobre a questão da intensidade dos treinos no futebol.

Se a velocidade é fator decisivo no êxito esportivo, no caso do futebol, basta não tratá-la como a mesma velocidade do atletismo, natação ou outros esportes individuais. É necessário que se entenda a fundo, na essência, como ela se manifesta no jogo, e especialmente, como pode e deve ser desenvolvida.

No Brasil, é hábito (ou talvez vício, ou quem sabe, tradição) treinar em dois períodos. Isso acontece tanto nas equipes de base (especialmente sub-17 e sub-20), quanto nas equipes profissionais de 1ª ou 2ª divisão.

Treinar pela manhã e no período da tarde (ainda que os jogos sejam à noite!) é a representação máxima do paradigma do “quanto mais, melhor”, e não do “treinar intensamente, com qualidade”.

Mas, o “quanto mais, melhor” não sobrevive impune, pois como conseguir em treinos de dois períodos manter a máxima intensidade nas atividades, se o “quanto mais”, acumulado ao longo de horas, dias e semanas, leva a incompletas recuperações de uma sessão a outra? Como jogadores mal recuperados podem conseguir agir em máxima intensidade por todo o treino?

Talvez isso explique porque o futebol por lá (na Europa) seja mais dinâmico, movimentado, intenso… E não como escutei outro dia, de conceituado homem do futebol, de que a menor velocidade de jogo aqui no Brasil deve ser atribuída, pura e simplesmente, a altas temperaturas e dimensões maiores dos campos de jogo quando comparadas às médias da Europa – sem falar na “malemolência” dos jogadores brasileiros.

Treinar muito e em baixa intensidade condicionará jogadores a jogarem em baixa intensidade (e quem sabe a aguentar dois jogos seguidos!).

A maneira com que se joga é reflexo da maneira como se treina. A maneira como se treina, é reflexo de como aqueles que trabalham com a preparação dos futebolistas enxergam o jogo.

Então, ao invés do “quanto mais, melhor”, o “real, óbvio, adequado (e melhor!)” deveria ser, “quanto melhor, melhor”.

Acho que é isso…

Para interagir com o autor: rodrigo@universidadedofutebol.com.br

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Zona

Eu deveria prestar uma homenagem ao Armando Nogueira.

Deveria, mas não vou. Não que eu não ache que ele mereça uma homenagem, muito pelo contrário. Ainda que eu não tenha acompanhado sua época de ouro, Nogueira foi fundamental para inspirar outros tantos que hoje servem para me inspirar.

Além do mais, qualquer homenagem a Armando Nogueira necessitaria ser feita em poesia. E realmente não sou muito bom com poesia. Não sou nada romântico. Quando alguém fala que daria a lua de presente para o seu amor, eu fico pensando que diabos o amor da pessoa faria com a lua que acabou de ganhar. Pra quê ganhar uma? Não é melhor uma caixa de bombons? Mas falar pro seu amor que você daria uma caixa de bombons também não me parece ser nada romântico. Enfim. Eu não gosto de poesia. Não sei fazer e não entendo. Logo, não tenho como gostar.

Não sendo uma pessoa poética, portanto, eu não poderia tentar ser um discípulo de Armando Nogueira. Porque pra fazer isso não se pode ficar pensando que se um lenço de papel fosse realmente um enorme latifúndio para o Mané Garrincha, o Brasil tem muita sorte de ele ter escolhido ser jogador de futebol ao invés de líder do MST. Elza Soares na Via Campesina seria o terror encarnado.

Eu posso, porém, tentar ser um discípulo da Mãe Dináh.

Isso porque eu acho que escrevi há um certo tempo que pra fazer dinheiro na Copa do Mundo de 2014 seria interessante investir na indústria contraceptiva, já que o Brasil é um dos maiores, senão o maior, destino de turismo sexual do planeta e o fluxo de turistas estrangeiros ávidos por fazer parte desse circuito sem deixar filhos para exigir heranças deve ser bastante grande. Ou isso, ou advogado de família, justamente para ajudar esses filhos a exigir as heranças correspondentes. Eu inclusive defendi essa ideia publicamente em um seminário realizado em Curitiba. Obviamente eu não fui levado a sério. Que nem a Mãe Dináh.

Entretanto, assim como a Mãe Dináh, tudo indica que eu tenho uma capacidade ímpar de prever o futuro. Nós, videntes, temos que conviver com a frequente descrença geral, mas o futuro nos prova verdadeiros. Eis que no começo de março eu comprovei não ser uma fraude. Afinal, o governo britânico anunciou que irá doar 42 milhões de camisinhas à África do Sul depois que o país fez um pedido formal de doação de 1 bilhão de preservativos.

Tudo bem que a questão não é necessariamente evitar a proliferação de herdeiros, mas sim a preocupação com a taxa absurda de 20% da população adulta sul-africana infectada pelo vírus HIV. Ainda assim, mostra que há lógica na relação entre a Copa do Mundo e as atividades sexuais. E, volto a dizer, ninguém no Brasil se preocupou com isso ainda. E nem vai se preocupar, afinal nem estádio tem ainda. Isso dá uma noção da confusão de medidas e necessidades que vai tomar conta do país nos próximos quatro anos. Vai ser uma zona. No bom e no mal sentido. Até a Mãe Dináh consegue prever isso.

Para interagir com o autor: oliver@universidadedofutebol.com.br

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A mídia da vez

Por aqui já comentei, em várias ocasiões, que não se pode pensar mais em esporte sem se falar das mídias sociais. Nada de mesa-redonda pós-jogo, com a análise modorrenta de comentaristas. Tudo em tempo real, com a opinião e a participação do torcedor, alçado à condição de comentarista da vez, podendo ainda dar o recado para os atletas, serem de fato ouvidos, conectarem-se a eles.

E isso vale para o bem e para o mal!

Um bom exemplo disso foi neste domingo durante o eletrizante Corinthians 4×3 São Paulo. Alex Glikas é diretor comercial da Locaweb. Não é uma figura pública. Mas representa a empresa que, neste domingo, estreou o patrocínio de dois jogos para o São Paulo. Corintiano (assim como são os donos da empresa), Glikas não se conteve e tirou sarro do Tricolor em sua página na internet. São pouco mais de 200 seguidores, provavelmente quase todos eles amigos e conhecidos de Glikas, passíveis de entenderem a brincadeira e darem risada dela.

Só que algum jornalista (tinha de ser!!!!) viu a gozação de Glikas ao rival. E a história se espalhou. Ganhou chamada de capa nos sites, revoltou a torcida tricolor. Glikas retirou seu comentário do ar e publicou um pedido de desculpas aos torcedores.

Em seu perfil no microblog, agora, diz ele: “Sinceras desculpas à torcida e ao SPFC. No calor do clássico, o torcedor tomou conta do profissional. Não acontecerá de novo”. Algo bem mais polido e insosso do que as palavras “no calor do clássico”. Algo típico de uma mesa de bar.

Em 140 caracteres veio a frase que comprova o quanto o torcedor, hoje, está ligado nas redes sociais, interagindo, interferindo, palpitando, mudando o rumo das coisas. A Locaweb teve de publicamente dizer que não vai retirar o patrocínio ao São Paulo, permanecendo na quarta-feira para a o jogo da Copa Libertadores. E que a opinião foi dada por um funcionário, não representando o sentimento da empresa.

É a mídia da vez, que reforça o quanto é importante, para as empresas, para o esporte e para as figuras públicas, se policiarem com essa exposição aparentemente inofensiva dos malditos 140 caracteres.

É claro que Glikas não queria ofender o Tricolor, muito menos relacionou seu ato com o patrocínio recém-acertado. Foi a opinião de um torcedor. Como se estivesse na mesa do bar, ou no estádio, ou em frente à televisão.

Só que a mídia social não é o bar da esquina. Está ali, para quem quiser acessar, cornetar, reclamar. E, pior de tudo. Reproduzir.

Para interagir com o autor: erich@universidadedofutebol.com.br

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Ego Sum

Se você acompanha essa coluna há pouco tempo, você deve saber que eu faço um doutorado.

Se você acompanha essa coluna desde seu começo, você deve imaginar que eu estou chegando ao final do meu doutorado.

Mas ninguém deve acompanhar essa coluna desde seu começo. Talvez apenas os editores da Universidade do Futebol, já que eles são obrigados a revisar semanalmente o que eu escrevo para evitar que os incontáveis erros gramaticais sejem publicados. E olha que acho que por essas alturas eles já devem estar usando a correção automática.

De qualquer maneira, o problema com o doutorado é que você começa a pesquisar uma coisa achando que você vai chegar em algum lugar, mas, depois de um tempo, você não apenas se dá conta que você não está chegando em lugar algum, mas que tem muitas outras coisas que deveriam ser pesquisadas.

Uma questão que eu acho que merece uma discussão detalhada para a melhor compreensão possível sobre o comportamento da indústria do futebol brasileiro é a influência que o ego possui nas ações dos tomadores de decisão envolvidos com o jogo. Até que ponto as pessoas tomam decisões baseadas em princípios lógicos, desprovidas de qualquer necessidade de auto-sustentação? Até que ponto essa necessidade de se auto confortar influencia o rumo das suas ações?

Eu venho batendo na tecla de que o futebol gera mais exposição do que dinheiro há muito tempo. Assumindo que isso seja verdade, é natural imaginar que boa parte das pessoas que se envolvem com o futebol buscam mais exposição do que dinheiro. Isso explica, por exemplo, o grande envolvimento de diretores não remunerados com os clubes. O cara larga o trabalho, a casa e a família para se dedicar ao clube. Muita gente vê nisso, não sem subsídios, uma ação de picaretagem. Afinal, se o cara se dedica tanto assim, o cara deve levar uma boa grana por fora. Por vezes, isso é verdade. Mas a impressão que eu tenho é que na maioria das vezes isso se dá por uma questão de auto-estima.

Pessoas que se envolvem com o futebol rapidamente alcançam um status de importância não necessariamente relacionada ao seu currículo pessoal. Isso acontece, por exemplo, com um cara qualquer que de repente vira presidente do clube de futebol. Do dia pra noite, o cara larga o anonimato e se torna uma figura pública. Alguns não gostam disso. A maioria acaba se embebedando. E não larga o osso. Pior, acha que a exaltação é pessoal, e não institucional. Acha que a bajulação se dá pela figura individual, e não pelo fato de ser presidente de uma organização muitas vezes histórica e influente. Aí começa a confundir as coisas. Faz uma conta no Twitter e vai pro abraço. Tenta ser maior que o clube. Logicamente, não é. E tudo, hora ou outra, acaba se esfacelando.

Mas não é só o presidente. Talvez pior sejam os diretores. Afinal, presidente é presidente. Justo que seja minimamente egocêntrico. Diretor, porém, é outra história. O cara é eleito, nunca foi nada, e de repente acha que é o ó do borogodó, que eu não sei se está relacionado apenas à última vogal ou ao fato de ocupar 50% de uma palavra oito letras. Enfim, o cara sobe nas tamancas e, por ter feito parte de uma chapa – uma vez que na maioria dos clubes os diretores não são eleitos individualmente, mas sim fazem parte de um grupo encabeçado pelo presidente – acha que tem certeza daquilo que está fazendo. Afinal o cara é diretor. E diretor é da diretoria. E diretoria é vip. É nata. É elite. É qualquer outro adjetivo que indique superioridade. Tipo a última bolacha do pacote, ainda que eu ache que não seja muito apropriado uma vez que a última bolacha está sempre quebrada e sai junto com um monte de farelo. Ainda assim, ele vai lá, acha que sabe, faz o que quer e dificilmente alguém vai reclamar, uma vez que isso pode gerar um problema político.

Normalmente, portanto, há forte influência do ego no processo cognitivo dos principais tomadores de decisão do futebol.

O problema é que o esquema não para aí. Afinal, não é só dentro do clube que o ego impera. Fora dele pode ser pior ainda, principalmente na imprensa. Muito jornalista que trabalha com futebol ganha muito pouco. Muito comentarista que comenta futebol não ganha nada. Ainda assim, o cara não larga o osso por duas razões: a) porque ele gosta do que está fazendo e é feliz, o que é muito justo; e b) porque ele aparece na televisão e assim ele se torna uma pessoa conhecida e respeitada, o que até pode ser justo também, mas pode carregar um lado nefasto.

Ao aparecer todo dia e ser reconhecido na rua, um jornalista pode eventualmente achar que automaticamente sabe tudo sobre aquilo que ele está falando, e não se preocupa em aprofundar muito a sua opinião. Seu ego influencia na não necessidade do aprimoramento profissional. Muitas vezes, essa opinião é crítica em relação às decisões tomadas pelo clube, que por sua vez também são geradas pela necessidade de auto-estima. Aí, quando um ego bate outro ego, a coisa se complica. E o rumo das decisões começa a tomar a direção do caos.

Se você é psicólogo, você deve ter percebido que eu não sei muito bem sobre o que eu estou falando. Por isso que eu mencionei a necessidade do assunto ser mais bem pesquisado. O entendimento mais profundo dessa questão me parece ser bastante importante para o desenvolvimento mais apropriado da indústria.

E, se eu estou falando, pode ir com fé.

Acredite.

Não seje burro.

Para interagir com o autor: oliver@universidadedofutebol.com.br

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Diário de viagem – Parte 3

Nossa jornada seguia agora para a Irlanda, onde iríamos cumprir a agenda de visitas técnicas aos estádios locais, bem como assistir a um jogo da Primeira Divisão local e participar de um ciclo de palestras na sede da Federação Irlandesa de Futebol (FAI).

E aqui, vale a pena mencionar algo sobre a infraestrutura e os serviços dos aeroportos da Inglaterra e Irlanda, em contraponto ao que vivenciamos no Brasil, nessa mesma viagem – e que também são importantes dentro de um contexto de Copa do Mundo, como anteriormente destacamos.

O aeroporto internacional de Curitiba opera, até hoje, sem voos internacionais, à exceção do destino Buenos Aires. Não há a devida preparação alfandegária para operar um maior número de voos, nem para receber aviões de maior porte. E estamos falando da chamada “Capital do Mercosul”.

O Aeroporto Internacional de Guarulhos, em São Paulo, está envelhecido e sobrecarregado. Nitidamente. Na ida, não houve muitos problemas com check-in e despacho de bagagens. Na volta, sim. Mesmo com folga de algumas horas, sobrou pouco tempo para confirmar a conexão para Curitiba, porque muitos voos internacionais chegam no mesmo horário e, dado o duopólio de nossa aviação, temos que suportar a sobrecarga e ineficiência dos serviços de uma das companhias aéreas.

Por outro lado, no Aeroporto de Londres, Heathrow, as coisas funcionam. Mesmo quando falamos do terceiro maior do mundo em número de passageiros. São vários terminais, interligados por um sistema de metrô interno e também com estação para ligá-lo ao centro da cidade. E existem várias lojas para compras e praças de alimentação muito bem servidas. Não houve atrasos, apesar das distancias percorridas entre um terminal e outro e o rigor da revista antes do embarque.

Em Dublin, obviamente, o movimento é bem menor e os serviços também funcionaram em alto nível.

Ali, conhecemos o novo estádio da FAI, Aviva, para 50.000 pessoas, que se encontra em fase final de construção, e será inaugurado em agosto, num amistoso contra a Argentina, e que servirá exclusivamente ao futebol. Lindíssimo e com o projeto totalmente preocupado com questões socioambientais (iluminação solar e impacto nas casas vizinhas, água de chuva captada para irrigação e uso sanitário, gestão de recursos e resíduos).

Além disso, visitamos o estádio de Croke Park, sede dos Gaelic Games (Jogos Gaélicos) – belíssimo e com capacidade para 83.000 pessoas, um dos maiores da Europa.

O jogo a que assistimos foi no estádio Dalymount Park, do Bohemian Football Club, com capacidade para 8.000 pessoas e com atmosfera típica da Rua Javari. Bem familiar mesmo, ainda que a casa do maior clube da Irlanda.

A Irlanda é um país interessante no que concerne aos seus principais esportes. Não só existe o futebol, como também o Rúgbi, o Gaelic Football (Futebol Gaélico) e o Hurling.

O Futebol Gaélico é uma mistura de Rúgbi, com o nosso futebol, com o americano Lacrosse e com o críquete e com o próprio Hurling. Vai entender… Vou tentar explicar.

É um dos quatro jogos Gaélicos que promove a GAA (Associação Atlética Gaélica), a maior e mais popular organização na Irlanda, com regras rígidas sobre amadorismo e o principal evento do esporte é o inter-condado, o All-Ireland Football Final. Acredita-se que o jogo descende do antigo Futebol Irlandês, conhecido como caid, que remete ao ano de 1537. O jogo moderno tomou forma em 1887.

O Futebol Gaélico é jogado por times de 15 jogadores em gramado retangular com traves em forma de H localizadas no fim do campo. O objetivo principal é marcar gols, conduzindo a bola com chutes e socos. O time com maior pontuação no fim da partida ganha.

Jogadores podem avançar no campo com uma combinação de carregar a bola, fazer uma embaixada e pegar a bola novamente, chutando, e passando a bola com os pés ou mãos para os companheiros de time.

No Croke Park, visitamos o museu da GAA, muito bem gerido e servido, onde pudemos (tentar) entender mais a respeito das origens dos Jogos Gaélicos.

O que nos impressionou, definitivamente, foi uma bem visível convergência entre a infraestrutura esportiva e a história das instituições que nela desfilam suas equipes.

História construída por dentro e por fora dos estádios, nas arquibancadas, nos museus e memoriais – como símbolos representativos dos valores e do orgulho de todo o povo irlandês.

Para interagir com o autor: barp@universidadedofutebol.com.br

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Tecnologia no futebol – "Mini fórum" com os leitores: os portões fechados

Olá, amigos!

Damos sequência ao texto Portas Fechadas: tecnologia não entra! Por quê?

Agradeço os emails recebidos e tentarei sintetizar aqui algumas das opiniões colocadas pelos leitores. Como o espaço é curto, não reproduzo todos os diálogos, mas indico os nomes dos amigos que colaboram com essa ideia de “mini fórum” a respeito da tecnologia no futebol.

A modalidade fechou as portas para a tecnologia e a pergunta que fazemos a respeito disso é:

estão certos os homens que gerenciam o futebol? Sim? Não? Talvez? Por quê?

Hoje, apresento algumas das ideias do pessoal que defende a postura da Fifa. No final deste “mini fórum”, faremos uma grande amarração entres pensamentos e participantes.

Portão Fechado

Alguns amigos defendem que a Fifa está num caminho certo, que não deve adotar tecnologia sobre diversos pretextos, os quais estão topificados a seguir:

Permitir o acesso à tecnologia tira o aspecto humano do jogo, é como se o futebol fosse automatizado (Fred Souza, Elisário Soares, Rodolpho);

Perde-se a polêmica, a discussão, grande atrativo para o torcedor (Elisário Soares, Rodolpho, José Irineu);

Se gastaria muito tempo para utilizar os recursosm acarretando em atraso e muitas paralisações (Rodrigo Martins, Amauri Furlan, José Irineu, Fred Souza);

Não seria democrático, pois nem todas as categorias poderiam se beneficiar. Teríamos um futebol diferente de acordo com as condições financeiras de cada região ou mesmo num determinado campeonato, como o Brasileiro, com claras diferenças entre estádios e poder econômico (Rodrigo Martins).

São argumentos defendidos pelos colegas de diferentes formas, mas que de modo sintético estão contidos nesses aspectos.

Para não “contaminar” tais tópicos com meus contrapontos a esses argumentos, deixo-os para que outros amigos emitam suas opiniões a respeito.

Na próxima semana, apresentarei os tópicos da turma do “Portão Aberto”, que defende o acesso à tecnologia no futebol. Existe ainda a turma do “Portão Encostado”, que defende em partes a tecnologia – esta também terá seu espaço nessa coluna.

Após exposto sem juízo num primeiro momento os tópicos, darei espaço para o debate propriamente dito, com direito à réplica e tudo mais.

Acredito, assim, pessoal, contribuirmos para aprofundar um pouco mais a respeito do uso da tecnologia no futebol, sem ficar numa perspectiva batida, e para tal disponibilizo esta proposta de “mini fórum”

Participe, mande seus comentários, via email ou twitter (@edufanta).

Para interagir com o autor: fantato@universidadedofutebol.com.br