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Futebol e cerveja… Ou seria cerveja e futebol?

Tudo começou quando me deparei com uma matéria cujo título me chamou a atenção: “Atletas deveriam beber cerveja todo dia, diz estudo“. Seu subtítulo afastava possíveis desconfianças dos mais incrédulos: “Além de matar a sede e relaxar, a cerveja ajuda na recuperação após a prática esportiva”, dizia.
 
Não havia dúvidas. O Conselho Superior de Investigação Científica (CSIC), da Espanha, avalizava o estudo “Idoneidade da cerveja na recuperação do metabolismo dos desportistas” que, baseado em relatórios e pesquisas de especialistas em medicina, fisiologia e nutrição da Universidade de Granada, defendia o consumo moderado da cerveja para os atletas como fonte de hidratação diária.
 
A tese, de autoria do cardiologista e ex-jogador de basquete da seleção espanhola, Juan Antonio Corbolãn – medalha de prata nas Olimpíadas de Los Angeles (1984) -, afirmava que o consumo diário de três tulipas de 200ml de cerveja para os homens e de duas para as mulheres, favorecia a recuperação do metabolismo hormonal e imunológico depois da prática esportiva de alto rendimento, além de também prevenir dores musculares.    
 
Tomei conhecimento dessa matéria no sábado ao final da manhã, em casa, quando já começava a pensar o que iria bebericar antes do almoço, já que o joguinho de futebol da tarde estava irremediavelmente prejudicado pela chuva que insistia em não parar desde a noite anterior.
 
Mais do que depressa quis levar ao conhecimento de meus colegas da Unicamp o “grande achado” e, no espírito recomendado (não só) para um fim de semana, fiz saber a todos que eu estava fazendo a minha parte! O que não sabia e, portanto, não esperava, era que tão ingênua mensagem fosse gerar tamanha – e distinta – repercussão…
 
A primeira delas veio reforçar minha euforia pela “descoberta”:
 
“Ah! Mas eu também considero da maior relevância social isso, afinal, a minha bebida preferida agora torna-se, definitivamente, também meu remédio e, além de tudo, uma poderosa arma para a melhoria do desempenho fisico ! eh eh eh. Isso é o máximo!”.
 
A segunda veio enaltecendo uma modalidade esportiva que, em nosso país, vive à sombra do futebol, para desespero do missivista:
 
“Vi esse cardiologista jogar algumas vezes. O Corbolãn foi um dos melhores que já vi jogar. Ele jogou dois campeonatos mundiais pelo Real Madrid e era espetacular, daqueles armadores clássicos. Só podia ser mesmo um armador basqueteiro para fazer uma pesquisa de tamanha relevância social”.
 
Já a terceira, me pegou no contrapé…

Surpreendi-me com o conteúdo de seu e-mail. Pertinente a matéria tratada, a OMS difunde os benefí­cios da alcoolemia relativa à ingestão moderada do vinho às pessoas já dependentes da bebida, mas esclarece que não recomenda aos não usuários. Sabendo que os libares chamados “sociais”, como o álcool e cerveja, são porta aberta para ingestões massivas, e inclusive de drogas pesadas, e, modéstia a parte, da relevância dos impactos de nossas posições de médico e educadores fí­sicos, e, portanto, intelectuais formadores de opinião, estou tomando a iniciativa de, frente ao material acima mencionado, solicitar manifestação a respeito da Associação Brasileira de Estudos do Álcool e outras Drogas – www.abead.com.br.
 
Ademais, considerando os vultuosos lucros do grande capital cervejeiro, fico curioso em ver as declarações de ausência de conflitos de interesses dessa divulgação internacional de polí­tica pública fundamentada em 16 observações”.
 
Senti-me na obrigação de, antes de abrir a garrafa de vinho (a chuva e o frio me convenceram de sua pertinência naquele momento, em detrimento da cerveja), a dar sequência à conversa, o que fiz da forma retratada abaixo:
 
Confesso pra você que meu “‘espí­rito”, ao encaminhar a mensagem em questão, estava todo comprometido com a idéia do feriado, disposto a não ficar chateado pelo fato de que a maioria de nossos colegas não fizesse a menor idéia do que estamos, nós, paulistas, homenageando nesse fim de semana prolongado por conta do dia “9 de Julho”. Levando a sério a notí­cia, você está coberto de razão em chamar a  atenção para a possibilidade da mensagem/pesquisa aludida conter o “dedo” da máfia das indústrias cervejeiras. Não descarto essa possibilidade, até porque a tese da neutralidade da pesquisa cientí­fica nunca fez parte daquelas por mim defendidas.

Por outro lado, procuro também não ignorar a “máfia” da indústria farmacêutica, a qual o filme “o jardineiro fiel” tão bem retratou, “produzindo” doenças e testando medicamentos em pessoas, delas fazendo os “ratinhos” de plantão.
 
Também busco estar atento à  miopia do conceito de saúde que orienta – sem medo de errar – mais de 90% da formação em educação física nos  cursos superiores de nosso país, totalmente alheia e distante do conceito de saúde ampliada defendida por nossa política pública de saúde…

Fato concreto é que o Esporte – nos termos que a sociedade moderna a ele atribuí ­-, além de se fazer de simulacro do rendimento fí­sico necessário ao processo produtivo no modo de produção que pauta nossa organização societária, e à revelia dos que observam no  ócio, tempo e espaço nocivos aos interesses dessa lógica organizativa de sociedade, também se associa àquilo que “Baco” representa: festa,  alegria, prazer, regado a vinho e, por que não… À cerveja”.
 
E encerro a mensagem dando vazão a um sentimento que muito aflige aos que, pela ótica das ciências humanas e sociais, desenvolvem estudos e pesquisas no campo da área da Educação Física:
 
“Continuemos essa sadia reflexão, distante do campo acadêmico tão preocupado em produzir seus “papers” e, lógico… Publicá-los em periódicos “A” internacional”.
           
Pois não é que o assunto ainda trouxe a participação na conversa de outros colegas! Um deles, nos dando uma verdadeira aula sobre a origem da cerveja (vocês sabiam que ela teria nascido, ao acaso, há mais de 10.000 anos?), não sem antes nos alertar para o fato de estarmos “mergulhados em uma pobreza afetiva, marcada pelo higienismo e eugenismo do mundo contemporâneo, essa onda hiper conservadora e moralista, especialmente nos paises periféricos e com baixa densidade intelectual como o Brasil”.
 
E não deixa por menos:
 
“É evidente que sou totalmente a favor das interdições legais de publicidade de bebidas alcoólicas, de fumo e também de comida, desse estimulo estúpido em assoc
iá-las a ser bem sucedido/sucedida, bonito/bonita e sedutor/sedutora e é evidente que já assinei mil listas e me comprometi e me comprometo todos os dias contra o aviltamento da mulher, do corpo feminino na publicidade da cerveja no Brasil e de outros produtos… Mas, é preciso atenção, delicadeza e cuidado para não nos transformarmos em pequenos fascistas, policiais de uns e de outros, com atitudes completamente avessas à vida pública que é sempre política, à vida democrática”.

Já o outro, para não deixar dúvidas sobre o que me motivou a escrever, colocando a conversa de volta ao espírito de um sábado regado à cerveja e a futebol, e nos brindando com a lembrança de um outro componente inseparável dos dois acima, qual seja, a amizade que permeia a enxurrada de jogos e jogadores de final de semana dos clubes e várzeas dispersos por este país afora:
 
“Depois desta saudável chuva de e-mails, que acompanha este úmido final de semana, aproveitei a dica para deliciar-me com uma maravilhosa cerveja escura (negra, bock, malzebier, cafeinada, ou como queiram denominar).
 
Não poderia deixar de contribuir nesta ocasião com um estudo quase-científico realizado recentemente por um coletivo de amigos que se reúne numa chácara em Americana-SP para celebrar a amizade. Fizemos uma pesquisa a cegas com 12 marcas de cerveja, buscando identificá-las, junto a 14 especialistas (daqueles que possuem calos no cotovelo devido às inúmeras horas no balcão dos bares). Resultado: o que mais acertou conseguiu identificar 3 marcas.
 
Conclusão: A quantidade não necessariamente leva ao conhecimento profundo do assunto. Perspectivas: continuaremos nos aprimorando na arte de degustar desta bebida, moderadamente sempre”.

Não sei por que me lembrei de um filme (ou seria livro?) chamado Samba, suor, futebol e cerveja... Pois é… Para muitos, incompatíveis; para outros tantos, inseparáveis… E para você?
 
 
Para interagir com o autor: lino@universidadedofutebol.com.br
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Treinar jogando: a Zona de Desenvolvimento Proximal como mais um argumento!

O maior motivo de reclamação das equipes de futebol (o excesso de jogos) acaba sendo o principal meio para a evolução do jogar que elas acabam tendo

Em um jogo de futebol, durante o confronto das duas equipes que o disputam, há um sem número de situações-problema, que ocorrem o tempo todo, aleatoriamente, de maneira imprevisível, em cada milímetro dos 7000 metros quadrados que correspondem ao campo de jogo.

Vencer o jogo significa resolver melhor essas situações. Resolver melhor essas situações significa tomar as melhores decisões a cada ação, sob o ponto de vista individual e coletivo.

Na tomada de decisão, a intenção na ação e as estruturas criadas a partir de experiências anteriores podem colaborar para melhores decisões em uma situação-problema qualquer. Para tanto, a experimentação de situações desafiadoras, diversificadas e ricas, específicas do jogo, aumentará cada vez mais as chances de quem joga de tomar decisões acertadas.

A inteligência humana é um mecanismo móvel, imprevisível, versátil e circunstancial, que, diante dos problemas dispõe ao sujeito um leque de possibilidades, que, se for amplo (o leque), diversificado e rico, contribuirá para que sejam escolhidas as melhores opções disponíveis para cada circunstância.

Então, o treino de futebol deve levar em conta que, para se estar habilitado para jogar, deve-se treinar, jogando.

Nessa perspectiva, vale ressaltar que a possibilidade de aprender a partir de estímulos que desencadeiam processos de assimilação e acomodação – e de, portanto, formar novos esquemas cognitivos – deve estar adequada à fase de desenvolvimento do sujeito que recebe o estímulo (e isso inclui o seu nível de compreensão e ação no jogo). Em outras palavras, só é possível interagir com problemas se esses forem adequadamente superiores ao conhecimento prévio necessário para tal (não pode ser excessivamente superior, nem inferior!).

Sobre isso, Vygotsky descreveu a existência de uma área potencial de desenvolvimento cognitivo definida como uma “área” que rodeia o desenvolvimento real atual do indivíduo (que é determinado pelo seu nível atual para resolver problemas sem auxílio de outras pessoas) e pelo nível de desenvolvimento potencial (que é determinado através da resolução de problemas que precisa ser “guiada”).

Então, o nível de desenvolvimento consolidado, que permite a utilização do conhecimento de forma autônoma, é o desenvolvimento real do sujeito. Ele não é estático e vai se alterando no processo de aprendizagem. A consolidação do desenvolvimento real gera também possibilidades menos elaboradas e não consolidadas que potencialmente podem ser construídas; esse é o desenvolvimento potencial. O desenvolvimento potencial tende a ser, com o processo permanente de aprendizagem, o futuro desenvolvimento real (FIGURA). 

Segundo Vygotsky, o processo de desenvolvimento não coincide com o processo de aprendizagem, porque há uma falta de sintonia (“assintonia“) entre os dois (o processo de desenvolvimento e o processo de aprendizagem que o precede). Dessa assintonia, que corresponde à área da “dissonância cognitiva” do potencial do aprendiz, surge a Zona de Desenvolvimento Proximal.

A Zona de Desenvolvimento Proximal é, então, em outras palavras, o campo intermediário do processo que liga o estágio atual de desenvolvimento com o próximo em potencial. Porém, o próximo em potencial a ser buscado, no caso do jogo de futebol, é o próprio jogar (melhor, mais elaborado, etc.).

Então, que sentido faz, no futebol, sessões de treinos, onde o cerne são os sprints, os saltos ou as longas corridas a que são submetidos os jogadores? Que próximo estágio de desenvolvimento potencial se conseguirá alcançar com isso?

O tempo para desenvolvimento do jogar no futebol é escasso. Muitos compromissos, jogos, competições viagens… E, mesmo assim, perde-se muito dele (oh, precioso tempo!), treinando justamente algo que não vai contribuir para que se alcance os novos níveis do jogar.

E aí, sabe quando é que a equipe acaba evoluindo seu jogar (ou no “futebolês”, adquirindo ritmo e consistência)? Jogando no meio ou fim de semana suas partidas oficiais.

Então, em outras palavras, o que se configura no maior motivo de reclamação das equipes de futebol (o excesso de jogos), acaba sendo o principal meio para a evolução do jogar que elas acabam tendo.

Para interagir com o autor: rodrigo@universidadedofutebol.com.br

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Números inventados

Esta provavelmente será a coluna de minha autoria mais lida na história. Uma estimativa minha, baseada no número de emails recebidos por conta da última coluna e na repercussão da publicação no digníssimo blogdojuca, indica que o número deverá septuplicar, chegando, superestimando, a 14 leitores, fora a equipe da redação da Universidade do Futebol.

O que, pro meu nível, já gera certa ansiedade. Ainda mais devido à infeliz ideia de deixar para escrever após o “Placar da Rodada”.

Nada sensato. Assim como não foi sensato mencionar o nome da empresa Itaiquara na última coluna. Não apenas pelo número de pessoas que me mandaram emails com receitas de bolo por email, fomentadas talvez por certa nostalgia em relação ao fermento, mas também pela infelicidade temporal.

Você viu a coletiva do René Simões, reclamando da empreitada ao vestiário da Portuguesa, não viu? Você notou a logomarca da Itaiquara logo acima da cabeça dele, indo um pouco pra direita, não notou? Talvez não. Mas eu notei. E só notei por causa da minha maldita última coluna. Não tivesse eu pesquisado a empresa, possivelmente não teria prestado atenção. Não tivesse você lido, também não. Citação errada, na hora errada, com publicidade errada.

A escolta armada lusitana não acabou só com as perspectivas da carreira do Edno no time. Acabou também com qualquer perspectiva minha de receber uma cesta de produtos da Itaiquara. Se o fermento for tão bom assim quanto as pessoas que me mandaram email disseram, eu vou ficar realmente frustrado.

Assim como ficaram frustradas algumas pessoas em se deparar com a pequenez relativa do futebol. Mas não se engane. Ser pequeno em termos financeiro não quer dizer necessariamente ser menos importante. Veja o Dado Dolabella, por exemplo. Ele é rico. E não é importante.

Um questionamento foi levantado por diversas pessoas astutas: afinal de contas, pode ser dito que o negócio do futebol é pequeno porque os clubes faturam pouco em relação ao que outras empresas arrecadam? O fato é que não, não pode. É um questionamento válido e que merece maior análise. Peguemos as quatro fontes de receitas relativas a clubes de futebol: mídia, patrocínio, licenciamento e estádio. Todas elas oferecem receitas para terceiros, ou seja, grana que não passa no caixa do clube. Mas que é do futebol.

A Globo arrecadou, com publicidade aberta e fechada, e mais o pay-per-view, uns 550 milhões de reais com o futebol em 2008. Cálculo grosseiro baseado em uma série de dados não confirmados, mas que indicam, pelo menos, um patamar. Somando a Band, totaliza uns 600 milhões. Acho. Não sei mesmo. Tô chutando, sem nenhuma vergonha.

É muito complicado atribuir um valor de receita gerada por patrocínio, por isso eu também vou inventar um número: 100 milhões de reais. Esse foi o dinheiro que patrocinadores geraram com o futebol. Número inventado com base na soma, também grosseira, dos valores de patrocínio dos clubes adicionados a um pequeno percentual de retorno sobre o investimento. E fazer soma com 100 é sempre muito mais fácil. Adicionemos mais uns 500 milhões de receita de patrocinadores de televisão e chegamos a 600 milhões. Sem fundamento algum, é claro.

O grosso da receita de licenciamento vem da venda de camisas. Uma camisa custa uns R$ 180,00, por aí. Dependendo da marca. Suponhamos que, no ano passado, um em cada 50 brasileiros tenha comprado uma camisa oficial de um clube brasileiro, o que eu acho uma estimativa otimista. Isso dá uma venda de 3,8 milhões de camisas oficiais, que gera uns 680 milhões de reais.

De acordo com a CBF, cerca de nove milhões de pessoas assistiram as séries A e B do Campeonato Brasileiro em 2008. Suponhamos que cada uma dessas pessoas tenha gasto uns R$ 10,00 nos estádios, já que não tem mais cerveja, e cincão pro tiozinho não riscar o carro, já que tem outros ocupantes do carro pra rachar. Isso dá uns R$ 135 milhões, com estádio. Dos quais, nesse meu cenário deturpado, R$ 45 milhões foram pra mão de flanelinhas. Se for verdade, já saiba o que fazer da vida.

Totalizando, as quatro principais fontes de grana do futebol geram um total de R$ 2 bilhões para terceiros. Vamos supor que os clubes brasileiros, mais as federações e a CBF, tenham gerado uns R$ 3,5 bilhões, o que é também superestimado. Tudo isso somado, e superestimado, dá R$ 5,5 bilhões. Se eu não estiver superestimando o suficiente, esse valor sobe para R$ 6 bilhões, o equivalente a 0,2% do PIB do Brasil em 2008. Se eu estiver meio certo, a fatia real chega a 0,4%. Se eu estiver um pouco certo, talvez chegue a 0,6 ou 0,7% do PIB. Mas não dá pra imaginar que seja mais do que isso. Nada que seja significativo para a economia nacional. Nada que se possa comparar com outros setores produtivos do Brasil. É isso. Puro e simples.

Talvez você esteja decepcionado. Eu certamente estou. Perdi a chance de receber uma cesta da Itaiquara.

Para interagir com o autor: oliver@universidadedofutebol.com.br

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Tá no contrato…

Assistindo ao programa “Linha de Passe” da ESPN Brasil, na última segunda-feira, chamou-me a atenção a explicação que o jornalista José Trajano dava aos telespectadores sobre a transmissão dos jogos do Campeonato Espanhol pelo canal.

Dizia que, por contrato, o canal poderia transmitir, em rodadas alternadas, os dois melhores jogos – que, naturalmente, incluem Barcelona e Real Madrid – sendo um ao vivo e outro em VT.

E que no contrato isso, e aquilo…

Ainda mencionou a obrigatoriedade do canal em fazer referência, em jogos e em reportagens, à maior competição mundial de clubes como Uefa Champions League, e não como Copa dos Campeões da Europa ou outra denominação qualquer. Isso tudo porque “tá” no contrato.

Um dos princípios mais importantes previstos no conjunto normativo e regulamentar da Fifa diz respeito à estabilidade contratual. A partir dele, todos os protagonistas da “família futebol” – jogadores, clubes, agentes, associações nacionais – devem respeitar, mutuamente, aquilo que for negociado e pactuado por meio dos contratos.

Os contratos nada mais são do que acordos que racionalizam e formalizam a vontade das partes, sujeitando-as ao equilíbrio, transparência e previsibilidade quando da necessidade de invocar e exigir o cumprimento de obrigações reciprocamente assumidas.

Bastante apropriada parece a analogia à evolução dos princípios, das regras, das práticas e dos costumes ocorrida no comércio internacional, especialmente a partir do século XV e o que vivenciou o futebol internacional no século XX.

Da realidade das trocas comerciais efetuadas por povos de distintas nacionalidades, com costumes e práticas distintas, moedas e meios de troca diversos, além da discrepância normativa e da falta de mecanismos capazes de dirimir os conflitos, os protagonistas do comércio internacional trataram de criar soluções especializadas as suas necessidades.

O auge desta evolução e organização internacionais pode ser resumida na formação da Organização Mundial do Comércio, que baliza o relacionamento entre os Estados e também inspira as regras de conduta dos atos praticados entre os particulares da iniciativa privada.

Não à toa, a previsibilidade e segurança jurídica, que também passam por meios de solução de controvérsias adequados e especializados, aumentam e aceleram o intercâmbio internacional de negócios. E o futebol tem se beneficiado desta cultura regulatória internacional desde meados da década de 1990, a partir do estabelecimento dos Estatutos e Regulamentos da Fifa e sua Câmara de Resolução de Disputas e da invocação do Tribunal Arbitral do Esporte (CAS).

O fato de que a Liga Espanhola ou quem comercializa seus direitos de transmissão terem determinado quais jogos e quando poderão ser transmitidos não é à toa, aleatoriamente determinado. Isso é fruto do conhecimento profundo daquilo que se vende e do seu devido valor comercial agregado pela organização dos eventos – coisa que o futebol brasileiro ainda está engatinhando e sofre para vender seus campeonatos fora daqui.

A própria Uefa Champions League desenvolveu um trabalho extremamente minucioso de roteirização da competição, criando hino oficial, entrada e perfilamento das equipes em campo, logomarca, abertura das transmissões dos jogos, transformando seus eventos em experiência, não apenas em jogos de futebol. Daí a necessidade de preservar a identidade dos fatos com a marca e exigir esta observância dos parceiros em nível contratual.

Portanto, vale lembrar um ditado no Direito: quem entra num mau acordo, provavelmente acabará numa boa briga.

No meio disso, estão os contratos, justamente para equilibrar as forças dos que negociam e evitar maus acordos e, ainda mais, boas brigas.

Para interagir com o autor: barp@universidadedofutebol.com.br

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Futebol, tecnologia e frases para refletir II

Olá amigos,

No texto I deste título, trouxemos a colaboração de Abraham Lincoln, Alphonse Allais e Arthur C. Clarke.

Hoje, buscando, nas celebres frases, inspiração para discutirmos algumas questões presentes no futebol moderno, contamos com a colaboração de outro trio de grande relevância no cenário nacional e mundial: Rui Barbosa, Jean-Jacques Rousseau e Nelson Mandela.

Um dos grandes intelectuais brasileiros do inicio do século passado, Rui Barbosa, disse certa vez:

“A miopia intelectual é a mais constante geradora do egoísmo”.

Confesso que essa frase por si só ilustra inúmeras situações e desperta, em cada um dos amigos, uma infinidade de interpretações, mas, como o propósito desse texto é justamente apresentar-lhes algumas das interpretações, vamos à conexão que faço desta frase com o futebol e a tecnologia.

Sendo sempre enfático sobre a necessidade de entender tecnologia como processo, lembramos da gestão de conhecimento, meio extremamente necessário nos clubes de futebol e que conta com a tecnologia e suas diferentes possibilidades como uma grande aliada para se tornar uma eficaz ferramenta de gestão.

Entretanto, abre-se a questão do grande egocentrismo que envolve muitos dos profissionais do futebol, e, até certo ponto, do esporte em geral. Para que uma gestão de conhecimento seja plausível, mais do que tecnologia, mais do que projetos e processos, é preciso admitir que outras pessoas, e não só uma, detêm diferentes níveis de conhecimento que se complementam, e mesmo quando aparentam ser incompatíveis, o embate ajuda a encontrar uma solução mais completa e embasada.

A miopia a que Rui Barbosa se refere é muito peculiar quando nos lembramos das fases da infância, nas quais a criança se vê como o centro de tudo, e tem dificuldades de reconhecer terceiros como parte importante do mundo em que vive. Essa comparação, um tanto quanto impensada, pode denotar que a gestão e os processos administrativos no futebol estão ainda na sua fase de infância, talvez, tentando chegar à adolescência, quando há a compreensão mais complexa do mundo e das relações sociais, ainda que prevaleçam alguns pensamentos imaturos.

Essa ideia pode ser complementada pelas palavras de Jean-Jacques Rousseau:

“Geralmente aqueles que sabem pouco, falam muito e aqueles que sabem muito, falam pouco”.

Para justificar o egocentrismo e a tal miopia intelectual, as palavras servem de escudo, protegendo quem as proclama, porém, muitas vezes, podem acabar servindo de obstáculo, seja pela miopia de Rui Barbosa, seja pela cegueira de Van Gogh, que dificulta, mas não impede (no máximo tarda) a chegada de novos rumos na administração do futebol.

“Quando um cego grita para outro cego, os dois tropeçam na mesma pedra”, disse Vincent Van Gogh.

E para não parecer que achamos que a culpa é única e exclusivamente de quem está aí fazendo o futebol há tantos anos, nos reportamos à frase do inquestionável Nelson Mandela, que ilustra muito bem aquilo que penso sobre como a ciência deve olhar para o futebol:

“Se você falar com um homem numa linguagem que ele compreende, isso entra na cabeça dele. Se você falar com ele em sua própria linguagem, você atinge seu coração”.

Para tocar o coração do futebol, defendemos a ciência no campo, temos que transformar nossos sisudos discursos em uma linguagem que toque o coração dos “profissionais da bola”, uma linguagem que faça sentido e seja passível de trazer resultados. Mas, que resultados são esses…

Para interagir com o autor: fantato@universidadedofutebol.com.br

Leia mais:
Futebol, tecnologia e frases para refletir I

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Fórmula e conteúdo

Os pontos corridos estão cada vez mais óbvios na mente da imprensa; mas e a adequação do calendário?
 
A fórmula do sucesso é, de fato, uma fórmula sem segredo. Ou, pelo menos, é o que mostra ser nesta primeira volta quase completa do Campeonato Brasileiro. Algumas palavras-chaves deveriam estar anotadas no caderno de cada dirigente.
 
Planejamento, pouca alternância de comando, elencos mais completos.
 
Essas três premissas já deveriam, com os pontos corridos entrando em sua sexta edição, fazer parte da cartilha de todo cartola. E da imprensa também!
 
Passada a primeira metade do campeonato, o espaço para surpresas é quase mínimo. Talvez Barueri e Avaí sejam as exceções do momento. O primeiro, pela campanha acima do esperado no ano de debute na elite do futebol. O segundo, pela melhora de desempenho sem grandes mudanças de elenco e de treinador. O que, talvez, explique essa arrancada.
 
O restante do campeonato não muda. Vai bem quem tem jogador de reposição, treinador com prestígio e calma para trabalhar no banco e, sobretudo, paciência dos dirigentes.
 
Palmeiras, Inter e São Paulo têm todas as condições para disputar o título, sendo que colorados e tricolores levam vantagem pelo fato de terem equipes com praticamente 15 a 16 jogadores, sem sofrer grandes oscilações quando sai um atleta considerado titular.
 
Esse talvez seja o grande ponto de interrogação sobre o futuro do Palmeiras no campeonato. Um time bem montado, eficiente na marcação, ainda tentando se encontrar no ataque, mas que, quando perde um jogador titular, fica sem o mesmo rumo.
 
A fórmula está pronta e já consagrou, nos últimos três anos, o São Paulo. Pontos corridos geralmente premiam quem é mais eficiente e, principalmente, quem tem mais fôlego para aguentar oito meses de campeonato com muitos jogos nos meios e finais de semana.
 
Até a imprensa percebeu isso…
 
Resta, agora, entender que a pergunta não é quando o calendário do futebol será unificado.
 
Antes disso temos tantos estaduais para serem resolvidos! Do contrário, a fórmula continuará a prejudicar o conteúdo.

Para interagir com o autor: erich@universidadedofutebol.com.br

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O treino do jogador de futebol na “caixa de areia”

Hoje, vou me intrometer onde não fui chamado. Dia desses, estava vendo TV, ou melhor, zapeando canais, quando uma fervorosa discussão em um programa esportivo me chamou a atenção.

Dois especialistas da mesma área – preparação física – divergiam sobre benefícios, malefícios e a necessidade real de treinos em “caixa de areia” para jogadores de futebol.

Um deles dizia ser o treino em “caixa de areia” essencial para melhorar a velocidade de deslocamento dos jogadores em campo e que, portanto, esse meio de treinamento deveria ser usado em qualquer etapa da preparação. O outro concordava que o trabalho em “caixa de areia” era benéfico para a melhora da velocidade de deslocamento, mas que esse tipo de trabalho só deveria ser empregado em determinadas etapas do processo de treinamento.

Oh, não, senhores!

Primeiro, pelos motivos que já tantas vezes apresentei, proponho que pensemos em treinos para jogadores de futebol numa outra perspectiva – integrada, complexa, imprevisível, etc, etc, etc. Mas tudo bem; se preferem não mudar, paciência – a verdade, na verdade, não é uma verdadeira verdade.

O caso é que o problema na discussão que assisti é muito anterior a questões que envolvem modelos ou construtos inovadores nas tendências do treino desportivo do futebolista.

A velocidade de deslocamento do jogador de futebol, a constante mudança de direção e as alternâncias permanentes de ritmo de corrida estão, entre outras coisas, associadas também ao tempo de aplicação e manifestação da força muscular por parte desses jogadores. Esse tempo, para favorecer contrações bastante rápidas, precisa ser mínimo.

Para se deslocar em alta velocidade, um jogador necessita que o tempo de aplicação de força no solo (no gramado onde joga) seja muito pequeno, mas que promova movimentos muito rápidos, de maneira que a aplicação da força pelo pé do atleta no campo e a reação do campo sobre o pé se expressem de maneira extremamente reativa e explosiva.

O tempo de contato a cada movimento entre pé (chuteira) e solo (gramado) deve ser mínimo, e nele (no tempo mínimo) a expressão da força (que garanta a ação rápida) deve ser relativamente máxima e suficiente para a necessidade da própria ação.

E isso, é justamente o contrário do que a “caixa de areia” propicia.

Quando um atleta tenta fazer corridas rápidas na areia tem dificuldades, pois o tempo de contato entre o seu pé e o solo, a cada movimento, é maior do que quando realizado na grama, ou outra superfície mais dura. Isso quer dizer, que a frequência de movimentos que acaba sendo capaz de fazer na areia é menor do que no gramado e que, portanto, a exigência neuromuscular para a ação não se configura como sobrecarga que estimule respostas adaptativas no sentido do aumento da velocidade.

Trabalhos científicos têm, faz muito tempo (muito mesmo!), mostrado que os efeitos de curto e médio prazo de treinos na caixa de areia não contribuem para o aumento da velocidade de deslocamento ou da força explosiva; pelo contrário, muitos relatos apontam perda de desempenho nesses índices com treinos que a utilizam como meio.

Então, diria aos nossos especialistas (os que assisti discutindo) que, sob o ponto de vista da complexidade, essa discussão nem faria sentido. Mas que ainda assim, mesmo não me pautando nela (na complexidade), o treino na “caixa de areia” para melhora do desempenho na velocidade de deslocamento dos jogadores de futebol ou da sua força explosiva não faria sentido algum em etapa alguma da preparação atlética do futebolista.

Para interagir com o autor: rodrigo@149.28.100.147

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O treino do jogador de futebol na "caixa de areia"

Hoje, vou me intrometer onde não fui chamado. Dia desses, estava vendo TV, ou melhor, zapeando canais, quando uma fervorosa discussão em um programa esportivo me chamou a atenção.

Dois especialistas da mesma área – preparação física – divergiam sobre benefícios, malefícios e a necessidade real de treinos em "caixa de areia" para jogadores de futebol.

Um deles dizia ser o treino em "caixa de areia" essencial para melhorar a velocidade de deslocamento dos jogadores em campo e que, portanto, esse meio de treinamento deveria ser usado em qualquer etapa da preparação. O outro concordava que o trabalho em "caixa de areia" era benéfico para a melhora da velocidade de deslocamento, mas que esse tipo de trabalho só deveria ser empregado em determinadas etapas do processo de treinamento.

Oh, não, senhores!

Primeiro, pelos motivos que já tantas vezes apresentei, proponho que pensemos em treinos para jogadores de futebol numa outra perspectiva – integrada, complexa, imprevisível, etc, etc, etc. Mas tudo bem; se preferem não mudar, paciência – a verdade, na verdade, não é uma verdadeira verdade.

O caso é que o problema na discussão que assisti é muito anterior a questões que envolvem modelos ou construtos inovadores nas tendências do treino desportivo do futebolista.

A velocidade de deslocamento do jogador de futebol, a constante mudança de direção e as alternâncias permanentes de ritmo de corrida estão, entre outras coisas, associadas também ao tempo de aplicação e manifestação da força muscular por parte desses jogadores. Esse tempo, para favorecer contrações bastante rápidas, precisa ser mínimo.

Para se deslocar em alta velocidade, um jogador necessita que o tempo de aplicação de força no solo (no gramado onde joga) seja muito pequeno, mas que promova movimentos muito rápidos, de maneira que a aplicação da força pelo pé do atleta no campo e a reação do campo sobre o pé se expressem de maneira extremamente reativa e explosiva.

O tempo de contato a cada movimento entre pé (chuteira) e solo (gramado) deve ser mínimo, e nele (no tempo mínimo) a expressão da força (que garanta a ação rápida) deve ser relativamente máxima e suficiente para a necessidade da própria ação.

E isso, é justamente o contrário do que a "caixa de areia" propicia.

Quando um atleta tenta fazer corridas rápidas na areia tem dificuldades, pois o tempo de contato entre o seu pé e o solo, a cada movimento, é maior do que quando realizado na grama, ou outra superfície mais dura. Isso quer dizer, que a frequência de movimentos que acaba sendo capaz de fazer na areia é menor do que no gramado e que, portanto, a exigência neuromuscular para a ação não se configura como sobrecarga que estimule respostas adaptativas no sentido do aumento da velocidade.

Trabalhos científicos têm, faz muito tempo (muito mesmo!), mostrado que os efeitos de curto e médio prazo de treinos na caixa de areia não contribuem para o aumento da velocidade de deslocamento ou da força explosiva; pelo contrário, muitos relatos apontam perda de desempenho nesses índices com treinos que a utilizam como meio.

Então, diria aos nossos especialistas (os que assisti discutindo) que, sob o ponto de vista da complexidade, essa discussão nem faria sentido. Mas que ainda assim, mesmo não me pautando nela (na complexidade), o treino na "caixa de areia" para melhora do desempenho na velocidade de deslocamento dos jogadores de futebol ou da sua força explosiva não faria sentido algum em etapa alguma da preparação atlética do futebolista.

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O triste fim do caso da Máfia do Apito

Caros amigos da Universidade do Futebol,

Chegou ao fim o impasse que pairava sobre os desdobramentos do caso daquilo que ficou conhecido como Máfia do Apito.

Para quem não se lembra, no Campeonato Brasileiro de 2005 foi descoberto um esquema envolvendo apostadores e juízes de futebol, que manipulavam (ou tentavam manipular) jogos para favorecer apostas anteriomente feitas por integrantes do grupo.

Antes de qualquer comentário, é sempre importante ressaltar quão prejudicial ao esporte tal prática representa. A manipulação de resultados altera a verdade desportiva e pode acarretar, em última análise, na descredibilidade total do jogo, afastando torcedores, investidores, mídia, etc.

As autoridades desportivas agiram com firmeza nesse caso, ao afastarem em definitivo dois árbitros responsáveis. Porém, na justiça comum, o resultado não foi nada satisfatório.

Acabamos de ter a notícia de que os desembargadores responsáveis pelo julgamento da ação penal proposta contra os envolvidos decidiram por trancar o processo, isentando-os de qualquer pena na esfera criminal.

Aparentemente, apesar de reconhecerem que de fato houve manipulação de resultados, os desembargadores entenderam que não há como caracterizar tal fato como criminoso com base na nossa legislação criminal.

Em outras palavras, podemos abstrair dessa decisão que a manipulação de resultados desportivos, ainda que para a finalidade de se auferir lucro com apostas irregulares, não caracteriza crime.

Não queremos entrar no mérito se a decisão foi acertada ou não. Mas precisamos dizer que ela é bastante prejudicial, não só para o futebol, como também para o esporte em geral em nosso país.

Temos que unir esforços, tanto das autoridades do futebol, como das autoridades públicas, para se alterar com urgência a legislação criminal pátria. É preciso que se reconheça de uma vez por todas a existência de uma especificidade do esporte e que, desta forma, sejam criadas uma série de artigos legais que visem coibir atitudes indesejáveis no mundo do esporte.

Lembre-se que o esporte é hoje um ramo de atividade comercial, mas que possui um caráter social de proporções indescritíveis. Não se pode aceitar que certas práticas continuem a ser impunes, e que aproveitadores continuem a tentar desvirtuar os seus princípios fundamentais em busca de proveitos financeiros.

Não tenho nenhuma dúvida que a manipulação de resultados desportivos, assim como outras condutas não condizentes com os princípios do esporte, deveriam ser punidas como um crime como outro qualquer.

Precisamos de uma reforma legislativa já. De uma reforma séria, sensata, e não política. Para a punição dos responsáveis e da busca pela tão sonhada credibilidade do nosso esporte.

Para interagir com o autor: megale@universidadedofutebol.com.br

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Fermento

Você não vai gostar do que vai ler. Provavelmente, irá reclamar.Quiçá me enviará um e-mail. Mas alguém tem que dizer. O futebol não é um negócio tão grande quanto você imagina. Não é. Nunca foi. Provavelmente, nunca será.

Alguém, em algum lugar, criou o mito. Provavelmente foi o William MacGregor, um escocês que era dono do Aston Villa e fundou a Football League na metade do século XIX. Ele, em seu livro ‘The book of Football’, escreveu: ‘football is a big business’. A ideia pegou, e todo mundo passou a reproduzir.

Você pode estar pensando que eu sou idiota, o que é justo. Afinal, todo mundo diz que o negócio do futebol é enorme, só que mal explorado.Mas a verdade, infelizmente, é que o futebol é um negócio extremamente supervalorizado. Ele gera mais exposição do que dinheiro. E, talvez por isso, todo mundo ache que vale muito, mas muito dinheiro.

Você conhece a Usina Itaiquara de Açúcar e Álcool S.A.? É provável que não. A não ser que você trabalhe no setor de cana-de-açúcar, ou que compre produtos de panificação, ou que more em Tapiratiba, São Paulo, ou que torça para a Portuguesa, o que eu imagino não serem características do perfil dos poucos que leem essa coluna.

De qualquer maneira, a Itaiquara produz energia, produtos pra confeitaria e produtos pra uso doméstico, como açúcar, mistura pra bolo, mistura pra pão de queijo e fermento, que minha mãe sempre disse também ser energia.

Incrivelmente, ou não, a Itaiquara patrocina a Portuguesa, além da Pizza na Roça, supostamente a melhor pizzaria do Brasil, localizada em Caconde, São Paulo. Incrivelmente, também, é que a Itaiquara não está sendo citada aqui por nada disso. A Itaiquara está sendo usada de exemplo porque ela foi a milésima empresa em vendas do Brasil no ano de 2008, de acordo com o índice “Melhores e Maiores” da Exame. A Itaiquara faturou no ano passado 133,9 milhões de dólares, o que dá cerca de 320 milhões de reais de acordo com a cotação usada pela revista. A milésima empresa do Brasil. Isso quer dizer que outras 999 empresas faturaram mais.

E sabe quanto o São Paulo Futebol Clube, tradicionalmente o clube com maior receita do país, faturou no ano passado? 158 milhões de reais, menos da metade do faturamento da Itaiquara, a milésima empresa do Brasil, que vende produtos de panificação e patrocina a Portuguesa, o que – colocando nessa ordem – até faz sentido. Menos da metade. O maior clube do Brasil.

Lógico que você vai dizer que o São Paulo explora mal as receitas e que ele poderia crescer muito mais se o futebol fosse mais organizado. Certo. Não há dúvidas que ele poderia arrecadar mais. Mas quanto mais? O grosso da grana, quase 40%, vem da venda de jogadores e direitos de televisão, valores que dificilmente podem ser elevados. Adicionando o patrocínio, que está num valor bastante significativo e que dificilmente tem espaço para crescimento, o percentual sobe para quase 50%. Esse valor é de certa forma consolidado e tem pouco espaço para crescimento, por mais bem organizado que o clube seja.

De resto, tem valor de ingresso, sócios, premiações, enfim, uma diversidade de coisas. Que até poderiam apresentar também um crescimento, mas nada capaz de fazer dobrar o faturamento do clube para que ele, dessa forma, chegasse próximo à milésima empresa do país.

Na Europa, acredite, também não é diferente. Os clubes de futebol não figuram na lista das maiores empresas de qualquer país. Apesar de ter uma exposição enorme, o negócio do futebol, volto a dizer, não é tão grande assim.

Diminuir as expectativas de geração de receita provenientes do futebol, em especial do Brasil, talvez seja um passo importante para se melhorar as condições atuais. Por isso, por mais decepcionante que possa parecer, é imprescindível que se analise a realidade do jeito que ela é.

E se você é de Itaiquara ou trabalha em um canavial, ou é torcedor da Portuguesa, por favor, me envie um e-mail. Ficaria bastante contente em conhecer as razões pelas quais você lê o que eu escrevo.

Em tempo: caso o São Paulo tivesse enviado o seu balanço para a Exame, ele ficaria na honrosa milésima centésima nonagésima quinta posição, empatado com a Ponte de Pedra, uma hidrelétrica localizada em Itiquira, Mato Grosso, que tem seis funcionários. Se você é de Itiquira, também pode me mandar um e-mail. Se você for um desses seis funcionários, por favor, não mande nada. Seria assustador demais.

Para interagir com o autor: oliver@universidadedofutebol.com.br